ACADEMIA DE HISTÓRIA MILITAR TERRESTRE DO BRASIL

 AHIMTB/RESENDE MARECHAL MARIO TRAVASSOS

 

 

DISCURSO DE POSSE DE NEY DANTAS

NA 7ª CADEIRA ESPECIAL

QUE TEM POR PATRONO EM VIDA O VICE--ALMIRANTE REF HELIO LEÔNCIO MARTINS

 

 

Local     Auditório do Comando da AMAN

Data      27 de setembro de 2013, sexta-feira, às 15:00 horas

 

 

 

Ilmo Sr Dr JOSÉ RECHUAN, Prefeito de Resende

 

Exmo Sr General-de-Brigada TOMÁS MIGUEL MINE RIBEIRO PAIVA, Comandante da  AMAN e 1º Presidente  de Honra da AHIMTB/Resende

 

Ilmo Sr Cel CLAUDIO MOREIRA BENTO, Presidente da AHIMTB/Resende

 

Ilmo Sr Ubirajara Garcia Ritton, Presidente da Câmara de Vereadores

 

Ilma Sra Heloisa Ururahy Vilella Leandro, Diretora do Dom Bosco

 

Ilmo Sr Antonio Leão, Superintendente de Turismo da Prefeitura

 

Minhas amigas Marilda e Regina que me ajudaram desde o início

 

Meus caros resendenses genuínos e resendenses por amor

 

Meus amigos e confrades

 

Mds Sras e Srs Convidados

 

Minha mulher Vera

 

Meu filho Aloysio

 

Minhas irmãs Marcy e Lucy

 

Meus pais, presentes em espírito

 

 

Minhas palavras serão recortes de biografias, retalhos de histórias e trapos de memória.

 

Inicialmente, dirijo-me ao General Paiva que tão cortês e gentilmente nos acolhe nesta hora e prestigia esta cerimônia.

Em seguida, agradeço ao Coronel Claudio Bento por cujas mãos sou trazido a esta academia brasileira de história militar para convívio com tão ilustres historiadores.

 

Confesso minhas emoção, satisfação e orgulho por retornar aos domínios da AMAN, área herdada da Escola Militar onde adentrei pela primeira vez no início de 1945 para gozar minhas inesquecíveis infância e adolescência em época que minha memória tem gravadas histórias da rua Villagran Cabrita, do primeiro Grupo Escolar ‘Olavo Bilac’, dos quantos professores da AMAN meus mestres no Ginásio Dom Bosco, do Círculo Militar na Esplanada, das sessões dominicais de cinema e do bosque de eucaliptos atrás dele, do hospital onde nasceu minha irmã, do armazém reembolsável, da sapataria e da barbearia nas áreas de serviço, dos churrascos na fazenda Santa Maria,  do estádio General Mark Clark e das áreas vizinhas de esporte, do conjunto de  piscinas, de Monte Castelo, de Farolito e Lampião,  os cavalos de meu pai, um apaixonado pela Cavalaria que se fez professor e decano da AMAN.

 

Ao redigir este meu discurso de posse nesta casa recebi de um experiente amigo a sutil definição de um bom orador "Falar de pé para que todos o vejam, alto para que todos o ouçam e pouco para que todos o amem." Procurei seguir à risca seu conselho.

 

Jacques Le Goff é um historiador francês nascido em Toulon em 1º de janeiro de 1924, autor de dezenas de livros e trabalhos dentre eles “História e Memória” de onde extraí dois conceitos que se seguem.

 

O conceito de memória é crucial. ... A memória, como propriedade de conservar certas informações, remete-nos em primeiro lugar a um conjunto de funções psíquicas, graças às quais o homem pode atualizar impressões ou informações passadas, ou que ele representa como passadas.”

 

“A palavra 'história' ... vem do grego antigo ‘historie’, em dialeto jônico. ... Daí ... o grego histor 'testemunha' no sentido de 'aquele que vê ... e também ‘aquele que sabe; historein em grego antigo é 'procurar saber', 'informar-se'. ... É este o sentido da palavra em Heródoto, no início das suas Histórias, que são ‘investigações’, ‘procuras’".

