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SUMÁRIO

CAPITULO 1- ORIGENS DE CANGUÇU

- Indios Tapes seus primitivos habitantes

CAPÍTULO - 2 CANGUÇU DO CURATO À INDEPENDÊNCIA DO BRASIL

CAPÍTULO- 3 - CANGUÇU – DA INDEPENDÊNCIA DO BRASIL AO SEU VILAMENTO

CAPÍTULO 4 –CANGUÇU DO VILAMENTO À REPÚBLICA

CAPÍTULO 5 – DA REPÚBLICA À REVOLUÇÃO DE 30

CAPÍTULO 6- DA REVOLUÇÃO DE 30 AO CENTENÁRIO DO MUNICÍPIO 1957

CAPÍTULO 7- FILHOS ILUSTRE DE CANGUÇU

ANEXOS

 


 

APRESENTAÇÂO

O presente trabalho se refere a uma reprodução parcial de nossa obra CANGUÇU REENCONTRO COM A HISTÓRIA – UM EXEMPLO DE RECONTITUIÇÃO DE MEMÓRIA COMUNITÁRIA, publicado pelo Instituto Estadual do Livro em 1983 no total de 500 volumes .

Trabalho por sua vez que se constitui numa síntese ,por questões de economia, de uma pesquisa bem mais ampla sobre Canguçu ,que elaboramos de 1956 a 1983 ,por 27 anos e a qual se referem os números consantes do texto desta síntese e refe rentes a pesquisa original inédita, da qual reproduzimos diversas cópias disponíveis para consultas em meu poder ,( cmbento@resenet.com.br ) ,na ACANDHIS, na Biblioteca do Colégio N.S Aparecida, Biblioteca Municipal de Canguçu ,Arquivo Histórico do RGS, IHGRGS, Cúria Metropolitana , no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Para enriquecer e atualizar o trabalho publicado em 1983, acrecentamos ao final de determinados trechos a palavra Nota. E a seguir o acréscimo como atualização. Esperamos poder reeditar o trabalho com todas a sua iconografia que aqui reproduzimos as mais importantes.

Este trabalho possui como moldura a História Militar do Brasil no Rio Grande do Sul , aspecto predominante no Rio Grande do Sul de 1800/1932, por cerca de 132 anos :Reflexos em Canguçu das guerras : Guaranítica 1752/56 , as do Sul 1763/75, a de 1801, a de 1812, as contra Artigas 1816 e 1820, a Cisplatina 1825/28, a Revolução Farroupilha 1835/45, a contra Oribe e Rosas 1851/52, a contra o Uruguai em 1864 , a do Paraguai 1865/70, a Revolução Federalista e Revolta na Armada 1893/95, a Revlução de 23, a de 24/26, a de 30 e a de 32 que teve seu epílogo em 20 de setembro de 1932 em Cerro Alegre em Piratini. Votos de bom proveito aos internautas canguçuenses que a cada dia aumentam mais e interessados na História de Canguçu.

O autor

Votos de que os canguçuense

 


CAPÍTULO 1 - ORIGENS

 

ÍNDIOS TAPES - PRIMITIVOS HABITANTES DE CANGUÇU

 

As terras de Canguçu, junto com as dos outros municípios situados nas serras do Tapes e do Herval, são as mais antigas do Rio Grande do Sul. Geologicamente fazem parte do núcleo sul-rio-grandense que integra o complexo cristalino brasileiro, com solos com cerca de 1 bilhão e meio de anos.

Os primitivos habitantes de Canguçu foram os índios Tapes que emprestaram o nome à serra onde se assenta o município. Na época da fundação do Rio Grande este grupo indígena era pouco numeroso. Seus últimos remanescentes em Canguçu, ao que se sabe, findaram seus dias no Posto Branco na década de 30. Existem vestígios dos mesmos na população da região de Canguçu Velho ( Fávila, Terra dosTapes, Pulguedo ) (1) onde, segundo vários testemunhos, encomtram-se sinais de cemitérios indígenas.Quando da fundação da cidade de Rio Grande, em 1737, marco do povoamento português do Rio Grande do Sul, tropas do fundador brigadeiro José da Silva Pais e de estanceiros lagunistas que desde 1733 começaram a se estabelecer em torno de Porto Alegre atual, na região denominada genericamente Viamão, escaramuçaram com os Tapes que habitavam as terras de Canguçu.(2) É muito provável que os Tapes em Canguçu, sob a direção dos jesuítas, passaram a formar ali uma guarda avançada para obstacular penetrações portuguesas nas 11 estâncias jesuítas que abasteciam de gado os Sete Povos das Missões Orientais do Uruguai e mais quatro do outro lado do referido rio. Estâncias que se estendiam nas pastagens do enorme quadrilátero formado pelos rios Uruguai,Ibicuí, Jacuí, Lagoa dos Patos, rios Camaquã, Negro e Quaraí e que tinham como grandes porteiras São Martinho, na serra de mesmo nome, e Santa Tecla, próximo a Bagé(3). Os cursos d’água funcionavam como enormes cercas do imenso mangueirão que continha em seu interior grandes manadas de gado selvagem (alçado ou chimarrão), atrativo e econômico à exploração e povoamento inicial do Rio Grande do Sul, particulamente por levas e levas de paulistas, como um substitutivo depois do alijamento sofrido na exploração do ouro em Minas Gerais, em conseqüência da guerra entre Paulistas e Emboabas 1708-1709.(4)

Durante a guerra de 1763-77, vamos ter algumas poucas e esparsas notícias dos índios Tapes em Canguçu, através de relatórios de Rafael Pinto Bandeira que lá esteve a morte e que segundo lenda ali teria conhecido e vivido um romance com uma índia minuano(5), filha de um cacique.

 

POVOAÇÃO AÇORIANA DE CANGUÇU

 

Entre 1747-1750, deram entrada no Rio Grande do Sul, provenientes dos Açores, numerosos casais que passaram à História com o nome genérico de açorianos.(6)Eles destinavam-se, numa primeira fase, a povoar a faixa litorânea entre a ilha de Santa Catarina e o arroio Chuí e forte São Miguel,conquistado em 1737, por Silva Pais.(7)Com a celebração do Tratado de Madrid em 1750, a partir da terceira leva chegada ao Rio Grande, passaram a ser destinados a povoar os Sete Povos das Missões que Portugual deveria receber da Espanha, em troca da Colônia do Sacramento. Muitos casais se fixaram e prosperaram em Povo Novo da Torotama, entre as atuais cidades de Rio Grande e Pelotas.

As levas destinadas aos Sete Povos inicialmente se aglutinaram em torno de Rio Grande. Posteriormente foram enviados para Porto de Dorneles atual Porto Alegre para seguirem na esteira do Exército Demarcador de Portugal que remontando o Jacuí, até o passo São Lourenço, dali penetraria nos Sete Povos das Missões. Após evacuados os índios missioneiros que habitavam a região, eles seriam substituídos pelos açorianos. A reação dos índios missioneiros liderados pelos jesuítas à entrega dos Sete Povos a Portugal, daria lugar à guerra Guaranítica 1754-56(Rio Grande do Sul) (8). Frustrada a penetração nas Missões ao longo do Rio Jacuí de parte do Exército Demarcador de Portugal, os açorianos a ela destinados aglutinaram-se em torno dos recém fundados fortes Santo Amaro e Rio Pardo, ao longo da margem esquerda do Jacuí, entre Porto Alegre e Rio Pardo e em torno de Porto Alegre. Posteriormente a atual cidade de Taquari teria origem açoriana. Com a fundação do forte de São Gonsalo em 1755(9), na margem direita do rio Piratini, próximo à sua foz no São Gonsalo e que se originou de seu nome, criou condições de segurança para que os açorianos, povoadores de Povo Novo da Torotama e margem oriental do referido canal, começassem a explorar as terras de Pelotas à margem ocidental do citado canal e as do municípios de Canguçu, da bacia do rio Piratini, sem serem molestados pelos Tapes, sob controle dos jesuítas. Fatos históricos posteriores e que serão abordados mais adiante, determinarão o afluxo de açorianos, particularmente provenientes de Povo Novo e de Colônia do Sacramento, para povoarem as terras de Canguçu.

CANGUÇU BALIZA CAMINHO HISTÓRICO

 

Ao término da guerra Guaranítica as terras de Canguçu passaram a ser devassadas por militares, nas comunicações terrestres entre as bases militares portuguesas de Rio Grande -Forte de São Gonsalo- Rio Pardo, ao longo da trilha natural usada até então pelos Tapes em suas andanças e balizada atualmente pelos seguintes acidentes geográficos: RIO GRANDE – POVO NOVO – FORTE DE SÃO GONSALO – PEDRO OSÓRIO – CERRO PELADO – VILA FREIRE – MORRO REDONDO – COXILHA DOS CAMPOS – CANGUÇU(Arroio das Pedras) – COXILHA DO FOGO(Encruzilhada do Duro) – VAO DOS PRESTES(Passo do Camaquam de Baixo) – ENCRUZILHADA DO SUL(Guardas da Encruzilhada) – PÂNTANO GRANDE – RIO PARDO, com os nomes primitivos entre parênteses(10).

As terras de Pelotas desde 1758 foram doadas ao Coronel de Dragões Thomaz Luis Osório(11); que comandara até 1754, em Rio Grande, o célebre Regimento de Dragões, célula máter da guarnição federal do Rio Grande do Sul. Unidade transferida então sob seu comando para o Rio Pardo, guarnição por ele fundada e unidade histórica que com ele participou com destaque de toda a guerra Guaranítica(12).

Este histórico caminho será trilhado nos primórdios do povoamento do Rio Grande com bastante intimidade, como se verá mais adiante. A partir de 1801 será prolongado de Rio Pardo até os Sete Povos das Missões, após incorporados por Portugal.

Mencionou sem maiores detalhes a existência desse histórico e primitivo caminho de integração do Rio Grande, o destacado historiador e geógrafo militar general Francisco de Paula Cidade(13). Para os demais estudiosos a região ao sul do rio Camaquã, por carência de fontes, principalmente, tem sido um vázio geohistórico, um território sem memória, decorrência principalmente da confusão estabelecida entre Encruzilhada do Duro e guardas de Encruzilhada mencionadas nas guerras 1763-77, de serem a mesma coisa ao norte do rio Camaquã e não, como em verdade, respectivamente a atual Coxilha do Fogo no município de Canguçu e a cidade de Encruzilhada do Sul(14).

Aproveitando das condições de segurança e comércio existete ao longo desse caminho histórico, alguns açorianos e outros povoadores foram se estabelecendo ao longo do mesmo.

PRIMEIRA ESTÂNCIA EM CANGUÇU

 

Entre 1756-1762 se estabeleceu com estância entre o passo do Acampamento no rio Piratini e Vila Freire atual , Luiz Fransisco Marques de Souza, irmão do mais tarde Marechal Manoel Marques de Souza que também seria grande proprietário em Canguçu na bacia do rio Piratini, além de avô do general Marques de Souza, Conde de Porto Alegre e padrinho do Almirante Tamandaré patrono de nossa Marinha. As ruínas dessa estância ainda existem.

Figura: Durante a guerra Guaratiníca, o General Gomes Freire de Andrade estabeleceu, além dos já existentes na Vila de Rio Grande, os fortes de Santo Amaro, Rio Pardo e São Lourenço ao longo do rio Jacuí e , mais o São Gonsalo no rio Piratini.Da necessidade de apoiarem-se mutualmente, as terras de Canguçu começaram a ser devassadas pelos Dragões do Rio Pardo e a fazer parte do histórico caminho rio-grandense que ainda hoje liga Rio Pardo-Rio Grande, através do Camaquã. Colônia do Sacramento era de Portugal e seria trocada pelos Sete Povos. Somente Montevideu, fundada por Portugal, estava sob controle de Espanha. O forte São Gonsalo fora criado para proteger a linha de suprimento e de comunicação do Exército Demarcador de ações dos índios Tapes que habitavam a região atual de Canguçu. (Fonte: pesquisas do autor desenhadas por Bené).

Omitida esta ilustração que consta do livro impresso

CANGUÇU, BASE DE GUERRILHA CONTRA OS ESPANHÓIS

 

Em 1762, na eminência de invasão do Rio Grande pelos espanhóis, como projeção de lutas na Europa entre Espanha e Portugal, o coronel Osório citado, proveniente do Rio Pardo e com destino ao Chuí, atravessou as terras de Canguçu com maior parte do Regimento de Dragões, fundando pouco após a fortaleza de Santa Tereza na atual ROU e, na época, território de Portugal pelo Tratado de Madrid de 1750(17).

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Figura; Aspecto das ruínas da estância de Luís Marques de Souza, no rincão dos Cravos no Quarto subdistrito de Canguçu, próximo ao passo do Acampamento no rio Piratini. Foi a primeira estância em Canguçu. Ela serviu de base dos guerrilheiros de Rafael Pinto Bandeira e aos Dragões do Rio Pardo, para atuarem contra os espanhóis que denominavam a Vila de Rio Grande e a margem Leste do Canal São Gonsalo de 1763-1776. Serviu de apoio à Comissão Demarcadora de Limites 1748-88 e foi abrigo de Bento Gonsalves ao final da guerra Farroupilha. Nela teve lugar, set.1823, um combate de encontro entre as forças governistas e revolucionárias. O local era conhecido então como Atalaia e se prestou ao longo da História para tal. Julgamos seja a ruína mais antiga ligada à vida rural rio-grandense e à sua História Militar (Foto do arquivo da professora Marlene Barbosa Coelho).Aparecemos sobre as ruinas

*Elas foram por mim identificadas após visita ao local(15) e longa pesquisa decorrente, com apoio no mapa da demarcação do Tratado de Santo Ildefonso, cujo trecho público na obra O NEGRO NA SOCIEDADE DO RIO GRANDE DO SUL(16).

Após a invasão do Rio Grande, em 1763, pelo litoral, por paderoso exército espanhol ao comando do general Pedro Ceballos, governador de Buenos Aires, as terras de Canguçu foram em abril e maio de 1763 atravessadas, em viajem de ida e volta, de Rio Pardo até o canal São Gonsalo, por um contingente de 100 homens paulistas e dragões, comandados respectivamente pelo mais tarde heróico e bravo paulista, tenente Cypriano Cardoso Barros Leme e os dragões tenente João Nogueira Beja e o furriel José Carneiro Fontoura, ascendente entre outras, das ilustres famílias pelotenses Assunção e Simões Lopes(18). Eles tentaram em vão, socorrer ao Cel Thomaz Osório.

Canguçu passou a ser base de guerrilhas contra os espanhóis para hostilizá-los na então Vila de Rio Grande e ao longo do canal São Gonsalo. Comandadas pelo intrépido rio-grandense Rafael Pinto Bandeira serviam também para cobrir, à distância, o forte de Rio Pardo e as estâncias portuguesas entre o Camaquã e o Jacuí, contra um ataque partido da atual cidade de Rio Grande, então em poder de Espanha(20).Por ocasião da invasão espanhola de Rio Grande, muitos açorianos de Povo Novo da Torotama e imediações, entre a região atual de Rio Grande e Pelotas, se fixaram ao longo do caminho histórico Rio Grande –Rio Pardo passando por Canguçu.e buscaram proteção nas terras de Canguçu, ao longo do histórico caminho, estabelecido desde 1756, Rio Grande-Rio Pardo(21).

Em 29 de maio 1767, o coronel Marcelino de Figueiredo, partindo do Estreito, tentou com suas tropas, assaltar e retomar aos espanhóis a Vila do Rio Grande. Suas embarcações de assalto foram dispersadas no canal pela cerração e ventania. Frustado o assalto teve por consolação a reconquista da margem norte(atual São José do Norte). Nesta ocasião a estância de Luís Marques, em Canguçu, serviu de base inicial de guerrilha(22) a Rafael Pinto Bandeira, reforçado por Dragões do Rio Pardo, para atrairem, de Rio Grande para o corte do São Gonsalo, nas imediações de Pelotas atual, efetivos espanhóis, visando a enfraquecer aquela posição para o assalto frustrado intentado(23).

Em1974 o governador de Buenos Aires, general Vertiz y Salcedo, invadiu o Rio Grande do Sul pela campanha, com o objetivo principal de varrer das terras atuais de Canguçu(Encruzilhada do Duro) e Encruzilhada do Sul( guardas da Encruzilhada) as bases de guerrilhas portuguesas que tantos prejuízos vinham causando aos interesses dos súditos espanhóis. Erigiu o citado governador, natural do México, nas proximidades de Bagé atual, a Fortaleza de Santa Tecla. A missão de Vertiz y Salcedo foi prejudicado pelos reveses que Rafael Pinto Bandeira impôs às suas tropas em Santa Bárbara e Tabatingai(24).

*Cypriano Cardoso que deparo e abordo com frequência em meus estudos e trabalhos sobre a guerra de 1763-77 prestou serviços militares ao Rio Grande do Sul e a Santa Catarina(19) quase à altura dos prestados por Rafael Pinto Bandeira.

Incapaz de atacar Rio Pardo, a " Tranqueira Invicta ", o citado governador contramarchou em direção à base espanhola mais próxima – a Vila de Rio Grande – atravessando na ocasião as terras de Canguçu, ao longo do histórico caminho entre Rio Grande e Rio Pardo(25). Este mesmo trajeto seria feito em abril de 1776 pelo major Patrício Correia Câmara, o futuro Visconde de Pelotas, à frente de parte de seu Regimento de Dragões. Proveniente da conquista da Fortaleza de Santa Tecla, destinava-se a dar cobertura no Taim a um possível ataque à Vila de Rio Grande, reconquistada em 1 de abril, após 13 anos sob domínio espanhol. Dessa marcha deixou circunstanciado relatório que tornou possível indentificar os locais de Canguçu onde6 suas tropas acamparam, bem como o nome primitivo de Arroio das Pedras,da cidade de Canguçu. Em Pelotas, sobre a margem oriental do canal de São Gonçalo, ele encontrou um fortim espanhol abandonado(26).

Nota.Publiquei em 2002 a História da 3ª Brigada de Cavalaria Mecanizada Brigada Patricio Correia da Câmara onde o biografo e refaço em linguagem atual o seu histórico relatório e dentro do Projeto História do Exército na Região Sul e com muitas informações de interesse de Canguçu.

SIGNIFICADO DA PALAVRA CANGUÇU – TEORIAS

 

À cerca de uma légua de Canguçu-Velho, segundo J. Simões Lopes Netto em 1912(27)," destaca-se um elevado cerro, há longos anos chamado Cerro Grande. Da sua altura descortina-se um dilatado e magnífico panaroma, talvez maior de dez léguas( cerca de 65 Km ) de raio em todos os rumos. O nome nativo cabia-lhe certo: Cang Kassu, saliência alta, cabeça grande. Sobre este cerro está construído um marco da Carta Geral da República. Do marco divisam-se a olho nu os Três Cerros, em Pelotas, a Cordilheira, em Encruzilhada, o Pedregal, em Piratini, o Cerro Chato, em Herval e a Serra Mariana Pimentel, próximo a Pedras Brancas(Guaíba) ".

Sobre Canguçu-Velho, J. Simões Lopes Netto, o primeiro a divulgar a história de Canguçu, escreveu:(28)

" Canguçu-Velho repousa sobre a pendente nordeste de uma extensa colina. Dela alonga-se uma vasta área quase plana que vai fazer a margem direita do arroio do Moinho de límpidas águas roladas sobre pedras e de volume bastante para uma grande população. Em frente e aos lados ergue-se e prolonga-se a serra, como defesa natural fácil de atender. Para trás desdobram-se campos ricos de pastagens e abundantes de gado de toda espécie, para alimento e trabalho. De um lado um veio de cristal de rocha, mineral típico da região. De outro camadas de terra humosa, de um metro e mais de espessura, para frutas e cereais ". Local que possui as características de um rincão.

Para o autor citado aí teria sido instalada em 1622 a primeira redução jesuítica pelo padre Roque Gonzales, fato por mim negado em artigo do Diário Popular de Pelotas(29). Para mim Canguçu-Velho foi a sede da Real Feitoria de Linhocânhamo do Rincão do Canguçu 1783-1788, conforme tenho publicado(30), aproveitando as condições exelentes descritas por nosso maior escritor regionalista de um verdadeiro rincão.

A palavra Canguçu apareceu oficialmente em 1783, no nome da Real Feitoria localizada no Rincão do Canguçu, atual Canguçu-Velho. Sobre a palavra formulo as seguintes teorias: Primeira teoria: Ter sido dada originariamente pelos Tapes que habitavam a região ao cerro( morro, monte ) Canguçu, ponta culminante da serra dos Tapes e mencionado antes como Cerro Grande. Pois, segundo entendimentos vários, a começar por J. Simões Lopes e confirmado por Pedro Calmon(31), a palavra Cang-Assu significa cabeça grande, saliência alta o que se aplicaria ao cerro citado, próximo do qual existia o rincão de Canguçu-Velho, descrito por J. Simões Lopes Netto e chamado então Rincão do Canguçu.

Em 1775, o marechal Jaques Diogo Funk registrou em Roteiro de Viagem da ilha de Santa Catarina,a palavra Cang-Uassu, para designar defronte "a ilha , no continente, morro de Serraria que começava e se levantava ".

Para mim, desse acidente geográfico, ponto culminante da Serra dos Tapes, conhecido como cerro de Canguçu, avistado inclusive pelos navegantes da Lagoa dos Patos que, utilizavam para a navegação, teriam se originado os seguintes significados para a palavra Canguçu:

  1. Rincão do Canguçu, região de Canguçu-Velho atual.
  2. Real Feitoria do Linhocânhomo do Rincão do Canguçu 1783-1788, estabelecimento que funcionou em Canguçu-Velho.
  3. Ilha Canguçu, da Lagoa dos Patos que passou a chamar-se de Feitoria por ter servido de porto alternativo de embarque e desembarque da Feitoria em Canguçu, junto ao principal no arroio Correntes.
  4. Baixio Canguçu de Lagoa dos Patos, defronte à ilha Feitoria(ex-Canguçu) na latitude do Cerro Canguçu.
  5. Arroio Canguçu, ex-Turuçu e atual Arroio Grande, afluente da Lagoa dos Patos na altura do ilha Feitoria, com nascentes próximo ao Cerro Canguçu, por cujo vale era feita a ligação da Real Feitoria em Canguçu com seus portos citados.
  6. Cidade de Canguçu, fundada em 1799 como capela curada " no Arroio das Pedras denominado Canguçu " (33)
  7. Canguçu-Velho, denominação que tomou o local onde havia funcionado a Real Feitoria do Linhocânhamo após a fundação da cidade de Canguçu em 1799.
  8. Serra de Canguçu. Denominaçaõ particular da Serra dos Tapes em Canguçu. Esta expressão é citada pelo então Marquês de Caxias durante a Revolução Farroupilha.(34)
  9. Combate de Canguçu (primeiro). Travado em Canguçu, próximo à região de Pedra das Mentiras.(35)
  10. Combate de Canguçu (segundo). Travado em Canguçu nos fundos da atual Escola Normal Nossa Senhora Aparecida,(36) no Serro do Ataque.
  11. Município de Canguçu, criado em 1857.(37)
  12. Combate de Canguçu-Velho. Travado em 1923 na região entre o general Zeca Neto e Cel. Hipólito Ribeiro (filho).(38)

Segunda teoria: Origina-se das palavras guaranis Caa-guassu com o sentido de mato grande.Assim sendo, seria uma alusão dos Tapes à mata densa que recobria a vertente da Lagoa dos Patos e que era avistada a grande distância das planícies à sua frente. Esta expressão é citada pelo Brigadeiro Fransisco Roscio no Compêndio Noticioso do Continente do Rio Grande de São Pedro.(39)

Terceira teoria: Origina-se da existência desde a ilha de Canguçu até o Cerro de Canguçu e ao longo do arroio Canguçu (atual Arroio Grande) de onça chamada Canguçu. Nome que derivaria da expreção Cang-assu, cabeça grande, que caracterizava o felídio ou de Caa-guassu, onça que vivia no mato grande.*

Esta teoria foi por mim pesquisada e publicada sob o titulo o " Tigre no Rio Grande do Sul " (40) onde concluía ser difícil a presença do tigre canguçu na altitude da Serra dos Tapes, por ser um animal dos banhados, como diz seu nome científico(pantera onça palustris). No mesmo artigo deduzia-se ser possível ter existido na Serra dos Tapes a onça pintada (pantera onça, onça) animal que segundo Debret em sua Viajem Pitoresca e Histórica ao Brasil(41) era "muito comum nos planaltos de Curitiba se escondendo nas matas junto às nascentes."

Corrobora nesta teoria a reportagem do ilustre canguçuense Dr. Dirceu Pires Terres(42) sobre o título "Onça Pintada abatida em São Lourenço- Canguçu". Ele registra a caçada de uma onça, em 19 março de 1953, no Vale do arroio Grande (ex-Canguçu) pelos caçadores Alfredo Wacks e Evaldo e Ricardo Janke. Se fosse onça canguçu ajudaria que o nome de Canguçu se deve a presença no passado, na Região de Canguçu Velho, nascente do arroio citado, de exemplares do tigre canguçu que segundo o zoológico do Rio de Janeiro, vivia em baixios(banhados, pântanos,etc.).

Se for uma onça pintada contraria a tese do nome de Canguçu advir da omça canguçu. Cientificamente a onça pintada prefere as nascentes de arroios em regiões altas.

Em 1839, Nickolau Dreys, em sua Notícia Descritiva... diz ter ouvido os urros de tigre ao viajar ao longo do Canal São Gonsalo(43).

 

Certeza da origem do nome Canguçu não se possui. È possível que documentação relativa à concessão de sesmarias no município venha esclarecer algo, bem como a descoberta de outros documentos relativos à indicação de Canguçu-Velho para sede da Real Feitoria e o estudo da cultura dos Tapes, primitivos habitantes da região. O nome de Canguçu vai aparecer em 1799, no requerimento de seus moradores para fundarem uma capela e da seguinte forma: "Dizem os moradores do Arroio das Pedras denominado Canguçu".(44)

Eis pois uma questão para os estudiosos transformarem de teoria em realidade. No momento me inclino pela segunda teoria que prevalece sobre as anteriores.(45)

Nota: A atual avenida Paulista foi outrora um morro coberto por mata grande mata e era conhecida por Canguçu com o significado de Mato Grande,teoria hoje que adoto para explicar o nome de Canguçu como derivado de CAA´=Mato e AÇU= Grande .Ou mato Grande.

 

POVOAMENTO DAS TERRAS DE CANGUÇU (46)

 

Expulsos os espanhóis da Vila de Rio Grande, conquistada pelo Exército do Sul, ao comando do tenente-general Henrique Bohn(47) em rimeiro de abril de 1776, expulsos, em conseqüência, dos passos do canal São Gonsalo que controlavam, as terras do município de Canguçu passam a ser povoadas: ao longo do histórico caminho entre Rio Grande e Rio Pardo; as vertentes do rio Piratini e da Lagoa dos Patos a partir de Rio Grande e Povo Novo, e as da vertente do rio Camaquã a partir de Rio Pardo, particularmente por antigos guerrilheiros de Rafael Pinto Bandeira que aí possuíram suas bases contra os espanhóis. Pelotas e Canguçu receberam apreciáveis contingentes de Colônia do Sacramento que fora conquistada definitivamente a Portugal em 1777 pelo general Pedro Ceballos.

A comissão de Demarcação do Tratado de Santo Ildefonso de 1777, ao percorrer o vale do rio Piratini até 1784, encontrou-o bastante habitado e ocupado por propriedades agrícolas e pecúarias.

*Os troncos colonistas de muitas famílias canguçuenses é estudado pelo destacado genealogista rio-grandense Carlos Grandmassom Rheingantz(49)9 JÁ FALECIDO) e nosso confrade no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, e que em sua casa em Petrópolis, conforme mostrou-me, possui ficha dos nomes de muitos dos canguçuenses.

Segundo o general João Borges Fortes (51) ao referir-se à carta do governador Marcelino de Figueiredo, de 26 de maio de 1779, ao Vice-Rei no Rio de Janeiro, escreveu aquele governador(52): "Os vastos campos ulteriores deste rio (o Jacuí) até o rio Camaquã e mais além (caso do município de Canguçu) achei todos tomados com posses e animais, sem terem ordem para isto, antes a tinha dado em contrário, de sorte que os vassalos obedientes ficaram sem campos por esperarem que legitimamente se lhe conferissem e os que não são obedientes tomaram todos os campos".

Em Primeiro de abril de 1780 o referido governador publicou edital convocando todos os que desejassem legitimar terras ao sul do Jacuí que requeressem.

Durante o ano de 1780 foram legitimadas dezenas de propriedades concedidas pelo Coronel Marcelino de Figueiredo(53) tenente-general Henrique Bohn, coronel Roncali(54) e Rafael Pinto Bandeira. Os dois últimos haviam estado em Canguçu para combater os espanhóis.

Segundo o autor citado, foram aquinhoados "nessa distribuição os combatentes da guerra de1763-77 recém finda, desde os menos aos mais graduados. Como a área conquistada era imensa sobraram terras para todos".

Logo após a expulsão espanhola e até cerca de 1780, os povoadores de Pelotas e Canguçu dedicaram-se ao plantio de trigo(55). Com o estabelecimento das charqueadas em Pelotas, por volta de 1780, as atenções foram se voltando aos poucos para a pecuaria extenciva, para o abastecimento da indústria saladeril pelotense. Em 1808, a cultura do trigo, com a abertura dos portos, sofreria grande golpe em razão da concorrência da farinha de trigo norte-americana com a que ali era produzida.

Segundo depoimento do general Zeca Neto, os campos de Canguçu junto ao rio Camaquã, antes que fossem povoados de gado, abrigaram grandes lavouras de trigo(57). Entre os grandes produtores encontrava-se Antônio de Souza Mattos, nosso trisavô materno,e avô de Zeca Neto, conforme o registra Fernando Luiz Osório em sua obra A Cidade de Pelotas.(58)

Entre os deslocados de Colônia do Sacramento conquistada e arrasada pelos espanhóis e que se fixariam em terras de Pelotas e próximas às de Canguçu, encontrava-se o menino Hipólito da Costa, que viria ser mais tarde o Fundador da Imprensa Brasileira.(59)

Em 1780 e 1800 houve apreciável migração de origem açoriana para Canguçu, das localidades arenosas de Estreito, Mostardas, São José do Norte e de Povo Novo. Este foi o primeiro nucleo de migração para Canguçu(60) desde 1756.

Nota: Escrevemos livro O Gaucho fundador da Imprensa Brasileira premiado em 1972 pela Associação Rio Grandense de Imprensa e pela Assembléia Legislativa do RGS e que estamos tentando publicar agora.

 

CANGUÇU FRONTEIRA DE FATO ENTRE ESPANHA E PORTUGAL

(1777-1801)

 

Pelo tratado de Santo Ildefonso de 1777, os limites entre Espanha e Portugal passaram a ser balizados em certo trecho pelo rio Piratini, por não terem os demarcadores chegado a um acordo sobre o exato traçado da fronteira entre o Piratini e o Jaguarão. Isto ficou bem evidente em carta do Marques de Souza, grande sesmeiro em Canguçu, comandante da Fronteira do Rio Grande e cunhado do capitão-mor Paulo Rodrigues Xavier Prates, também grande sesmeiro em Canguçu. Escreveu o governador de Buenos Aires entre muitas outras cartas: (61)

"Meu senhor meu amo"

"O Coronel D. Joaquim de Soria, comandante da fronteira de Castro Largo, trouxe ao meu conhecimento o ofício dirigido a V. S. , pela qual soube através das guardas espanholas, que vassalos de vosso Rei ocuparam terrenos fora dos da demarcação.

