OS 70 ANOS DA

 REVOLUÇÃO PAULISTA

 DE 1932


Cláudio Moreira Bento

Há 70 anos, de 9 de julho a 2 de outubro de 1932, o Brasil foi sacudido pela revolução de 1932, liderada pelo Estado de São Paulo contra o Governo de Getúlio Vargas que assumira a chefia do Brasil em decorrência da vitória da Revolução de 1930 que ele liderara .

Até hoje não estão bem claras as razões do envolvimento de São Paulo neste movimento que aqui evocaremos do ponto de vista das operações militares terrestres e aéreas que se desenvolveram nas diversas frentes de batalha e das navais na Frente do Litoral .

E concluiremos das lições militares decorrentes que a tornaram inclusive num laboratório para a formação de lideranças do Exército e de nossa Força Aérea que defenderam em 194/45 a Democracia e a Liberdade Mundial na Itália,  sob ameaça do nazi facismo.

Evento histórico em evocado com realismo e fidelidade pela Rede Globo na novela ESPERANÇA de Benedito Rui Barbosa .

Sobre de que lado estava a razão política, se do governo ou dos revolucionários, a História o dirá numa análise isenta do episódio que esta muito cedo para ser feita ..

Ao historiador resta celebrar a coragem e patriotismo do heróis que se consagraram entre os governistas e revolucionários,  em defesa do que elegeram, sinceramente, como suas verdades .Pois ninguém é capaz de arriscar sua vida em combate se não estiver convicto da justeza da causa que abraçaram .

 

 

Introdução á Revolução de 1932

 

A Revolução Paulista teve início em 23 maio de 1932, sendo interventor de São Paulo, Pedro de Toledo, que viria a abraçar o movimento.

O estopim foi o confronto ocorrido nesse dia, na Praça da República, entre membros da Legião Revolucionária Getulista, fundada por Miguel Costa, e populares contrários ao que a Legião defendia.

Nesse choque, onde foram usadas até armas de guerra, morreram os jovens paulistas Miraguaia, Martins, Dráusio e Camargo, que dariam origem a sigla MMDC que congregou os conspiradores revolucionários.

O levante teve lugar na noite de 9 de julho de 1932, unindo tropas da Força Pública de São Paulo, algumas unidades do Exército, e voluntários paulistas.

Assumiu o comando da 2ª Região Militar, em São Paulo, o Coronel Euclides de Oliveira Figueiredo, na condição de revolucionário. Mais tarde viria, para o comando das operações, o general reformado do Exército Bertoldo Klinger.

O General Klinger era filho de Rio Grande (RS). Fora colega de Getúlio, na Escola Preparatória e Tática do Rio Pardo (RS). Cursara Artilharia no Exército Alemão (1910-12). Foi um dos idealizadores da revista A Defesa Nacional, em 1913, tendo exercido grande influência cultural e doutrinária no Exército até 1922, ano da vinda da Missão Militar Francesa. Foi o maior representante da influência militar alemã no Exército até esse ano. Atingiu o posto de general em 1931, sendo logo a seguir reformado. O estudamos em Centenário de nascimento do General Bertoldo Klinger .A Defesa Nacional,  n o 711,jan/fev 1984.

Euclides Figueiredo, carioca, cursou o Colégio Militar do Rio de Janeiro (CMRJ). Fez o curso de Cavalaria no Exército Alemão, de 1910 a 1912. Era veterano do Contestado. Chefiou o Curso de Cavalaria da célebre Missão Indígena, da Escola do Realengo. Participou da pacificação da Revolução de 1923, no Rio Grande. Foi contra a revolução de 30 como comandante da atual 2a Bda C Mec Brigada Charrua em Uruguaiana cuja história estamos resgatando dentro do Projeto História do Exército na Região Sul .Ele comandou o atual Regimento de Dragões, de Brasília, cujos históricos uniformes foram adotados em seu comando. É pai do ex-presidente João Figueiredo. Foi um dos 13 idealizadores da revista A Defesa Nacional, junto com Klinger.