 

Cabe pois aos homens procurar, investigar, testemunhar, registrar, guardar na memória. Homens que fazem história são aqueles que as escrevem em um contínuo e árduo, mas prazeroso afazer para aqueles que gostam. Uns fazem mais. Muito mais. Buscam esses homens e os reúne em uma entidade que conduz com abnegação, dedicação quase que exclusivos carinho e amor com um propósito – o de criar uma memória.

Felizmente, dentre os pouco mais de 200 milhões que já somos hoje existem homens idealistas, que implantam suas ideias, criam. E criam para um futuro longínquo que por certo não verão chegar. Não importa.

 

Um exemplo é Claudio Moreira Bento (19 out 1931), oficial do Exército Brasileiro, historiador militar, escritor e jornalista, um incansável pesquisador de nossa história militar terrestre desde antes de Instrutor de História Militar na AMAN entre 1978 e 1980, que hoje do alto de seus 82 anos de idade tem a incomum capacidade de presidir uma  Federação de Academias de História Militar Terrestre do Brasil.

 

Foi ele o seu criador e das cinco filiadas, dentre elas esta que preside, a Academia de História Militar Terrestre do Brasil - Marechal Mário Travassos, fundada em Resende em 1º de março de 1996 e reorganizada em 23 de abril de 2012, todas com a fito de desenvolver a história das Forças Terrestres do Brasil: o Exército, o Corpo de Fuzileiros Navais, a Infantaria da Aeronáutica, as Policias Militares e os Corpos de Bombeiros Auxiliares e de outras forças que as antecederam. 

  

O seu largo conhecimento e suas íntimas ligações com entidades de pesquisa histórica de nosso país o permitiram e o credenciaram escolher os patronos e membros de suas academias.

 

Esta em que ora nos reunimos tem duas cadeiras dedicadas ao Corpo de Fuzileiros Navais. Uma delas, a Especial de nº 7, inaugurada no dia 22 de julho de 1999 em sessão solene na Escola Naval, com a presença do Corpo de Aspirantes, que tem por patrono, em vida, o Vice-Almirante Hélio Leôncio Martins (12 jan 1915), em reconhecimento aos seus notáveis serviços prestados à História Militar Terrestre do Brasil.

 

Impossível minutar toda a biografia de Hélio Leôncio, considerado hoje o maior historiador vivo da Marinha que ao longo de seus 98 anos de idade nos empresta um formidável acervo de trabalhos em que conta sua própria história que se mistura com a da Marinha onde fez a brilhante carreira que abraçou em 1932.

É membro de conceituadas entidades culturais civis e militares do país e da Academia Nacional de la Historia Argentina. É conferencista, autor de inúmeros artigos técnicos, históricos e literários publicados na Imprensa diária do país, nos Anais Hidrográficos, na Revista Marítima, na Revista do Clube Naval, e nas Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro - IHGB e nas do Instituto de Geografia e História Militar do Brasil – IGHMB

 

  Aluno brilhante em todos os cursos que assistiu. Mereceu a Medalha de Ouro Conde Anadia, prêmio ao primeiro aluno da Escola Naval. Foi o primeiro colocado no Curso de Aperfeiçoamento de Hidrografia e Navegação em 1938 onde lhe foram ensinadas matérias além daquelas diretamente afins ao mar, o Magnetismo Terrestre, a Geodésia e a Topografia. Foi também o primeiro colocado no Curso Superior de Guerra Naval.


          Seu relato de caráter histórico quando embarcado no navio Monitor ‘Paraguaçu’ em primeira viagem do Rio de Janeiro para ser incorporado no porto fluvial de Ladário, em Mato Grosso, é notável documento de consulta e referência.

Ao escrever um de meus trabalhos, ‘A História da Sinalização Náutica Brasileira’, tive a oportunidade de entrevistá-lo para ouvir os critérios que adotara para o apagamento de nossos faróis durante a II Guerra Mundial na qual participara como Capitão-Tenente fazendo-o merecedor de medalhas brasileiras e norte-americana. A experiência adquirida em operações de guerra levou-o para o nascente Centro de Adestramento Almirante Marques Leão estabelecimento de passagem obrigatória a todos os oficiais de nossa Esquadra.