Tomei conhecimento de vossa resposta, que justificava a transposição do Arroio Grande para o Sul, por ter enviado gente além daquele arroio, para recolher gado vacum e cavalar reiuno, pertencente a seus domínios, por incapacidade de cont^r-los na margem norte do referido arroio, fundamentando a justificativa no fato de dito gado não ser de propriedade do rei meu amo.

Baseado em que estes terrenos não são indecisos, mandei colocar nos mesmos cinco guardas avançadas e muitas estâncias, por concluir que em nada alteraria o estabelecido no Tratado de Santo Ildefonso-(1777) com referência ao Arroio Grande.

Considerando que o rio Piratini seja o verdadeiro limite de possessão de ambos os soberanos, não posso deixar de ressaltar que as habitações, plantações e estâncias portuguesas que ultrapassaram esta linha para o Sul, foram feitas com infração ao Tratado(de Santo Ildefonso).

Serão também infrações as guardas portuguesas que projeta estabelecer nos arroios Palma Sola, Chasqueiro, Arroio Grande e Arrependidos.

Tendo V. S. já iniciado a partilha de chácaras ao Sul do Arroio Grande e ocupado os terrenos que medeiam entre ele e o Piratini, e assinalados como pertencentes a Espanha, e sendo o Piratini distante 6 léguas do Palma Sola, 9 do Chasqueiro, 11do Arroio Grande e 14 do Arrependidos, o estabelecimento neles, de parte de V. Majestade Fidélissima, Rei de Portugal, através de seus vassalos, contraria o acordo com S. Majestade Católica Rei de Espanha, e tanto maior será a infração à medida que vassalos portugueses se estabeleçam o mais afastado para o Sul do rio Piratini.

Embora houvesse algumas estâncias portuguesas antes de 1777 ao Sul do Piratini, o assunto está pendente de decisão dos reis de Espanha e Portugal, mas nunca os terrenos ao Sul do Arroio Grande.

Junto envio a situação de nossas guardas do Quilombo, São José e Santa Rosa, que ficam para o Sul do Piratini, nos passos sobre o arroio Chasqueiro(Passo do Canuto), Arroio Grande e Arrependidos, acrescentando que Portugal poderá estabelecer quantas quiser ao Norte do Piratini e a Espanha ao Sul, por se tratar de artigo do tratado de Santo lldefonso".

Neste exato momento o Marquês de Sobremonte propõe acordo, tentando, ingenuamente, ludibriar o atilado Marques de Souza, pois o terreno entre o Arroio Grande e Piratini era terreno neutro.

Nota: Escrevemos a História da 8 ª Brigada de Infantaria MotorizadaBrigada Manoel Marque de Souza (1 º) em 2001 que resgata a vida deste heroico fronteiro.Obra que integra o Projeto História do Exército na Região Sul que estamos desenvolvendo.

REAL FEITORIA DO LINHOCÂNHAMO DO RINCÃO DO CANGUÇU

 

De 1783-1788 funcionou no Rincão do Canguçu, atual Canguçu-Velho(62), na vertente da Lagoa dos Patos, da Serra dos Tapes, a Real Feitoria do Linhocânhamo do Rincão do Canguçu.

O local escolhido para a Real Feitoria foi uma área de cerca de 17.000 habitantes, incrustrada na sesmaria que fora concedida, após 1780, ao capitão-mor e coronel de Milícias Paulo Xavier Rodrigues Prates. A Real Feitoria estendia-se de Canguçu-Velho, no município de Canguçu, ao longo do vale do então arroio Canguçu (atual Arroio Grande) até as proximidades da ilha de Canguçu, atual Feitoria, próximo de onde o Arroio Grande desemboca e onde possuía a sede de sua estância o capitão-mor Paulo Xavier Rodrigues Prates mencionado.

Assunto por nós pesquizado e publicado,(63) cujo local da sede localizamos conforme comunicamos em reportagem no Diário Popular (64).

Este, natural de Laguna, filho do capitão-mór dessa localidade catarinense-João Rodriguês Prates- (65), um dos primeiros povoadores das terras gaúchas e que atuou com destaque na luta pela expulsão dos espanhóis do Rio Grande do Sul, 1763-77.

* Na Real Feitoria, além do linho era produzido estopa para vestir os escravos, milho, feijão, abóbora e mandioca. A última passou grande parte a ser transformada em farinha. A pecúaria teve grande impulso nos campos adjacentes aos atuais locais de Canguçu e Canguçu-Velho, tendo seu rebanho em 1788, apesar do elevado desfrute, atingido 3.031 bovinos e 105 cavalares e muares.

Foram incubidos da organização e administração da feitoria o padre Francisco

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Figura: Reconstituição aproximada do sobrado sede e mangueirão de pedra da Real Feitoria do Linhocânhamo do Rincão de Canguçu(1783-89), cujas ruínas oitocentistas ainda estão bem evidentes em Canguçu-Velho. ( Fonte: Do autor: O Negro na sociedade do RS ).

 

Foram incubidos da organização e administração da feitoria o padre Francisco Rodrigues Prates, irmão do capitão-mór, Paulo Xavier Rodrigues Prates, tenente Jose Machado de Morais Sarmento e os soldados do Regimentp de Bragança .irmãos João e Mathias Martins

Unidade Militar que, em Primeiro de Abril de 1776, participara da reconquista da Vila de Rio Grande, ao comando do coronel Sebastião Xavier (66) da Câmara Veiga Cabral que, como governador do Continente do Rio Grande (RS atual) de 1780-1801, concedeu terras no município de Canguçu, supervisionou a instalação da Real Feitoria e terminou por fundar a atual cidade de Canguçu, em 1800, como se verá.

De uma exposição sobre o linhocãnhamo do Rio Grande de São Pedro, feita ao Vice-Rei, em 1801, pelo administrador da Real Feitoria em São Leopoldo, o padre Antônio Gonsalves Cruz, conclui-se que foi expressiva a produção do estabelecimento em Canguçu e jamais alcançada pelo de São Leopoldo(67).

Em torno da Real Feitoria em Canguçu, segundo o general Souza Docca, " além dos casais açorianos que já existiam no local condensaram-se outros casais ". Condensação presumo em função principalmente da segurança proporcionada pelo padre Francisco Xavier Prates, tio avô do que viria a ser o primeiro bispo do Rio Grande do Sul, D. Feliciano Rodrigues Prates.

A Real Feitoria em Canguçu foi acionada por 44 escravos provenientes da Real Fazenda em Santa Cruz, no Rio de Janeiro. Ali atualmente funciona o Primeiro Batalhão de Engenharia de Combate, a unidade mais antiga da Arma de Engenharia do Exército.*

*Fazendo que pertencerá aos jesuítas, foi propriedade, após, da Família Real. Era o descanso predileto de D. João Vl. Nela tiveram lua de mel D. Pedro l e D. Leopoldina. D. Pedro ll nela vereaneou até ali falecer seu filho, o príncipe herdeiro do trono. Depois D. Pedro ll abandonou a fazenda e transferiu-se para Petrópolis, que desde então passou a ser local de veraneio da Família Real (68).

Viveram em Canguçu durante cinco anos os seguintes escravos com filhos nascidos em Canguçu Velho(69).

1- Prudêncio de Assunção e Anna de Santana (pais de Maria e Laurina).

2- Ignácio Pestana e Úrsula (pais de Pedro, Joaquim e Aurea).

3- Severino Cordeiro e Ângela Maria (pais de Pedro).

4- Estanislau da Cruz e Nataria da Trindade (pais de Rosa e Hipólito).

5- João Rodrigues e Josefa Maria (pais de Anna e Angelina).

6- João Honorato e Francisca da Conceição (pais de Manoel e Maria).

7- Bento Correia e Maria Pereira (pais de Maria e Lourenço).

8- Ignácio de Lima e Maria das Promessas (pais de Francisca e José).

9- Nicolau Teixeira e Gertrudes do Rosário.

10- Clemente Pereira e Ana Tavares (pais de Francisco).

11- Apolinário Cardoso e Elenna da Cruz (pais de Salvador e Leonor).

  1. Antônio Pereira e Maria Rosa.
  2. Gordeiro Pereira e Joana Baptista (pais de Marcos e Maria).
  3. Bazilio de Andrade e Maria da Batalha (pais de Manoel e Sebastião).
  4. Florentino Cardoso e Rita Maria (pais de Francisco e Marta).
  5. José de Anchieta e Úrsula das Virgens.
  6. Felipe de Santiago e Simeana das Virgens (pais de Maria e Domingas).
  7. Thomas Gomes e Paula Francisca ( pais de Ana ).
  8. Manoel de Jesus Francisco(peão).

Além desses foram enviados para a Real Feitoria de Canguçu 11 escravos e 27 escravas confiscadas de um contrabando. Os escravos confiscados, ao que parece provenientes da África, eram designados pelos seguintes nomes: Lourenço Ladino, Caetano Ladino, Matheus Novo Rebolo, Manoel Canguela, Domingos Rebolo, Domingos Mukumba, Antônio Camondongo, José Mukumba, Manoel Ganguela , 1 negro e um moleque por batizar.

As escravas confiscadas eram assim designadas:Luzia Ladina, Luzia nova Benguela, Josefa Ganguela, Anna Canguela, Maria Songo, Suzana Ambaia, Dominga Canange, Ana Congo, Maria Congo, Maria Benguela(l), Joana Benguela, Maria Canguela, Maria Canguela(ll), Joana Angola, Maria Benguela(ll), Maria Benguela(lll), Ana Benguela, Maria Benguela(Vl),Tereza Angola, Francisca Benguela, Maria Canguela,Maria Benzoela, Maria Benguela(V),Joana Mukumba e Maria Canguela.

Em 1788 a Real Feitoria do Rincão do Canguçu foi transferida para Faxinal da Courita em São Leopoldo atual, local hoje conhecido como Feitoria, onde funcionou até 1824, quando foi extimta, para abrigar em suas instalações os primeiros colonos alemães.

Em carta do Vice-Rei Luiz de Vasconsellos , de 6 de agosto de 1788, publicada por Carlos de Souza Morais(70) conclui-se que a razão fundamental da transferência foi o fato de em Canguçu as lavouras e campos ficarem mais distantes dos portos de embarque no Arroio Correntes e na ilha Canguçu (atual da Feitoria) na Lagoa dos Patos, do que em São Leopoldo, onde a Feitoria ficava bem próximo do rio dos Sinos.

Pela documentação disponível, não fica bem claro se a transferência da Real Feitoria de Canguçu para São Leopoldo se processou em função de interesses do Estado ou de particulares.É preciso o surgimento de outros documentos para chegar-se a uma conclusão definitiva.

O fato é que a Feitoria em São Leopoldo nunca ultrapassou em produção de linho a de Canguçu.

Segundo Arno Wehling, nosso confrade no IHGB e professor das UFRJ, FGU e Universidade Gama Filho no Rio de Janeiro, a Real Feitoria do Linhocânhamo foi estabelecida em Canguçu-Velho, "em razão da necessidade de Portugal em produzir artigo que pesava negativamente em sua balança comercial e que, de 1782-1808, teve alta internacional acentuada" (71).Estudam a Real Feitoria, primeiro núcleo populacional de Canguçu, a professora Ângela Tereza Sperb nossa confrade no Instituto Histórico de São Leopoldo e o professor Corsino dos Santos, da Universidade de Brasília, para os quais fornecemos os elementos que conseguimos reunir. Sob o título –" Pelotas até a fundação do Diário Popular" publicamos no 90 aniversário desse jornal, em 1980, esclarecedora matéria sobre o local da Feitoria.

Nota: Publicamos em 1992 a plaqueta Real Feitoria do Rincão do Canguçu 1783/89 ( em Canguçu Velho) pela Prefeitura Municipal e divulgamos no Gaúcho n 22,Informativo do Instituto de História e Tradições do RGS e também esta no site da ACANDHIS e no da AHIMTB www.resenet.com.br/users/ahimtb .Guardo expressivo arquivo sobre o assunto.

 

PRIMEIROS SESMEIROS CANGUÇUENSES

 

Consegui apurar que, após a guerra de Restauração do Rio Grande 1763-77, quatro grandes personalidades de então receberam sesmarias em Canguçu. Trata-se do tenente-general Manoel Marques de Souza, que recebeu sesmaria no Cerro Pelado, no vale do Piratini; o capitão-mór e coronel de Milícias Paulo Xavier Rodrigues Prates, na vertente canguçuense da Lagoa dos Patos e nascentes (nos arredores da atual cidade de Canguçu) dos rios Piratini e Camaquã; o capitão Simão Soares da Silva e Jerônimo Xavier de Azambuja. Paulo Xavier Rodrigues Prates era casado com uma irmã do tenente-general Manoel Marques de Souza e do tenente Luiz Francisco Marques de Souza primeiro estancieiro em Canguçu (73). Sobre os primeiros grandes sesmeiros canguçuenses obtive os seguintes dados:

PAULO XAVIER RODRIGUES PRATES (1743-1813). Nasceu em Laguna SC, por vo9lta de 1743, filho do capitão-mór João Rodrigues Prates e de Isabel Gonsalves Ribeiro, tronco de destacada família rio-gtrandense e paulista (74). O capitão-mór João e seu filho Paulo foram respectivamente bisavô e tio avô de D. Feliciano Rodrigues Prates, primeiro bispo do Rio Grande do Sul. Seu pai nasceu em 1695 em Extremoz – Portugal. Estabeleceu-se em Laguna-SC, onde casou em 1724 com a lagunista Isabel Gonsalves Ribeiro, filha de Manoel Gonçalves Ribeiro, juíz ordinário de Laguna. O avô e pai citados do capitão Paulo receberam sesmarias no Rio Grande respectivamente, em 1732, nos campos de Tramandaí e, em 1739, na região de Gravataí. Em 1762, seu pai, por ordem do capitão-general Gomes Freire de Andrade do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas, deixou Laguna à frente de 100 paulistas para auxiliar a defesa de Rio Pardo sob ameaça de invasão pelo Governador de Buenos Aires, Pedro Ceballos. Faleceu em Gravataí em 1766 (75) deixando três filhos, dos quais dois padres e mais cinco filhas. Aliás, nesta família e na de Marques de Souza registram-se muitos sacerdotes como se verá.

O capitão Paulo atuou nas Milícias onde atingiu o posto de coronel. Após 1780 transferiu-se de Gravataí e estabeleceu a sede de sua estância na ilha de Canguçu, atual da Feitoria na Lagoa dos Patos, onde faleceu em 13 de junho de 1813 de " queixa no peito ". Foi transportado para o Rio Grande onde foi sepultado. Notícias mais detelhadas sobre esta personalidade à qual se liga intimamente a fundação de Canguçu, como se verá, nos foi dada pelo comerciante inglês John Luccock que o visitou na ilha de Canguçu, atual da Feitoria por volta de 1809 (76).

Luccock e seus companheiros aportaram à meia-noite no extremo leste da ilha "Cangazú" por onde passava o canal de navegação da Lagoa dos Patos, o que tornava a ilha um ponto obrigatório de passagem da navegação entre Porto Alegre e Rio Grande, razão de sua escolha como um dos portos de embarque e desembarque da Real Feitoria do Linhocânhamo em Canguçu-Velho atual, de 1783-88, além do existente no arroio Correntes, no continente. Próximo estava ancorado um barco com capacidade de 150 toneladas com destino ao Rio de Janeiro. Pela manhã chegou até aos viajantes o proprietário da ilha, Paulo Xavier Rodrigues Prates, assim descrito por Luccock:

" Era um major de Milícias, homem alto e bem apessoado. Trajava casaco e colete de algodão, calças de fustão, botas à moda de Hesse e um chapelão de palha, manufatura caseira. Num boldrié de couro preto exibia a tiracolo uma faca de mato ".

Refere que o domínios do major Paulo compunham-se de duas outras ilhas além da Canguçu e que na maior, a noroeste, ele possuía sua residência. E prossegue o comerciante inglês:

" Na ilha em que estávamos o major Paulo fundara uma fábrica de sabão, a fim de aproveitar o sebo que dispunha, usando para isso a cinza de três diferentes gêneros de madeira existentes no local. A pouca distância da choupana iniciara a construção de uma boa casa, o que supunha oportuno porque o negócio prosperava e os navios eram obrigados a passar por junto à ilha. Logo que entramos a conversar em negócios pareceu-me que o major apesar de ser abastado não dispunha de grande numerário e possuía insignificante provimento de artigos exportáveis. Oferecia entretanto em pagamento de mercadorias a ilha de "Cangazú" em que estávamos, seus prédios e gado, assegurando que o número ia para mais de 4.000 cabeças com pastagens suficientes, estimando tudo em 8.000 cruzados cerca de 900 libras esterlinas ". E continua Luccock dando preciosas informações sobre tudo que viu na ilha de Cangazú.

Mais adiante entraremos em contato com Paulo Xavier Rodrigues Prates ligado à fundação da cidade de Canguçu 9 anos antes da descrição que transcrevemos.

Paulo Xavier Rodrigues Prates teve os seguintes irmãos todos nascidos em Gravataí: (77)

Paulo Xavier Rodrigues Prates deixou os seguintes filhos todos nascidos em Gravataí, antes de receber sesmaria em Canguçu:

Ana Alexandrina de Souza Prates que deixou ilustre descendência em Pelotas e Canguçu conforme demonstrou nosso confrade Carlos Rheingantz.

MANOEL MARQUES DE SOUZA (1773-1822) – tenente-general. Nasceu na Vila de Rio Grande em 27 de janeiro de 1743, após a sua (78) fundação pelo Brigadeiro Silva Pais. Era filho de Antônio Simões e Quitéria Marques, naturais respectivamente de Valongo e Milhardo em Portugal. Inicialmente dedicou-se às atividades de funcionário público. Na iminência da guerra 1763-77 alistou-se no Regimento de Dragões do Rio Pardo, tendo se destacado na luta contra os espanhóis até 1774. Por seu valor, intrepidez e profundo conhecimento adquirido dos homens e da terra rio-grandense, foi feito ajudante-de-ordens em 1775 do tenente-general Henrique Bohn, comandante do Exército do Sul estacionado em São José do Norte e encarregado de expulsar os espanhóis da Vila Rio Grande (79), de Santa Tecla (80) e São Martinho.(81)

Na madrugada de 1º de abril de 1776, acompanhou o ataque principal português através do canal entre São José do Norte e Vila de Rio Grande, orientando o comandante da tropa integrada por 200 granadeiros (82). Do final da guerra em 1777 e até 1795, morte de Rafael Pinto Bandeira, serviu na Fronteira do Rio Grande, cujo comando assumiu e exerceu por quase 25 anos, cumulativo com o de coronel da Legião de Cavalaria Ligeira do Continente.

Na guerra de 1801 teve atuação destacada em sua fronteira para a vitória, tendo inclusive assumido inteiramente o governo do Continente ( atual RS ) por morte de seu titular, o tenente-general Veiga Cabral e até assumir o brigadeiro João Francisco Róscio (83).

Nesta ocasião liderou muitos canguçuenses que serviram sob suas ordens (84).

Depois desta guerra foi elevado a brigadeiro. Em 1812 o foi a Marechal-de-Campo.

Então penetrou no Uruguai fazendo a vanguarda do Exército Pacificador da Banda Oriental, ao comando de D. Diogo de Souza (85). Mais uma vez liderou os canguçuenses.

Em 1816, como tenente-general graduado, teve atuação destacada na fronteira do Rio Grande na primeira guerra contra Artigas o que lhe valeu a confirmação no mais alto posto – o tenente-general. Em 1820 assumiu pela segunda vez o governo de sua capitania natal, quando enfrentou e debelouy, em abril de 1821, com energia, motim em Porto Alegre, do Batalhão de Infantaria e Artilharia.

Em outubro de 1821, às vésperas da Independência foi acusado de tramá-la, junto com seu Ajudante-de-Ordens e de pretender estabelecer a capital em Rio Grande.

Em consequência foi mandado recolher-se à Corte, em outubro de 1821, onde faleceu após cinco meses, aos 79 anos, sendo sepultado no Convento de Santo Antônio, sem viver para ver o dia 7 de setembro de 1822, dia da Proclamação da Independência do Brasil, para cuja concretização ele pagou alto preço ao final de sua proveitosa vida – o ser arrancado do Rio Grande, onde nascera e vivera e tornara-se um dos maiores fronteiros de sua História. Mas sua filha, casada com o Marechal-de-Campo Joaquim de Oliveira Alvares, que conspirou abertamente em pról da Independência, a assistiu no Rio.

Esse foi, em síntese, a vida gloriosa do primeiro sesmeiro canguçuense na bacia do rio Piratini.

Nota: Hoje ele é o patrono, por nossa sugestão e proposta instruida e aceita da 8º Brigada de Infantaria Motorizada, cuja história foi por nós elaborada e lançada em 2001 dentro do Projeto História do Exército no RGS

*SIMÃO SOARES DA SILVA (1741-1818) – Coronel de Milícias. Nasceu em Rio Grande onde foi batizado em 4 de novembro de 1741 e faleceu em Boqueirão (São Lourenço atual), em 11 de agosto de 1818. Foi casado com Joaquina Rosa do Nscimento, nascida em Rio Grande, em 24 de dezembro de 1755 e falecida em Boqueirão em 1824. Presumo haver recebido sua sesmaria no 5º subdistrito de Canguçu.

Simão Soares da Silva durante a guerra de 1801, como capitão de Milícias, junto com o tenente de Dragões João Antonio da Porciúncula, partindo das guardas do Taim e Albardão, fronteira pelo Tratado de Santo lldefonso, penetraram nos Campos Neutros e expulsaram as guardas espanholas ali existentes. A seguir surpreenderam a guarda espanhola no Chuí (85).

Foram seus filhos ligados a Canguçu:

1 – Tenente-Coronel Manuel Soares da Silva que casou, em 1798, na Capela N. S. da Conceição do Arroio das Pedras, atual Canguçu, com Clara Barbosa de Menezes, filha do tenente José de Sampaio.

2 – Simão Soares da Porciúnca (1773-1818). Casado em Canguçu, com Maria Venúncia Séria.

3 – José Soares da Silva, casado em 1798 na Capela N. S. da Conceição do Arroio das Pedras, com Guiomar Maria da Silva.

Simão Soares da Silva de ascendência açoriana deu origem à ilustre família, cujos descendentes vivem em Canguçu, São Lourenço, Pelotas, Bagé, Piratini.

Foi cidadão prestante em Canguçu segundo J. Simões Lopes Neto, Ismael Soares da Porciúncula.

Seus descendentes se ligaram à família de Bento Gonsalves da Silva, à do genealogista Carlos Grandmassom Rheingantz (86), à do historiador Pedro Calmon (87) e ao autor dessas linhas, através de Maria de Souza Mattos, filha do seu trisavô-Antonio de Souza Mattos(88).

JERONIMO XAVIER DE AZAMBUJA. Morou em Canguçu atual (1799-1808). Sua esposa Ana Joaquina Barbosa recebeu sesmaria nas imediações de Canguçu (Arroio das Pedras) em 1799. Jeronimo Xavier foi o fiscal da capela curada N. S. da Conceição por ocasião da fundação de Canguçu em 1800.

Teve papel destacado na Fronteira do Rio Grande na Guerra de 1801, como imediato do comandante da referida fronteira, Marques de Souza.

Foi proprietário de duas sesmarias em Canguçu recebidas em 1799 e 1793.

São canguçuenses suas filhas Cândida Lima e Rafaela, nascidas em 1803 e 1806. Era natural de Viamão. Foi companheiro de lutas de Rafael Pinto Bandeira, tendo participado da reconquista da Fortaleza de Santa Tecla em 1776.

Nota: Jerônimo teve papel importante na fundação de |Canguçu como curato conforme demonstramos em nosso pequeno livro Os 200 anos da Igreja Matriz N.S de Canguçu 1800-2000. É seu descendente Flavio Azambuja Kremer que muito tem escrito sobre a História de Canguçu e que possui preciosa Biblioteca particular sobre a História do Rio Grande a qual nos honrou dando-lhe o nome de Armazém Literário Cel Cláudio Moreira Bento

A CIDADE DE CANGUÇU SURGE DE UMA QUESTÃO DE TERRAS

 

Em 1780, o português José Pinto Martins, após estada no Ceará, fundou a primeira charqueada em Pelotas, célula mater da grande indústria saladeril que se instalou na região e em torno da qual iria girar a vida rio-grandense por mais de um século. As charqueadas em Pelotas iriam ter grande influência em Canguçu, como local de produçaõ bovina e de passagem de estradas de tropas de gado que drenavam a produção bovina, para Pelotas, de extensas áreas entre o Camaquã e o Jacuí e mais além, bem como ao sul do Piratini. Vestígios dessa época áurea são os mangueirões de pedra existentes nas regiões denominadas Lacerda e Florício Ribeiro em Canguçu.

No arroio Pavão, em Pelotas, possuía a sua estância o intrépido brigadeiro Rafael Pinto Bandeira, cuja vida que se extinguiu em 1795, esteve bastante ligada a Canguçu, por mais de 25 anos (90).

De sua estância no Pavão ele exerceu, de 1780-1795, o comando da Fronteira do Rio Grande e as funções do Coronel da Legião de Cavalaria Ligeira, raiz histórica da guarnição federal em Pelotas. Sua vida e obra foram ensaiadas por Alcides Cruz (91).

Por volta de 1793 surgiu uma questão de terras em torno da posse do local onde se assenta a cidade de Canguçu. Questão de terras entre o capitão-mór Paulo Rodrigues Xavier Prates e João Francisco Teixeira de Oliveira. O primeiro alegando posse e domínio antigo da área e o segundo a requerendo para si como devoluta (92).

A questão arrastou-se pelos próximos anos. Na Europa, o clima de guerra era minente entre Espanha e Portugal. No Rio Grande, trecho da fronteira de fato passava pelo rio Piratini. Era impositivo vivificá-la e fortificá-la. E o local da cidade de Canguçu se prestava para tal, como nó orográfico para onde convergiam diversos caminhos. Inclusive uma grande via de penetração, desde o forte Cerro Largo, atual Melo, na ROU, balizado pela seguinte direção geral: CERRO LARGO- Passo CENTURION ( no rio Jaguarão) – HERVAL – PINHEIRO MACHADO – PIRATINI – CANGUÇU. Direção que Rafael Pinto Bandeira havia usado bastante de 1767-78, para penetrar no atual Uruguai, entre os forte espanhóis de Santa Tereza e Santa Tecla, para arrear gados e buscar informações militares. A criação do forte de Cerro Largo pelos espanhóis foi conseqüência das penetrações de Rafael ao longo da direção citada (93).

A necessidade militar estratégica, de barrar em profundidade, em Canguçu aquela via de penetração, a questão de terras em torno de sua posse e o desejo dos moradores do local de possuírem assistência religiosa, requerendo para isso a concessão do local para erigirem capela e fundarem povoação, resultou na fundação de Canguçu, em 1º de janeiro de 1800, com o lançamento da Pedra Fundamental da Capela Curada N. S. da Conceição de Canguçu.

IMPORTÂNCIA ESTRATÉGICA DE CANGUÇU

 

O local escolhido para fundar a hoje cidade de Canguçu é nó orográfico. Em suas proximidades, numa altitude em torno de 500 metros, nascem afluentes dos rios Piratini e Camaquã e da Lagoa dos Patos. Como nó orográfico, para ele convergiam diversos caminhos que se desenvolviam em linha seca, a partir dos rios e lagoa citados.

Esta condição, no campo militar, imprimia ao local grande importância estratégica já comprovada na guerra 1766-77.

Se conquistada pelos espanhóis, em 1801, dali poderiam lançar contingentes contra Rio Grande e Rio Pardo, impedindo que estas duas guarnições se apoiassem mutuamente.

A guerra de 1801 irá ser decidida no passo de N. S. da Conceição do Jaguarão, no rio Jaguarão (próximo a Centurion) sobre o eixo citado, bem como a guerra Cisplatina 1825-28, tanto que o Exército Brasileiro, ao fim desta guerra, virá para Piratini onde será desmobilizado, conforme depoimento do veterano Bernardo Pires (95).

Ao final da guerra 1763-77 houve quem propusesse o local onde se situa hoje Canguçu para a capital do Rio Grande, por possuir, segundo o proponente, segurança para apoiar a marcha das estâncias para o poente, ao contrário da vila de Rio Grande, vulnerável militarmente, e Viamão, muito distante. Na Revolução Farroupilha, Piratini e Caçapava, próximas a Canguçu, seriam capitais da República Rio-grandense.

CANGUÇU NA CARTOGRAFIA ATÉ 1788

 

Em mapa mandado levantar pelo brigadeiro Silva Pais após fundar o Rio Grande em 1737, as terras de Canguçu aparecem genericamente como Terra dos Tapes (98). No mapa do brigadeiro Francisco Róscio (99) de 1774-78, as terras do atual município aparecem atravessadas por um caminho desde o Passo Geral (no Camaquã) atual Passo da Guarda, indo até as imediações da cidade de Canguçu. Aparece igualmente no rio Camaquã o Passo das Pedras, chamado por Patrício Correia Câmara em 1776 de Camaquam de Baixo, e que é o Vao dos Prestes. Aparecem ao sul do rio citado diversos arroios sem nome. Ao norte da guarda de Encruzilhada aparece a estância de Antônio José de Mathos (100), que julguei ser nosso tetravô o que necessita confirmar e e que seria tronco tronco da família Matos em Canguçu e Camaquã. Em mapa de 1780 do Marechal Diogo Funck (101) convergem para o Posto da Encruzilhada diversos caminhos. Deles, dois penetraram no atual município de Canguçu através dos passos das Pedras ( Camaquã de Baixo- atual Vao dos Prestes ) e do Geral da Armada (atual da Guarda) (102). Reproduzi parte em meu livro sobre O Negro na Sociedade do Rio Grande do Sul(103). A única estância cujo nome do proprietário aparece por completo é a do citado Antônio José de Mattos, veterano das lutas contra os espanhóis 1763-77. Algimas referências a Canguçu antes de 1800 serão feitas: ao Passo das Pedras (Vão dos Prestes) e Arroio das Pedras(local da cidade de Canguçu), junto à conhecida e nomeada desde então Coxilha de Santo Antônio, divisora das águas do Piratini e do Camaquã, sobre a qual corre a Rv – Canguçu – Piratini. No mapa da demarcação do Tratado de Santo lldefonso 1784-88, que reproduzi parte em meu livro citado sobre o Negro no Rio Grande do Sul,(103) aparecem todas as terras do município no vale do Piratini com acidentes geográficos como: Cerro Pelado; Arroio das Pedras; Passo do Acampamentono no rio Piratini; estância de Francisco Marques de Souza e Cerro Partido, em Canguçu. Na Carta Corográfica de 1789, publicada pelo general Tasso Fragoso, em a Batalha de Passo do Rosário (104) no local hoje ocupado pela cidade de Canguçu, consta a seguinte inscrição:

" Aqui se alojou o Coronel Rafael Pinto Bandeira com as trpas que comandava ao tempo da guerra (1763-77) para passar na vizinhança de Monte Videu (Montevidéu) com o fim de destruir e arrear gados dos Castelhanos, o que o conseguiu com felicidade, trazendo avultada quantidade de gado vacum e cavalar em 1777 ".

O executor desta façanha foi o cabo Bernardo Antunes que trouxe da campanha de Maldonado para Canguçu 1.600 cavalos chucros (105). Como prova documental do povoamento de Canguçu até antes de 1784, temos a seguinte afirmação em 1799 do coronel Manoel Marques de Souza, Comandante da Fronteira do Rio Grande,(106) (na época, de fato no rio Piratini) o governador de Buenos Aires Marquês de Sobremonte, em resposta ao protesto deste que já transcrevemos em parte neste capítulo:

" Quanto à espécie de Vª. Sª. parece querer ressuscitar de que o Piratini deve servir de limites entre os domínios das duas nações confinantes, devo dizer que esta foi um dia a opinião dos espanhóis. Porém eles mesmos pouco ou nada têm falado em tal. Isto depois que se lhes fizeram patente que quando as partidas empregadas na demarcação passaram a treze ou quatorze anos (1786 ou 1785) pelas vertentes do Piratini, já havia muito que estas estavam povoadas pelos portugueses, sem contradição nem oposição de pessoa alguma"

. Portanto, segundo o comandante da Fronteira há muito antes de 1786 o sul do município de Canguçu na bacia do Piratini estava povoado pelos portugueses e, inclusive, por seu irmão, antes mesmo de 1763.