Dessa forma, na condução militar da revolução, os paulistas dispuseram de dois excelentes e renomados profissionais militares, dos mais dedicados e produtivos de que o Exército dispunha, integrantes do restrito e seleto grupo que passou à história como Jovens Turcos, constituído de tenentes que estudaram na Alemanha ou na Escola de Guerra em Porto Alegre. Como instrutores e escritores, através da histórica A Defesa Nacional, eles revolucionaram a instrução e os costumes do Exército. Paradoxalmente, porém, formados na doutrina militar alemã, tiveram que empregar a Força Pública de São Paulo treinada, desde 1909, por uma Missão Militar Francesa.

 

Forças em presença

A Revolução de 1932 desenvolveu-se em 6 frentes: Frentes Leste, ou do Vale do Paraíba; Frente Sul, ou Paranaense; Frente Mineira (menos Vale do Paraíba); Frente de Mato Grosso; Frente do Litoral (entre a Serra do Mar e o litoral norte de São Paulo) e a Frente do Rio Grande do Sul.

 

Frente Leste ou do Vale do Paraíba

Foi a frente principal para os revolucionários. Suas tropas combateram entre as serras da Mantiqueira e do Mar, de Guaratinguetá para o norte, até a fronteira São Paulo – Rio. Eles atuaram ao longo da ferrovia e da antiga rodovia Rio - São Paulo, integrando a 2ª DIO – Divisão de Infantaria em Operações, ao comando do Coronel Euclides Figueiredo.

A 2ª DIO possuiu 5 destacamentos, atuando em eixos diferentes:

Os dois destacamentos, este e o anterior, combateram na direção do Rio de Janeiro, seu objetivo.

 

Nessa frente autuou a principal força governista, uma Divisão de Infantaria da 1ª Região Militar, comandada pelo General Pedro Aurélio de Goes Monteiro tendo, como chefe de estado-maior, o Coronel Pantaleão Pessoa.

Ela cobriu todos os setores do Vale do Paraíba e os que para ele convergiam, quer no eixo Rio – São Paulo, quer no de Minas e, mesmo, do litoral de Angra dos Reis e Parati.

O posto de comando governista foi instalado em Resende, inicialmente, e contou com o apoio de uma base aérea estabelecida na esplanada da atual AMAN. Os aviões, conhecidos por vermelhinhos, eram os Waco.

Essas tropas foram sendo reforçadas por tropas vindas do Norte, do Nordeste e do Sul. Elas contaram até com canhões navais montados em vagões ferroviários.

O General Góes Monteiro foi uma das mais brilhantes cabeças militares do Exército em todos os tempos. Foi estrategista militar e político de raros méritos, além de grande estudioso de Napoleão.

Já havia atuado em São Paulo, como chefe de Estado - Maior de força que combateu, ali, a Revolução de 24.

Como Tenente-Coronel comandante de Regimento de Cavalaria em São Luiz Gonzaga, foi guindado à liderança militar da Revolução de 30.

É imensa sua projeção na construção do Exército a partir de 1930, ao lado do General Eurico Dutra,. Góes Monteiro tem sido muito estudado por brasilianistas, em função de sua importância.

 

Frente Sul ou Paranaense

Nesta frente, também muito importante, houve dois setores para os revolucionários:

Hoje Miguel Costa e o Cel Pedro Dias de Campos são patronos de duas cadeiras especiais da Academia de História Militar Terrestre do Brasil e dois ícones da Policia Militar de São Paulo,  cuja História nós sintetizamos em Sesquicentenário da PMSP .São Paulo:PMSP,1981.

Os governistas atuaram em dois destacamentos, ao comando do General Castilhos Lima:

 

Frente Mineira (excluído o Vale do Paraíba)

Os revolucionários exerceram fraca vigilância, com esparsos elementos da Força Pública e voluntários de São Paulo, no enorme arco balizado por Bragança Paulista-Campinas-Ribeirão Preto-Uberaba-São José do Rio Preto.