 

Transferiu-se para a reserva em 12 de maio de 1964 e foi reformado em 12 de janeiro de 1983. Foi então que com maior dedicação e afinco tornou-se o historiador que é hoje que nos lega um volumoso acervo histórico como colaborador da Coleção História Naval Brasileira, marcante realização do Serviço de Documentação da Marinha e como autor de obras como ‘Estórias Navais Brasileiras’ (1985), ‘A Marinha e a República’, A Revolta dos Marinheiros – 1910’ (1988), ‘A revolta da Armada’ (1997) e mais recentemente ‘Gloriosas Amantes’ (2005), a sua “travessura literária".

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O Almirante de Esquadra Arlindo Vianna Filho (23 abr 1936) foi escolhido para ser o primeiro ocupante da Cadeira Especial de número 7, desta Academia, aquela inaugurada no dia 22 de julho de 1999 em sessão solene, na Escola Naval, e que tem o Vice-Almirante Hélio Leôncio Martins seu patrono, em vida. 

 

Do Almirante Arlindo guardo boas lembranças de Aspirante exemplar, justo, educado, leal desde quando oficial-aluno meu veterano em 1957 na Escola Naval.

Submarinista ele, Hidrógrafo eu, cruzamos juntos em um mesmo Aviso de transporte de pessoal  a baía de Guanabara em direção às nossas bases na mesma ilha de Mocanguê próxima à Ponta da Areia em Niterói e na volta ao então ‘cais do Ministério’. Nesse informal convívio quotidiano, ainda que curto, observava-o por sua postura esbelta, elegante e polida que conservou ao longo da carreira e o levou a servir no gabinete da Vice-Presidência da República (1970-1973) e a exercer o cargo de Adido Naval em Santiago do Chile (1983-1985) graças ao seu profissionalismo e à sua cultura.

 

Comandou o Submarino Bahia, foi Diretor da Escola de Guerra Naval onde anos antes fora diplomado com distinção, foi Comandante-em-Chefe-da-Esquadra (11 abr 1996 a 8 abr 1997); Comandante de Operações Navais (1998-1999) e Chefe do Estado-Maior da Armada (2000).

 

Reservei para menção especial seu cargo de Diretor de Hidrografia e Navegação no período de 13 de abril de 1992 a 12 de agosto de 1994 período em que foi promovido a Vice-Almirante e em que deu prosseguimento com maior ênfase à criação do Espaço Memória da Hidrografia em prédio histórico da Diretoria em cuja criação e montagem da ala de Sinalização Náutica, já eu na reserva desde 1985, tive o prazer de participar sob a batuta de outro Almirante Hidrógrafo ex-Diretor.

O Almirante Arlindo, ao deixar o cargo de Diretor recebeu o título de Hidrógrafo Honorário e, por direito, tornou-se o membro da Confraria do Bode Verde.

 

Arlindo, transferido para a Reserva em 26 de maio de 2000 e reformado em 3 de dezembro de 2002, é atualmente membro da Sociedade Brasileira de Geografia componente do Terço do Conselho Diretor desde 2010 com mandato renovado até 25 de fevereiro de 2016. É conferencista, ensaísta e autor de quase uma dezena de livros dentre eles ‘As razões e as paixões do patrono de Marinha do Brasil’ (1991),  ‘Estratégia Naval Brasileira’ (1995) e a biografia ‘Tamandaré Joaquim Marques Lisboa Marquês de 1807-1897’ (2003).

 

Foi alçado à Acadêmico Emérito da AHIMTB vagando sua Cadeira para a admissão do Almirante Max Justo Guedes.

 

O Almirante Max Justo Guedes (6 ago 1927 - 8 nov 2011) foi empossado como membro da AHIMTB na Cadeira Vice-Almirante Hélio Leôncio Martins, em sessão solene realizada no Museu Naval à rua D Manoel, em 6 de agosto de 2008,  em cerimônia comemorativa dos 200 anos da chegada do Corpo de Fuzileiros Navais ao Brasil.