Em mapa mandado levantar pelo Visconde de São Leopoldo após a Independência, para figurar em sua obra Anais da Província de São Pedro, pelo geógrafo Duvotenay, a Freguesia de Canguçu parece um deserto. Só aparecem as inscrições: "Capela de Canguçu" e "Serra dos Tapes" ou de "Canguçu".

Nota: Piratini foi fundada em 6 julho 1789, ano em que foi a Real Feitoria do Linhocânhamo do Rincão do Canguçu. em Canguçu Velho. transferida para São Leopoldo atual. E sobre as origens de Piratini publicamos em 2002 plaqueta pelo IHTRGS e ACANDHIS Piratini um sagrado símbolo gaúcho farrapo. Assunto que abordamos em nossa oração inaugural em 6 de julho de 2003 da Academia Piratiniense de História como seu presidente fundador e que figura no Site da ACANDHIS.

RAFAEL PINTO BANDEIRA – O DESBRAVADOR DE CANGUÇU

 

Rafael Pinto Bandeira nasceu em 16 de dezembro de 1740, no recém-fundado Presídio Jesus Maria José, origem da cidade de Rio Grande. Era filho do lagunista coronel de Dragões Francisco Pinto Bandeira (107), segundo estancieiro a estabelecer-se no Rio Grande do Sul por volta de 1733, em Sapucaia do Sul atual, e o primeiro Comandante da 1ª companhia organizada do legendário Regimento de Dragões do Rio Pardo (108).

Em 1763, por ocasião da invasão espanhola do Rio Grande do Sul, Rafael já era um experimentado tenente do Regimento dos Dragões do Rio Pardo e bastante conhecedor das campanhas rio-grandenses. Teve seu batismo de fogo, em 1763, no combate de Monte Grande, sob o comando de seu pai. Com a adoção da guerra de guerrilhas contra os espanhóis, em razão da fraqueza militar a que ficara reduzido o Rio Grande, após a invasão espanhola em 1763, coube-lhe comandar o setor ao rio Camaquã, ficando seu pai ao norte até ser substituído em 1771, por morte em Rio Pardo, pelo intrépido capitão Cypriano Cardoso Leme (109). De 1767-1778, Rafael usara Canguçu como base de suas guerrilhas contra os espanhóis, estabelecidos ou atuando nas campanhas do Rio Grande contíguas ao atual Uruguai e neste territorio (110). De Canguçu ele partira para lutar contra os espanhóis em Santa Bárbara e Tabatingai, em 1774, e para conquistar e arrasar Santa Tecla em 1776. Para Canguçu conduziu grandes manadas vacuns e cavalares, arreadas em operações militares, dos espanhóis, ao sul do Jaguarão.

Como prêmio de sua ação militar em Santa Tecla, foi feito coronel de uma Legião Ligeira de Cavalaria (111), tropa que basicamente mobilizou a fronteira do Rio Grande até a Independência, como se verá.

De 1777 até 9 de abril de 1795, data de sua morte em Rio Grande, exerceu o Comando da Fronteira do Rio Grande e da Legião de Cavalaria Ligeira, basicamente de sua estância do Pavão, em Pelotas. De 1780-1795 exerceu inteiramente, por diversas vezes, o governo do Continente do Rio Grande de São Pedro, nos impedimentos do tenente-general Veiga Cabral da Câmara, como 1º Comissário da Demarcação do Tratado de Santo Ildefonso.

É chamado " a primeira espada continentina ", em razão de ser o rio-grandense que primeiro brilhou na guerra com repercussão internacional. Em função disso, foi o primeiro rio-grandense a governar o Rio Grande do Sul, então Continente do Rio Grande de São Pedro.

Alcides Cruz o ensaiou no início do século (112). Mas fatos novos surgidos impõem um estudo mais profundo desse rio-grandense, cujos restos mortais repousam na bicentenária igreja do Rio Grande. Sua popularidade atual muito merecida, se deveu a Érico Veríssimo em O tempo e o Vento.

Seu último contatro com Canguçu, após a guerra, nos vem da informação que forneceu do Vao dos Prestes, em 1º de fevereiro de1778, sobre os postos que ocupava sua Legião e Voluntários de São Paulo (113). Deixou um contingente no Passo dos Ladrões (atual Passo das Carretas).

Segundo a Câmara Municipal de Canguçu em 1881 (114) é a seguinte a posição relativa da cidade em relação à histórica Coxilha de Santo Antônio e , também no passado, denominada Estrada de Santo Antônio. Com a fundação de Canguçu ela passou a cruzar o povoado e seu trecho primitivo passou a chamar-se estrada Velha e , após, das Tropas.

" A Vila de Canguçu está situada na parte ocidental da serra dos Tapes, entre o campo e a serra, junto a uma encruzilhada de morros que forma a coxilha que segue de L – W denominada Santo Antônio ".

A continuação da estrada Santo Antônio para Pelotas chamava-se estrada dos Fojos (115). Fojos tem o sentido de armadilha: buraco coberto de galhos para caçar animais; sumidouros de água; valetas estreitas e profundas. Por ela passaram numerosas tropas de gado. Fica a pergunta se o nome deveu-se a armadilhas naturais ou artificiais para o gado existentes no itinerário. *

Pinto Bandeira realizou muitas operações de informações e de arreadas no Uruguai, a partir de Canguçu, através do Sargento Bernardo Soares e Cabos Bernarddo Antunes e Antônio Lopes Duro (116).

Estudos que temos procedido nos levam a concluir que Rafael Pinto Bandeira e seus guerrilheiros ou cavalarianos ligeiros foram os debravadores de 1767-1777 das terras de Canguçu, ao longo do dorso da coxilha Santo Antônio, que divide as bacias do Camaquã e Piratini, e das que dividem os afluentes desses cursos d’água. Ele e seus bravos acamparam ou tiveram postos de vigilância nos seguintes locais atuais: Vao dos Prestes (Camaquã de Baixo e Passo das Pedras); Passo da Guarda (Passo da Armada, local até onde Camaquã era navegável); Coxilha do Fogo (Encruzilhada do Duro), diferente do Sítio do Duro (117); Coxilha Santo Antônio (divisora em Canguçu dos rios Piratini e Camaquã); Cerro Partido (que mergulha no balneário João Paulo); Arroio das Pedras (cidade de Canguçu atual e imediações, abundantes de aforamentos graníticos); Estância Francisco Marques de Souza; Passo do Acampamento e Cerro Pelado na bacia do Piratini.

Os Voluntários de São Paulo que atuaram com Rafael em Canguçu em 1777-78 integravam a Companhia de Cavalaria de Legião de São Paulo, ao comando do capitão Garcia Rodrigues Paes Leme. Eram seus oficiais o 1º Ten. João de Castro Canto e Mello, 2º Tem. Francisco José Machado e Alferes Salvador de Abreu Rangel.

O tenente Canto e Mello é parente próximo da que seria mais tarde a Marquesa de Santos, ligada à vida de D. Pedro l, nosso primeiro imperador (118).

O jornal Correio Mercantil de Pelotas de 8 Jul. 1883, na coluna Canguçu, reclamou de uma sanga de 8 metros de fundo, 12 de largura e meia quadra de cumprimento, defronte ao cemitério, na rua General Osório, sobre a estrada para Pelotas, que a noite oferecia sério risco aos carreteiros e tropeiros. O signatário da coluna – A sentinela, pedia enérgica providência da Câmara, "pra no dia menos pensado termos de lamentar grandes desgraças". Teria esta sanga contribuído para o nome de Estrada dos Fogos dado a Pelotas- Canguçu.

Nota: Biografamos com mais detalhes o Brigadeiro Rafael Pinto Bandeira como o primeiro rio- grandense a atingir o generalato e no livro Comando Militar do Sul –4 décadas de História 1953-1995 e Antecedentes ,dentro do projeto que estamos desenvolvendo sobre História do Exército na Região Sul. Propusemos e instruímos proposta aprovada que tornou Rafael Pinto Bandeira patrono do 8 º Esquadrão de Cavalaria Mecanizada de Porto Alegre que integra a 8ª da Inf Mtz de Pelotas.


 

CAPÍTULO 2 – CANGUÇU – DO CURATO À INDEPENDÊNCIA

 

FUNDAÇÃO DA CIDADE DE CANGUÇU

 

Em dazembro de 1799, 140 moradores do distrito de Canguçu da Vila de Rio Grande, encaminharam o seguinte requerimento (1) ao tenente-general governador do Continente do Rio Grande de São Pedro, nome na época do atual Rio Grande do Sul e que era subordinado ao Rio de Janeiro.

 

" llmo. e Exmo. Senhor

 

Dizem os moradores do Arroio das Pedras, denominado Canguçu, distrito dessa Freguesia de São Pedro do Rio Grande que eles vivem mais de trinta léguas longe de sua paróquia, com dificuldades de muitos arroios e rios caudalosos que os embaraçam de serem socorridos com os sacramentos sempre necessários, porém muito mais precisos nos últimos momentos da vida do homem, acontecendo verem-se pelas estradas muitas cruzes em sinal de sepultura daqueles desgraçados que faleceram privados de toda a consolação e utilidade da Graça Santificante do Sacramento da Penitência.

No distrito de Canguçu se acham 140 vizinhos com 1.000 pessoas de sua obrigação. E posto que os referidos suplicantes tenham já o fundo, dois contos de réis (2.000 réis) como se mostra a relação junta, para erigirem uma capela, na qual possam receber os sacramentos e se representem os mistérios da Religião, para a honra e glória de Deus.

Contudo lhes falta licença e proteção de V. Exª., sem a qual ficarão infrutíferos os desjos dos suplicantes.

Portanto. – Pedem a V. Exª. seja servido conceder a licença pedida em nome de sua Majestade e nomear para inspetor da referida Igreja o Tenente-Coronel Jerônimo Xavier de Azambuja (2) em quem se acham todas as qualidades necessárias, por cuja graça – receberemos mercê".

Despacho

Como pedem

Rio Grande, 30 de dezembro de 1799.( Rubrica de Veiga Cabral )

O PRIMEIRO INSPETOR DA CAPELA DE CANGUÇU

 

O Tenente-Coronel Jerônimo Xavier de Azambuja lutou ao lado de Rafael Pinto Bandeira. Participou da conquista de Santa Tecla em 1776, sendo citado como valente pelo governador Marcelino de Fgueiredo (3). Na guerra de 1801 foi o subcomandante da Cavalaria Ligeira da Fronteira do Rio Grande ao comando de Marques de Souza. Dele se origina a família Azambuja entre o Taim e o Chuí e entre o Piratini e o Jaguarão. Foi estanceiro em Canguçu até a guerra de 1801. Após transferiu-se para os campos abaixo do Piratini. Era filho do lagunista capitão Francisco Xavier de Azambuja, cuja descendência ensaiei (4).

O CRIADOR DE CANGUÇU

 

Canguçu foi criado pelo Tenente-General Veiga Cabral, Governador do Continente de São Pedro e 1º Comissário da Demarcação de Limites do Tratado de Santo lldefonso, cuja vida e obra, de grande projeção nos destinos do Rio Grande do Sul, temos a honra de pela primeira vez ensaiar, de modo o mais extenso possível.

CÂMARA, Sebastião Xavier da Veiga Cabral da (1742-1801). Nasceu em Santa Maria do Soutello, Portugal. Sua família era muito conceituada. Segundo Lyra Tavares " formou-se engenheiro geógrafo " (5). Veio para o Brasil em 1767, aos 25 anos de idade, como tenente-coronel do Regimento de Infantaria de Bragança, comandado pelo coronel Francisco Lima e Silva, tio-avô do Duque de Caxias. Após 5 anos no Rio de Janeiro foi para o Rio Grande do Sul, em 1774, comandado o primeiro escalão de tropas que constituíram o Exécito do Sul e o RI de Bragança. Dele escreveu o cirurgião- mór Francisco Ferreira de Souza, do Regimento de Infantaria do Rio de Janeiro, atual Batalhão Sampaio, por ocasião da viajem Rio – Rio Grande 1774: (6).

" Em 26 dez nosso RI do Rio de Janeiro deu as boas-festas aos amigos, por se separarem uns de suas casas e outros de seus divertimentos e outros de suas famílias. Amenizava este afastamento virmos na honrosa companhia do Sr. Sebastião Xavier da Veiga Cabral da Câmara, comandante das Tropas do Sul, pelo seu gênio amável, pelas suas virtudes admirado e pelo seu ilustre nome respeitado ".

Tomou parte ativa no assalto à Vila de Rio Grande, em 1º de abril de 1776, sendo o primeiro a penetrá-la no dia seguinte, após evacuada pelos espanhóis. Por este feito foi promovido a brigadeiro.

Em 1780, em função dos incidentes entre os coronéis Marcelino de Figueiredo e Rafael Pinto Bandeira, foi mandado assumir o governo do Continente do Rio Grande de São Pedro ( RGS atual ). E de 1780-1801 exerceu estas funções com brilho, dedicação e mesmo heroismo, cumulativamente com as de 1º Comissário da Demarcação do Tratado de Santo lldefonso. Nesta condição percorreu em 1784 a bacia do Piratini, em Canguçu, encontrandoa povoada há algum tempo, conforme escreveu o coronel Manoel Marques de Souza em 1799 ao Governador de Buenos Aires, Marquês de Sobre Monte (7).

O fruto do intenso e produtivo labor administrativo de Veiga Cabral durante cerca de 20 anos, como governador e demarcador no Rio Grande do Sul de 1780-1801, foi inventariado em diversas páginas por Abeillard Barreto (8).

Dentre esses estudos ou trabalhos, indiretamente ligados a Canguçu e diretamente ao Rio Grande do Sul, registro como de muita importância histórica:

A maior projeção da obra de veiga Cabral no Rio Grande do Sul foi no campo militar. Foi ele o planejador secreto e condutor, com o auxílio do coronel Manoel Marques de Souza, comandante da Fronteira do Rio Grande e do tenente-coronel Patrício Correia Câmara, da vitoriosa guerra de 1801 que temos estudado (11), da qual resultou a incorporação, pela força das armas, ao Rio Grande do Sul, dos Sete Povos das Missões e dos ricos territórios espanhóis ou neutros pelo Tratado de Santo lldefonso, entre os rios Piratini e Jaguarão, arroios Taim e Chuí e da margem esquerda do rio Santa Maria.

Seu heroísmo decorreu do fato de conduzir a guerra na sua fase mais crítica de seu leito de morte no Rio Grande, vindo a falecer, em 5 de novembro de 1801, na Vila de Rio Grande aos 59 anos.

Seu governo precisa ser estudado com maior profundidade e temos a certeza que se inscreverá como um dos de maior duração como de maior projeção do Rio Grande do Sul. De uma coisa temos certeza: Em seu governo o Rio Grande do Sul conheceu o maior progresso e desenvolvimento relativo de sua história. Antônio Gonsalves Chaves em suas Memórias Econômico – Políticas, em 1822, faz restrições ao trato do problema fundiário por Veiga Cabral. O autor citado viveu em Pelotas de 1805-1838.

O VISITADOR QUE PRESIDIU A FUNDAÇÃO DE CANGUÇU

 

O lançamento da pedra fundamentel da igreja de Canguçu, em 1º de janeiro de 1800 foi presidido pelo representante do bispo do Rio de Janeiro – o Visitador Frei Bento Cortez de Toledo, natural de São Paulo e pelo seu secretário – o padre José Ignácio da Silva Pereira, da llha de Santa Catarina. Informações sobre eles retirei de parecer ao Vice-Rei do Brasil, datado de 12 de julho de 1805, elaborado pelo padre capitular Francisco Gomes Villasboas, respondendo pelo bispado do Rio, por morte de seu titular, e considerado pelo Vice-Rei " probo, inteligente e de prática nos negócios da diocese do Rio (12) ". Escreveu o padre Villasboas sobre o visitador citado e que aqui parafraseio: (13).

" Frei BENTO CORTEZ DE TOLEDO. Natural de São Paulo (Taubaté). Franciscano. Veio ao Rio muito acreditado no bispado de São Paulo e a procura do Frei Antônio de Santa Úrsula Rodolvalho, mestre jubilado e de muito conceito aqui, de virtuoso e douto. Por seu conceito, foi colocado pelo bispo como professor de Letras no Seminário do Convento de Santo Antônio, onde chegou a ser Vice-Reitor, funções que exerceu sem desmerecer o conceito que gozava. Em 5 de novembro de 1798, foi nomeado Visitador do Continente do Rio Grande de São Pedro. Finda a visita àquele Continente, ausentou-se dele para o seu bispado em São Paulo assumir a paróquia de Taubaté, remetendo os livros e atos de sua visitação para este bispado do Rio de Janeiro ".

Portanto, os atos de criação da capela Curada de N. S. da Conceição de Canguçu foram enviados para o Rio de Janeiro. Não se sabe é se o padre José Ignácio, secretário da visita, transcreveu nos livros os nomes dos 140 povoadores de Canguçu com as respectivas quantias que doaram para erigirem a capela. Sabe-se, com certeza, que os nomes dos 140 moradores de Canguçu que requereram permissão para fundar um povoado e uma igreja, foram omitidos pelo secretário da visita no livro de Tombo da Capela Curada de Canguçu, conforme conclui-se de J. Simões Lopes Neto (14). Os atos do Visitador foram aprovados pelo 1º Bispo do Rio de Janeiro, D. José Joaquim Castello Branco, falecido em 2 de janeiro de 1805.

Tenho procurado exaustivamente estes nomes, faz mais de 25 anos, pela importância histórica dos mesmos. Na impossibilidade em anexo tentamos reconstruir parte deles com o apoio em fontes diversas.

A visita do Frei Bento Cortez de Toledo ao Continente do Rio Grande de São Pedro, taxada de "abusiva", provocou, em plena guerra de 10801, uma representação de parte de seu governador Veiga Cabral, o criador de Canguçu, propondo a criação de um Bispado ou de um Vigararia Geral, com juridição sobre o Rio Grande de São Pedro e Santa Catarina. O processo decorrente está publicado na Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e retrata a conjuntura católica em Portugal e Brasil, no início do século XlX (15). Seu mérito escapa a este trabalho. A proposta de Veiga Cabral iria vingar 11 anos após , com criação, em 1812, da Vigararia Geral de Porto Alegre. A alternativa de bispado somente iria concretizar-se 47 anos após, em 7 de maio de 1848, tendo como primeiro bispo D. Feliciano Rodrigues Prates, vigário de Encruzilhada do Sul atual e sobrinho neto do padre Francisco Rodrigues Prates, primeiro padre de Canguçu, como administrador da Real Feitoria do Linhocânhamo do Rincão de Canguçu em 1783, e do capitão-mór Paulo Rodrigues Xavier Prates.

CANGUÇU NA GUERRA DE 1801

 

Em 1801 Espanha e Portugal entram em guerra na Europa. Em conseqüência ela se verificará também no Rio Grande do Sul.

Aqui ela durou de 14 Jul.-17 Dez. Foi planejada e comandada pelo tenente general Veiga Cabral, que fundara Canguçu. Durante a sua fase mais crítica ele a comandou de seu leito de morte em Rio Grande.

As hostilidades tiveram início na Fronteira do Rio Grande, a que Canguçu pertencia e servia de fronteira de fato no rio Piratini. Elas consistiram no ataque às guardas espanholas estabelecidas entre o Piratini e o Jaguarão, pelo major Vasco Pinto Bandeira (16), irmão de Rafael Pinto Badeira. Seguiram-se as ações na Fronteira do Rio Pardo: conquista do forte São Martinho; arrazamento da guarda de São Gabriel do Batovi fundada pelos espanhóis, conforme trata com detalhes Osório Santana Figueiredo, e Santa Tecla, pr[oximo a Bagé. Ainda na mesma fronteira do Rio Pardo, a partir de São Martinho, foram lançados 40 dragões e aventureiros que conquistaram os Sete Povos das Missões. Segue-se a conquista de Santa Vitória do Palmar, a partir do Taim e Albardão, por contingentes ao comando do sesmeiro em Canguçu, capitão de Milícias Simão Soares e do tenente de Dragões José Antunes da Porciúncula, até hoje, ambos, com descendentes em Canguçu. Canguçuenses participam a seguir do vitorioso combate do passo das Perdizes, de 17 de junho, contra tropas enviadas de Cerro Largo ( Mello atual ).

O Marquês de Sobremonte cerrou sobre Cerro Largo, que fora conquistado por Marques de Souza. Este evacuou aquela praça e concentrou toda a Fronteira do Rio Grande no Passo N. S. da Conceição do Jaguarão (próximo a Centurión).

Passam-se os dias e as tropas do Marquês de Sobremonte concentraram-se ao sul do Jaguarão e as de todo o Rio Grande ao norte, frente a frente, na altura do passo N. S.ª da Conceição do Jaguarão. O Marquês de Sobremonte enviou um ultimatum ao coronel Marques de Souza, que não cedeu e o respondeu com altivez. Face à superioridade dos rio-grandenses, o Marquês de Sobremonte retirou-se para Cerro Largo. Em 11 de novembro, morreu, em Rio Grande, Veiga Cabral, sendo substituído pelo brigadeiro Francisco Róscio.

Em 17 de dezembro de 1801 foi publicada a paz no Rio Grande e cessaram as Hostilidades.

Ao final da guerra, os rio-grandenses haviam conquistado de fato os territórios: entre os rios Piratini e Jaguarão; dos Sete Povos das Missões; de Santa Vitória do Palmar e da margem esquerda do rio Santa Maria.

Os referidos territórios não foram devolvidos em razão da Espanha não haver restituído na Europa a cidade de Olivença que conquistara pelas armas de Portugal.*

Canguçu foi a base de partida de muitos povoadores dos novos e ricos territórios conquistados e que ali viveram , casaram, prosperaram e procriaram de 1780-1801.

ASPECTOS HISTÓRICOS DO ANO DA FUNDAÇÃO DE CANGUÇU

 

Ao ser fundado Canguçu, reinava em Portugal o Príncipe Regente D. João, em nome de D. Maria l. Já havia nascido em 12 de outubro de 1798 aquele que seria o primeiro imperador do Brasil, com o nome de Pedro l. Nascimento saudado em Canguçu através do nome da estância São Pedro de Alcântara, de propriedade de Afonso Pereira Chaves e Pedro João da Fonseca. Estância situada a SO da cidade de Canguçu atual e vendida, em 12 de junho de 1800, a Manuel Antunes Moreira, conforme promessa de compra e venda em meu poder (19), bastante reveladora de alguns dos primeiros povoadores de Canguçu.

Governava o Brasil o Vice-Rei Conde de Resende. A fundação de Canguçu teve lugar no 11º ano da Idade Contemporânea ou da Revolução Francesa. Na Europa começara a brilhar a estrela de Napoleão Bonaparte. Ele obtivera de 1776-1779 vitórias militares sobre a Sardenha, Áustria, Inglaterra e Turquia. Ao final das mesmas foi nomeado 1º Consul. No ano da fundação de Canguçu ele venceu os austríacos, em Merengo, passaporte para sua proclamação, em 1804, como Cônsul vitalício.

A Capela Curada de N. Sª da Conceição de Canguçu foi a 13ª a ser criada oficialmente pelos portugueses dentre as que se tornaram municípios. Foram as primeiras capelas dentro do critério acima, com apoio em Fortes e Wagner (20): Rio Grande (1737), Viamão (1754), Santo Antônio da Patrulha (1760), Vacaria (1761), Gravataí (1761), Rio Pardo (1762), Taquari (1764), Piratini (1789), Encruzilhada (1799), Canguçu (1800). A próxima seria a de Caçapava, em 5 de julho de 1800.

De fato, a capela de Canguçu data de 1798, ou antes, com o nome de N. Sª da Conceição do Passo das Pedras, ora de Arroio das Pedras, conforme sacramentos nela realizados (21). Documento que acabo de localizar na Biblioteca Nacional, datado de 1881, afirma que o povoamento da cidade de Canguçu teve início de fato em 1795 (22). Carta do sesmeiro do local Paulo Rodrigues Xavier Prates, datada de 11 de Nov. 1799, na qual comunica haver doado o local para N. Sª da Conceição, registra diversos posseiros no local e refere inclusive a ranchos velhos lá existentes (23).

Pela carta citada todos os terrenos seriam pertencentes a N. Sª da Conceição de Canguçu e seus usuários pagariam foros. E mais, que caso não vingasse o projeto da Capela os rendimentos dos terrenos reverteriam para o luzimento do altar de qualquer capela que invocasse N. Sª do Rosário ( e não especificamente a de Rio Grande, como passou à trdição).

Segundo J. Simões Lopes Neto, com apoio em memória de Manuel Gomes de Freitas, (destacado historiador rio-grandense, (24) que instalaria Canguçu em 1857), os destinos dos terrenos obedeceram ao seguinte critério estabelecido pelo tenente general Veiga Cabral da Câmara (25).

Os terrenos concedidos seriam de propriedade exclusiva de N. Sª da Conceição e divididos em duas classes. " Os terrenos de primeira seriam vendidos a 960 réis cada. Mediriam cerca de 10m X 44m. Destinavam-se a fundar a povoação nas ruas que foram marcadas desde então e que persistiram até 1939. Os de segunda classe e patrimônio de N. Sª da Conceição, estavam bem nítidos. Os referidos terrenos ficavam compreendidos entre os arroios que cercam Canguçu. O limite norte era o arroio que passa junto ao arrasado cerro da Liberdade.

Em ofício de 22 de janeiro de 1798, o Vice-Rei do Brasil, ao propor a Portugal a transformação do atual Rio Grande do Sul, de Continente à Capitania do Rio Grande de São Pedro e Santa Catarina, tendo como primeiro capitão general o fundador de Canguçu, escreveu a certa altura:

" Também me parece próprio criar vilas segundo o número de fogos (habitações) que houver nas freguesias. Porque com essas povoações poderse-ão reger os indivíduos mais facilmente pela justiça ordinária e se engrossarão as forças (militares), fazendo-se capazes de tratar da sua segurança e a do Estado " (26).

Aqui encontramos mais um apoio da criação de Canguçu haver obedecido a critérios de Segurança Externa.

Nota: Manoel Gomes de Freitas que biografo neste trabalho nasceu em Canguçu. E patrono de cadeira na ACANDHIS e Patrono da Academia Piratiniense de História.

PROPOSTA PARA A CAPELA DE CANGUÇU PERTENCER Á VILA DE PELOTAS A CRIAR.

 

Em 6 de abril de 1804, em carta dirigida ao Princípe Regente D. João, o major de Ordenças Domingos José Marques e escrivão de sesmarias do Continente do Rio Grande de São Pedro, escreveu em certa altura, ao propor a criação das vilas de Rio Grande, Pelotas, Cachoeira, Triunfo, Rio Pardo e Santo Antônio:

" A segunda vila, no lugar denominado Pelotas, sito na Barra do São Gonsalo da Parte Norte, honde fundeão embarcações e se faz um comércio vivo, podendo-se-lhe acrescentar as Capelas de CANGOSU, PAVATENY e a do ARROIO GRANDE".

O major Domingos, alegando conhecimento geográfico, topográfico, econômico, civil e militar do Rio Grande, em razão de seu ofício de escrivão de sesmarias, baseava sua proposta na "necessidade de minorar o estado de desordem e principalmente de falta de justiça", no Rio Grande do Sul de então.

COLOCAÇÃO DO SACRÁRIO DA CAPELA DE CANGUÇU

 

Em 8 de janeiro de 1804, após quatro anos de trabalhos para a construção da Capela Curada N. S.ª da Conceição de Canguçu, foi ela benzida e colocado o seu sacrário pelo padre visitador Agostinho José Mendes dos Reis. Sobre ele escreveu o citado padre Villasboas, ao Vice-Rei do Rio de Janeiro, em parecer na citada representação do governador Veiga Cabral que taxava de abusiva a visita realizada pelo padre Bento Cortez de Toledo (27).

" E se este visitador (Bento Cortez de Toledo) obrou como se diz, posso certificar a V. Excia. que conheci alguns visitadores com espírito verdadeiramente apostólico. Ainda hoje existe um deles, netural de Santa Catarina, chamado Agostinho José Mendes dos Reis. Ele tem visitado o Continente do Rio Grande de São Pedro por quatro vezes. E foi tanto o interesse temporal que tirou, sendo aliás pobre, que em prêmio para poder sobreviver sem mendigar, pediu a escrivania da vara de Santa Catarina, contendando-se com o tênue rendimento dela ".

O padre Agostinho dos Reis resgatava assim, com seu verdadeiro espírito apotólico, as dúvidas deixadas sob a ação de seu antecessor e que motivaram representação do governador do Rio Grande ao Vice-Rei do Brasil e ao Ministro de Estado de Portugal (28).

O Sacrário foi colocado sob os pés da pequena imagem de N. S.ª da Conceição de Canguçu (29).

CANGUÇU 1780 – 1804 SEGUNDO SEU PRIMEIRO POVOADOR

 

O capitão-mór Paulo Rodrigues Xavier Prates entreteve pelo menos três questões de terras nos limites de sua sesmaria, na atul cidade de Canguçu e adjacências. Da que manteve com João Francisco Teixeira de Oliveira resultou o terreno doado a N. S.ª da Conceição, base da atual cidade de Canguçu, conforme abordou J. Simões Lopes Neto (30). A outra foi com o alferes José de Souza Pereira, primeiro povoador de Canguçu, cujas propriedades situavam-se a SO da tual cidade de Canguçu. Esta, é tratada na carta que transcreverei.

Ela foi cedida, em 1812, a J. Simões Lopes Neto por nosso avô Genes Gentil Bento, junto com outros documentos importantes ligados à fundação de Canguçu, todos em meu poder (31).

A transcrevo a seguir, com observações entre parênteses e notas, após ter sido por mim paleografada com o auxílio do Arquivo Nacional e interpretada de modo a torná-la mais inteligível ao leitor comum.

Nela é citado o segundo povoador de Canguçu, o Capitão José Joaquim Gouveia, que mais tarde casaria com Esdolástica, filha do capitão-mór Paulo Xavier Rodrigues Prates (32). Como nome abreviado de Francisco Teixeira, ela cita o primeiro contendor do capitão-mór Paulo citado.

Mas deixemos falar o primeiro povoador de Canguçu e nos transmitir suas angústias e valiosas informações.

 

" Senhor Capitão-Mór

 

Paulo Rodrigues Xavier Prates

 

Respondo a sua (carta) datada de 20 de abril. Nela vejo a honra com que me trata. Parece-me que para Vossa Mercê eu sou surdo, cego e mudo. Porque faz 24 anos que habito este lugar (desde 1780) e não tenho conhecimento das divisas que diz ter nos seus títulos e menos do que, "fraldas dos serros sobem por ela acima".

Só tenho conhecimento das divisas que estão nos títulos de propriedade que obteve do falecido tenente general (Sebastião Cabral da Câmara – Governador do Rio Grande 1780-1801) por serem os naturais do seu próprio rincão.

Eu por hipótese sou ignorante? Parece-me que Vossa Mercê não poderá esquecer que quando eu vim povoar este campo (em 1780) era esta campanha povoada de feras, índios, desertores, ladrões e contrabandistas que serviam para insultar as nações portuguesa e espanhola. Não deixaria o capitão José Joaquim Gouveia de lhe dar notícias do que era isto (Canguçu e imediações). Ele foi o primeiro que apareceu aqui no seu rincão há quatro anos com os meus animais.