A força governista, constituída pelo destacamento Coronel Manoel Rabelo, tinha a missão de isolar militarmente São Paulo de Mato Grosso de possíveis reforços vindos via Santana do Parnaíba e Porto do Tabuado. O destacamento era orientado sobre Ribeirão Preto.

 

Frente do Mato Grosso

Os revolucionários matogrossenses não conseguiram unir-se aos paulistas. As tentativas foram impedidas em Porto Murtinho e Coxim.

As forças governistas eram constituídas pelo destacamento do Coronel Rabelo (com atuação também em Minas), de Foz do Iguaçu, na direção de Ponta Porã e sobre Campanário, o de Porto Murtinho, e o de Cuiabá, que alcançou Coxim, embora lançado sobre Campo Grande.

 

Frente do Litoral (entre a Serra do Mar e o Atlântico)

Os revolucionários tinham, como missão, a defesa do porto de Santos, como o forte de Itaipu e a cidade de Santos, com o Batalhão de Caçadores e duas companhias do Exército, e a defesa do flanco revolucionário, em Cunha, contra a ação de tropas, particularmente navais, lançadas a partir de Parati.

Os governistas tinham como missão o bloqueio de Santos, inclusive com apoio aéreo. O destacamento terrestre, em Parati, foi lançado na direção de Cunha, com predominância de fuzileiros navais.

 

Frente do Rio Grande do Sul

Tropas da região da fronteira que foram levantadas sobre a liderança do Dr. Borges de Medeiros, ex-presidente do Rio Grande do Sul, mais com a finalidade de fixar tropas governistas que pudessem ser enviadas para combater São Paulo, do que para apoiar São Paulo, pois ficaram reduzidos a 450 combatentes e, no combate de Cerro Alegre, de 20 de setembro de 1932, numeraram 204.Este combate foi resgatado pelos acadêmicos Cel PMRS Jose Luiz Silveira, veterano dele e mais por Osório Santana Figueiredo

 

As Operações Militares

 

Na Frente do Vale do Paraíba

Os destacamentos Andrade e Agnelo progrediram na direção do Rio, respectivamente ao longo da antiga rodovia Rio-São Paulo, atingindo Formoso (Serro Frio), em São José do Barreiro (SP), e ao longo da ferrovia Rio-São Paulo, atingindo Salto, na fronteira Rio-São Paulo.

Ao tentarem progredir no Estado do Rio, foram barrados por governistas, em Clube dos Duzentos, sobre a rodovia, e em Engenheiro Passos, que o ‘Major Agnelo manteve até o final de julho, dominando a rodovia que dá acesso ao circuito das águas.

Os governistas, com posto de comando na estação ferroviária de Resende, desfecharam uma contra-ofensiva, em agosto, que obrigou os revolucionários a bater em retirada e se entrincheirarem em Queluz.

Sobre o posto de comando do destacamento Sampaio, em Cruzeiro, os governistas conduziram pesado bombardeio de Artilharia, do qual participou a aviação governista com base no atual Campo de Paradas da AMAN (Campo de Marte). Canhões de Marinha montados em vagões ferroviários bombardearam fortemente a estação de Vila Queimada.

Em setembro, os revolucionários se retiraram de Queluz e ocuparam a linha de trincheiras Vila Queimada-Lavrinhas (ocupada em 2 de setembro).

Na frente de Silveiras, os revolucionários, numa contra-ofensiva, impuseram revés ao 19º Batalhão de Caçadores. O espaços na região de Silveiras foi disputadíssimo, com vitórias alternadas, até 12 de setembro (retirada para Jatai).

No setor do Túnel da Mantiqueira, em Cruzeiro, os revolucionários construíram uma linha de resistência balizada pelos picos da Gomeira, Cristal, Itaguaré e Gomeirinha, acima da boca do túnel voltada para Minas e nas escarpas.

A posição começou a ser disputada em 16 de julho. E os combates prolongaram-se até 27, por 11 dias, até a perda da posição pelos revolucionários, após épica e memorável resistência.