 

Desde menino demonstrou curiosidade a aptidão ao aprendizado de História e Geografia ao se interessar por essas obras da coleção de Monteiro Lobato. Aos dez anos, filho de oficial do Exército,  ingressou  no Colégio Militar do Rio de Janeiro. Aos 17 anos, com mais intensa curiosidade pela História, teve conhecimento de que haveria um curso de História de Cartografia Brasileira, no Ministério das Relações Exteriores, ministrado por Jaime Cortesão, médico, político, escritor e historiador português, falecido em 14 de agosto de 1960 aos 76 anos de idade e irmão do também historiador Armando Cortesão. Apesar de sua idade, Cortesão o admitiu no curso ao saber que o jovem Max conhecia toda sua obra. Para alguns dos biógrafos de Max Justo foi esse o momento que marcou o nascimento de  um dos mais famosos mestres da História da Cartografia, a nível mundial.

Como aspirante da Escola Naval entre 1946 e 1951 mereceu distinção como aluno de História Naval, Navegação Astronômica, Instrumentos Náuticos e Direito Internacional.

Em 1961, embarcado no Cruzador Barroso, então docado, aproveita-se do longo período de reparo e de imobilidade do navio, para escrever O Descobrimento do Brasil obra que o revela como historiador.

 

A carreira militar de Max Justo foi, por vezes, interrompida, por participações suas em missões de carácter histórico, como aquela em que viajou para  Portugal, em 1967, por ocasião das Comemorações do V Centenário do nascimento de Pedro Álvares Cabral. Coincidentemente em seu voo de regresso ao Brasil, fez companhia ao Almirante Rademaker, então Ministro da Marinha, também passageiro, de quem ouviu em conversa franca sua intenção de incumbi-lo da  criação de um museu naval de qualidade. E o nomeia Vice-Diretor do Serviço de Documentação da Marinha - SDM, estabelecimento que veio a chefiar entre 1976 e 1997, como então Capitão-de-Mar-e-Guerra.

 

No longo período em que se manteve à frente do SDM, Max Justo foi o responsável por importantes obras e transformações como a que transferiu  o Serviço de Documentação Geral da Marinha para novas e modernas instalações na rua de D. Manuel, no Centro do Rio de Janeiro e os seus anexos para a Ilha das Cobras;  restaurou o Forte de Santo António da Barra para criar  o Museu de Hidrografia, em cuja obra participei como Encarregado do Serviço de Sinalização Náutica do Leste que tinha o forte e o farol sob sua responsabilidade; aproveitou-se dos obsoletos  Contratorpedeiro Bauru e Submarino Riachuelo para transformá-los em museus; assumiu a Ilha Fiscal no interior da baía de Guanabara e as antigas Docas da Alfândega entre a Praça XV e a antiga sede do Ministério da Marinha no Rio de Janeiro para ali instalar dois  Espaços Culturais da Marinha abertos à visitação pública; deu novas instalações à Biblioteca da Marinha na rua Mayrink Veiga no Centro do Rio de Janeiro e reformou o Serviço de Documentação da Marinha na Ilha das Cobras; transformou o Rebocador de alto-mar Laurindo Pita participante das I e II Guerras Mundiais em rebocador para turismo pela Baía de Guanabara; e foi ao Estado de São Paulo para ali criar, em Campinas, o Museu da Caravela.

 

Nesse período, Max Justo foi transferido para a Reserva em 14 de abril de  1986, reformado em  6 de agosto de 1991, foi agraciado com o título de Hidrógrafo Honorário em 1993 e  promovido a Contra-Almirante em 25 de março de 1998 para continuar à frente da Diretoria do Patrimônio Histórico e Cultural da Marinha – DPHCM criada em 1997. O homem certo, no lugar certo.

 

Em 2003, despediu-se definitivamente do serviço e da Diretoria que ajudara a criar.