Dizendo-lhe que povoasse o campo onde hoje se encontra o castelhano Medina, concordou. Disse-me que daqui não queria coisa alguma, e que pretendia ali naquele campo conservar o seu gado até passar das guardas para dentro (33). Vendo que eu não tinha medo dos casais (açorianos), e dos demais que vinham povoar os campos, mudou o seu gado para o campo que depois vendeu ao falecido Manoel (José) Cardoso. Um Chaviano (ou Flaviano) que aqui veio ver o seu campo para comprar disse-me que estes lugares só serviam para a habitação de feras. Um Francisco Gomes falou ao Alferes Manuel Alves de Carvalho que aqui também me disse que estes lugares só serviam para degredo. E mais, que se por seus pecados cometesse algum crime e o quisessem mandar para este ligar, se empenharia para que o enviassem para Angola. Alguns destes que eram seus parentes não lhe disseram o que era esta campanha naqueles tempos? (1780-84). Do contrário, Vossa Mercê não empreenderia com tamanha desumanidade o propósito de tirar-me meu campo que me custou com tanto risco de vida a povoar, sacrificando-me e a minha família ao que nos suceder de (grave) fosse possível.

Reconheça que depois de eu estar aqui há 7 anos (em 1787) o capitão José Joaquim Gouveia lhe disse que o seu rincão era pequeno e Vossa Mercê devia procurar ficar com o meu campo que está em dois serros contra o Piratinim Menor (35). Logo esqueceu Vossa Mercê das leis da humanidade e das contas que há de prestar a Deus. Escreveu uma carta ao senhor seu cunhado (coronel Manoel Marques de Souza) para me por fora do meu campo. Porém, Deus que foi o meu defensor não permitiu que Vossa Mercê o conseguisse. Mostrei-lhe (a Manoel Marques de Souza) como o já havia feito ao capitão José Joaquim, ao capitão Francisco Xavier e ao falecido tenente José de Sampaio que o meu campo estava fora das suas divisas. Mas isto não foi bastante para Vossa Mercê se conter, pois como disse a João Francisco Teixeira de Oliveira, não tinha sombras humanas e somente as de Deus. Continuou com a sua contumácia.

No ano seguinte (1788), requerendo ao coronel Joaquim José Ribeiro da Costa ( governador interino que tomou posse em maio 1787) (36) dizendo-lhe que eu estava estabelecido em seu campo perturbando os seus animais com os meus. Naquele tempo Vossa Mercê só possuía duas manadas de éguas no seu rincão e meus animais não passavam suas divisas. Mas primeiro recomendou ao major que, é hoje Caetano Barbosa, que visse se eu estava no seu campo e que dentro de 8 dias me despejasse. Despejou? Não! Hoje estou no mesmo lugar! Não mandei medir e demarcar o meu campo sem contradição de pessoa alguma? Não foi citado Francisco Teixeira que estava senhor e possuidor de seu rincão? Não requereu exame de suas divisas? Não foram examinadas judicialmente? Porque requereu Vossa Mercê ao falecido tenente general (Veiga Cabral da Câmara) medição de seu campo por um engenheiro que Sua Majestade mandou para este Continente (do Rio Grande de São Pedro) para a marcação da divisória com a Espanha (Tratado de Santo lldefonso) e não pelo piloto de medições? Tudo isto com o fim de aumentar o seu campo e por fora o pobre João Francisco Teixeira de Oliveira(37).

Onde está a medição que Vossa Mercê pediu ao falecido tenente General (Veiga Cabral da Câmara) dos limites que dividem o seu campo com o meu? Que remorsos o conduzirão à presença do Padre Mestre Rodovalho (Frei Antônio de Santa Ursula Rodovalho) (38) a quem disse o que me tinha feito? O que ele me disse parece-me escusado repetir-lhe.

Eu bem sei que Vossa Mercê é aparentado, é o preferido do Capitão-Mór (39) e que repetidamente a ele recorrer como diz . Sei que sou um pobre desconhecido. Mas por esta razão como disse São Pedro, "não deixarei Deus para obedecer aos homens". Isto em consideração à numerosa família que Deus me deu. E a este mesmo Deus peço dar a Vossa Mercê um toque de sua divina graça para que adote suas futuras providências na consideração da Eternidade.

Desejo a sua saúde e de toda a nobre obrigação (família) para que na posse dela mandar (ordenar) a este que sempre foi de Vossa Mercê o menor criado.

 

Ass: José de Souza Pereira.

 

Hoje, 19 de maio de 1804."

O SÁBIO PADRE RODOVALHO VISITOU CANGUÇU?

 

Chamou-nos a curiosidade a citação do padre mestre Rodovalho do qual obtivemos os seguintes dados na História do Convento de Santo Antônio do Rio de Janeiro (40) que recebemos ao visitá-lo em março de 1980. à procura do altar de campanha do Duque de Caxias que lá se encontra:

"Frei Antônio de Santa Úrsula Rodovalho. Nasceu em Taubaté. Foi um dos mais sábios que teve a Província Franciscana da Imaculada Conceição que sediou-se no Convento de Santo Antônio no Rio de Janeiro de 1675-1901. Afamado orador, grande mestre de Filosofia e Teologia. Aos 8 de outubro foi eleito Provincial. Aos 25 de abril de 1810 foi nomeado bispo de Angola, mas por motivo de saúde renunciou antes de ser sagrado. A 11 de janeiro de 1811 renunciou ao cargo de Provincial. Faleceu em 1817".

Foi a este padre "mestre jubilado e de muito conceito aqui de virtuoso e douto" (41) que o padre Bento Cortez de Toledo, que presidiu a fundação de Canguçu se apresentou antes de vir realizar a sua visita e de assumir a paróquia de Taubaté, terra natal do padre Rodovalho.

Aonde o primeiro povoador de Canguçu teria falado antes de 1804, com o padre Rodovalho? Numa visita deste ao Continente como visitador ou em companhia do provincial? Era mais fácil ao padre conhecer o capitão Paulo, por este possuir padres dois irmãos, um filho e dois sobrinhos (42). Entre os dois últimos, D. Feliciano Rodrigues Prates que estudava no Rio e seria sagrado padre dois meses após a data da carta transcrita e em 25 Jul. 1804.

É muito provável que o padre Rodovalho tenha passado em Canguçu, a serviço de sua Província, ocasião em que o primeiro povoador de Canguçu desabafou-lhe suas mágoas e foi por ele consolado.

PRIMEIRO ESBOÇO E DESCRIÇÃO DE CANGUÇU E ADJACÊNCIAS

 

Anexo a carta transcrita e com a mesma letra, acompanha uma exposição possivelmente bem anterior, tendo no verso um esboço. Na exposição a letra R-(Requerente?) refere-se ao capítão- mór Paulo Xavier Rodrigues Prates e a letra A-(Acusado?) ao Alferes José de Souza Pereira. Eis o texto do anexo em linguagem atual e interpretado da forma mais inteligível hoje:

A fFigura: Esboço de autoria provável do primeiro póvoador de Canguçu, Alferes JOSÉ DE SOUZA PEREIRA, elaborado talvez antes de 1800. (Cópia)

"O acusado não disputa:

- O estabelecimento do requerente que está no pé do arroio Tamanduá.

O esposto mostra o dolo do requerente em procurar fazer medições através de um engenheiro para lhe enredar (confundir) as suas divisas com as do acusado.

( Um trecho pouco legível e inteligível a respeito de medições procedidas ).

A primeira ponta do Piratini verte em realidade da Serra dos Tapes. A segunda nasce junto a mesma Serra dos Tapes e mais acima dos serros de campo".

No esboço e na carta não foi possível ler o nome (Dos Lhes) cuja tapera ficava no boqueirão da 3ª ponta do Piratini.

Segundo J. Simões Lopes Neto, o local onde se assenta Canguçu chamava-se Rincão do Tamanduá (44). Penso, com apoio na carta transcrita, que José Francisco Teixeira de Oliveira não comprou o Rincão do Tamanduá (45) do Cap.-Mor Paulo e, sim, que o ocupou e terminou perdendo a questão, sendo de lá tirado, após o que o Capitão-Mór Paulo o doou a N. Sa. da Conceição.

As questões de terras foram uma constante nesta época. Logo após a elevação do Rio Grande a Capítania, uma de suas autoridades escreveu ao Príncipe D. João:

" Um juiz de tombo de toda a capitania, e da maior necessidade. Do contrário vai toda ela cair no caos, porque são tantas as demandas por causa de terras que em séculos elas não se porão em sossego. Os juízes de foro tem tanto do que cuidarem que se também forem juízes de medições, será impossível cumprirem suas obrigações em tempo " (46).

 

Manoelito de Ornelas em Gaúcho e Beduínos transcreve petição de casais de açorianos de Santo Amaro, dirigida a D. João, que reflete o problema dramático relacionado com a posse da terra.

 

O próprio Cap. Mór Paulo Rodrigues Prates, em carta de 11 de novembro de 1799, ao Alferes José de Souza Pereira, alerta-o em certa altura:

 

" Me parece desnecessário expor a Vossa Mercê, por quanto não os ignorará, os imensos arestos (demandas) que em todos os lugares existem sobre patrimônios " (47)

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CANGUÇU NA CRIAÇÃO DO RIO GRANDE

 

Em 19 de setembro de 1807, setenta anos após a fundação do Rio Grande por Silva Paes, D. João criou a Capitania Geral do Rio Grande de São Pedro. Quatro meses depois, em 22 de janeiro de 1808, ele desembarcou na Bahia com o restante da Família Real, obrigado por Napoleão a deixar Portugal, às pressas, por haver recusado declarar guerra à Inglaterra, tradicional aliada. As razões declaradas da criação da Capitania foram a distância do Rio e o aumento de sua população e progresso. Em verdade, ela atendeu às razões de Segurança Externa. Pois, a Bacia do Prata, com o aprisionamento por Napoleão do rei de Espanha, irmão de D. Carlota Joaquina, esposa de D. João, viu-se envolvida por agitações movidas por sentimentos independentes, nativistas e imperialistas. Agitações que ameaçaram colocar em risco a segurança e a integridade do Rio Grande e a dar um destino ao atual Uruguai contrário aos desejados por Portugal. O primeiro Capitão General D. Diogo de Souza, proveniente de governos em Moçambique, Maranhão e Piauí, assumiu em 9 de outubro de 1809 (48). Situação de Canguçu e do restante do Rio Grande por esta época pode ser deduzida da obra do viajante inglês John Luccock (49), que visitou a Capitania de 1809-1813, e das "Reflexões sobre o estado" da mesma, em 1808, de Manoel Antônio de Magalhães (50). Ao chegar ao Rio, D. João entre outras iniciativas, conquistou Caiena na Guiana Francesa, criou o atual Regimento de Cavalaria de Guardas – os Dragões da Independência de Brasília (51) e a Academia Real Militar, raiz histórica da Academia Militar das Agulhas Negras (52).

Na lnglaterra, no ano da vinda da Família Real para o Brasil, Hipólito José da Costa que havia passado a juventude em Pelotas, iniciava a edição do Correio Braziliense (1808-1822) conforme já abordamos em diversos trabalhos (53). John Luccock assim descreveu o gaúcho rio-grandense que viu em Rio Grande em 1809, e, seguramente entre eles, alguns canguçuenses que iam até aquela vila negociar:

" Eram a maioria das vezes, homens baixos e robustos cuja mestiçagem com o sangue índio se denunciava na barba rala, nos cabelos finos e nos olhos vivos. Os homens de origem espanhola ou portuguesa tem longas e cerradas barbas, cabelos anelados, rosto e membros mais delgados que os mestiços. São todos morenos de cabelos e olhos negros.

Suas roupas são quase sempre de algodão grosseiro e resistente feito em casa. Compõem-se de camisetas de mangas abertas e calças que vão pouco abaixo dos joelhos que se prendem à altura dos quadris por uma cinta. A cinta também é de algodão tingido de azul ou vermelho, quando não entremeado com as duas cores e a branca e terminando em franjas. Comprida e estreita, era enrolada três ou quatro vezes na cintura. Em suas dobras depositavam dinheiro e outros pequenos valores. Aos ombros levam uma bolsa de couro com o isqueiro (de pedra e mecha) e um pouco de fumo. Todos usavam chapéu alto de forma cônica e abarretada, de feltro, de palha ou folha de palmeira. Via-se na cinta uma faca afiada. Embora descalços, traziam esporas presas com tiras de couro macio e botas (de garrão de potro) apresilhadas nos joelhos. Um ou outro usava lenço no pescoço, facão de mato e se fazia acompanhar de criados ". E prossegue a deliciosa descrição sobre outros detalhes, onde aparecem estribos feitos da seção transversal de chifres de boi (54).

CANGUÇU NA CAMPANHA DO EXÉRCITO PACIFICADOR DA BANDA ORIENTAL

 

Em 1810 começou a emancipação da Argentina. Em conseqüência, nossa fronteira foi violada com atentados às propriedades, por desordeiros que atuavam na Argentina e Uruguai atuais. Para previnir estes males e outros maiores, foi organizado o Exército de Observação da Capitania. No atual Uruguai, o governador Hélio, que defendia os interesses da Espanha, foi sitiado por tropas de Buenos Aires, Rondeau e Artigas. Pediu auxílio a D. João. Em conseqüência, o Exército de Observação transformou-se em Pacificador. Sob o comando de D. Diogo invadiu o Uruguai pela fronteira do Rio Grande, pelo histórico passo N. S.ª da Conceição do Jaguarão, após concentrar-se em Bagé atual, cuja fundação data desse evento. Canguçuenses integraram a vanguarda ao comando do marechal Manoel Marques de Souza, comandante da Fronteira do Rio Grande. Participaram da conquista de Cerro Largo (Mello atual) em 23 de julho de 1811, das tomadas da Fortaleza de Santa Tereza, em 5 de setembro e de Maldonado, em 14 de outubro, local onde incorporou-se às operações militares, como coronel auditor, o mais tarde Visconde de São Leopoldo (55). D Diogo recebeu um recado do governador Hélio para que retornasse ao Rio Grande em face do levantamento do cerco. Nesta ocasião Artigas concentrou-se no arroio Ahuy do outro lado do Uruguai, frente a Uruguaiana atual, após levantar o cerco que fazia com Rondeau.

Quando o Exército Pacificador encontrava-se em Maldonado, Canguçu foi elevado à condição de Freguesia, em 31 de janeiro de 1812, conforme Ângelo Pires Moreira, em " Canguçu, Pelotas e jJaguarão, freguesias trigêneas "(56).

De 16 Mar.-2 Mai. 1812, D. Diogo deslocou o Exército de Maldonado Paissandu. Canguçuenses participam da Vanguarda ao comando de Marques de Souza. Em 10 Jun., D. Diogo recebeu ordem, em Paissandu, de reinternar-se no Rio Grande. Em 13Jun. marchou para as cabeceiras do Cunha Perú, ao sul de Santana atual. Ali, em três meses, com o concurso de Chagas Santos comandante dos Sete Povos das Missões, D. Diogo pressionou os artiguistas para fora do distrito de Entre-Rios (rios Uruguai-Ibicuí, Santa Maria e Quaraí) que incorporou então, quando inclusive, doou sesmarias no local, bem como em Santa Vitória do Palmar.

Desse local o Exército Pacificador reinternou-se no Rio Grande, sendo que Marques de Souza pelo paso N. S.ª da Conceição do Jaguarão e Francisco Xavier Curado (57) por Bagé. Participaram pois alguns canguçienses, da segunda guerra ao comndo de Marques de Souza, sesmeiro ao sul de Canguçu.

Participaram da guerra de 1763-77, bem como desta, como continuaram a participar até 1822, sucessivos contingentes de paulistas que ao lado dos açorianos, estudados pelo Mestre Dante de Laytano (58), se constituíram uma grande corrente povoadora, até hoje pouco estudada e destacada sob este enfoque.

Para estudar-se a influência sociológica dos migrantes paulistas militares e civis que radicaram-se no Rio Grande de 1733-1822, evento tão magistralmente romanceado por Érico Veríssimo na família de Ana Terra, é fundamental que se leia Monsenhor Amaury Castanho, de Sorocaba, sob o pseudômino de Aluízio de Almeida: Vida Cotidiana da Capitania de São Paulo 1722 – 1822 e Vida e Morte do Tropeiro.Através da primeira obra desse autor, que recebi de suas mãos, em visita que lhe fiz em Sorocaba em 19 de dezembro de 1977, em companhia de Vinício Stein Campos, conheci o seguinte que se relaciona com Canguçu:

O Frei Bento Cortez de Toledo que lançou a pedra fundamental de Canguçu encontrava-se em São João Del Rei com os seus irmãos padre Carlos Correia de Toledo Melo e o (major) Luiz Vaz de Toledo Piza partidários da lnconfidência Mineira em 1789, mas sem haver participado do movimento. Que era irmão do Frei Rodovalho, citado na carta transcrita do primeiro povoador de Canguçu. Que todos eram de Taubaté, e filhos de um homem que após enviuvar ordenou-se padre e foi vigário de Mogi das Cruzes(59).

Ensaiamos participação militar de São Paulo na guerra da Restauração do Rio Grande do Sul em 1776 (60) e a professora Maria de Lourdes F. Lins, doutora em História pela USP o fez no período 1763-78 e 1810-1822 (61).

Sobre isto publicamos trabalho no Boletim do Instituto Histórico e Geográfico do Paraná em 1978.

A FREGUESIA N. S.ª DA CONCEIÇÃO DE CANGUÇU

Em 31 de janeiro de 1812, em Resolução Nº 7 à consulta feita à Mesa de Consiências e Ordens, o Príncipe D. João criou as freguesias de Arroio Grande (Jaguarão atual), Pelotas e Canguçu conforme documento a seguir transcrito em linguagem intelegível, hoje (62).

" Foi ouvida a Mesa de Consciências e Ordens sobre o requerimento dos moradores do Arroio Grande, a capela da Lagoa (Mirim – foz do Jaguarão) enquanto não se edifique outra à custo dos povos que a isso se devem obrigar por contrato.

O procurador Geral das Ordens concordou com O reverendo. Bispo, na ereção das três freguesias com os limites que indicou. Não concordou que a construção da Igreja (em Jaguarão) seja obrigação dos povos, mas sim construída à custa da Real Fazenda.

Dando-se vistas ao Procurador da Coroa e Fazenda concordou com as informações do Reverendo. Bispo quanto a criação das três freguesias e seus limites. Não concordou ser obrigação dos povos edificarem a nova igreja (em Jaguarão). Abordando a questão sobre quem é obrigado a edificar inteiramente as matrizes: Se atribuir esta obrigação por direito ao Padroeiro, quanto à Capela-Mór, aos povos quanto o corpo da lgreja. Quando não existir constituição ou convenção especial, não convém seja imposta aos paroquianos esta expressa condição ou obrigação. Basta que designe o lugar em que a lgreja deve ser construída. Pois o fervor e devoção dos povos os persuadirão a fazer a desejada edificação.

A Mesa, o Reverendo Bispo, o Procurador Geral das Ordens e o Desembargador Procurador Geral da Coroa e Fazenda são de parecer consultar à Vossa Alteza sobre:

_ A ereção das três freguesias de Pelotas, Canguçu e Arroio Grande, separadas da Freguesia de São Pedro do Rio Grande, tendo por limites e localidades designados pelo Reverendo Bispo e sem obrigação determinada de os fregueses erigirem a lgreja às suas custas pelas razões ponderadas.

_ Assignar (atribuir) Vossa Alteza Real aos párocos das ditas freguesias a congrua (pensão) anual de 200$000 réis a cada um e às fábricas a quantia do costume do Bispado.

Vossa Alteza mandará o que for servido.

Rio de Janeiro, 17 de janeiro de 1812.

Resolução

Conforme parecer

Palácio do Rio de Janeiro, 31 de janeiro de 1812.

(Rúbrica do Príncipe Regente D. João)

Os limites de Canguçu foram então estabelecidos.

 

O CRIADOR DA FREGUESIA DE CANGUÇU

 

Criou a Freguesia de Canguçu e definiu-lhes os limites, o rei D. João IV (1769-1826), então Príncipe Regente, em nome de sua mãe D. Maria I, impedida por doença mental . D. João foi um príncipe politicamente muito esperto e hábil. Com sua vinda para o Brasil, em 1808, coube-lhe infra-estruturá-lo para tornar-se independente, em 1822, através de seu filho D. Pedro l, ao qual aconselhou, em 1821, ao voltar para Portugal: "Coloca a coroa do Brasil na tua cabeça antes que um aventureiro o faça". Por sugestão do Congresso de Viena, elevou o Brasil, em 16 de dezembro de 1815, à condição de Reino Unido. Em 20 de março de 1816, por morte de sua mãe, tornara-se rei do referido reino, com o título de D. João Vl. Antes de partir para Portugal incorporou, em 1821, o atual Uruguai ao Brasil, com o nome de Província Cisplatina, situação que perdurou até 1828.

* VISITA A CANGUÇU DO BISPO DO RIO DE JANEIRO – 1815

 

Nos dias 25, 26 e 27 de novembro de 1815, pouco menos de um mês da elevação do Brasil à condição de Reino Unido do Brasil, Portugal e Algarves, Canguçu foi visitado pelo 8º Bispo do Rio de Janeiro (1807-33) D. José Caetano da Silva Coutinho.

Tratei en detalhes no Diário Popularde Pelotas de 22 mar. 77 (63).

Segundo o monsenhor Balem et Alli (64): " D. José Caetano nasceu em Caldas da Rainha – Portugal, em 1767. Bacharelou-se em Cânones em Coimbra. Sagrado Bispo de Lisboa em 15 de março de 1807, conseguiu burlar as tropas de ocupação de Napoleão e chegou ao Rio de Janeiro cerca de um mês e meio após a Família Real". Piratini foi a primeira Freguesia criada por sua proposta em 3 Abr. 1810. Canguçu foi a terceira após Pelotas, dentro da procedência que se observou no ato de criação, embora gêmeas.

Os limites de Canguçu atuais, de certa forma foram os propostos por D. José Caetano a D. João. Este prelado foi figura intimamente ligada ao processo da Independência do Brasil, onde assistiu a toda a ação de D. João, coroou D.Pedro l e o assistiu até sua abdicação, falecendo dois anos após na Regência.

Foi o Bispo D. José Caetano que presidiu na Capela Imperial, em 10 nov. 1822, dia da Apresentação de Nossa Senhora a tocante e histórica cerimônia cívica religiosa "na qual o Imperador D. Pedro l entregava ao tenente Luiz Alves de Lima e Silva (o futuro Duque de Caxias), o primeiro exemplar da Bandeira do Brasil independente, recém-criada, envolta no incenso que o precalo Bispo-Capelão Mór D. José da Silva Coutinho lhe lançava de seu turíbulo de prata". (65)

Dentre as observações feitas por D. José Caetano sobre Canguçu, repetimos aqui:

A freguesia produzia anualmente 1000 a 2000 alqueires de trigo "o que a fazia uma das mais notáveis de Capitania neste particular". Supunha que o vigário padre Tourem fosse um grande plantador do produto.

Calculou a população em torno de 3000 que era servida por 5 padres, sendo o vigário Tourem coadjuvado pelo padre Duarte Cruz Pinto e mais os Padres Gervásio Pereira Carneiro, num oratório para os lados de Piratini, Joaquim Tavares num oratório para os lados de Pelotas e Januário para os lados de Camaquã. Sobre a igreja no seu 15º ano de criada observou: "é uma barraca de telha , pobre mas caiadinha, com seus ornamentinhos e duas sinetas inteirinhas . Achei a pia batismal indigna e mandei fazer outra logo. Vi o cemitério em torno da igreja – achei-o mais indigno e reclamei do vigário. Ao visitar os pobres e doentes achei a localidade menor que Caçapava, pois os seus moradores ricaços moram em suas fazendas de gado e trigo".

Chegou as 11 horas de 25 de Nov – sábado e hospedou-se "na casa da mãe do Fidêncio", no outro dia domingo "na casa do Alferes Braz e D. Ricarda" e segunda, "jantou na casa de Felisberto".

Dia 26 – Domingo. Confessou algumas senhoras, rezou missa, ministrou comunhão geral e bênção papal.

Fez um sermão tendo por tema o Juizo Final. Realizou crismas e um casamento em casa particular. Recusou-se abrir mão da idade mínima para um casamento de uma menina. No dia 27 , em razão de forte chuva, não pode viajar. Ouviu missa, Pregou sermão e celebrou 7 casamentos, "dos quais 5 de pessoas que viviam emancebadas" incluindo "o Camp os natural de Goyáz". Registrou que muitos homens e mulheres viajaram dúzias de léguas para que os confessassem e casassem. Encerra seu registro que aqui sintetizei com a seguinte frase:

" Os campos aqui na Primavera reacendem todos com o aroma das guabirobas, uma espécie de pitanga rasteira, bastante semelhante à murta européia ".

A visita à Pelotas é descrita pelo nosso confrade Padre Rubem Neis (66) que nos cedeu os apontamentos relativos a Canguçu.

Por coincidência hoje, dia 3 de julho 1980, em que redijo esta parte e outras, onde citei autoridades religiosas de São Paulo, ligadas a Canguçu, o Papa João Paulo ll realizou sua visita àquele Estado.

José Saturnino da Costa Pereira, irmão de Hipólito da Costa o fundador da Imprensa Brasileira em Apontamentos para a formação de um roteiro das costas do Brasil, citado por Fernando Osório (67) transcreve uma conta corrente onde aparecem os fornecimentos de trigo em 1817, 1818 e 1819 a comerciantes de Pelotas, do canguçuense Antônio de Souza Mattos nosso trisavô, que julgo filho de José Antônio Mathos, que apareceu nos mapas do Brigadeiro João Róscio e Marechal Funck, ao norte de Encruzilhda (68).

José Saturnino, irmão do Patrono da Imprensa, raducou-se no Rio. Foi deputado às cortes de Lisboa e senador do Império. Era irmão do padre Felício, primeiro vigário colado, que lutou no Rio, junto às autoridades eclesiáticas, para a criação das freguesias de Pelotas e Canguçu (69).

No ano da visita do Bispo do Rio de Janeiro, a Canguçu, Napoleão foi derrotado em Waterloo.

CANGUÇU NAS GUERRAS CONTRA ARTIGAS – 1816-1821

 

Nesta época Artigas dominava a Banda Oriental, atual Uruguai. Seus objetivos territoriais visavam em nosso território o domínio dos Sete Povos das Missões e do território entre os rios Santa Maria, Quaraí, Uruguai e Ibicuí. Concluíram os assessores de D. João Vl que era imperativo o Brasil extender seus limites até o rio da Prata. Para executar este plano veio de Portugal, ao comando do tenente-general Carlos Frederico Lecor, uma Divisão de Voluntários Reais, com um efetivo de 4.832 que acaba de ser estudada pelo general Paulo Queiroz Duarte (70).

Artigas permanecendo no Sul do Quaraí, próximo a Santana atual, invadiu o Rio Grande por São Borja, com André Artigas e pelo sul do lbicuí com Verdum que destruiu o acampamento de S. Diogo (Capela Queimada), nucleo inicial da cidade de Alegrete.

O general Curado que comandava a Fronteira do Rio Pardo cerrou suas tropas para rio lbirapuitã – Chico e teve lugar uma série de combates em que tomaram parte canguçuenses das famílias Matos, Prestes e Borba, etc, do vale do Camaquã (71). Travaram-se nesta frente os combates de lbirapuitã – Chico e Carumbé contra Artigas, o de São Borja contra André Artigas, e o de lbirocai contra Verdun e que puseram em debandada estes adversários.

No entanto, ao saber que Artigas reunia novos meios no rio Arapeí, o Marquês de Alegrete, Capitão-General do Rio Grande, invadiu a Banda Oriental e bateu Artigas em Arapeí e finalmente em Catalan.

Na fronteira do Rio Grande , Lecor invadiu a Banda Oriental pelo arroio Chuí, com seus Voluntários Reais, tendo por vanguarda 106 milicianos do Rio Grande, inclusive alguns da Freguesia de N. S.ª de Canguçu, enquanto o restante da Fronteira do Rio Grande vigiava o Jaguarão. Lecor venceu as resistências oferecidas por Rivera no combate de Ìndia Muerta em 16 de Nov 1816, e pelas guerrilhas de Lavalleja e Oribe. Entrou em Mondevidéu em 20 de Jan de 1817, que se submeteu incondicionalmente. Teve início o domínio português sobre Montevidéu que durou 11 anos, até 1828. Entre os auxiliares de Lecor, segundo transmitiu-me o falecido professor Adail Bento Costa, de Pelotas, (72) com apoio em tradição familiar, ia Antônio Bento que daria origem a família Bento em Canguçu por irradiação da antiga Estação de Cerrito que ela ajudou a fundar, junto com a família Caldeira (73) e outras.

Artigas continuou a resistir no interior da Banda Oriental. Em 1820 invadiu o Rio Grande, por Santana do Livramento atual, recalcando as defesas ao comando do tenente-coronel José de Abreu, "O Anjo da Vitória" até o Passo do Rosário (74). Forças ao comando do Conde da Figueira, Capitão-General do Rio Grande intervieram, pressionaram Artigas e terminaram por batê-lo por completo, em 22 de janeiro de 1820, em Taquarembó, obrigando-o a exilar-se no Paraguai, onde findou seus dias. Em conseqüência, pouco depois, em 1821, o Uruguai foi incorporado ao Brasil com o nome de Província Cisplatina, situação que perdurou por 7 anos.

Sobre a primeira campanha, o capitão Diogo Arouche de Morais Lara, nosso patrono no lnstituto Histórico e Geográfico de São Paulo, produziu a Memória da Campanha de 1816. O que era o Rio Grande do Sul a este tempo, no limiar da lndependência do Brasil durante esta, poderá ser deduzido da obra do naturalista Augusto Saint-Hilaire que percorreu o Rio Grande do Sul por esta época (75).

Entre o final desta guerra e a lndependência, o último capitão-general, o mais tarde Duque de Saldanha, concedeu muitas sesmarias de mato em Canguçu situadas na Serra dos Tapes na vertente da Lagoa dos Patos (76).

Em 1821, desinteligências entre o futuro Duque de Saldanha citado e o grande fronteiro e sesmeiro em Canguçu, general Manoel Marques de Souza, acusado de favorável a lndependência, obrigaram a que este fosse arrancado do Rio Grande e mandado para o Rio de Janeiro, onde faleceu antes de ver concretizada a lndependência.

Maiores dados sobre os religiosos que atuaram em Canguçu de 1783-1822 e que menciono em minha História da lgreja N. As. da Conceição de Canguçu (77) poderão ser buscados na obra do frei Basílio Rower sobre a História da Província Franciscana da lmaculada Conceição que teve por sede o Convento de Santo Antônio no Rio de Janeiro, cujo padroeiro o Santo Antônio da Garoa, ligado às tradições militares do Rio Grande do Sul, é tenente-coronel do Exército Brasileiro e a padroeira da Província o é também de Canguçu e do Exército. Aos pés de uma gravura de N. As. da Conceição, o Duque de Caxias expirou em Santa Mônica, em 7 de maio de 1880 (78).

O padre Francisco Rodrigues Prates que foi o primeiro administrador da Feitoria do Linhocânhamo em Canguçu estudou e lecionou no Convento de santo Antônio.