Em 8 de setembro, os governistas atacaram fortemente o setor. Os revolucionários foram obrigados a deixar o setor do túnel, que caiu pela manobra governista que, de Resende, atacou Cruzeiro.

Em Cruzeiro comandou os revolucionários o Coronel Sampaio que, segundo consta, era da família do Brigadeiro Antônio de Sampaio, atual patrono da Infantaria do Exército e que teve atuação heróica na batalha de Tuiuti, na Guerra do Paraguai.

Combateu aí no setor do túnel, como médico da Polícia Militar de Minas, Juscelino Kubistchek que encontraria mais tarde sua morte em acidente automobilístico próximo ao local.

Na área de Piquete foi mantida, em mãos revolucionárias, a Fábrica de Piquete. No início de setembro os revolucionários ocupavam a seguinte linha avançada: Piquete - Túnel da Mantiqueira -Fazenda Boa Vista – Pinheiros -Lavrinhas –J atai.

Em 11 de setembro os revolucionários deram início à retirada para Guaratinguetá, fato determinado pela perda de Cachoeira Paulista.

 

Na Frente Sul ou Paranaense

Na frente Paranaense, na estação ferroviária de Buri, ambos os combatentes escreveram páginas épicas.

Foi onde se verificaram os maiores choques.

A criatividade revolucionária idealizou e tornou realidade um trem blindado tendo montado em plataforma um canhão 75mm.

Pressionados e em inferioridade numérica, os revolucionários executaram uma manobra retardadora, trocando espaço por tempo, em benefício da ação principal no Vale do Paraíba.

A revolução do Rio Grande do Sul teve o mérito de provocar a retirada de tropas governistas desta frente, vindas do Rio Grande com João Francisco, para irem combater o Dr. Borges de Medeiros, que se levantaria em favor de São Paulo.

 

Na Frente Mineira

Os revolucionários haviam se organizado em Bragança, Campinas, Mogi-Mirim, São José do Rio Pardo e Ribeirão Preto.

Em 26 de agosto, foram obrigados, por falta de munição, artilharia e por inferioridade numérica, a se retirarem para a linha do rio Peixe. Em 30, se retiraram para Mogi-Mirim. Aí destacou-se o Capitão Romão Gomes que, recorrendo a guerra de guerrilha, conseguiu ganhar tempo nessa frente, onde inclusive, em Barretos, os revolucionários usaram minas nas estradas.

 

Na Frente de Mato Grosso

Foi notável a luta pela posse de Porto Murtinho, essencial à revolução para a exportação de café, uma vez que o porto de Santos estava sob bloqueio naval governista

Somente em 12 de setembro os governistas conseguiram controlá-lo e assim sepultar as últimas esperanças revolucionárias de apoio em recursos externos.

 

Na Frente do Litoral

No setor de Santos não houve combates, somente divergências entre autoridades revolucionárias por questões hierárquicas. Registre-se, no Forte de Itaipu, um simulacro de canhão de costa com um toro de madeira como se fosse um canhão e que, como tal dizem, impôs respeito, da mesma forma que, em algumas frentes, as matracas que simulavam metralhadoras.

 

Na Frente do Rio Grande do Sul

Os revolucionários em pequeno número, sob a liderança de Borges de Medeiros, conseguiram fixar tropas governistas, evitando que fossem usadas contra São Paulo e provocando, inclusive, a retirada da Frente Paranaense de valorosas tropas gaúchas para combater a revolução no Sul. Borges de Medeiros, com um pugilo de revolucionários, se manteve em campo até próximo do término da Revolução em São Paulo, até ser batido e aprisionado em Cerro Alegre, em Piratini, em 20 de setembro de 1932. Cumpriu, num contexto estratégico, sua ação diversionária de alívio da frente revolucionária paulista, o que nunca foi ressaltado devidamente em São Paulo.