 

Mas, apesar de sua já abalada saúde, depois da obra magnífica que levou a cabo no Serviço de Documentação Geral da Marinha, depois da preciosa pesquisa que fez no campo da História Naval e da Cartografia, depois da admiração  que sempre manifestou pelas aventuras  que levaram  os portugueses aos mais importantes mares do planeta Terra, o Almirante Max Guedes, apesar da doença que o consumia, manteve-se envolvido, em vários outros importantes projetos. Entre 2005 e 2008, ocupou a presidência da Fundação Eva Klabin Rapaport criada em 1990 para abrigar a coleção reunida por Eva Klabin (1903-1991), um dos mais importantes acervos de arte clássica dos museus brasileiros, aberta ao público em 1995 em uma casa na Av. Epitácio Pessoa, 2480 – Lagoa no Rio de Janeiro.  

Em 8 de novembro de  2011, aos 84 anos, o Contra-Almirante Max Justo Guedes, então considerado o maior historiador naval contemporâneo, acadêmico titular da cadeira especial Vice-Almirante Ref. Hélio Leôncio Martins veio a falecer enquanto exercia 13 cargos e comissões como as de  Membro da Comissão de Geografia do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro; Conselheiro do Liceu Literário Português; Conselheiro da Fundação Cultural Brasil-Portugal e Membro do Conselho Administrativo do Museu Nacional de Belas Artes; além de pertencer a 21 outras entidades entre Institutos, Academias e Sociedades nacionais e estrangeiras afins à História e à Geografia tais como Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (Sócio benemérito); Sociedade da Língua Portuguesa (Portugal, sócio efetivo); Instituto Histórico e Geográfico do Uruguai (Sócio correspondente); Academia de Marinha (Portugal, sócio efetivo); Academia Chilena de la Historia (Sócio correspondente); Real Academia de la Historia (Espanha, sócio correspondente) e Academia Internacional de Cultura Portuguesa.

 

 Ao longo de sua carreira de militar historiador, Max Justo Guedes enriqueceu a história da cartografia brasileira com tudo que absorveu em visitas aos mais importantes arquivos e museus nacionais e estrangeiros, em participações em conferências, congressos e seminários, em associações e institutos de pesquisa a que pertenceu e em suas ligações com especialistas brasileiros e estrangeiros. A rica biblioteca particular que organizou, uma referência temática, a doou à Biblioteca da Marinha que, com certeza, incluía o acervo de lavra própria com 119 títulos dentre os quais ‘O descobrimento do Brasil’ . 1966. 145p;  ‘Primórdios da Hidrografia científica no Brasil’ in Anais Hidrográficos de 1974 e ‘A preservação da memória nacional’ e  ‘O tesouro dos mapas: a cartografia na formação do Brasil’  2002.

 

O Almirante Max Justo Guedes foi agraciado com 32 medalhas e condecorações das quais 6 de Portugal e uma da Espanha o que segundo alguns o distinguia como o estrangeiro que possui mais condecorações portuguesas; e com o título de Doutor Honoris Causa pela Universidade Nova de Lisboa.

 

Desculpem-me, fui assaz parcimonioso com esta minibiografia de Max Justo Guedes meu antecessor nesta cadeira. Ele merecia muito mais.

 

E eu quem sou? Como fui absorvido a esta constelação? Fossem o Coronel Claudio Bento, o Almirante Helio Leôncio, o Almirante Arlindo e o Almirante Max Justo as estrelas Acrux (α Crucis), β Crucis, γ Crucis (Gacrux) e δ Crucis do Cruzeiro do Sul e eu me sentiria como a ε Crucis, a "Intrusa", exatamente um intrometido, cuja luz é ofuscada pelo brilho das principais coirmãs tornando-a quase imperceptível. É como me sinto.

 

Quis o Destino que nossos rumos se cruzassem. E como!

 

Vim para Resende em 1945 pelas mãos de meu pai, então Capitão do Exército, e fomos morar na rua Vilagran Cabrita 9, do Bairro Independência, a rua que tem o nome do patrono da Arma de Engenharia, coincidentemente, a mesma casa , onde vinte e três anos mais tarde veio morar o Coronel Bento, engenheiro militar, pai de dois filhos que foram para a Marinha. Um deles Hidrógrafo como eu.

 Ali vivi minhas infância e adolescência sem jamais ouvir de meu pai qualquer insinuação quanto à carreira que deveria seguir. Fui para a Marinha por vocação. Segui a carreira de meu avô.