Nota: Sobre a Igreja produzimos e publicamos a obra Os 200 anos da Igreja Matriz N.S da Conceição de Canguçu em 2.000 e por ela financiada e distribuída


 

CAPÍTULO 3 – CANGUÇU – DA INDEPENDÊNCIA AO VILAMENTO

 

CANGUÇU NA INDEPENDÊNCIA

 

Por ocasião da lndependência, a vila de Rio Grande era sede de dilatado município que abrangia os atuais de Pelotas, Piratini, Canguçu, São Lourenço, Arroio Grande, Jaguarão, Herval do Sul, Santa Vitória do Palmar e Pedro Osório etc (1) e possuía 3.550 casas. O número de casas da então Freguesia de Canguçu – 600 – somente era superado por Pelotas com 700, Rio Grande com 680. Seguia-se Piratini com 580, Lagoa (Arroio Grande, Jaguarão e Herval) com 480, Estreito com 260 e Mostardas com 220 (2). O município de Rio Grande constituía a chamada Fronteira do Rio Grande, dividida em 12 distritos militares a saber: Canguçu (Freguesia de Canguçu); Norte e Estreito (São José do Norte); Mostardas; Rio Grande; Povo Novo; Taim, (Santa Vitória atual); Pelotas (Pelotas atual); Boqueirão (São Lourenço do Sul); Piratini (antigas Vila Freire e estação de Cerrito); Casais (atual município de Piratini e Pinheiro Machado); Herval (Herval do Sul, Arroio Grande e Pedro Osório ao sul do Piratini) e Cerrito do Jaguarão (atual município de Jaguarão).

Para distinguir o Cerrito (Jaguarão atual) de Cerrito (antigo Cerrito Velho e Vila Freire) chamava-se o último de Piratini e Piratini atual de Casaiiis. O pesquisador desta região deverá atender para este detalhe para não incindir em erros. O passo N. S. da Conceição do Jaguarão nesta época não ficava na atual cidade de Jaguarão e, sim, na altura de Centurión.

A população de Canguçu era de 5.800 contra 1.000 em 1.800, e 3.000 em 1815, por ocasião de visita do bispo do Rio de Janeiro. Somente era superada por Pelotas 7.250 e Rio Grande 5.800. Piratini possuía 5.350, Lagoa 4.800, Estreito 2.560 e Mostardas 2.100(3).

Canguçu proporcionalmente às demais localidades apresentava a maior densidade rural. Suas terras, na época, estavam sendo objeto de intensa migração em razão das concessões de sesmarias de mata, feitas na vertente da Lagoa dos Patos, 1821-22, pelo 4º e último capitão general do Rio Grande (4).

A referida autoridade era o brigadeiro João Carlos de Saldanha Oliveira e Daun. Era afilhado de D. João lV que o nomeou para o Rio Grande, num de seus últimos atos antes de partir para Portugal. Era neto do Marquês de Pombal, cuja obra possui grande projeção no destino brasileiro do Rio Grande do Sul. tomou posse em 10 de agosto de 1821, com a idade de 31 anos, num período difícil de transição do Brasil Colônia para o lndependente. Suas dificuldades e atuação equilibrada são estudadas por Guilhermino César que lhe fez justiça. (5)

Tinha vindo com o coronel integrante do Estado-Maior da Legião de Voluntários Reais que incorporou o Uruguai. Foi comandante, no Rio, do atual Batalhão Sampaio. Era um destacado e bravo profissional militar. Em Portugal atuou até 1870 com larga ação política, tendo lutado contra os absolutistas ao lado de D. João IV de Portugal e nosso Pedro I do Brasil.

O sentimento independentista e liberal era intenso na época da Independência entre os rio-grandenses, conforme registrou o sábio Saint-Hilaire que visitava o Rio Grande então. (6)

Em Pelotas, segundo apurou Fernando Luiz Osório (7) a Independência foi "festejada em 15 de outubro publicamente com solenidade e pompa ainda até não vistas".

Uma idéia do Rio Grande do Sul econômico e político e por extensão de Canguçu, pode ser obtida da obra Memórias Econômico-Políticas de 1822, de autoria de Antônio Gonçalves Chaves, rico e culto charqueador que viveu em Pelotas de 1808-1838. *

E em Canguçu igualmente conforme abordei em O mineiro que foi o cérebro de Revolução Farroupilha, Itajubá, EFEI, 1981.

Nota: Sobre a projeção de Pombal nas dimensões continentais do Brasil focalizo em detalhes a sua projeção na consolidação da conquista da Amazônia em nosso livro Amazônia Brasileira - Conquista, Consolidação, Manutenção- História Militar Terrestre da Amazônia 1616-2003. Porto Alegre: Metropole,2003

 

GUERRA CISPLATINA 1825-28

 

A Independência desfalcou o Exército de grande parte de seus oficiais que voltaram para Portugal. O problema da consolidação da Independência no Norte e Nordeste desviou os parcos recursos do nascente Exército do Brasil, do que se aproveitaram os orientais apoiados pela Argentina e após, unidos, para moverem guerra contra o Brasil, visando à Independência do Urugaui, que lhe fora incorporado artificialmente em 1821.

A guerra Cisplatina iniciou com o desembarque na praia de Agraciada, no Uruguai, em 19 de abril de 1825, de 33 orientais sob a liderança de Lavalleja. Pouco após a revolta, com apoio popular e argentino, atingiu Montevidéu. Em 25 de agosto de 1825, em Florida, a Província Cisplatina declarou-se independente do Brasil e confederou-se à Argentina de então.

No Rio Grande, elevado a Província, em 25 de agosto de 1825, seu presidente, o Visconde de São Leopoldo, procurou auxiliar o general Lecor a debelar o movimento. O marechal José de Abreu e Barão do Cerro Largo, comandante das Armas da Província entrou em ação. Após vitória de Bento Manoel Ribeiro em Áquila, os orientais bateram os brasileiros em Rincon de Las Galinas e logo em seguida em Sarandí, em 22 de outubro de 1825, o que assegurou aos orientais, todo o controle da campanha uruguaia.

O general Lecor e o marechal Abreu foram demitidos.

O substituto do Marechal Abreu, Massena Rosado , concentrou todo o Exército do Sul em Alegrete.

O general argentino Alvear concentrou os argentinos em Durazno e após invadiu o Rio Grande do Sul por Aceguá – Bagé – São Gabriel, quando travou-se a indecisa batalha do Passo do Rosário, ou Ituizangô, de 20/Fev/1827. Comandou os brasileiros o Marquês de Barbacema. A marcha dos dois exércitos e situação dos mesmos para a batalha acabam de ser por mim estudadas e publicadas (8) bem como foram motivo de conferência que pronunciei nos IHGB – IGHMB em 1977.

Finda esta batalha, a fase final da campanha vai ser desenvolvida com os orientais e argentinos concentrados em Cerro Largo (Mello atual na ROU) ao comando de Alvear e os brasileiros, próximo ao antigo Passo de N. As. da Conceição do Jaguarão, ao comando de Lecor.

Nesta ocasião partidas inimigas incursionaram em Piratini e Canguçu até Camaquã como o registra Wiedersphan. (9)

A guerra terminou em 1828 em pleno inverno.

Com a desmobilizaç]ao do Exército do Sul, muitos de seus integrantes se radicam nas freguesias de Piratini, Canguçu e São Francisco de Paula. Os integrantes canguçuenses, entre eles Joaquim Teixeira Nunes, voltaram às atividades. Uma idéia de seu término e desmobilização do Exército em Piratini foi dada por Bernardo Pires, bisavô do major Ângelo Pires Moreira e que abordei em meu trabalho – Autoria dos Símbolos do Rio Grande do Sul (10).

Neste ano foram eleitos juízes de paz da Freguesia de Canguçu, João Pereira de Medeiros e Joaquim Antônio de Medeiros (11) respectivamente do 3º distrito, com sede em Vila Freire, e o do 1º, com sede em Canguçu, que teve como substituto eventual Joaquim Moura (ou Moreira?).

Nota: Publicamos sobre a Guerra Cisplatina 1825/28 a obra Os 170 anos da Batalha do Passo do Rosário. Porto Alegre: Metrópole,2003

INCORPORAÇÃO DE CANGUÇU À VILA DE PIRATINI

 

Por decreto de D. Pedro l, de 15 de dezembro de 1830. Piratini foi elevada à condição de Vila. Seu território passou a compreender os seus limites como freguesia, os da freguesia de Canguçu, os da capela de Vila Freire (Cerrito) e o distrituto de Bagé até o Piraí. (12)

Nesta época, a projeção da abdicação de D. Pedro l em 1831, combinada com o desfecho da guerra Cisplatina que fechou a fronteira do Uruguai aos brasileiros, mais os pesados impostos sobre o charque pelotense e a légua de campo acumularam desgostos que criaram o clima favorável para a Revolução Farroupilha, 1835-45, que teve em Piratini e em seus distritos de Canguçu fortes redutos, ao ponto de Piratini ser escolhida para ser a primeira capital da República Rio-Grandense 1836-45.

Uma visão do Rio Grande do Sul durante a guerra Cisplatina 1825-28, em 1834 e 1839 é fornecida através das obras produzidas pelos seguintes viajantes:

Nota: Piratini ao ser criado município dele faziam parte os atuais municípios de Canguçu, Cerrito, Piratini, Pedras Altas, Candiota, Hulha Negra e Bagé. E este foi o seu imenso território durante a Revolução Farroupilha, segundo Davi de Almeida em Piratini.Piratini:2003.2ª ed, onde a p.4 reconhece como tendo feito justiça a Piratini Alfredo Varela, Walter Spalding e Cláudio Moreira Bento.

CANGUÇU NA REVOLUÇÃO FARROUPILHA (13)

 

Os historiadores, até o presente, poucas referências têm feito ao município de Canguçu na Revolução Farroupilha.

Rebuscando, porém, as Ordens do Dia e Ofícios do Barão de Caxias (1842-1845), referentes à sua atuação que culminou com a pacificação deste movimento, encontrei muitas referências ao distrito de Canguçu da então Vila de Piratini – a primeira capital da República Rio-Grandense. O Jornal O POVO, órgão oficial daquela República me forneceu muitos subsídios.

A brigada do Gen. Antônio de Souza Neto, que venceu a Batalha do Seival, após a qual foi proclamada a República Rio-Grandense, era constituída de dois esquadrões a duas companhias recrutadas no então distrituto de Bagé.

O outro esquadrão o era por uma companhia recrutada em Canguçu e a outra na região de Vila Freire, hoje município de Cerrito..

Esta é a conclusão a que cheguei com o apoio no interessante trabalho de Davi de Almeida sobre o município de Piratini, em que publicou documentos comprobatórios.

CANGUÇU NA BATALHA DO SEIVAL

 

Dentre os vencedores de Seival que constuíam a célebre Brigada Liberal de Neto e assistiram proclamar-se a República Rio-Grandense, cerca de quarta parte era canguçuense.

Nesta encontrava-se o célebre coronel Joaquim Teixeira Nunes, também conhecido pela alcunha de "coronel Gavião, o Bravo dos Bravos Farroupilhas" segundo o gen. Tasso Fragoso, além de ser considerado a "maior lança farrapa". (14)

Este herói foi objetivo de artigos meus publicados no Recife (15), Pelotas e consta de meu livro, A Grande Festa dos Lanceiroa. (16) e ao final deste livro em Canguçuenses ilustres .

SERRA DOS TAPES REDUTO FARRAPO

 

Piratini e Canguçu constituíram-se, em toda a revolução, fortes redutos farroupilhas, locais de proteção para Neto e Bento Gonsalves, nos intervalos das escaramuças.Ali mantinham invernadas de suas cavalhadas, bem como eram locais de recompletamentos a base de escravos, de sua Infantaria e corpos de Lanceiros negros. Foram os últimos redutos a caírem e já ao final da revolução, graças à ação pacificadora de Caxias.

Pouco tempo decorrido do início da ação do Barão de Caxias, foi para Canguçu que se dirigiu Bento Gonsalves, segundo expressão do próprio Barão de Caxias , "para buscar proteção nos terrenos montanhosos e pedregosos dos distritos de Canguçu". (16)

IMPORTÂNCIA MILITAR DE CANGUÇU – PIRATINI

 

A importância militar Canguçu – Piratini foi tamanha que Caxias destinou para basear-se em Canguçu, a Esquerda do Exército, ao comando do célebre e competente tenente-coronel da Guarda Nacional Francisco Pedro de Abreu (Chico Pedro ou Moringue), mais tarde Barão de Jacuí, o mais destacado soldado legalista e mestre de guerrilhas nas coxilhas e serras rio-grandenses.

Chico Pedro estabeleceu em Canguçu a base de combate da Esquerda do Exército, composta do 5º Corpo de Cavalaria da Guarda Nacional e 11º Batalhão de Caçadores.

Instalou seu posto de comando na antiga cadeia pública de Canguçu, por ele mandada construir e fazendo chegar aos republicanos que para eles havia mandado construir "aquele quarto de hóspedes", segundo J. Simões Lopes Neto. (17)

CANGUÇU ACAMPAMENTO DA ALA ESQUERDA DO EXÉRCITO DE CAXIAS

 

As tropas de Cavalaria de Chico Pedro acamparam no terreno atualmente pertencente à Escola Normal N. S. Aparecida, e a Infantaria nos terrenos abrangidos pela praça Marechal Floriano e Prefeitura Municipal.

O Barão de Caxias em ofício de 11/ Ago/ 1843, (de seu Quartel em Caçapava) dirigido ao Ministro da Guerra, escreveu em certa altura: (18)

"e o resto da tropa com o Tenente Coronel Francisco Pedro de Abreu percorrendo os distritos de Canguçu (Canguçu e Vila Freire) e imediatos, pôs em debandada algumas partidas de rebeldes: uma delas, a mais numerosa, composta de um capitão de nome Felíssimo Félix Feijó, um tenente e cinqüenta e quatro soldados se me apresentou. Cinqüenta tomaram o nosso serviço e quatro pediram anistia". Nesta ocasião aderiu aos imperiais o jovem canguçuense Hipólito Pinto Reibeiro (19) mais tarde destacado combatente do Regimento de Osório em Monte Caseros 1852, comandante de cavalaria no Paraguai e vencedor do Combate de Inhadui na Revolução de 93 e que apresentaremos em local próprio.

Chico Pedro a partir de agosto de 1843 penetrou em Canguçu e aí manteve sua base de operações até a Paz em Ponche Verde, quando foi substituído pela 8ª Cia. do 4º Batalhão de Fuzileiros ao comando do capitão Antônio de Sampaio, atualmente patrono da Arma de lnfantaria do Exército. (20)

Com a entrada das tropas legalistas em Canguçu, após 8 anos de revolução, a Serra dos Tapes passou a ser controlada e Piratini perdeu a segurança e tornou-se extremamente vulnerável por Leste.

EM CANGUÇU UM MALHETE MAÇONICO DE BENTO GONÇALVES

 

Bento Gonsalves, segundo o próprio Barão de Caxias, buscou a proteção em Canguçu até agosto de 1843.

Como lembrança de suas longas permanências em Canguçu, que a partir de certo momento passou a oferecer-lhe mais segurança e proteção, em razão do terreno dobrado e coberto de vegetação, deixou seu malhete com o qual presidia a Loja Maçonica de Canguçu – Fidelidade e Esperança, (21) segundo Simões Lopes Neto colheu em 1912.

Dito malhete, segundo tradição, fora trazido da Bahia, de onde fugiu espetacurlamente do Forte do Mar.

Da participação de Canguçu na Revolução Farroupilha constava somente um breve relato dos combates de Canguçu publicados no "Relatório de 1933", da administração do Prefeito de Canguçu, Conrado Ernani Bento, e outros documentos administrativos publicados por Dante de Laytano em sua História da Revolução Farroupilha.

Das edições de O Povo, jornal farroupilha, conclui que o primeiro funcionário público de Canguçu, Vicente Ferrer de Almeida, havia servido à revolução como destacado oficial do Quartel do Exército Farroupilha, em Piratini.

O 1º COMBATE DE CANGUÇU 25/26 OUT 1843

 

Na noite de 25 para 26 de outubro de 1843, travou-se em Canguçu um combate, entre imperiais e farroupilhas (Ordem do Dia nº 90 de Barão de Caxias – São Gabriel 2/Nov/1843).

Já encontrava-se por ordem do Barão de Caxias estacionado em Canguçu, fazia dois meses, a coluna da Esquerda do Exército, ao comando do tenente-coronel Francisco Pedro de Abreu (Chico Pedro).

Dita coluna era composta de 60 cavaleiros do 5º Corpo de Cavalaria da Guarda Nacional de Chico Pedro e de 250 infantes do 11º Batalhão de Caçadores, ao comando do tenente-coronel Francisco Félix da Fonseca Pereira Pinto.

Ela colocava sob séria ameaçava Piratini e adjacências e controlava os passos de Camaquã.

Por esta razão, Bento Gonsalves, Antônio Neto e Camilo dos Santos decidiram surpreendê-la e batê-la em seu acampamento em Canguçu e, por fim, restabeleceram o domínio farrapo na Serra dos Tapes, ou "departamento mais perigoso e mais farrapo".

Os farroupilhas marcharam de Piratini, acamparam a tardinha na região denominada Pedra das Mentiras (22) para, na madrugada seguinte, atacarem de surpresa o acampamento de Chico Pedro em Canguçu.

Segundo Caxias, os farroupilhas possuíam para este ataque mais de 300 homens.

Chico Pedro através de eficiente rede de informações foi alertado do plano farroupilha e tratou, não somente de anular a surpresa dos farroupilhas, como surpreendê-los.

Neste sentido reuniu em Canguçu todo o seu efetivo na noite de 25 e, após "preparar comida para dois dias", colocou-se em marcha, noite escura, na direção Lacerda.

Após marchar "duas léguas" (12 Km) encontrou o acampamento farroupilha "nos pedregosos e dobrados campos em direção ao mesmo Canguçu", entre os altos da Lacerda e Pedra das Mentiras. (23)

Chico Pedro carregou sobre o acampamento farroupilha secundado por "duas descargas de lnfantaria", obtendo surpresa total.

Surpresos com o inesperado ataque noturno, os farroupilhas dispersaram-se em todas as difereções, abandonando bagagens e cavalos ensilhados.

Segundo Chico Pedro, foram mortos 10 farroupilhas e aprisionados 5, "não fora as trevas da noite e desigualdade do terreno", a vitória seria mais perfeita e completa.

Caxias ao finalizar a Ordem do Dia nº 90 referente ao 1º Combate de Canguçu assim se expressou: (24)

Que aquele "encontro contribuiu para o término dos males de que sofre esta importante parte do Império, os quais em breve, serão trocados pela paz duradoura com a qual aspiram todos aqueles que amam a prosperidade e união do Brasil. Satisfeito com a perícia e valor da coluna Esquerda do Exército, revelada em Canguçu, louvo todas as praças que compõem, e, particularmente, os tenentes coronéis Francisco Pedro e Pereira Pinto". Na Ordem do Dia citada, Miguel Frias Vasconcellos, líder da abrilada em 1832 no Rio de Janeiro e que agora servia Caxias como Quartel Mestre General, era promovido a tenente coronel. A este personagem D. Pedro l entregara em 7 de abril de 1831, a sua renúncia ao trono do Brasil.

Caxias relatou este combate ao Ministro da Guerra em ofício datado de 12 Nov 1843, o qual, lamentavelmente, não consta de seus ofícios publicados.

O 2º COMBATE DE CANGUÇU – 6 NOV 1843

 

Em 6 de novembro de 1843, decorridos 11 dias do 1º combate, os farroupilhas trataram um segundo combate com os imperiais, surpreendendo estes, com sua base de operações em Canguçu e na ocasião do almoço.

Dito combate é mencionado por Caxias em sua Ordem do Dia n.º 94 de 18/Nov/1843, emitida no seu QG nas pontas do Jaguari (25).Ela é a base da presente constituição:

Segundo Caxias na ordem citada, "os generais Bento Gonsalves e Antônio Neto, profundamente chocados com a surpresa conseguida por Chico Pedro no 1º combate de Canguçu, de 26 de outubro, decidiram procurar uma desforra".

Num grande esforço conseguiram reunir 600 homens, dos quais, 300 infantes enviados por Canabarro que então dirigia a República e alguns cavalos e homens de Mariano Glória e o coronel Teixeira Nunes – "O coronel Gavião", filho ilustre de Canguçu .

No dia 6 de novembro, "aniversário em que se declararam republicanos" aquela coluna se dirigiu a Canguçu, fazendo-se acompanhar de uma peça de artilharia calubre 3".

Os imperiais integrantes da Coluna Esquerda do Exército encontravam-se acampados nos terrenos do atual Ginásio N. Sª Aparecida e possuíam fortificações (trincheiras) no Serro do Ataque (contíguo ao Cerro da Liberdade).

Estavam-se reunindo para o almoço.

A Coluna Esquerda ao Comando de Francisco Pedro Abreu era constituída de "uma guerrilha" do 5º Corpo de Cavalaria da Guarda Nacional e do 11º Batalhão de Caçadores (logo após mudado para 8º Batalhão de Fuzileiros).

O 11.º de Caçadores, sob o comando do Ten Cel Francisco Félix da Fonseca Pinto, era constituído de 3 companhias comandadas respectivamente pelos majores graduados Carlos Resin (2.º Cia) e Fernando Antônio Muniz (3º Cia) e tenente Venceslau Oliveira Bello (6º Cia).

Subcomandava o 11º Batalhão o major Antônio Joaquim Bacellar.

Às 11 horas da manhã, os farroupilhas desdobraram o seu dispositivo ao longo do Cerro do Ataque e atacaram com todo o ímpeto o dispositivo imperial aos gritos de : "Às bagagens! Viva Rio Pardo!".

Os farroupilhas ao atacarem partindo de NO, desbordavam a posição imperial fortificada na direção W, a de Piratini, por onde eram normalmente esperados.

Com este movimento procuravam atingir o dispositivo imperial pelo flanco direito, após o que iriam direto as bagagens, além de envolver as posições avançadas no alto da vila Triângulo, atual.

O ataque farroupilha foi precedido da lnfantaria protegida pela Cavalaria farrapa. Foi aparado pelo 11º Batalhão de Caçadores.

A peça de artilharia farrapa de 3 polegadas entrou em funcionamento, não causando mais estragos por terem os imperiais buscado proteção nas trincheiras.

" COMBATE RENHIDO E SOB VIVÍSSIMO FOGO "

 

Segundo o Barão de Caxias: " A tropa imperial os recebeu a sangue frio e um renhido combate se travou sustentado pelas 3 companhias do 11º de Caçadores e uma pequena guerrilha do 5º Corpo de Cavalaria da GN. Porém foi tal a bravura das mesmas que o adversário depois de uma hora de vivíssimo fogo, retirou-se do campo de batalha".

Baixas de combate: Os farroupilhas deixaram no campo de batalha do Cerro do Ataque e terreno da atual Escola Normal N. S. Aparecida "30 mortos, sendo 3 oficiais e 27 soldados, 2 prisioneiros e dois desertores" e um número de feridos "estimado em 60, muitos dos quais gravemente", num total de 94 baixas, ou cerca de 16% do efetivo presente na batalha.

Este elevado número de baixas é um atestado eloqüente da violência deste curto ataque que durou uma hora e da grande disposição farrapa de cobrar caro a surpresa de Canguçu de 11 dias atrás.

Os imperiais juncaram o campo de batalha com 5 mortos (1 cadete, 1 anspeçada, 1 sargento do 5º Corpo e dois soldados) e 14 feridos, "alguns gravemente", num total de 19 baixas.

As baixas imperiais foram em menor número por combaterem em trincheiras que cavaram em torno do acampamento e no Cerro do Ataque.

Segundo J. Simões Lopes Neto, no ano de 1912, ainda existiam vestígios destas trincheiras no Cerro do Ataque (26) contíguo ao Cerro da Liberdade.

Pesquisa arqueólogica poderá assinalar vestígios deste combate que envolveu cerca de 1.000 homens, do qual resultaram 35 mortos e cerca de 80 feridos e, ao meu ver, o mais violento de toda a revolução, proporcionalmente aos efetivos presentes. Foi para valer, não foi escaramuça ou entrevero.

Os corpos dos 35 bravos que tombaram neste combate em defesa de seus ideais foram sepultados no cemitério de Canguçu que existiu no local onde atualmente ergue-se o Grupo Escolar ao lado da Casa da Cultura e antiga Prefeitura.

Deus sabe o nome destes bravos que lutaram para a construção deste Brasil, uns pela sua integridade e unidade e outros pela República centenária em que hoje vivemos.

Citações de combate: Do Barão de Caxias, "por tão plausível motivo" (o combate) se tornaram credores de louvor por suas bravuras , os tenentes-coronéis Pereira Pinto, Francisco Pedro de Abreu, major Antônio Joaquim Bacellar, majores graduados Carlos Resin (27), Fernando AntÔnio Muniz, tenentes Venceslao de Oliveira Bello, Prudêncio Máximo dos Reis Carneiro, alferes Antônio José da Silva, Custódioi Coelho dos Santos e Sabino Justiniano da Rocha.

Foram elogiados o capitão Antônio José de Carvalho e alferes Francisco Pires de Salles do 5º Corpo que dirigiram os atiradores de Cavalaria.

ATOS DE BRAVURA EM COMBATE

 

Foi citado com relevo o alferes Fidelix Pais da Silva do 5º Corpo de Cavalaria da Guarda Nacional "que praticou atos de valor, entreverando-se na Infantaria adversária, resultando disto receber duas contusões, uma de bala e outra de uma coronhada".

Em ofícios ao Ministro da Guerra, Caxias escreveu que os tenentes-coronéis Francisco Pedro e Francisco Felix Pereira Pinto, eram credores das boas graças do Imperador e recomendou fosse despachado favorável, o requerimento do segundo, no sentido de ser armado oficial da Imperial Ordem do Cruzeiro.

Nota: Depois da Paz de Ponche Verde o 8º Batalhão de Fuzileiros foi retirado de Canguçu e enviado para Bagé então distritos de Piratini .Coube a seu comandante o Ten Cel Francisco Felix da Fonseca Pereira Pinto distribuir os primeiros terrenos em Bagé antes que esta até então abandonada durante a Revolução fosse elevada em 5 de junho de 1846 a município, sendo seu 1º presidente da Câmara de Vereadores Pedro Rodrigues de Borba vindo de Canguçu e irmão de Malaquias Borba, nosso trisavô e estancieiro na Armada, conforme abordo na História da 3ª Brigada de cavalaria Mecanizada de Bagé e já citada e que possui muitas referências a Canguçu;.

CHICO PEDRO RETORNOU A CANGUÇU APÓS PORONGOS

 

Após a surpresa de Porongos, imposta por Chico Pedro a Canabarro, encontro no qual se destacou sobremodo o canguçuense coronel Teixeira Nunes, salvando os farroupilhas do desastre total, o vencedor foi mandado retornar a seu acampamento.

Caxias, em ofício de 16/Nov/1844, ordenou a Chico Pedro que após entregar os prisioneiros de Porongos em Rio Grande, "com mais forças se concentrará V.S. para o lado de Canguçu", devendo aí se fortificar imediatamente, providenciar gado para a tropa para que esta não sinta falta de seu fornecimento e procurará saber notícias de Bento Gonsalves e persegui-lo, em combinação com o major Israel e o tenente-coronel Andrade Neves que mandei marchar sobre Encruzilhada". O último mais tarde seria o Barão do Triunfo na guerra do Paraguai e teria como seu vanguardeiro o canguçuense coronel coronel Hypólito Pinto Ribeiro (28).

Em 27 de junho de 1844, Chico Pedro, partindo numa incursão a Piratini, conseguiu aprisionar por mais de dois meses em Canguçu, na cadeia que mandara construir". Mariano de Mattos após foi chefe de Estado-Maior de Duque de Caxias na guerra contra Rosas, 1852 e Ministro da Guerra em 1866.

Nota: Biografamos a Cel José Mariano de Matos, carioca em O Exército Farrapo e os seus chefes. Rio de Janeiro: BIBLIEx,1991.2v bem como os demais chefes militares farrapos.

CHICO PEDRO BATIDO EM CANDIOTA

 

Chico Pedro estava em Canguçu e Piratini com uma coluna de 1.000 homens. Sabedor que em Bagé se encontrava Antônio Amaral com 100 homens de Cavalaria, decidiu atacá-lo sem nada comunicar ao Barão de Caxias.

Deixou 780 homens de sua coluna em Canguçu e Piratini e com 200 cavalarianos e 20 infantes marchou a toda velocidade e em segredo para o distrito Bagé de Piratini, com comida pronta, como era seu procedimento em tais casos.

No distrito de Bagé não encontrou o coronel Amaral que havia mudado em busca de melhores pastos. Conseguiu prender Domingos de Almeida, ex-ministro das Finanças e destacado charqueador em Pelotas, natural de Diamantina Minas Gerais e "cérebro da Revolução".

Ao retirar-se para sua base de combate em Canguçu, em pequenas e lentas marchas, em razão do mau estado dos cavalos exauridos na marcha forçada Canguçu-Bagé, foi surpreendido por tropas farroupilhas e orientais junto do arroio Candiota, sendo completamente batido.

Este foi o major e mais humilhante revés sofrido pelo famoso guerrilheiro legalista, que jé havia imposto tantas derrotas aos farroupilhas, obtidas pela surpresa.

Era um especialista em deslocar-se rapidamente, a longas distâncias em segredo, em marchas forçadas de dia e de noite, levando alimentação pronta.

Quanto menos se esperava irrompia num ponto determinado sem que ninguém o pressentisse. Foi o mais destacado, competente e constante guerrilheiro legalista.

A palavra Chico Pedro ou "Moringue" tornou-se uma legenda entre os imperiais e o terror entre os farroupilhas.

Nota: Creio havermos sido pioneiros em biografar Chico Pedro e o fizemos no livro Porto Alegre –memória dos sítios farrapos e da administração de Caxias. Brasilia:EGGCF,1989.Foi seu sargento em Canguçu Jacob Fetter, tronco dos Fetter de Pelotas cuja participação na Revolução Farroupilha esclarecemos o suficiente como apoio em entrevista que prestou em 1892 ao Almanaque Rotermund, conforme consta da obra de Adolfo Antônio Adolfo Fetter Junior Os Vetter/Fetter 170 anos no Rio Grande do Sul .Pelotas: Ed do autor,1997.p.6,485,486 notas e bibliografia p.517.

CAXIAS ADVERTIU CHICO PEDRO

 

Caxias em ofício de 11 de agosto de 1844, quase dois meses após Chico Pedro haver aprisionado José Mariano de Mattos e retê-lo em Canguçu, reclama (29): "Desde que recebi sua carta de que foi portadora a esposa do major José Mariano de Mattos, que não tenho recebido nenhuma participação sua, e nem mesmo a parte oficial sobre a prisão do mesmo Mattos, o que me tem posto em embaraços, por não poder enviar ao Governo lmperial a parte oficial de um acontecimento que já há muito lá deve ter soado por vias particulares.... e por isso novamente lhe ordeno que tenha o maior cuidado de me participar qualquer acontecimento que ocorrer por este lado" (em Canguçu).

Chico Pedro, ao que parece, andava amuado com o Barão de Caxias ou com o Ministro da Guerra, pela censura que sofrera em conseqüência de sua fragorosa derrota em Candiota, em 16 de maio de 1844, batido que foi por Antônio Manuel do Amaral que segundo o canguçuense Caldeira, "quando atacava o inimigo em campo raso era de espada em punho e que não conhecia outra arma na ocasião do combate senão a arma branca" (30)

O PATRONO DO EXÉRCITO EM CANGUÇU

 

Entre 19 e 29 de dezembro de 1844, Caxias andou pelas terras do município de Canguçu, após sair de Piratini e ter seguido até a Coxilha do Fogo, conforme anunciou ao comandante da fronteira de Bagé, em 19 de Dez de 1844 (31).