Meu pai prefeito de Canguçu e ligado a Borges de Medeiros do qual seu pai Cel Genes Bento fora chefe de Polícia e Secretário, contrariando seus sentimentos pacificistas dirigia-se para Piratini em companhia de um genro, para incorporar-se as forças Borges de Medeiros que apoiavam os paulistas, quando conheceu em caminho que este fora derrotado e preso e enviado para Pernambuco .

Possuíam os gaúchos que lutaram pela causa dos paulistas e em condições dificílimas, uma certa mágoa por não serem lembrados pelos veteranos paulistas de 32 em suas comemorações

.Mais tarde brincando no porão de minha casa notei enterrado no chão um embrulhos envoltos em jornal .E ao escavar o solo dele recolhi 4 embrulhos que eram as armas que meu pai e meu cunhado teriam usado nesta revolução se tivessem se unido a tempo com Borges de Medeiros .O combate de Cerro Alegre de 20 de setembro de 1932 teve lugar na estância construída em 1852,a qual em data recente serviu de cenário em Piratini da novela da TV Manchete Ana Raio e Zé Trovão .

Aviação e Marinha

A aviação governista do Exército e da Marinha não impediram a ação da aviação revolucionária. Os bombardeios foram inócuos. Os aviões serviram para reconhecimentos e para o lançamento de panfletos. Foi nessa época que, triste com o emprego dado à sua invenção, Santos Dumont, o pai da Aviação, morreu de infarto segundo seu atestado de óbito e para outros suicidou-se ao ver o avião que inventara ser usado como arama de guerra fratricida ..

A Marinha atuou com eficiência no bloqueio naval de Santos, e seus fuzileiros navais desembarcados em Parati atuando contra o flanco revolucionário na direção Parati- Cunha- Guaratinguetá, com muitos bons resultados e grande rendimento e proteção da manobra que forçou o Armistício.

 

A Pacificação

Por volta de 14 de setembro já se começou a falar em Armistício, pelas seguintes razões, depois de 2 s meses de intensa e brava luta, forçado pela insustentável situação econômica de São Paulo e ; falta de suprimentos e de munição, sendo que esta vinha sendo pouca e de má qualidade produzida por Matarazzo, numa emergência; abatimento moral do comando político da Revolução, que percebia toda a triste realidade na falta dos apoios prometidos, principalmente dos gaúchos, em razão de Flores da Cunha, seu interventor, haver apoiado o governo, e, finalmente, a inviabilidade de êxito militar da Revolução.

A linha Guaratinguetá foi bombardeada fortemente, em 20 de setembro, por aviões e artilharia, no mesmo dia em que Borges de Medeiros era batido e preso em Cerro Alegre, Piratini.

Com a perda de Cunha para os fuzileiros navais e a perda do túnel, facilitando o livre acesso de governistas mineiros ao Vale do Paraíba, o anel governista foi se fechando em torno de Guaratinguetá, onde se concentraram as últimas esperanças revolucionárias.

Em 27 de setembro, quando ia ser desfechada a ofensiva governista sobre Guará, telegrama do Catete insinua a negociação de uma trégua.

Ela foi aceita e o chefe do Estado - Maior governista, Coronel Pantaleão Pessoa, chefe e profissional de raros méritos, mas muito discreto, redigiu a Convenção de Paz em termos elevados e fraternos.

A Convenção de Paz, em seu artigo V, rezava, entre outras considerações:

 

" O reconhecimento da extraordinária persistência e bravura com que se bateram as tropas paulistas, de um modo geral.

E, com esse reconhecimento, homenagear os nobres sentimentos daqueles revolucionários que, doravante, quisessem contribuir à união dos brasileiros e trabalhar para a extinção das dissensões e ressentimentos políticos, restabelecimento da coesão e disciplina das Forças Armadas".

Aceitas as condições propostas todos os comandos governistas se empenhariam em limitar, ao mínimo, as apurações das responsabilidades pela revolução, e na entrega dos oficiais e praças revolucionários prisioneiros.

A pacificação teve lugar em Aparecida, no posto de comando do General Pedro Aurélio de Goes Monteiro, comandante governista.