Foi aqui a terra onde plantei as sementes de minhas primeiras amizades que como flores rego até o presente.

 

Fui para o Colégio Naval em 1955 e ingressei na Escola Naval em 1957 sem jamais deixar de frequentar Resende. Fui promovido a Guarda-Marinha em 1960 e fiz a Viagem de Instrução que me levou a visitar o Navio-aeródromo Minas Gerais que, em dezembro de 1960, viria a ser incorporado à Armada e comandado pelo então CMG Helio Leôncio. Quando em trânsito de regresso ao Rio de Janeiro escolhi a Hidrografia e Navegação como minha futura especialização e como Segundo-Tenente embarquei pela primeira vez no Navio Faroleiro ‘José Bonifácio’ aquele mesmo que, em condições semelhantes, quase um quarto de século antes, embarcara o Tenente Hélio Leôncio, hoje patrono vivo da cadeira que estou sendo levado a ocupar.

Somos, ambos, Hidrógrafos pertencentes à Confraria do Bode Verde da qual o Almte. Hélio Leôncio é hoje o decano e em cujos encontros de confraternização tenho a oportunidade de ouvi-lo e de me deleitar com suas histórias da Marinha de seu tempo na Guerra e em inúmeras campanhas hidrográficas que participou para a confecção de cartas náuticas, histórias sempre escolhidas a dedo. Que memória!

 

A primeira comissão que realizei a bordo do Navio Faroleiro ‘José Bonifácio’ ao longo de nove meses do ano de 1962 de assistência aos faróis entre os estados de Santa Catarina e do Pará me permitiu conhecê-los ‘ao vivo’, in  loco, o que se mostraria anos mais tarde coisa rara. Para mim, utilíssimo, pois a eles, à sua arte, passei a me dedicar e continuei ao longo da maior parte de minha carreira naval.

 

Minha ligação com o faróis do Brasil levou-me a pesquisar suas histórias muitos deles construídos no interior de fortalezas, fortes e fortins ‘alevantados desde o século XVI ao século XVIII, primeiro de madeira terra socada, depois de alvenaria de tijolo e de pedra ...’  como historiou o Coronel Annibal Barreto em sua obra ‘Fortificações do Brasil’ publicada em 1958 pela Biblioteca do Exército, aliás patrono da Cadeira 43 desta Academia de História Militar.

Foi nessa oportunidade que tomei conhecimento do envolvimento do Brigadeiro Conrad Jacob Niemeyer e de outros oficiais do Real Corpo de Engenheiros, na construção e reforma de faróis no norte do país em 1830.

 

Formado em Hidrografia e Navegação em 1963, ora percebo que meu patrono e meus antecessores nesta Cadeira Especial 7 são todos Hidrógrafos, O Almte. Helio Leôncio formado em 1938 no ano anterior ao de meu nascimento; o Almirante Max Justo recebeu o título de Hidrógrafo Honorário em 1993 e o Almirante Arlindo, em 2004.

 

Ao pesquisar para escrever este texto, surpreendi-me ao constatar que os Almirantes Max Justo e Arlindo e eu somos filhos de oficiais do Exército, dois deles Engenheiros militares; meu pai era cavalariano.

 

Ao deixar a Marinha em 1985 e depois ao desligar-me em 1999 da empresa sueca Pharos Marine para produção e elaboração de projetos de Sinalização Náutica dividi meu ócio entre a Tijuca e a Ilha de Paquetá quando então, ouso dizer, tornei-me escritor e cronista amador.

 

Já se disse e eu enfatizo: “Pobre e obscuro é todo país que não tem memória.” É um triste país que desprezou sua história, esqueceu seus heróis e que ignora seus exemplos.

 

Agradeço ao sábio conselho do amigo Coronel Claudio Bento. Fui claro ao "Falar de pé para que todos me vissem”; fui convicto ao falar “alto para que todos me ouvissem” e fui, disso não tenho certeza, o bastante conciso “para que todos me aplaudissem."

 

Sou-lhes grato, a todos, pelas atenção e paciência com que ouviram minhas palavras durante estes  31 minutos.