Bento Gonsalves havia buscado proteção nas margens do Camaquã e Caxias avançou até a Coxilha do Fogo "fazendo vigiar os passos ao Camaquã por onde parecia mais provável que Bento Gonçalves irrompesse, para ficar em condições de caso este cruzasse o rio "sair-lhe a frente, impedindo que atingisse Triunfo onde já ia recrutar escravos das charqueadas".

Nota: Caxias segundo suas Ordens do Dia e Ofícios esteve em Piratini de 30 de dezembro de 1843 a 10 de janeiro de 1844, o que motivou carta que enviamos em 6 de janeiro de 2004 ao historiador de Piratini Davi de Almeida que negava até então esta circunstância ao referir-se a trabalho em que mencionávamos que ele lá havia estado,Carta publicada no site da ARDHIS. Carta que lhe enviamos depois de havermos tomado posse na cadeira General Bento Gonçalves da Silva na Academia Piratiniense de História a o tomarmos conhecimento da 2a edição de sua obra. Conclusão que chegamos depois de revermos os citados documentos.

O PATRONO DA INFANTARIA EM CANGUÇU

 

Sobrevinda a pacificação, com a Paz de Ponche Verde, foram destacados para Canguçu, com a finalidade de garantir os termos da paz, 150 homens integrantes da 8ª Companhia do 4º Batalhão de Fuzileiros da 2ª Divisão, sediada em Jaguarão, ao comando do Coronel Manoel Marques de Souza, mais tarde Conde de Porto Alegre, neto de um dos primeiros sesmeiros em Canguçu e herói guerreiro que temos citado com freqüência .

Comandava esta fração o capitão Antônio de Sampaio.

Sampaio aí estacionou até o ano de 1850, por um espaço de cerca de 5 anos, segundo P. Mallet Jobim, em afirmação ao autor.

Nota: Conde de Porto Alegre bicentenário em 2004 que comandaria o 2 º Corpo de Exército que enquadrou o 30 º Corpo de Cavalaria da Guarda Nacional de Canguçu que combateu |Guerra do Paraguai como veremos adiante.

Nota: Sobre Antônio Sampaio publicamos vários trabalhos onde se destaca Tradição e Disciplina. Fortaleza: Universidade Federal do Ceará, 1971 e distribuído a Policia Militar do Ceará

CANGUÇU NAS MEMÓRIAS DO BARÃO DO JACUÍ

 

O tenente-coronel Francisco Pedro de Abreu e mais tarde Barão de Jacuí, chefe legalista que ocupou Canguçu na fase final da Revolução após o então Barão de Caxias assumir o Comando das Armas e a Presidência do Rio Grande, deixou suas Memórias que foram publicadas pelo lnstituto Histórico e Geográfico do RGS em 1921. Sobre sua primeira estada em Canguçu quando teve lugar o combate da Piscada do Iguatemi, em 24 Jan de 1843, com Bento Gonçalves, conclui das memórias citadas (32).

Em 14 de janeiro embarcou em Porto Alegre e desembarcou no Passo do Liscano no São Gonçalo, com cerca de 460 homens sendo: 300 do seu 5º Corpo de Cavalaria GN, 100 cavalarianos do Corpo de Manoel Ourives e 60 infantes alemães recrutados em São Leopoldo. Sua missão era levar para Porto Alegre cavalhada la existente "e bater uma partida que diziam estar pelo Pantanoso" em Canguçu.... Cruzou o São Gonsalo, em 20 de janeiro, recebendo a cavalhada em mau estado. A seguir por falta de bombeiros (agentes de reconhecimento) "marchou direto à Capela de Canguçu, a reconhecer a força inimiga de mais de 200 homens ao mando do

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Figura acima: Canguçu por ocasião da Revolução Farroupilha. Ao fundo entre as pedras a cadeia mandada construir por Francisco Pedro para os farrapos. Ela srviu de Posto de Comando, de 1845-50, ao capitão Antônio de Sampaio, atual patrono da Armada lnfantaria. Aspecto da igreja por ele restaurada e do cemitério onde foram enterrados os mortos do 2º combate de Canguçu. Entre as duas casas a direita foi a primitiva entrada da vila por ocasião da fundação.

Figura: Canguçu 1835-57. Da esquerda para a direita: quarto prédio local da instalação de Canguçu e de sua Câmara Municipal: sexto prédio, ao fundo, residência e primeira escola régia para meninos do prof. Antônio Joaquim Bento e local nascimento do Cel. Genes Gentil Bento; sétimo sobrado primitivo que cedeu lugar ao atual construído em 1861. A igreja aparece com uma só torre. (Fonte: do autor, Estrangeiros e descendentes...p.114)

 

chefe rebelde Bento Gonçalves que não atacou por falta de bombeiro, mau estado do terreno e serem ali os moradores todos farrapos". Abreu atravessou Canguçu. Após descansar e alimentar seus cavalos marchou toda a tarde de 23 e noite de 23/24. Na madrugada de 24 teve um encontro com Bento Gonsalves na Picada do Iguatemi. Aí Chico Pedro emboscou Bento e perdeu um homem e outro foi ferido. Constatando ser a força de Bento Gonçalves muito forte "pôs-se em retirada, fingindo aos moradores de Canguçu estar com muito medo de ser atacado por Bento Gonçalves que trazia a retaguarda Antônio Neto". Às quatro horas Abreu acampou e foi acometido por Bento Gonçalves e "não se abalou e quando lhe pareceu se pôs em retirada fingindo o mesmo medo". Marchando toda a noite foi amanhecer no Passo do Mendonça, do Rio Camaquã.

Antônio Neto era tio do General Zeca Neto, que em 1923 iria percorrer e combater neste mesmo cenário como se verá. Zeca Neto possuía cerca de 15 anos quando seu tio citado faleceu.

A tradição local registrada por Simões Lopes Neto, assim se refere a este combate com algumas alterações naturais: "Que Chico Pedro ao tentar surpreender os farroupilhas foi cercado durante um dia no interior de um mangueirão. Que o referido mangueirão ficava além da picada, por sua vez cercada de pinheiros, fato raro naquela latitude".

Simões Lopes Neto registrou em 1912 que entre Canguçu, "Iguatemi e além existiam sepulturas e vestígios de outras de caramurus (imperiais) mortos das tropas de Chico Pedro" quando perseguidos na ocasião por Antônio Neto (33). Ao longo da História tem havido muitos crimes nessa picada, constando na memória do local ser a mesma mal assombrada (34).

CALDWELL, ANDRADE NEVES E CHICO PEDRO EM CANGUÇU

 

Em julho Chico Pedro saiu de Porto Alegre. Prendeu em Camaquã um irmão de Bento Gonçalves, José, juiz de paz local. Com isto os farrapos vieram abrigar-se em Canguçu. Chico Pedro antes de passar o Camaquã pediu que o Tenente-Coronel João Frederico Caldwelll (35). ( que estudei em Estrangeiros e descendentes... ) e o Tenente-Coronel Joaquim Andrade Neves, se deslocassem para a estância de Malaquias Borba em Canguçu junto ao passo da Armada, a fim de cobrirem sua travessia no passo Mendonça. No dia 12 de junho, escreveu Chico Pedro, "vendo já ter feito 40 léguas e tendo os cavalos bastante abombados resolvi marchar e fazer junção com as forças de Caldwell, na estância do Malaquias Borba" (36). No dia 13, principíamos nossa retirada ao repassar o Camaquã no passo da Armada."

Andrade Neves, mais tarde Barão do Triunfo, na Guerra do Paraguai, foi comandante do canguçuense Hipólito Ribeiro (37), conforme referi anteriormente.

PIRATINI E CANGUÇU "DEPARTAMENTO DE MAIS PERIGO E MAIS FARRAPO"

 

Em 7 de setembro Caxias nomeou Chico Pedro para comandante do "departamento de mais perigo e mais farrapo entre os rios Piratini e Camaquã". Este departamento hoje abriga os municípios de Canguçu, Piratini e grande parte de São Lourenço (então Boqueirão). A razão foram as constantes ameaças a Pelotas de parte de Bento Gonçalves e Antônio Neto.

Zeca Neto, sobrinho do último, irá tomar Pelotas de surpresa e, 1923, oitenta anos após, partindo de Canguçu como se verá.

Em setembro de 1843, Chico Pedro fez a sua segunda incursão a Canguçu, sede de seu comando, para lá estabelecer seu Quartel General. Neto e Bento Gonçalves estavam acampados no Cerro Partido, junto às nascentes do Pantanoso, atual Associação Rural. Ele rumou para este local "secretamente, numa marcha noturna de 7 léguas, não conseguindo surpreendê-los por falta de mais uma hora de noite, mas fez alguns prisioneiros e ficou senhor de alguns cavalos" (38).

No final de janeiro de 1844, após os dois combates de Canguçu, Chico Pedro "seguiu no encalço de Neto que estava na sua frente na coxilha do Fogo", tendo escaramuçado com algumas partidas farroupilhas. Nas folgas para repouso de seus cavalos e gente, ocupava-se com a construção de boas trincheiras no seu acampamento de Canguçu e em recompor a Igreja (N. Sª da Conceição) que estava a cair" (39)

Francisco Pedro no início da Revolução era um civil. Foi um dos chefes mais destacados e hábeis. Em 1850 vai liderar incursões contra uruguaios hostis aos brasileiros, em operações que passaram à história como "Califórnias do Chico Pedro". Na guerra do Paraguai estará em seu início comandado a fronteira com o Uruguai.

Em 1860, Domingos de Almeida, ex-ministro da Fazenda e cérebro da Revolução Farroupilha escreveu-lhe. Depois de referir ter estado prisioneiro em Canguçu aguardando solução de Caxias, agradeceu-lhe a atenção com que foi tratado e pediu que elogiasse, após 20 anos, um sargento negro que recusou a todas as propostas possíveis de suborno que lhe fez, para colocá-lo em liberdade ao ser transportado. E cita as tentadoras propostas de ouro, promoção ao oficialato. Pena não se conhecer o nome desse honesto e autêntico militar.

Nesta ocasião Domingos de Almeida era vereador em Pelotas e empenhava-se na abertura da rodovia Pelotas-Canguçu pela Serra dos Tapes, e a promover a colonização de terras devolutas de Canguçu e a lutar pela construção da ponte no passo do Acampamento no Piratini.

ASPECTOS VÁRIOS DE CANGUÇU DURANTE A REVOLUÇÃO

 

No final de setembro e início de outubro de 1836, os distritos de Canguçu forneceram à 1ª Brigada do Exército Farroupilha, estacionada em Pelotas, 403, 5 alqueires de trigo e 59 de milho. Os 369, 5 alqueires foram vendidos e 38 doados. Os fornecimentos foram entregues ao moinho do italiano Pedro Brizolara. Foeneceram e fizeram a entrega do trigo e milho transportado de carretas, os seguintes canguçuenses: Jacinto Nunes Garcia, João Teixeira de Araújo, João Pedro Tourem (preto liberto), Antônio de Souza Oliveira, Alexandre José Prestes, Manuel Pereira, José Vicente Borges e Antônio Fernandes Lessa (41). As remessas eram feitas através de guias assinadas pelos juízes de paz dos 1º e 3º distritos de Canguçu. Estas remessas revelam a antigüidade das famílias Lessa, Nunes Garcia, Prestes, Borges e Araújo em Canguçu, além das outras já conhecidas desde 1800. O liberto Pedro Tourem levou o nome do padre Pedro Tourem, o primeiro vigário de Canguçu e que nesta época estava rico e estabelecido em Alegrete (42).

Ao sul do povoado existia um curtume dirigido por um alemão Henrique de tal, que durante a Revolução de 1843 funcionou como Fábrica Nacional de Curtumes e Lombilhos. Canguçu forneceu madeiras de lei para o Arsenal em Piratini (43). Conheci vestígios do curtume mencionado e suas valas de curtição situadas na rua Júlio de Castilhos, na íltima quadra antes do cemitério.

Em Canguçu, durante a Revolução Farroupilha, funcionou a Loja Maçonica – Fidelidade e Esperança que foi freqüentada por Bento Gonçalves da Silva.

Ela foi fundada pelo fluminense Francisco Ferreira de freitas que foi o seu venerável. Foram luzes da loja Joaquim Maximiano Lobato, F. Palomeque, padre Hypólito Ribeiro e João Batista Pereira Galvão, historiador da comunidade, que registrava tudo o que ocorria, "cujo precioso arquivo inconsideradamente foi dispersado por um filho", compromentendo assim seriamente a Memória de Canguçu que com tanto esforço e tempo temos procurado refazer desde 1957 (44). O Padre Hypólito Ribeiro viveu 35 anos em Canguçu.

Canguçu produziu expressivamente a erva-mate que aqueceu as conversas nos acampamentos Farroupilhas.

Dentre a documentação fiscal, aparece uma Tereza Maria, moradora de Canguçu, liberta e relativamente próspera, enviando 4960 réis para o esforço de guerra e um tenente Clarimundo das Chagas, em Vila Freire, apreendendo evidentemente para si, couros e éguas. (45)

Dentre as tropas imperiais que atuaram em Canguçu, existia a companhia Alemã recrutada entre os imigrantes alemães de São Leopoldo, após os imperiais aí haverem assumido o controle através do Dr. Hillebrand. (46)

Do lado farrapo muitos canguçuenses negros integraram os corpos de Lanceiros farroupilhas ao comando do canguçuense Coronel Joaquim Teixeira Nunes. (47)

Uma visão romanceada desta revolução nos é fornecida pela obra: COLLOR, Lindolfo. José Garibaldi.Rio. José Olímpio, 1935.

CAXIAS E CANGUÇU

 

Durante sua ação pacificadora da Revolução Farroupilha, Caxias citara Canguçu várias vezes em suas ordens do dia e ofícios, particularmente nos enviados para o Ministro da Guerra Jerônimo Coelho, que poucos anos após será o criador do município de canguçu, com Presidente da Província como se verá. Escreveu o Barão de caxias em seus ofícios 1842-45 (48).

O resto da tropá anda como Tenente-Coronel Francisco Pedro de Abreu, percorrendo os distritos de Canguçu e imediatos. Ali colocou em debandad algumas pequenas partidas rebeldes" (Caçapava 17 Ago 1843).

"Neto foi para o arroio Pantanoso logo que Frncisco Pedro o principiou a perseguir. Perdeu toda a cavalhada de reserva que tinha escondida nos matos próximos a Piratini". (Bagé 19 Set 1843).

"Bento Gonçalves e Neto que haviam seguido com cerca de 400 homens em direção a Cerro Largo, no Estado Oriental, tiveram de regressar a toda a pressa para ‘os montonhosos distritos de Canguçu.’ (Passo do Menezes no Rio Jaguarão. 8 Set. 1843)

Era comandado pelo capitão Carlos Resin, que fez brilhante carreira no Exército Imperial e que estudei em Estrangeiros e descendentes na História Militar do Rio Grande do Sul.

"Recebi seu ofício e fico ciente da tomada de 300 cavalos na Serra dos Tapes pelo Tenente Alexandre e da dispersão da partida que os guardava". (São Gabriel, 15 Out 1843).

"De V. S. apresse a vinda do obus e mais praças que em ofício lhe ordenei. Por pessoas vindas de Piratini sei que o (Antônio) Neto e Bento Gonçalves depois de teram marchado sobre Canguçu, contramarcharam". (Pontas do Jaguari, 14 nov 1843).

"O Exército se acha dividido em três colunas. Uma de 3200 manobra sobre a fronteira de Santa Ana. A outra de 2.000 acha-se em São Gabriel e Bagé. A terceira com 500 cavaleiros e 500 infantes pisa o terreno entre Piratini e Canguçu". (Pontas do Camaquã, 15 nov 1843).

"Por um bombeiro chegado de Piratini soube que Bento e Neto tinham contramarchado de Canguçu aonde dizem tiveram outro encontro com nossas forças daquele lado". (Pontas do Jaguari, 17 nov 1843).

"O Coronel Chico Pedro, que eu havia deixado entre Canuçu e Piratini, à testa de uma coluna de 1.600 combatentes, sabendo que em Bagé estava o Coronel Antônio Manuel do Amaral com pouco mais de 100 homens para lá se pôs em marcha".

Após travaram o combate de Candiota.

E prosseguiu caxias:

"OCoronel Chico Pedro se retirou para Canguçu caindo em poder dos rebeldes o Major do 5º Corpo de Cavalaria Ismael Antônio da Silva " (Passo da Rita França, no Piraí, 2 Abr. 1844).

"Se V.M. se encontra em Canguçu ou mesmo por Pelotas deverá a todo o custo marchar sobre o Camaquã a espera de Neto" (São Gabriel, 11 Ago 1844).

Logo que fizer entrega dos prisioneiros em Rio Grande "voltará a ocupar as vilas de Canguçu e Piratini". (Bagé, 16 nov 1844).

"Eu vou marchar para a Coxilha de Fogo (Canguçu) e dali pretendo guarnecer o passo do camaquã e sair na frente de Bento Gonçalves se já tiver cruzado em direção a Triunfo". (Olhos d’água 19 dez 1844).

Estas transcrições provam a longa permanência de Neto e Bento Gonçalves em canguçu.

APONTAMENTOS DA REVOLUÇÃO POR UM CANGUÇUENSE

 

Dentre as fontes produzidas sobre a Revolução Farroupilha destaca-se os Apontamentos para sua História elaborados pelo canguçuense Manoel Alves da Silva Caldeira, que em 1883, será o presidente do Clube Republicano fundado em Canguçu (49). Foram escritos, atendendo a solicitações dos historiadores Alcides Lima, de Bagé (50), Alfredo Ferreira Rodrigues, de Rio Grande (51) e depois publicados, em 1929, pelo IHGRGS.

Conta sua participação no movimento desde os 18 anos, quando foi preso no assédio a Porto alegre, ocasião em que foi enviado para o Rio de Janeiro e obrigado a sentar praça na Artilharia da Marinha, na Ilha das Cobras (52).

Menciona com detalhes sua participação na fuga de Onofre Pires e Corte Real da Fortaleza de Santa Cruz (53) e viagem marítima até o Sul. Descreve sua participação como porta-bandeira, à frente do Corpo de LÇanceiros Negros ao comando do canguçuense ilustre Joaquim Teixeira Nunes, no combate de Rio Pardo (54).

Sobre a surpresa de Porongos manifesta-se aos dois historiadores citados, como tendo sido uma traição de David Canabarro (55), bem como a de não ter sido dada a liberdade prometida aos lanceiros negros (56).

Ponto alto de seus apontamentos e indiscutivelmente a sua maior contribuição à história da Revolução Farroupilha é o conjunto de perfis militares que traçou de seus principais líderes (57): Bento Gonçalves, Antônio de Souza Neto, David Canabarro, Crescêncio, João Antônio da Silveira, Onofre Pires, Joaquim Teixeira Nunes, José Alves Valença, José Mariano de Mattos, Antônio Manoel do Amaral, Joaquim Pedro Soares, Manoel Lucas de Oliveira, Corte Real, Agostinho, Marcelino, Balthazar de Bem, Belchior de Bem, Manoel Macedo, Coelho, Bento Manoel, João Paula, Carvalinho, Augusto, Brandão e o Capitão Cabo Rocha , natural de Guaíba e morto em ação na ilha do Fanfa (58) e com descendência em Canguçu. Seus últimos apontamentos foram produzidos em Canguçu, em 1898, quando possuía 83 anos. A família Caldeira foi uma das fundadoras da antiga Estação Cerito (59). Suas opiniões são relevantes para o julgamento de Canabarro, em Porongos, e do destino dado aos lanceiros negros farroupilhas que foram postos em liberdade para lutarem pela Revolução Farroupilha.

Nota: Aproveitamos os perfis que traçou dos chefes militares farrapos e os reproduzimos em O Exército Farrapo e os seus chefes, junto com o seu . Ele é patrono de cadeira na ACANDHIS inaugurada por Caio Moreira Pinheiro. Ele representou Canguçu em histórico congresso republicano em Porto Alegre

CANGUÇU NA GUERRA CONTRA ORIBE E ROSAS

 

Em 1851-52, o lmpério do Brasil, em aliança com Urquiza da Província de Entre Rios, moveu guerra contra os ditadores Oribe, do Uruguai e Rosas, da Argentina, em razão da necessidade de defender: seus limites com o Uruguai; as independências do Paraguai e Uruguai; a livre navegação no Rio Prata e proteger a vida e propriedade dos brasileiros na fronteira, atingidas pelas constantes lutas entre blancos e colorados. Enfim, para manter o equilibrio na Bacia do Prata. As agitações fronteiriças obrigaram a que diversas famílias se interiorizassem. Exemplo clássico desse comportamento foi a do mais tarde General Osório que mudou sua família de Bagé para Pelotas.

Para Canguçu migraram muitos brasileiros e inclusive uruguaios, para escaparem aos desastrosos efeitos das lutas entre blancos e colorados no Uruguai. Entre estes registre-se Martiniano Puente, Francisco Lafuente, Francisco Borraz, José Lazanzi e João lzacet (61) que possuíam razoável nível cultural que colocaram a serviço de Canguçu.

Nesta época chegou a Canguçu, proveniente da intranqüila e indefinida fronteira no Chuí, o casal Manoel Joaquim Silveira Terra e D. Maria do Nascimento Vasques, pais de Leão Silveira Terres, tronco da família Terres em Canguçu. Acreditamos também de lá tenha migrado na mesma época seu tio e padrinho, Manoel de Jesus Vasques que terá atuação comunitária destacada em Canguçu (62), onde se fixou com comércio.

Para conduzir a guerra foi escolhido Caxias. Este invadiu o Uruguai, em combinação com o argentino Urquiza, e depuseram Oribe. A seguir concentrou em Colônia do Sacramento de onde passou a operar contra Rosas. Enviou uma divisão Brasileira, ao comando do Coronel Manuel Marques de Souza que atuou ao comando de Urquiza.

Em 2 de fevereiro de 1852, a divisão Brasileira tomou parte da Batalha de Monte Caseros, na qual o ditador Rosas foi derrotado e obrigado a pedir asilo num navio inglês.

Destacou-se neste dia no comando do 2º Regimento de Cavalaria o então Coronel Manoel Osório e o canguçuense Hipólito Pinto Ribeiro. No Regimento de Osório lutaram lanceiros canguçuenses depois de lutarem na Revolução Farroupilha. Após a Paz de Ponche Verde, incorporaram-se àquela tradicional unidade.

Para lutar nesta guerra, o Brasil contratou na Alemanha uma legião Alemã, integrada por um Batalhão de Infantaria, um Regimento de Artilharia, do qual desertou Carlos Von Koseritz e duas companhias de Pontoneiros, assunto que estudei em Estrangeiros e descendentes na História Militar do RGS (63).

Da artilharia desertou na direção de Canguçu um grupo, sendo cinco mortos ao resistirem a prisão. Foram sepultados em Canguçu (64) no primitivo cemitério que existiu sob o Grupo Escolar, ao lado da Casa da Cultura..

Nesta guerra, o então Ministro da Guerra de República Rio-Grandense, José Mariano de Matos, exerceu o cargo de Ajudante-General do Conde de Caxias.

O desenvolvimento da guerra, bem como a participação dos canguçuenses poderão ser deduzidos das fontes primárias sobre a mesma publicada por Genserico Vasconselos (65) que estuda muito bem este conflito.

Possuo ensaio inédito sobre a participação da Legião Alemã os "Brummer" nesta guerra e publiquei síntese do assunto em Estrangeiros e Descendentes... (66).

Doei o original do ensaio ao Museu Visconde de São Leopoldo em São Leopoldo-RS.


 

CAPÍTULO 4 CANGUÇU – DO VILAMENTO À REPUBLICA

 

CANGUÇU MUNICÍPIO GÊMEO DE PASSO FUNDO

 

Lei Provincial nº 340, de 28 de janeiro de 1857, criou os municípios de Canguçu e Passo Fundo. Canguçu foi o 22º município a ser criado no Rio Grande do Sul (1), sendo o 8º, por ato do Presidente da Província (2).

Pelo artigo 3º da referida lei:

"A villa de Cangussú compreenderá em seus limites, além dos distritos da freguesia deste nome, os da freguesia de Cerrito (atual Vila Freire), todos com as divisas que atualmente tem".

Por ocasião da criação do município de Canguçu tinha lugar, na longínqua Índia, a revolta dos Cipaios contra a dominação inglesa, motivada pelo uso pelos dominadores de sebo de vaca, animal sagrado para os hindus, para impermeabilizar os cartuchos das armas de fogo.

No vizinho município de S. Lourenço, teve início a colonização alemã promovida por Jacob Rheingantz e que se irradiaria e ainda se irradia pelo município de Canguçu. Iníciou interessante viagem pelo Rio Grande do Sul, o médico Roberto Avé-Lallemant e a imortalizou em obra publicada na Alemanha em 1859. É leitura indispensável para quem desejar conhecer o Rio Grande do Sul de então (3).

O autor citado refere ao clima de guerra existente no Rio Grande do Sul e que eclodiria 8 anos após.

Marcos dessa época em Canguçu é a pia batismal de granito construída durante a guerra contra Oribe e Rosas 1851-52 pelo imigrante francês Marcelino Tolosam, na qual nos últimos 150 anos têm sido batizados cerca de cinco gerações canguçuenses.

Outro marco é a casa da antiga Estância do Cristal construída na ocasião por seu proprietário e cuja foto publiquei (5)em O negro na sociedade do RGS.e hoje o tempo aa demoliu

Três anos antes da criação do município, em 4 de maio de 1854, assumiu as funções de professor para meninos, aos 22 anos de idade, após nomeado pelo Presidente da Província, Visconde de Sinimbu, Antônio Joaquim Bento, tronco da família Bento em Canguçu (6).

Por esta época o Uruguai estava agitado internamente o que provocou imigrações, inclusive para Canguçu, e o envio pelo Brasil, para aquela nação irmã, por solicitação de seu Presidente Flores, de uma Divisão Brasileira de Observação.

Canguçu havia integrado por 27 anos o município de Piratini sendo que 9 anos durante a Revolução Farroupilha.

INSTALAÇÃO DO MUNICÍPIO DE CANGUÇU

 

A instalação do município teve lugar em 23 de junho, em ato presidido pelo notável historiador – o Comendador Manuel José Gomes de Freitas, filho ilustre de Canguçu, onde nasceu conforme seu assento de batismo, em 1811, e na ocasião Presidente da Câmara de Piratini. Foi auxiliado pelo secretário daquela Câmara – Luiz Joaquim da Luz, tabelião em Piratini. (7)

No ato de instalação foi dada posse a cinco dos sete vereadores eleitos em 3 de maio: José Rodrigues Soares – Presidente, José Antônio Pimenta, Domingos José Borges, Ignácio Francisco Duarte e Manuel Jesus Vasques. Não tomaram posse Manoel Carvalho de Abreu e Antônio Joaquim Caldeira, ambos de Cerrito (Vila Frire).

Serviu de secretário Vicente Ferrer de Almeida, veterano farroupilha, natural de Larvas e que seria o segundo coletor de Canguçu (8).

A Câmara funcionou por longos anos em prédio que na década de 30 serviu como cinema. É o terceiro da esquerda para a direita na quadra da igreja.

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Figura p.82 : Ruínas da sede da Estância do Cristal, em Canguçu. O prédio foi erigido em 1857 com a criação do município e reformado em 1901. O muro de pedra foi-lhe adicionado nos anos 30. A mesa de pedra, ao lado da entrada era para a colocação de arreios. Na foto, da esquerda para a direita o autor, seu irmão Jesus e o caseiro. (Foto: ano 1970 de Jesus Bento Martins).

A vila de Canguçu possuía 458 pessoas e 52 casas térreas e 2 sobrados. Um destes era segundo prédio ligado ao mencionado. O outro era o chamado "sobrado velho" incendiado em 13 de fevereiro de 1952 (9) cuja foto foi publicada por Simões Lopes Neto (10).

Em 26/27 junho de 1977, o Diário Popular publicou ampla reportagem alusiva ao 120º aniversário da criação de Canguçu e hoje documento histórico de grande valor que evoca a criação do município.

A Assembléia Legislativa da Província aprovou o seguinte orçamento para Canguçu no ano financeiro 1/Jul/57 – 30 jun 58 (11):

"A Câmara de Canguçu – Despesas

ordinária) - 360$000

1.430$000

 

- Aluguel de casa para Câmara e cadeia - 360$000

- Mobília para a Câmara e livros - 300$000

- Limpeza da vila de Canguçu - 150$000

- Conserto de ruas e estradas - 300$000

1.110$000

direito, luzes e utensílios para a cadeia - 400$000

- Eventuais - 100$000

500$000

 

Total - 3.040$000

 

Foi a Câmara autorizada a dispender o saldo de suas rendas com os melhoramentos mais urgentes do município.

Nota: Na noite de 4 de maio de 2004, na Cãmara Municipal que é abrigada por edifício que foi construído no local do antigo Sobrado Velho que incendiou, membros da Academia Canguçuense de História leram trabalho por nós elaborado Semana Legislativa de Canguçu 2004 –Considerações históricas .

O CRIADOR DO MUNICÍPIO

 

O Brigadeiro Jerônimo Francisco Coelho foi o criador dos municípios de Canguçu (12) Passo Fundo e Santana do Livramento. Foi uma figura muito proeminente no lmpério. É considerado o fundador da lmprensa de Santa Catarina ao fundar em 1831, o jornal O catarinense.O considero o Pai da Engenharia Civil no Brasil (13) por haver, como Ministro da Guerra em 1875, desdobrado a Escola Militar da Corte em Escola de Aplicação, na Fortaleza São Joõ e Escola Central do Exército no Largo do São Francisco, na qual criou a especialidade engenheiro civil, para o que havia concorrido antes o Duque de Caxias.

São de sua autoria, como Ministro da Guerra, as diretrizes seguidas por Caxias na Pacificação da Revolução Farroupilha.

Nasceu em Laguna – SC, em 30 Set 1806 e faleceu em Friburgo, em 16 Fev 1860.O almirante Boiteux o estuda em Santa Catarina no Exército (14).

Sua gestão na Província do Rio Grande do Sul ligou-se a problemas de Segurança Externa. De 1854-1864, o clima no Rio Grande do Sul era de guerra que finalmente eclodiu. Inicialmente em 1864, contra Atanázio Aguirre, do Uruguai e, em 1865, contra Solano Lopes, do Paraguai.

ADMINISTRAÇÃO DE CANGUÇU – IMPÉRIO CÂMARAS MUNICIPAIS (15)

 

PRIMEIRA – Eleita em 3 Mai 1857:

1 – José Joaquim Rodrigues SOARES – Presidente

2 – Manoel Carvalho de ABREU

3 - José Antônio PIMENTA

4 – Domingos José BORGES

5 – Antônio Joaquim CALDEIRA

6 – Inácio Francisco DUARTE

7 – Manoel Jesus VASQUES (16)

 

SEGUNDA – Eleita em 7 Set 1860:

8 – Antônio Pompeu BURLAMAQUE – Presidente

9 – Manoel Antônio DUARTE (17)

10 – José Joaquim A. BEZERRA

11 – Francisco José dos SANTOS (18)

12 - Maurício Rodrigues da SILVA

13 - Clarimundo Hypólito PEREIRA DA SILVA

14 - José Antônio PIMENTA (2º)

 

TERCEIRA – Eleita em 7 de Set 1864:

15 – Joaquim Antônio LESSA – Presidente (19)

16 – João Batista PEREIRA GALVÃO (20)

17 – Theófilo de SOUZA MATTOS (21)

18 – Antônio Alves Diniz TEIXEIRA

19 – Manoel Izidoro de FREITAS

20 – Manoel da Silva MOTTA

21 – Plácido SARAIVA DO AMARAL (22)

 

Esta administração enfrentou problemas relacionados com a Guerra do Paraguai 1864-1870. Um de seus membros, Theófilo de Souza Mattos, comandou, no Paraguai, unidade integrada por canguçuenses como se verá.