O General Klinger enviou, até Cruzeiro, seus representantes que não concordaram com a Convenção.

No entanto, os representantes da Força Pública de São Paulo a aceitaram, depois de reunião em separado com o Coronel Pantaleão Pessoa.

Houve discordâncias entre Klinger e Euclides Figueiredo. Este declarou-se disposto a prosseguir, mas em realidade, ao que parece, já não existiam condições operacionais e logísticas para tal.

E teve fim o confronto militar. Os paulistas, batidos militarmente, conseguiram uma vitória política: a promessa de constitucionalização do Brasil e a nomeação de Armando Sales para interventor.

São Paulo surpreendeu, nessa revolução, com a mobilização de homens e mulheres, recursos financeiros (campanha do ouro) e indústrias para o esforço de guerra em prazos considerados impossíveis.

Improvisaram linhas de fabricação de armas, granadas, morteiros, máscaras contra gases, munição de artilharia, bombardas, veículos blindados, telefones capacetes, binóculos etc.

Produziram material de saúde, alimentos enlatados, precursores das rações de campanha.

Mobilizaram, até o 3º dia, 50.000 homens que foram organizados em 40 batalhões e que demonstraram grande vontade do combater, mas que careciam de instrução, armamento e chefes para enquadrá-los em quantidade necessária, para atuarem num quadro de guerra moderna, como foi o caso dessa Revolução.

Muito contribuiu no fortalecimento do moral dos revolucionários a pregação pelo rádio de Cézar Ladeira e o toque do dobrado Paris Belfort, que se tornou uma espécie de hino de guerra revolucionária e que, até hoje, causa arrepios nos veteranos paulistas.

As mulheres paulistas se mobilizaram e atuaram na mobilização industrial, confeccionando uniformes, numa amostragem do que aconteceria com a mulher americana na 2ª Guerra Mundial. As mulheres mobilizadas foram em número de 72.000. São Paulo emitiu bônus, dinheiro e selos.

 

Causas do insucesso militar

Interpreto como principais causas do insucesso militar da Revolução de 32:

 

Causas do sucesso governista

Conclusão

A Revolução de 1932 foi o maior movimento armado interno no Brasil, com perdas em torno de 600 vidas humanas. Os combatentes de ambos os lados superaram as expectativas em valor, criatividade e elevação moral e espiritual.

É um episódio de ensinamentos militares que enriqueceram, de muito, o patrimônio cultural militar brasileiro, que estava prestes a enfrentar uma luta com algumas semelhanças no Teatro do Mediterrâneo, com a Força Expedicionária Brasileira e o 1o Grupo de Caça O Senta Pua .

A FEB foi integrada por brasileiros paulistas do 6º RI, Regimento Ipiranga, o maior credor de duas glórias, em Castelnuovo e em Fornovo, na captura de 25.000 alemães.

Em 1932, segundo Guilherme de Almeida,

 

"Marchou o soldado paulista, marcou o seu passo na História, deixou na terra uma pista, deixou um rastilho de glória".

 

Em 1932 foi a segunda vez que o corredor Rio-São Paulo, ligando essas duas megacidades, foi envolvido num conflito militar.

O primeiro foi em 1842 com a revolução que estourou em 31 de maio em Lorena e se estendeu para Silveira, Areias e Bananal e que só teve fim com o combate de Silveiras de 12 de julho.

Movimento, de cujo combate o Barão de Caxias não participou, e correu por conta da Polícia Militar do Rio, após a região abrangida por Guará, Lorena, Cunha, Queluz, Silveiras, Areais e Bananal ter sido anexada à Província do Rio de Janeiro, de 18 de junho a 29 de agosto.

Trecho, aliás, que 90 anos após seria o centro de gravidade da Revolução de 1932, ao contrário da de 1842, em que o centro de gravidade se situou no triângulo São Paulo – Sorocaba - Campinas e o objetivo, ao invés do Rio de Janeiro, foi a conquista da cidade de São Paulo.