 

QUARTA – Eleição em 7 Set 1868:

Manoel de Jesus VASQUES (2º vez) Presidente

José Joaquium Rodrigues SOARES (2º vez)

22 – Graciano José CARVALHO

23 – Florício Rodrigues BARCELLOS (23)

Augusto Pompeo BURLAMAQUE (2º vez)

24 – Francisco Antônio MEDEIROS

25 – Felissimo José CARDOSO

Esta administração enfrentou o final da guerra do Paraguai

 

QUINTA – Eleição em 7 Set 1872:

26 – Marcelino CORREA DE PAIVA – Presidente (24)

27 – Manoel de Jesus VASQUES (3º vez)

Antônio Alves Diniz TEIXEIRA (2º vez)

28 – Graciano José de CARVALHO

29 – Aparício José BARBOSA

30 – Abel Coutinho da ROCHA

 

SEXTA – Eleição em 1º Out 1876:

João Baptista PEREIRA GALVÃO

Francisco josé dos SANTOS (2º vez)

31 – Antônio Polibio de ATAÍDE

Marcelino CORREA DE PAIVA (2ºvez)

32 – Boaventura Domingos BOEIRA

33 – Eneas Gonzaga MOREIRA (25)

 

SÉTIMA – Posse em janeiro 1 Jul 1880:

34 – Felizardo Siolveira do AMARAL – Presidente

35 – Bernardinho Pinto RIBEIRO

36 – Carlos Norberto MOREIRA (26)

37 – Miguel de Jesua VASQUES FILHO (27)

38 – Pedro Batista CORREA DA CÂMARA

39 – Querino José PICANÇO (28)

40 – Horácio da CRUZ PIEGAS (29)

Esta Câmara enviou à Biblioteca Nacional uma descrição pormenorizada do município como se verá.

 

OITAVA – Tomou posse em 7 janeiro 1884:

41 – Francisco Antônio MEDEIROS – Presidente (2ºvez)

42 – Patrício Alexandre PUENTE (30)

43 – Bernardinho da Silva MOTA (31)

44 – Gregório Motta da LUZ

Miguel de Jesus VASQUES FILHO (2ºvez)

Carlos Noberto MOREIRA (2ºvez)

Bernardinho Pinto RIBEIRO (2ºvez)

 

ÚLTIMA – Tomou posse 1888:

45 – Horácio Rodrigues da CRUZ (32)

46 – Francisco José da CUNHA

47 – João Pacheco RODRIGUES SOARES

48 – Manoel José PICANÇO

49 – Gaudêncio José BARBOSA

Francisco Antônio de MEDEIROS (3ªvez)

50 – Leão Silveira TERRES (33)

Nota: Miguel Jesus Vasques que foi vereador por 3 vezes, veio do Uruguai e era irmão de D .Maria do Nascimento Vasques Terra casada com Manoel Joaquim Silveira Terra. Ela era conhecida como Maria Terra, vinda de Santa Vitória e mãe do Cel Leão Silveira Terres. Seu filho Miguel de Jesus Vasques Filho era concunhado do Cel Genes Gentil Bento e possui descendentes em Porto Alegre como o pesquisador genealogista Fausto Vasques. Outro concunhado do Cel Genes Gentil Bento era um militar da família Niemayer e avós do grande arquiteto Oscar Niemayer segundo o citado Fausto Vasques.

GUERRA DO PARAGUAI 1865-70 (34)

 

A Guerra do Paraguai foi levada a efeito pela Triplíce Aliança (Brasil – Argentina – Uruguai) contra o Marechal Solano Lopes, dirigente do Paraguai.

As forças de Solano Lopes invadiram em 1865 o Rio Grande do Sul por São Borja e pararam em Uruguaiana que dominaram algum tempo. Ali foram cercadas pelos aliados e renderam-se, ainda em 1865, em presença do Imperador D. Pedro II.

Em 11 de junho de 1865, nossa Marinha venceu na batalha de Riachuelo a esquadra adversária, destruindo assim a capacidade ofensiva estratégica do Paraguai e isolando-o por água de apoio externo.

O próximo passo foi levar a guerra ao território do Paraguai, para conquistar e arrazar a Fortaleza de Humaitá e conquistar Assunção, sua capital.

O Exército do Brasil foi dividido em dois corpos de Exército.O comando do primeiro coube ao legendário general Osório, patrono da rua principal de Canguçu. O segundo coube ao general Marques de Souza e Conde de Porto Alegre. Ambos chefes eram conhecidos dos canguçuenses que participaram da batalha de "Monte Caseros" em 1852, nas portas de Buenos Aires, onde eles se destacaram sobremodo.

Sob o comando do legendário Osório, alguns canguçuenses atravessaram o Passo da Pátria, invadiram o Paraguai e participaram da maior batalha campal da América do Sul – a de Tuiuti, de 24 de maio de 1866, que pôs fim a capacidade ofensiva tática do Paraguai e, na qual, tombou ferido de morte o brigadeiro Antônio de Sampaio que como capitão, entre 1845 e 1850, segundo P.J. Mallet Joubin, estacionou em Canguçu no comando de uma companhia de Infantaria, para assegurar a paz estabelecida em Ponche Verde, que pôs fim à Revolução Farroupilha em 1845.

O destino da maioria dos canguçuenses que lutaram no Paraguai ligou-se ao 2º Corpo de Exercito, comandado pelo Conde de Porto Alegre, neto do general Manoel Marques de Souza/sesmeiro em Canguçu em 1880, e condutor de seus filhos nas guerras vitoriosas de 1801-1825, em ações na Fronteira do Rio Grande . Foi sob a liderança do Conde de Porto Alegre que canguçuenses, comandados pelo tenente coronel de Guarda Nacional de Canguçu e vereador – Theófilo de Souza Mattos, participaram ativamente da conquista de Curuzu e assistiram o desastre de Curupaiti que provocou a vinda urgente ao campo de batalha do Marquês de Caxias – o pacificador da Revolução Farroupilha e que nesta missão estivera na Coxilha do Fogo em 1844, conforme vimos anteriormente.

Com Caxias, canguçuenses assistiram a conquista de Humaitá que pôs fim a capacidade defensiva estratégica de Lopes. Fortaleza arrazada pelo Batalhão de Pontoneiros do 2º Corpo (35) assistida e registrada, em carta à família, pelo bravo canguçuense capitão Henrique José Barbosa (36) que não teve a ventura de voltar.

Nota: hoje consagrado no nome do Museu Municipal de Canguçu e patrono de cadeira na ACANDHIS

Coube a Caxias, além de Humaitá, projetar e executar o lance final da guerra – a célebre marcha de flanco através do Chaco que conduziu o Exército Brasileiro à retaguarda da posição fortificada do Piquiciri onde foi obtida a surpresa estratégica e teve lugar a Dezembrada (batalhas de Itororó, Avaí, Lomas Valentinas) e que pôs fim a capacidade defensiva tática do adversário, obrigando Lopes a refugiar-se na Cordilheira e abrindo o caminho para a conquista do objetivo final – Assunção.

Em 1º de março de 1870, o Marechal Solano Lopes foi alcançado por tropas do general Câmara e Visconde de Pelotas, quando morreu em Cerro Corá, lutando de espada em punho, como um bravo, pelo que elegeu ser a sua verdade. A fase final da guerra foi comandada pelo Conde D’EU, genro do lmperador Pedro ll.

Destacou-se nasta guerra, o então coronel Hipólito Pinto Ribeiro, filho ilustre de Canguçu, como consumado tático de Cavalaria e o vanguardeiro do vanguardeiro – o general Andrade Neves – o Barão do Triunfo e que será estudado a parte.

Nota: Resgatamos o Conde D` Eu e Marechal Gastão de Orleans do esquecimento e da injustiça nacional na obra Artilharia Divisionária da 6ª Divisão de Exército –Artilharia Marechal Gastão de Orleans. Porto Alegre: Promoarte,2003.

O CORPO DE CAVALARIA DE CANGUÇU NA GUERRA DO PARAGUAI

 

Com a eclosão da guerra do Paraguai coube ao vereador e capitão comandante da Guarda Nacional (GN) de Canguçu – Theófilo de Souza Mattos, reunir 100 canguçuenses (37) e organizar um Corpo de Cavalaria que ao lado de piratinenses e pelotenses, formaram uma Brigada Ligeira cujo comando foi entregue ao coronel Manoel Lucas de Oliveira, destacado filho de Piratini, que fora no passado Ministro da Guerra e da Marinha da República Rio-Grandense (38). Lucas de Oliveira deslocou-se da Orqueta, em Pelotas, até São Borja.

Em Ordem do Dia, de 19 de outubro de 1865 do 2º Corpo em Uruguaiana foi dada a seguinte constituição à Brigada Lucas de Oliveira (Brigada Ligeira):

12º Corpo de Cavalaria GN Pelotas

27º Corpo de Cavalaria GN – Piratini

30º Corpo de Município de Canguçu.

Por esta mesma Ordem do Dia, Theófilo de Souza Mattos, comandante dos canguçuenses, foi promovido de capitão a tenente-coronel da Guarda Nacional (39)

A unidade canguçuense, inicialmente 30º Corpo de Cavalaria da Guarda Nacional, após a conquista de Curuzu foi rebatizada de 11º Corpo Provisório de Guardas Nacionais e ao final da guerra, segundo concluí do general Tasso Fragoso, passou a denominar-se 14º Corpo de Volunatários de Cavalaria.

30º CORPO DO MUNICÍPIO DE CANGUÇU (40)

 

Sob a denominação acima, a tropa de Canguçu teve a seguinte organização pela Ordem do Dia citada:

ESTADO-MAJOR

Guarda Nacional – José Próspero da SILVA

Guarda Nacional – Feliciano José CARDOSO

1ª Companhia

Capitão: Zózimo da SILVA SOARES

Tenete: José Maria RIBEIRO

Alferes: Joaquim Cezar da LUZ (Guarda Nacional)

2ª Companhia

Capitão: Joaquim Maurício GONÇALVES

Tenente: José Dias da SILVEIRA

Alferes: Joaquim Antônio CARDOSO

3ª Companhia

Capitão: Casimiro Antônio da SILVA

Tenente: Napoleão REBERVEL

Alferes: Eneas lgnácio LEAL

4ª Companhia

Capitão: José Antônio LESSA

Tenente: Zeferino Pimentel de PY

Alferes: Victorino Marcelino d’ORNELLAS

11º CORPO PROVISÓRIO DE GUARDAS NACIONAIS EM CURUZU

 

Em Cauruzú a tropa canguçuense passou a ter denominação acima e a seguinte constituição (41):

Comandante: Tenente-Coronel Theófilo de Souza MATTOS

Fiscal: Major Joaquim José Rodrigues CANDIÉ

Tenente Ajudante: Antônio Claro BORGES

Alferes porta-estandartes: José Próspero da SILVA

Victor TORRES

Sully José de SOUZA

1ª Companhia

Capitão: Zózimo da SILVA SOARES

Tenente: Ezequiel da SILVA SOARES

Alferes: José Maria CORREIA

2ª Companhia

Capitão: Joaquim Maurício GONÇALVES

Tenente: José Dias da SILVEIRA

Alferes: José Feliciano CARDOSO

3ª Companhia

Tenente: José Maria RIBEIRO

Alferes: José Pinto de Sampaio AZEVEDO

4ª Companhia

Capitão: José Mateus de OLIVEIRA

Nas Ordens do Dia do 2º Corpo é citado o Tenente Franklin Máximo MOREIRA.

Pesquisas do grupo Flor de Lácio, integrado por Marlene Coelho, levantou depois os seguintes canguçuenses participantes da Guerra do Paraguai (42):

Major Belchior Jacinto DIAS, capitães José GOMES DE ARAÚJO, Florentino F. DUARTE e Horácio CRUZ PIEGAS, Henrique BARBOSA e José Joaquim CALDEIRA, tenentes Claro José de MOURA, João José Rodrigues SOARES, Francisco BARBOSA, José PICANÇO e Baltazar Pinto RIBEIRO, Alferes Florentino Furtado de SOUZA e José Fernando VERGARA, Diogo Pereira NUNES e Constantino Coelho dos SANTOS.

Na conquista do forte de Curuzú foram feridos os seguintes canguçuenses:

Tenente: Antônio Claro BORGES

Sargento: Boaventura Francisco da SILVA

Cabos: João Silveira DIAS

Serafim Silveira DIAS

Porfírio Teixeira e MELLO

Soldados: Crescêncio Lopes de MORAES

Franklin José de OLIVEIRA

Manoel Antônio ROSA

conforme parte anexa de Combate do tenente-coronel Theófilo de Souza Mattos, sobre a ação em Curuzú (43).

Segundo o Grupo Flor de Lácio, participaram da luta os irmãos: capitães Gabriel, Glaudêncio e Juvêncio NUNES GARCIA e tombaram em campanha ou em combate, os seguintes canguçuenses:

Capitão: Henrique BARBOSA (tifo)

Capitão: José Antônio SERRA

Tenente: Sezefredo BORGES

Sargento: João MORALES (tifo)

Participaram além, segundo e tradição oral colhida pelo grupo citado:

Antônio SOARES, Antônio PEREIRA DUARTE, Baltazar NUNES GARCIA, Camilo PEREIRA, Domingos BEDERAIDE, Florêncio LEAL, João José da FONSECA e Serafim Creut GOULART.

A lista está longe de ser completa. Necessita ser cortejada com as relações publicadas nas ordens do Dia de Osório.

O COMANDANTE DOS CANGUÇUENSES NO PARAGUAI

 

THEÓPHILO DE SOUZA MATTOS (1819-1872). Nasceu em Canguçu. Era neto e filho deu dos fundadores de Canguçu, Antônio de Souza Mattos. Foi casado com Francisca Gomes de Borba, neta e filha dos fundadores de Canguçu, Manoel José Gomes e Malaquias José de Borba (44).

Abastado fazendeiro no rio Camaquã, em 1864 foi eleito vereador, cumulativamente com as de capitão da Guarda Nacional. Eclodindo a Guerra do Paraguai, foi encarregado de formar um corpo pelo Barão de Porto Alegre e conduzí-lo para o campo de batalha.

Na vitoriosa conquista de Curuzú comandou a força canguçuense dando ao fianl dela a seguinte parte de combate (45) dirigida a seu superior imediato:

"Em cumprimento à ordem de V. S., tenho a honra de participar

que na tomada do Forte de Curuzú na manhã de hontem, tomou

parte o corpo a meu comando, protegendo a Infantaria que

atacou. Os officiais e praças do dito corpo portarão-se como devião,

avançando com patriotismo e denodo.

Congratulo-me com V.Sª pelo brilhante feito d’armas que

obteve o 2º corpo de exército a que tenho a honra de pertencer.

Junto a esta, remeto a relação nominal dos officiais

e praças que foram feridos durante o combate.

Acampamento junto às ruínas de Curuzú, 4 de setembro de 1866.

Ass. Theófilo de Souza Mattos – Tenente Coronel"

Após Curuzú, o próximo passo para o 2º Corpo de Exército foi Curupaiti que assim descrevi (46):

"Ataque ao forte de Curupaiti.

Ataque impetuoso e avassalador.

Cai a primeira linha de trincheiras.

Os aliados sob mortífero fogo.

E o espaço até a segunda?

O próprio inferno terrestre!

A batizes-bocas de lobo, mar de lama e fogo!

Tempestades de chumbo e um fosso intransponível!

E por fim – o nosso recuo.

Eis os preciosos ensinamentos do desastre de Curupaiti.

Pagos com pesado tributo – mais de 4000 baixas.

Ataque frontal – a uma posição fortificada,

sem proceder-se a completos reconhecimento.

Descoordenação dos ataques de flanco e fixação frontal.

E por fim – falta de Unidade de Comando.

Curupaiti repercutiu na Corte.

Era impositivo o Comando Único – Exército – Marinha.

Caxias foi nomeado para a função,

E convidou Osório a retornar.

E duas esperanças passaram a embalar

 

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Na figura acima: Visão do interior da fortaleza paraguaia de Curuzú por cuja posse lutaram os canguçuenses ao comando do tem.-cel. Theófilo de Souza Mattos integrando o 2º Corpo de Exército do Conde Porto Alegre. (Fonte: gravura do tenente argentino Cândido Lopes).

Eis como os canguçuenses atuaram em Curupaiti, classificada de hecxatombe por Osório e segundo parte de seu comandante dirigida a seu superior (47):

"Sendo pedido a este comando uma relação nominal

das praças mortas, feridas contuzas e extraviadas,

cumpre-me participar não ter este corpo que

lastimar perda alguma, em consequência de não ter entrado em fogo".

Acampamento junto ao forte Curuzú, 23 de setembro de 1866.

Ass: Theófilo de Souza Mattos – Tenente Coronel ".

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Figura: A MULHER CANGUÇUENSE EM QUATRO GERAÇÕES MÃE: Francisca Gomes de Borba (Mattos) filha de povoadores de Canguçu e esposa do Tenente Cel, Theófilo de Souza Mattos comandante dos canguçuenses na Guerra do Paraguai. FILHA: Fermina Percília Borba Mattos (Moreira) esposa de Carlos Noberto MOreira e mãe de Eucaris, Ciro, Alice, Afonso Celso, Carlos Licurgo, Orlando, Valter, Joana e Cacilda. NETA: Cacilda Mattos Moreira (Bento) esposa de Conrado Ernani Bento e mãe do autor e de Adail, Carlos l, Luiza, Carmem, Genes, Carlos ll, Marfa, Ernani, José, Jesus e Maria. BISNETA: Alda Moreira Barbosa (Lessa) filha de Antônio (Tita) Barbosa e de Eucaris. Esposa do Dr. Luiz Oliveira Lessa e mãe dos drs. Paulo e Luiz Carlos Barbosa Lessa.

 

Escaparam pois os canguçuenses de participarem do desastre que vitimou, segundo Pedro Calmon, cerca de terça parte da tropa atacante

RETORNO DA GUERRA

 

Antes de 1870, o corpo ao mando do Coronel Theófilo retornou a Canguçu, onde foi recebido com muitas homenagens. Segundo a tradição, ele faleceu em Bagé, em 1872, aonde se encontrava a negócios e em visita a parentes das famílias Borba e Mattos que para lá haviam migrado e vítima de males adquiridos em campanha.

Deixou grande descendência em Canguçu que ligou-se a família Moreira através de cinco casamentos realizados pos seus filhos com cinco irmãos da família citada (48).

Uma visão realista desse conflito poderá ser obtida de dois clássicos de nossa literatura militar, escritos por dois ilustres oficiais do Exército, que participaram da guerra e que atingiram após posições de destaque:

Dionísio Cerqueira em suas Reminiscências da guerra do Paraguai e o Visconde de Taunay em suas Memórias (49). A melhor e mais completa obra sobre a guerra em sua parte operacional, é a Guerra da Tríplice Aliança contra o Paraguai do general Tasso Fragoso (50).

Nota: Produzimos para a Escola de Estado- Maior do Exército, Brasil conflitos Externos 1500-1945 .Ver em Livros no site www.resenet.com.br/users/ahimtb

DESCRIÇÃO DO ATAQUE DE CURUPAITI POR UM CANGUÇUENSE

 

O capitão Henrique José Barbosa, canguçuense que combateu em Curupaiti noutra unidade, assim descreveu o combate em carta à família:

"No dia 22 de abril atacamos o forte de Curupaiti. Infelizmente fomos rechaçados depois de um forte combate. Às sete da manhã começou o bombardeio da nossa Esquadra que durou até meia hora depois do meio-dia. Logo depois principiamos o combate das forças de terra que durou até as cinco da tarde. As nossas forças montavam de dezoito a vinte mil homens. A do inimigo ignoramos porque sempre estiveram acobertados com as muralhas dos fortes. Tomamos todo o primeiro entrincheiramento, mas o segundo não nos foi possível conseguir. Tivemos de nos retirar com grande prejuízo, ficando os paraguaios de posse de suas posições.

Tivemos de prejuízo entre o Exército do General Mitre (Presidente da Argentina) e o nosso, perto de 4.000 homens entre mortos e feridos. Do inimigo não sabemos o prejuízo. O que posso afiançar é que chovia tantas balas de fuzil e artilharia que não posso calcular como escapamos com vida. Do Corpo de Canguçu não morreu ninguém, porque não entrou em combate". (51)

O capitão Barbosa desde 1855 já estava prestando serviço militar em Jaguarão. Pelas cartas recebidas por sua família, conclui-se que entre 1855 e 1865, a sua Grande Unidade guarnecia a fronteira com no Uruguai, ora com a Argentina.

A fase inicial da guerra, por ocasião da invasão paraguaia do Rio Grande do Sul, esteve ao comando do general Davi Canabarro. Por ocasião da invasão do Paraguai vai integrar o 2º Corpo de Exército do Conde de Porto Alegre, com o qual participou dos combates de Curuzu e Curupaiti, onde se encontrou com seus conterrâneos, ao comando do tenete-coronel Theófilo Mattos. Após Curupaiti passou a integrar o 13º Corpo de Pelotas ao comando do major Vasco Pereira da Costa (52).

O capitão Barbosa assim registrou a chegada de Caxias para assumir o comando da guerra após o desastre de Curupaiti:

"Por aqui corre que o general Caxias diz que por estes dois meses está concluída a guerra, mas eu não sei no que ele se fia. Não vejo jeito. Deus queira que assim seja. Feliz daqueles que não vieram cá. Avisa nossos irmãos e pais que eu sofro estes trabalhos e os que já estão por aqui, porque não vejo outro remédio. Os trabalhos de fortificações são terríveis. Trabalha-se dia e noite sem descanso. Pouco se dorme. Os alarmes todas as noites estão alucinando nossa gente. Enfim isto aqui é um aperto, Caso nunca visto. Não vão pensar que estes serviços não são feitos por mim porque sou apenas um dos mandões e não faço serviço pesado?"(52)(53)

Em carta de 27 Fev. 1867, do forte Curuzu, escreveu ainda gozar saúde e finalizou com esta ironia ao Serviço de Saúde:

"Temos sofrido três inimigos: primeiro os médicos, segundo a peste e terceiro os paraguaios".

O capitão Barbosa escreveu muitas cartas que merecem ser publicadas e comentadas. Ele faleceu vítima de tifo entre a conquista de Humaitá e a Dezembrada. Seu cinto com dinheiro retornou à família, através de um amigo a quem confiou antes de morrer. (54)

CANGUÇU DA GUERRA DO PARAGUAI À ABOLIÇÃO

 

Segundo Michael Mulhal, inglês que percorreu o Rio Grande do Sul em 1871, a Vila de Canguçu possuía uma população de 1.800 habitantes. Esta condição a fazia o 14º núcleo populacional da Província, somente superada por Porto Alegre (40.000); Rio Grande (18.000); Pelotas (18.000); Jaguarão (6.000); São Leopoldo, Uruguaiana e Cruz Alta (3.000); Bagé e Alegrete (2.000) e Rio Pardo, São Borja, Cachoeira e Jaguarão (2.000).

O viajante citado escreveu à certa altura: "Se fizermos uma excursão ao Faxinal de Canguçu (região do Faxinal) encontraremos os netos de um grupo de colonos portugueses que aqui chegaram, no século XVIII, e cujos hábitos de ordem, virtude e indústria ainda são bem preservados por seus descendentes" (55).

Esta situação está bastante alterada para pior hoje e acreditamos que os descendentes dos povoadores do Faxinal em Canguçu, perderam sua identidade e desconhecem suas origens. Sobre a vizinha colônia alemã de São Lourenço,

"A colônia tem tido muito sucesso. Compreende 1.637 pessoas com 340 famílias que cultivam 342 colônias e plantam grandes quantidades de cereais e legumes para os mercados de Pelotas e Rio Grande (56).

Nesta época, Canguçu possuía em sua sede 145 casas, das quais 8 sobrados, ou seis a mais que em 1857. Destes, três eram ao lado do antigo Sobrado Velho, um ao lado da Igreja, outro da família Valente e um último parte do curtume que pertenceu à família Morales. Os curtumes eram em número de 6. Existiam 2 ferrarias, 1 selaria, 1 farmácia e 2 açougues. Além da administração municipal existia uma delegacia de Polícia dividida em 5 subdelegacias e 3 quarteirões de paz, um tabelião, um escrvão de órfãos e ausentes, uma caletoria, um juizado municipal de órfãos, capelas e resíduos(57). Decorridos 10 anos e com cpoio em Descrição do Município de Canguçu enviado pela Câmara Municipal à Biblioteca Nacional no Rio e que lá localizei, (58) a situação de Canguçu era a seguinte: A sua população total era de 14.456 hab., sendo 2.956 escravos e, a da vila de 2.500 habitantes dos quais 109 escravos. A indústria de curtumes florescia e seus produtos tinham aceitação internacional. No ano anterior fora criada a sua primeira sociedade – O Edem Canguçuense e no ano da descrição uma biblioteca na referida sociedade. Como obras públicas a descrição mencionou a cadeia, a igreja, o cemitério e três fontes. A cadeia era a que foi construída em 1842 pelo chefe farroupilha Chico Pedro e que conheci e foi demolida em 1939 para dar lugar a atual. Era o "quarto de hóspedes" segundo ele (59) onde estiveram 4 presos, altos chefes farroupilhas. O cemitério era o atual, estabelecido desde 1778. As fontes eram as do Ouro, da Prata e do Ferro, pontos turísticos e românticos do Canguçu imperial, além da fonte da Saudade de propriedade da família Ferreira Monteiro, junto à esquina das ruas Júlio de Castilho com 24 de Maio, construída após. (60)

Menciona o aparecimento de ouro pelo lado da serra, bem como o carvão que ninguém tem explorado e a existência de tigres, Refere a abundância de peixes no Rio Camaquã das espécies dourado, pintado, grumatão, curvina, bagre, voga e jundiaí que sustentavam as populações a sua margem e não fora a distância, poderia abastecer Canguçu. Registrou uma epidemia de tifo em 1863, que vitimou muitos canguçuenses.

A PONTE DO PASSO DO ACAMPAMENTO NO PIRATINI

(PONTE DO IMPÉRIO)

 

Como melhoramento digno de registro, por sua repercussão provincial e internacional, cite-se a inauguração, no térmico da Guerra do Paraguai, da ponte do Passo do Acampamento no rio Piratini pelo governo imperial. (61)

Em 1861 o vereador pelotense, Domingos José de Almeida, em sua quinta e última legislatura e ex-ministro da Fazenda da República Rio-Grandense e seu cérebro (62), propunha a construção da ponte naquele local e justificava, em ampla memória, a razão da escolha. Nesta época segundo ele, a construção da ponte referida fora prometida pelo Barão de Mauá. Domingos José de Almeida, em 7 Mai 1861, reconheceu o local com o engenheiro Mr. Buck, fazendo-se acompanhar por representante de Canguçu – o capitão Ezequiel Marcelino Vieira (63).

O Passo do Acampamento possui este nome desde o tempo das guerras contra os espanhóis 1763-77. Ali acampou Rafael Pinto Bandeira com seus cavalarianos ligeiros, para previnir um ataque de Rio Grande, ou infiltração adversária por aquela direção. Mapa da damarcação do Tratado de Santo Ildefonso o assinala (63)(64).

Segundo anotação feita em 1933, pelo prefeito Conrado Ernani Bento, em foto da ponte tirada por Jùlio G. de Mattos, ela foi contratada pelo Vice-Presidente da Província, Dr. Joaquim Vieira da Cunha, em 1868 e construída de 1869-70 por Hygino Correia Durão. Foi orçada em 360 contos de réis.

ABOLICIONISMO EM CANGUÇU

 

Já abordamos o assunto em O Negro e descendentes na Sociedade do RGS do qual transcrevemos o trecho a seguir: (65)

"A primazia da fundação de clubes abolicionistas e sociedades libertadoras de escravos no Rio Grande do Sul requer muitos estudos para que seja estabelecida sem risco de injustiças.

As sociedades libertadoras, acreditamos, objetivavam a libertação de escravos menores e os clubes abolucionistas a abolição total.

Exemplificando:

Em 1870, em Canguçu, no âmbito da maçonaria local foi criada uma Sociedade Libertadora.

Esta, por ocasião do retorno dos filhos do local da Guerra do Paraguai, os homenageou com a alforria de duas escravas menores, de nome Elvira e Maria Conceição, compradas de seus amos a 600 réis cada.

A cerimônia foi realizada ao ar livre, sobre um cerro junto à cidade, que desde então passou a denominar-se Cerro da Liberdade.

Falou na ocasião o orador da loja maçonica local, Antônio Joaquim Bento, professor municipal régio.

Este cerro, monumento natural, foi demolido e transportado para o Rio Grande para aterrar áreas do Superporto, em completo desprezo ou ignorância às mensagens cívicas nele contidas.

O Clube Abolucionista do local foi fundado em 1884, como repercussão do ato cearense de libertação total de seus escravos.

Foram os abolucionistas mais destacados deste clube: Bernardino Pinto Ribeiro, Antônio Manoel da Costa e Enéas Gonzaga Moreira.

Canguçu era o 2º da Província em número de escravos em 1887 e os declarou todos livres, em 2 de abril de 1888.

A seguir, o clube abolucionista local foi dissolvido, em cerimônia ao ar livre, no Cerro da Liberdade.

Dentro desta distinção entre Clube ou Centro Abolucionista e Sociedade Libertadora, acreditamos que a Porto Alegre caiba a primazia no Brasil da organização de uma Sociedade Libertadora, e a Pelotas, no Rio Grande do Sul, a da organização de um Clube Abolucionista, em 21 de agosto de 1881.

Souza Docca, em sua História do Rio Grande do Sul fornece alguns subsídios de como transcorreu a campanha abolicionista naquele Estado, dentro dos fracos elementos de que pode dispor.

Em 1883, o Ceará e logo após a Amazônia declararam livres todos os seus escravos.

O primeiro local a seguir esses gestos, no Rio Grande do Sul, foi Quaraí, ao "declarar livres seus escravos em 3 de agosto de 1884".

Seguiram-se a Quaraí, segundo se conclui de Souza Docca:

Caí (16 Ago, 84); Viamão(21 Ago, 84); São Leopoldo (26 Ago, 84); Gravataí(agosto, 84); Porto Alegre, Alegrete, São Borja, Montenegro, Camaquã, Torres e Santo Ângelo (7 Set, 84); São Luiz Gonzaga (14 Set, 84); Itaqui, Rosário, Santo Amaro e Vacaria (15 Set, 84); Júlio de Castilhos (21 Set, 84); Santana, São Gabriel,Taquara, Bagé, Passo Fundo, Solledade e Pinheiro Machado (28 Set,84); Pelotas (16 Out, 84); Lavras (2 Dez, 85), Uruguaiana(1º Dez, 85) e Canguçu (2 Abr, 88).

Conclui-se que os municípios não citados só libertaram seus escravos por força da Lei Áurea de 13 de Maio de 1888.

O Almanaque da Província do ano de 1887 publicou o número de escravos da Província do Rio Grande do Sul por município.

Apresento estes dados em ordem decrescente de número de escravos:

Rio Grande – 844; Canguçu – 839; Encruzilhada – 645; Cachoeira – 464; São José do Norte – 408; Piratini – 391; Pelotas – 341; Caçapava – 323; Gravataí – 279; Herval – 258; Santa Vitória – 255; Santo Antônio da Patrulha – 252; Rio Pardo – 232; São Jerônimo – 225; São Francisco de Paula – 225; Osório – 220; Santo Amaro – 109; São Martinho – 157; São Sepé – 153; Jaguarão – 142; Soledade – 140; Cruz Alta – 131; D. Pedrito –117; Pinheiro Machado – 112; Lagoa Vermelha – 93; Bagé – 82; Arroio Grande – 73; e Porto Alegre –58.