Enfim são dois eventos guerreiros ocorridos no Vale do Paraíba ricos em ensinamentos para a segurança deste agora mega-eixo, tão diferente dos anos 1842 e 1932.

 

Qual a significação histórica da Revolução de 32 ?

Os que fizeram justificaram-na com a necessidade de fazer retornar o país à normalidade constitucional, tachando de absolutamente ditatorial, unipessoal e um equivoco, governo dito Provisório instaurado pelos tenentistas e os liberais de 1930.

Os que a condenam dizem-na revanchista, destinada a restaurar no poder as oligarquias derrubadas em 1930. O Gen. Espírito Santo Cardoso Ministro da Guerra, afirmou:

 

"... o povo de São Paulo está sendo iludido e explorado pelas sereias da politicagem..."

 

O Mar. Cordeiro de Farias viu o movimento assim:

 

"Não foi um encontro ideológico. Foi uma luta essencialmente política... O confronto era de natureza política e não ideológica entre o Brasil e São Paulo... não éramos inimigos mas adversários".

 

Juscelino Kubitschek, oficial médico atuante contra a revolução, viu-a mais tarde por ótica especial:

 

"Foi uma daquelas causas pelas quais os homens podem viver com dignidade e morrer com grandeza".

 

O Gen. Góes Monteiro, comandante governista na frente norte, preferiu ser incisivo em ordem do dia:

 

"... obra demolidora de políticos facciosos, ambiciosos e inescrupulosos".

 

O historiador das revoluções republicanas brasileiras, Helio Silva a exaltou :

 

"Pelo que ela representou de mobilização de forças, dedicação à causa comum, tenacidade e resistência".

 

Mas Alzira Vargas, auxiliar eficaz do pai na tarefa de comandar a repressão, entendeu de outra maneira:

 

"A Revolução Constitucionalista não era nem uma nem outra coisa. Não era uma revolução. Era uma represália. Não era constitucionalista, pois apenas contribuiu para perturbar a constitucionalização do país"

 

Da solidariedade mantida entre o povo paulista dá notícias o Gen. Klinger:]:

 

"... os ricos entregam o seu ouro, com discrição britânica e bravura romana; as senhoras despojam-se de suas jóias; os bispos entregam o ouro das igrejas e as suas próprias cruzes pastorais; os casais pobres levam à coleta suas alianças; os advogados, os médicos, os seus anéis...".

 

No terreno militar cabe a referência encontrada na História do Exército Brasileiro:

 

"O nosso maior movimento armado. O valor e a capacidade do homem, do brasileiro em face da adversidade superaram todas as expectativas, não só no campo material, das improvisações e imaginação, mas, também, no campo da elevação moral e espiritual, diante da causa e motivação para a defesa das suas convicções".

 

Seria obra da Frente Única, devendo irromper em vários estados. Mas somente cumpriram o combinado São Paulo e a parte sul de Mato Grosso, embora ocorressem pequenos levantes no RS, no PA e em MG e pronunciamentos no AM e na BA.

Em SP uniram-se os dois partidos políticos - Republicano e Democrático – com adesão popular total consagrada pela ida aos postos de alistamento de 38.000 voluntários e a oferta de 170.000 homens e mulheres para trabalhos auxiliares.

A mobilização da técnicas e da economia permitiram o repentino invento e fabrico de armas, munições, bombas, minas, tanques de guerra, trens blindados, morteiros, granadas, lança-chamas.

Porém, tudo isso e um exército à base de voluntários bisonhos estruturados ao redor de unidades do Exército e da Força Pública não bastaram para enfrentar o maior e mais poderoso complexo militar até ali mobilizado no país pelo Exército e Marinha .

O bloqueio do litoral, principalmente do porto de Santos, impediu contato dos revolucionários com o exterior e frustrou as poucas tentativas de fornecimento bélico.

Iniciada a 9 de julho, a revolução resistiu até 2 de outubro.


Cláudio Moreira Bento

Historiador Militar presidente da Academia de História Militar Terrestre do Brasil

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