A situação em que encontrei o Cerro da Liberdade em 1972 foi documentada em fotografia e descrita com um alerta cívico e ecológico no Diário Popular de Pelotas (66), de 19/3/72.

Q!uando da cerimônia de libertação dos escravos menores em Canguçu descrita, presidia a Província do Rio Grande o destacado historiador e homem público e também abolucionista em 1871, segundo Mulhall, (67), o Barão Homem de Mello.

Ele faleceu em 1918 na base do majestoso maciço de Itatiaia, que avisto da sala de onde redijo linhas, (68) em minha casa no Jardim das Rosas – Resende – RJ.

Nota: O Barão Homem de Mello é meu patrono de cadeira na Academia Itatiaiense de História por nós fundada em 1992 .


 

CAPÍTULO 5 CANGUÇU – DA REPÚBLICA À REVOLUÇÃO DE 30

 

ANTECEDENTES

 

Durante a Revolução Farroupilha, Canguçu como 1º e 3º distritos de Piratini, a primeira capital da República Rio-Grandense, possuiu ardorosos republicanos, conforme temos abordado em trabalhos que focalizam aquele Decênio Heróico (1). Os Anais do Arquivo Histórico do RGS também o têm demonstrado à luz de documentos que vêm publicando (2).

O próprio chefe legalista que lá operou – o tenente-coronel Francisco Pedro de Abreu reconheceu este fato em suas Memórias ao escrever a certa altura: (3)

Em 20 de janeiro de 1843 " com o fito de bater uma partida que diziam estar pelo arroio Pantanoso", passou o São Gonsalo e recebendo cavalhada em mau estado marchou direto à Capela de Canguçu, a reconhecer a força do inimigo de mais de 200 homens ao mando do chefe rebelde Bento Gonçalves que não atacou por falta de bombeiro (informante), mau terrreno e serem ali os moradores (de Canguçu) todos farrapos".

Nesta ocasião é que travou-se o combate da Picada do Iguatemi de 24 Jan 1843, mencionado (4).

Dentre os ardorosos farrapos canguçuenses atravessou os tempos o coronel Joaquim Teixeira Nunes – "O Coronel Gavião" e a "maior lança farrapa", segundo o general Tasso Fragoso (5), e descendente das famílias primeiras de Canguçu.

Foi ele o primeiro a portar a Bandeira da República Rio-Grandense no Te Deum, em Piratini, celebrado pelo Padre MIguel Justino Garcez Moncada, segundo vigário de Cerrito (Vila Freire) (6), em regozijo pela eleição de Bento Gonçalves à Presidência da República Rio-Grandense.

Cerimônia presenciada, registrada e relatada sob a forma de Apontamentos para a Revolução de 1835-45, pelo antigo tenente farrapo – o canguçuense Manoel Alves da Silva Caldeira, atendendo à solicitação dos historiadores Alcides Lima, em 1888 (7) e Alfredo Ferreira Rodrigues, em 1898. (8)

O sentimento republicano após dormitar desde a paz de Ponche Verde em 1845, por cerca de 38 anos na serra dos Tapes, acordou forte, em 1883, com a fundação, no atual quinto subdistrito de Canguçu, do Clube Republicano sob a presidência do citado tenente farroupilha, nesta oportunidade coronel da Guarda Nacional.

Segundo Simões Lopes Neto, este Clube teve a seguinte constituição (9): Presidente: Coronel GN Manoel Alves da Silva Caldeira; Vice – David (Mattos) Soares da Porciúncula (10); Secretários – Francisco C. Antigueira e João Paulo Prestes (11); Tesoureiro – João José da Fonseca e Diretores – Francisco de Souza Oliveira (12), Francisco Pedro Ribeiro, Auto Juvêncio Prestes, Arthur Walcur Moreira, Ezequiel José da Fonseca, Pedro Gonçalves de Medeiros e Manoel Ferraz Leite.

Esta fundação teve lugar após delegação de Canguçu haver em 23 de fevereiro de 1882, segundo Souza Docca, participado em Porto Alegre da instalação da Convenção Republicana e, em 15 de março de 1883, do 1º Congresso Republicano Rio-Grandense, ao lado de representações de 19 outros municípios e de outros 13 clubes republicanos. Representou Canguçu o velho farrapo Manoel Alves da Silva Caldeira.

Por esta mesma época começou a pregação republicana em Canguçu. Na Câmara Municipal os vereadores Leão Silveira Terres e Carlos Norberto Moreira.

No futuro tiveram destacada atuação comunitária e integraram o "Grupo dos 27" que se declararam favoráveis à República. (13)

Pela imprensa local, no jornal Crisálida pregava a República Genes Gentil Bento. Segundo J. Simões Lopes Neto "foi desde os mais verdes anos um sonhador, cheio de fé, do ideal republicano, ao qual deu com os melhores impulsos de seu coração de moço, as primícias de sua inteligência, na tribuna e na imprensa, em Canguçu e fora, salientando-se entre os poucos, mas intimerados pregadores de novo credo" (14).

A PROCLAMAÇÃO DA REPÚBLICA

 

A Proclamação da República em Canguçu inicialmente não causou maiores problemas. Ela foi conhecida oficialmente através da comunicação a seguir transcrita: (15)

 

"Estado do Rio Grande do Sul

 

Governo em Porto Alegre, 18 de novembro de 1889.

Sr. Presidente e demais vereadores da

Câmara Municipal de Cangussu.

 

Pelo governo Provisório aclamado no Rio de Janeiro, fui nomeado Governador Político do Rio Grande do Sul.

Como tal, cabe-me comunicar a V. Mces que por decreto de 15 do corrente, foi proclamado forma de governo à República Federativa, constituindo as Províncias, os Estados Unidos do Brasil.

Pedro de Alcântara, imperador deposto, partiu ontem com sua família no paquete "Alagoas" para a Europa, fornecendo-lhe o governo 5.000 contos para ocorrer as despesas e mais o subsídio de 800 contos, até que sobre este ponto se pronuncie a próxima Assembléia Constituinte.

Conto com a leal coadjuvação de V. Mces, a quem Deus guarde.

Ass: Marechal José Antônio Correia Câmara

Visconde de Pelotas"

 

A Câmara Municipal, após deliberar, aderiu à República e oficiou ao Marechal Câmara, congratulando-se com sua investidura e prometendo cooperar em tudo o que fosse possível (16).

O Marechal Câmara e 2º Visconde de Pelotas (1824-1893), nasceu em Porto Alegre (17). Era neto do marechal Patrício Correia Câmara que em 1776, no comando dos Dragões do Rio Pardo, atravessara o atual município de Canguçu proveniente de Santa Tecla e com destino ao Taim (18). Ingressou no Exército onde fez carreira rápida e brilhante. Na guerra do Paraguai destacou-se sobremodo, como comandante de brilhantes cargas de Cavalaria. Em Avaí foi promovido, de coronel a general com estas palavras de Caxias, admirado pelo brilho de sua atuação após uma de suas memoráveis cargas – "general Câmara: Louvo-o por suas brilhantes cargas". Foi o chefe brasileiro que comandou o último lance da guerra, ao derrotar o marechal Solano Lopes em Cerro Corá, em 1º de março de 1870. Era o Ministro da Guerra quando do falecimento do Duque de Caxias em 7 Mai 1880 (19). Como Ministro da Guerra foi autor de preposição da construção de uma ferrovia estratégica ligando Rio Grande a Canguçu, com a finalidade de "em caso de ataque a Rio Grande, evacuar os meios para Canguçu e ali oferecer resistência ao invasor". Foi quem mandou construir o velho casarão do Parque da Redenção que tivemos a honra de habitar em 1951-52, como aluno da Escola Preparatória de Cadetes e que dia a dia se agiganta na História do Ensino Militar no Brasil a partir de 1905, em que foi Escola de Guerra (20).

O Imperador D. Pedro II veio a falecer no exílio. A bandeira brasileira com a qual seu corpo foi coberto em Paris, encontra-se em poder de pessoa intimamente ligada a Canguçu por laços de família e agora artísticos como o restaurador da Igreja Matriz N. S. da Conceição de Canguçu – o professor Adail Bento Costa (21).

Proclamada a República, foi nomeada para dirigir Canguçu uma junta municipal com a seguinte constituição:

Nota: Estamos escrevendo a História do Casarão da Vàrzea, que abriga atualmente o Colégio Militar de Porto Alegre., onde funciona a Delegacia Gen Rinaldo Pereira da Câmara da Academia de História Militar Terrestre do Brasil que fundamos e presidimos. O General Rinaldo é neto e biógrafo do Marechal Câmara e foi casado com uma filha do grande mestre canguçuense André Leão Puente.

REVOLUÇÃO DE 93

 

Proclamada a República pouco após surgiram sérias divergências entre os republicanos rio-grandenses, "que ganharam mas não levaram", e os liberais e particularmente os conservadores que continuaram praticamente no poder no Rio Grande do Sul.

Aquelas divergências prosseguiram entre republicanos rio-grandenses, liderados pelo Dr. Júlio de Castilho, e os federalistas (antigos liberais e monarquistas) reunidos na União Nacional, sob a liderança do Dr. Gaspar Silveira Martins.

Em 13 de maio de 1890, em Porto Alegre, foi acendido o estopim que culminou com a sangrenta e fratricida Revolução de 93 no Rio Grande do Sul, ou Guerra Civil 1893/95 na Região Sul . Isto ao ser dissolvida à bala, manifestação dos republicanos comemorativa do 2º aniversário da Abolição. A dissolução do Congresso Nacional em 1891 pelo Marechal Deodoro da Fonseca, com o apoio de todos os presidentes de Estado à exceção de Lauro Sodré no Norte e a conseqüente renúncia daquele marechal, repercutiram em Canguçu negativamente.

Em 28 de fevereiro de 1892, reuniram-se 91 canguçuenses na sua Intendência e assinaram um manifesto de apoio à derrubada de Júlio de Castilhos, em 12 de novembro último, (24) que foi substituído por uma Junta Governativa, obrigando os chefes republicanos a emigrarem. Da República até a deposição de Castilhos o Rio GRande teve 18 presidentes.

Em 31 Mar 1892, foi criado em Bagé o Partido Federalista, cuja chefia coube a Gaspar Silveira Martins.

Em 17 de junho de 1892, Júlio de Castilhos conseguiu retomar a Presidência do Estado , em Porto Alegre, do general Câmara. Mas este a transferiu ao general Silva Tavares, em Bagé.

Em Canguçu, o coronel Bernadino da Silva Mota e o tenente-coronel Manoel Pedroso de Oliveira mobilizaram forças em apoio a Júlio de Castilhos (25).

Em 24 de junho de 1892, 35 canguçuenses republicanos assinaram na lntendência um manifesto em solidariedade a Júlio de Castilhos (26).

E daí por diante, de divergência em divergência, de incidente em incidente que envolveram muitos assassinatos políticos, republicanos e federalistas caminharam para o banho de sangue que foi a Revolução Federalista – batizada por estudiosos desse evento, como " Revolução de Bárbaros".

Banho de sangue que por uma ironia do destino, os líderes das duas facções, filosoficamente pacifistas: Gaspar Silveira Martins, por convicção, liberal, e Júlio de Castilhos, por convicção, positivista, não conseguiram evitar ou ao menos amenizar.

Segundo Ângelo Dourado, a Revolução de 93 (27) "é a mais horrorosa que o tempo registra". Por esta razão é uma página em branco de nossa história que os historiadores têm procurado omitir, sob o argumento de "não abrir feridas cicatrizadas". O Rio Grande do Sul sentiu até 1923, um complexo de culpa pelos padrões de violência atingidos por esta Revolução, contrariando a tradição de Firmeza e Doçura do Gaúcho brasileiro histórico. Firmeza traduzida pela coragem, bravura e garra no combate. Doçura traduzida depois do combate vitorioso, pelo respeito como religião, à vida, à honra, à família, à propriedade e aos direitos do vencido.

*Assunto que abordamos em Autoria dos Símbolos do RGS (28) como de inspiração filosófica da Revolução Farroupilha.

Tradição praticada como regra na Revolução Farroupilha, por ambos os contendores naturais do Rio Grande do Sul e retomada na Revolução de 23, denominada, em contraposição a de 93, de "Revolução de Cavalheiros", (29) apesar de dirigida no campo militar por veteranos da Revolução de 93, como no caso dos canguçuensesJuvêncio Maximiano Lemos e Zeca Neto (nascido na família Mattos no 5º subdistrito de Canguçu e de onde saiu aos 8 anos). Nosso objetivo aqui não é o de interpretar a Revolução de 93, tão carente de fontes e atitudes ainda inoportuna do ponto de vista histórico, mas, sim, fornecer alguns dados para uma interpretação madura e corajosa que um dia será feita e o deve ser dessa revolução, à procura de lições que evitem a incidência dos rio-grandenses em outro erro dessa natureza. Esta Revolução teve repercussão muito negativa em Canguçu, como em outras localidades como se verá. Em criança, apesar do abrandamento provocado em 30, pela Aliança Liberal, ainda percebi alguns gaúchos, ao menos em conversas e ameaças, se mostrarem adeptos da Firmeza e Amargura traduzida pelo costume de degola do adversário, valor cultivado por alguns gaúchos uruguaios e argentinos, conforme os paraguaios registraram em recente obra Rugidos de los Leones (30) sobre a Guerra do Paraguai. Tradição, segundo Afonso Arinos, de origem moura, transplantada para a Espanha (31) e dali para a Argentina e Uruguai, e deste último, segundo alguns estudiosos, por expressivos contingentes uruguaios que tomaram parte na Revolução de 93.

AS LIDERANÇAS MILITARES DA REVOLUÇÃO E CANGUÇU

 

No campo militar, as maiores lideranças de ambas as facções em luta ligam-se a Canguçu. O general Hipólito Pinto Ribeiro, chefe militar republicano e vencedor de lnhanduí era canguçuense.

O general Gumercindo Saraiva (do Amaral) "O Napoleão dos Pampas", era bisneto de Manuel Saraiva do Amaral, um dos primeiros povoadores de Canguçu e filho do canguçuense Francisco Saraiva do Amaral, como o prova o genealogista Carlos Rheingantz (32).

Tem produzido trabalhos sobre esta Revolução o ilustre confrade e amigo Arthur Ferreira Filho a cujas obras (33) o leitor interessado recorrerá para detalhes que ultrapassem o comunitário. Outros detalhes da revolução, que extrapolem a comunidade, serão abordados ao tratarmos do filho ilustre de Canguçu – Hipólito Pinto Ribeiro.

MOVIMENTAÇÃO DA TROPA DE CANGUÇU (34)

 

Em 19 Fev 1893. Sob o comando do coronel Bernadino Motta e Joãoda Luz, deixaram Canguçu 350 homens. Missão: Proteger as ferrovias junto à fronteira entre Jaguarão e Santana, e fornecer 50 homens para integrarem o 2º Batalhão da Reserva do Estado.

Fazia 14 dias que o general Silva Tavares havia lançado uma proclamação aos gaúchos, concitando-os a lutar contra o governo de Júlio de Castilhos, depois do que invadiu o Rio Grande do Sul a partir de carpintaria, no Uruguai.

Em 2 Mar 1893. Sob o comando do coronel Manoel Pedroso deixou Canguçu uma coluna de 200 homens. Missão: Integrar, em Bagé, coluna ao comando do general João Teles, num total de 1.200 homens. Coluna que abrigou os federalistas a levantarem o cerco a que submeteram Santana.(35)

Em 4 Mai 93. O canguçuense general Hipólito Pinto Ribeiro foi o comandante da vitoriosa batalha de lnhanduí. Nela tomaram parte sob o seu comando Salvador Pinheiro Machado, coronel Manuel do Nascimento Vargas (pai do Dr . Getúlio Vargas), Tupi Caldas, Aparício Mariense, e capitão Setembrino de Carvalho, mais tarde o pacificador da Revolução do Padre Cícero no Ceará, do Contestado no Paraná e Santa Catarina e da Revolução de 23 no Rio Grande do Sul. Do lado federalista lutaram nesta batalha os generais Silva Tavares e Salgado, Gumersindo e Aparício Saraiva, Juca Tigre, Torguato Severo, Vasco Alves e outros (36).

Em 12 Mar 93. Com reforços de mais 300 homens recebidos em fins de março de Canguçu e Piratini, o general Carlos Telles travou o combate de Upamoroti, na tarefa de impedir a reinternação no Uruguai dos derrotados em lnhanduí. Neste combate destacou-se a cavalaria integrada por canguçuenses e piratinenses, ao comando do coronel Manuel Pedroso de Oliveira.

A GRANDE MARCHA DE GUMERCINDO SARAIVA

 

Gumersindo Saraiva após lnhanduí não se internou no Uruguai. Prosseguiu em seu deslocamento conforme registrei em mapa anexo. (37)

Considerando 5 Fev 93 com o início de sua marcha e 10 de agosto de 94, dia de sua morte em Carovi, ele percorreu neste ínterim (1 ano, 6 m e 5 dias), 2.500Km a cavalo e o seguinte itinerário conforme mapa citado: Carpintaria – Santana – Inhanduí – Lavras – Jaguarão – Caçapava – São Gabriel – Alegrete – Cruz Alta – Passo Fundo – Lages – Brusque – Lapa – Ponta Grossa – Jaguariaiva – Ponta Grossa – Campos Novos – Passo Fundo – Carovi.

Consideramos Gumersindo Saraiva o maior líder de combate dessa Revolução no sentido técnico-militar. Pesquisa da Escola de Comando e Estado-Maior assim caracterizou a sua liderança (38) "Líder militar nato, sincero de propósitos, corajoso, justo, rústico e afetivo a seus liderados".

Os troncos dos Saraiva Amaral eram do 4º subdistrito de Canguçu .

Pouco a pouco eles foram cruzando o Piratini para o município de Arroio Grande. Gumersindo teve seu aprendizado militar nas lutas internas do Uruguai.

O SÍTIO DO RIO NEGRO

 

A página mais negra dessa revolução foi escrita em Bagé, no chamado Sítio do Rio Negro. O general Tavares invadiu de novo o Rio Grande. Ao tentar atacar Bagé foi repelido. Decidiu então atacar uma força de menos de 1.000 homens do marechal lsidoro Frenandes. E a seguir escreve Arthur Ferreira Filho: (39)

"O marechal governista deixou-se surpreender em campo raso por todos os lados. Logo os federalistas que contavam com o triplo de combatentes, dispondo de numerosa Cavalaria, cortaram-lhe todos os recursos, inclusive a àgua que abastecia o acampamento. Depois de enérgica resistência dos coronéis Manoel Pedroso e Utales Lupi, a força republicana rendeu-se. Numerosos prisioneiros, entre os quais os coronéis Manoel Pedroso (40) e Cândido Garcia foram degolados. Os jornais favoráveis ao governo avaliaram o número de 300 vítimas, no que deve haver exagero. Embora o degolamento não constituísse novidade, naquela feroz guerra civil, o morticínio do Rio Negro, pela categoria de algumas vítimas, pelos requintes de ferocidade de que se revestiu, alcançou uma tremenda repercussão contrária".

Entre os sitados no Rio Negro encontravam-se, segundo a tradição, muitos canguçuenses e piratinienses. Sabemos terem sobrevivido ao sítio os canguçuenses João Paulo Prestes, Juvêncio Maximiano Lemos, Joaquim Soares e o piratiniense Antero Pedroso de Oliveira em circunstâncias que abordaremos em local próprio ao tratarmos desses personagens.

Segundo ainda a tradição oral, a ser confirmada por fontes históricas, o general Hipólito Pinto Ribeiro ficou indignado e tratou de alcançar os chefes responsáveis, pelo massacre do Rio Negro, onde pereceram muitos canguçuenses e piratinienses.

Em fevereiro 1894 infligiu catastrófica derrota em Sarandi, ao coronel Davi Martins, a maior sofrida pelos federalistas (41). Depois, próximo a Encruzilhada, derrotou por completo o coronel Marcelino Pina de Albuquerque, segundo Aristóteles Vaz, o comandante do degolamento de civis governistas no Sítio do Rio Negro.

ÚLTIMO ANO DA REVOLUÇÃO – 1895

 

Em 26 de fevereiro, sob o comando do coronel Leão Silveira Terres (43), travou com canguçuenses e piratinienses sob seu comando, um combate em Piratini, contra forças do general Guerreiro Vitória.

Em 2 de abril foi organizado em Canguçu o 34º Corpo da Guarda Nacional sob o comando do tenente-coronel João Paulo Prestes (44).

Em 24 de julho , sob o comando do canguçuense general Hipólito Ribeiro, foi travado o último combate da Revolução. O general Hipólito surpreendeu, em Campo Osório, força ao comando do almirante Saldanha da Gama, que ao tentar escapar a cavalo, foi alcançado e lanceado. Sua morte foi uma grande perda para a Marinha e para o Brasil, bem como a do general Gomes Carneiro na Lapa – PR, frente às forças de Gumersindo Saraiva. A paz foi assinada em Pelotas, 23 de agosto de 1895. O cel. Savaget mais tarde herói em Canudos, esteve em Canguçu.

CONSEQÜÊNCIAS PARA CANGUÇU

 

A revolução durou 31 meses e fez 1.000 vítimas, além de causar graves prejuízos econômicos. Ela dividiu a família rio-grandense e por extensão a família canguçuense. Eduardo do Wilhemy, professor em Canguçu, no início do século, em artigo no Almanaque Literário e Estatístico do Rio Grande do Sul assinala que Canguçu sofreu "uma recessão e reetrocesso econômico com a Revolução" (45), em razão principalmente da migração para outras localidades com seus patrimônios, de tradicionais famílias canguçuenses do tempo do Império, deixando suas residências ao abandono. A Igreja que na Revolução Farroupilha foi inclusive restaurada pelo chefe legalista Chico Pedro (46) foi nesta ocasião profanada e seus livros históricos extraviados, conforme assinalou seu pároco, em 1908. O grupo Flor de Lácio, integrado por normalistas canguçuenses, descendentes de veteranos de ambas as facções, ao proceder pesquisas sobre esta revolução, sentiu o peso negativo da mesma e iniciou a descrevê-la com estas palavras: (47)

"Revolução que se caracterizou por atos repulsivos de sanguinarismo selvagem... Ela nasceu de ressentimentos entre homens que na disputa do poder no Estado, haviam recebido recíprocos agravos".

Canguçu não foi envolvido diretamente pela Revolução, como local de combates ou de trânsito de facções em luta. Os canguçuenses que dela participaram lutaram na fronteira e parte foi relacionado pelo grupo citado (48) com complemento do autor. Esta revolução dividiu os lares canguçuenses. A nessecidade de abrandar os efeitos dessa divisão foi a criação em 1896 do Clube Harmonia, de inapiração maçônica, com finalidade de harmonizar a família canguçuense, tão traumatizada pelos efeitos dessa luta fraticida. Assim mesmo esta idéia foi aceita com dificuldade.

A Revolução de 93 encerra uma preciosa lição para Canguçu. Pois, tentar desconhecê-la é correr o risco de repetí-la um dia.

Simões Lopes Neto, em 1912, ao elaborar Histórico de Canguçu a omitiu por completo, por inoportuna e inconveniente sua abordagem. (48)

Em 1891 a Vila de Canguçu possuía 1.600 habitantes e 194 casas. Já havia tido no início a migração, face às agitações resultantes da República.

Nota: No centenário desta Revolução a estudamos bastante junto com a Revolta na Armada em várias publicações onde destacamos : O massacre federalista do Rio Negro em Bagé em 28 nov 1893.Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.v.154, nº 378,jan/mar 1993. História da 3a Região Militar 1889;1953.Porto Alegre:3a RM,1995.v.2, p.77/143.Os cercos de Bagé e da Lapa duas resistências épicas da História Militar do Brasil. Revista A Defesa Nacional. nº 767, jan/mar 1995. A Revolução Federalista em Canguçu in: Revolução Federalista.Porto Algre:CIPEL1993 e várias outras relacionadas pelo correspondende da ACANDHIS Corálio Cabeda, na Revista do IHGRGS de 2003.Acreditamos que defendemos a comunidade canguçuense de manipulações da História envolvendo seus filhos e que permaneciam sem resposta. Confirmar é obra de simples verificação e raciocínio.

 

INTENDENTES DE CANGUÇU 1889-1930

 

Primeiro: Coronel Bernadino da Silva Motta (50)

Foi nomeado intendente provisório, em 20 de setembro de 1893, durante a Revolução de 93. Foi assistido em sua administração pelo seguinte Conselho Municipal Provisório:

Cel. Leão Silveira Terres, Henrique Maria Lopes (51), Marcelino Gonçalves da Silva (52), João Antônio Morais e Ernesto Barcelos do Amorim.

Este governo durou menos de um ano.

Segundo: Coronel Leão Silveira Terres (1ª vez)

Nomeado intendente, assumiu o cargo em 28 de agosto de 1894 pela primeira vez.

Terceiro: Coronel Leão Silveira Terres (2ª vez)

Escolhido em eleição em 21 de setembro 1896 continuou no cargo , como primeiro intendente eleito.

Teve como vice intendente: Tenente-Coronel João Paulo Prestes

Quarto: Coronel Hipólito Gonçalves da Silva (53)

Tomou posse em 21 de setembro de 1900 junto com o Conselho Municipal integrado por : (54) Antônio Florício Duarte; Joaquim Antônio Barbosa; Baltazar Raimundo Martins; Dario Mota de Freitas (55); José Bernabé Souza; Nicolau Ferreira Duarte e Florício Ribeiro de Souza.

Quinto: Coronel Leão Silveira Terres (3ª vez)

Tomou posse em 21 de Setembro 1904. Faleceu no exercício da função, em Mai1905, sendo substituído pelo vice -intendente Coronel Genes Gentil Bento.

Integraram o Conselho Municipal: Antônio Florêncio Duarte (56); José (Zeca) Albano de Souza; Antônio (Tita) Barbosa (57) e Nicolau Dutra.

UM PERFIL BIOGRÁFICO (58)

 

Coronel Leão Silveira Terres (1850-1905). Natural de Canguçu. Era filho de Manoel Joaquim da Silveira Terra, de Santa Vitória do Palmar e Maria do Nascimento Vasques, que migraram para Canguçu, em 1850, em companhia dos filhos João Manoel, Joaquim e Felipe, que mais tarde combateram na guerra do Paraguai ao comando do general Osório. O nome Terres foi dado pelo padre Hipólito Ribeiro, sob o argumento de que "Terra não era nome de gente". A migração para Canguçu foi em razão do clima de guerra iminente contra Oribe e Rosas. Em 1864, aos 14 anos, perdeu o pai ficando arrimo da mãe. Nesta ocasião começou a trabalhar como caixeiro de seu tio Manoel de Jesus Vasque e a servir de sacristão do padre José Fontes que lhe serviu de professor. Passado algum tempo, ganhou, por merecimento, a condição de sócio de seu tio. Como comerciante ambulante percorreu todo o município. Com 17 anos administradva uma casa comercial em Canguçu, outra em Piratini e outra no Uruguai aonde se deslocava para proceder balanços duas vezes ao ano. Com 20 anos foi nomeado subdelegado de Polícia e logo depois delegado e juíz de paz, reeditando na vida pública o sucesso da vida civil. Em 1873 casou com Bernardina Santos (59), filha do senhor da Estância do Cristal (60). Foi o líder do grupo dos 27 que aderiram a República na primeira hora e "integrado pelos irmãos Franklin Máximo e Carlos Norberto Moreira; João Paulo Prestes; Teófilo Moreira; Joaquim Nunes Garcia; Juvêncio e Maneco Prestes; João dos Santos; Joaquim Paula Freitas; Antônio Medina; Henrique Maria Lopes; Abel Soares Campos; Lúcio Antônio da Rocha e outros, segundo seu filho Leão dos Santos Terres (61)em carta a nós dirigida.

Foi nomeado Coronel da Guarda Nacional. Presidiu a Comissão Executiva designada pela Junta Municipal, a primeira administração republicana de Canguçu, durante três anos e meio. Presidiu o Conselho Municipal por um ano. Foi intendente nomeado em 1893-96, durante a Revolução de 93.

Em 26 de janeiro de 1895, comandando 80 canguçuenses e piratinienses, escaramuçou em Piratini contra forças do general Guerreiro Vitória, forte de 600 homens. Pressionado ocupou o divisor Piratini-Canguçu, evitando assim que o adversário, ao invés de rumar para Canguçu se dirigisse a Camaquã. Foi eleito intendente de 1896-1900 e após para o quatriênio 1905-1908, interrompido por sua morte no primeiro ano.

Das inumeras manifestações de pesar por sua morte, registro a seguinte, de autoria do professor Eduardo Wilhelmy (62): "O nome de Leão Terres pode ser repetido por todos sem ódio nem rancores. Foi generoso, condescendente e leal mesmo com os que com ele divergiam. Amou sua família com extremado afeto. Dedicou os seus serviços à terra que lhe serviu de berço. Foi bom, prestativo e humanitário para os necessitados e aflitos. Ao dizer adeus a este mundo deixa eternas saudades".Fez a oração fúnebre do coronel Leão Terres, o coronel Genes Gentil Bento.

Sexto: Coronel Genes Gentil Bento (1ª vez)

Teve a auxiliá-lo o Conselho Municipal integrado pelos seguintes nomes, a concluir por foto da época (63):

Antônio Florêncio Duarte, José Albano de Souza (64), Antônio Barbosa e Nicolau Dutra.

CANGUÇU EM 1905 SEGUNDO WILHELMY

 

O professor Eduardo Wilhelmy no final de 1905 publicou trabalho sobre o título: "Vila de Canguçu – Descrição Geográfica (65)". Ele escreveu em certo trecho, para caracterizar a recessão e retrocesso econômicos atravessados por Canguçu após a Revolução de 93. "O escritor dessas linhas conhece a vila desde 1869, quando pela primeira vez aqui chegou em suas viagens pelo Estado.

Depois de sua estada ali, como fotógrafo viajante, ainda visitou a maior parte das vilas e cidades do sul. Porém, exceto Bagé e Jaguarão, achei que Canguçu era a Vila mais animada dentre todas. Uma alegre e laboriosa população a habitava e todos os estancieiros de importância tinham casas na vila que habitavam, senão sempre, pelo menos o maior tempo do ano. E hoje? De todas estas famílias muito poucas restam morando aqui. Vários chefes já morreram e outros se mudaram para o Uruguai e Pelotas, etc... Suas casas se vão desmoronando desde o tempo da Revolução de 93. Outros venderam suas casas por menos de terça parte do custo. Lembro somente a do falecido Horácio Piegas que a intendência comprou por 12 contos de réis, quando este palacete custou uns 38.

E finalizava: "O vagaroso progresso que se nota na vila e município contrasta com a inteligência geralmente bem notável de seus habitantes. Em um meio acanhado, longe dos centros populosos, muitos caracteres não se definem, muitas inteligências permanecem ocultas. Vêmo-lo pelos muitos filhos daqui que hoje, noutros pontos, Pelotas e Porto Alegre, ocupam posição digna na sociedade, já por sua ilustração, já por sua atividade nos cargos públicos e particulares que bem desempenham".

O professor Wilhelmy era natural de Stetin, Alemanha. Ligou-se inicialmente por casamento à família de Jacob Rheighantz, o colonizador de São Lourenço. Manteve o prestigiado e moderno Colégio Osório em Pelotas a partir de 1880 noi regime de internato, no qual adotava revolucionário e moderno processo de ensino, segundo Fernando Luiz Osório (66), "incluindo a abolição dos castigos corporais".

Foi professor e líder religioso protestante na Flórida, em Canguçu, onde preparou a primeira geração de canguçuenses com curso universitário. Médicos: Drs. Luiz de Oliveira Lessa, Paulo Mesko que foi diretor do Hospital da Polícia Militar de São Paulo, Teófilo Mattos e o jurista e mais tarde desembargador Cândido Correia de Paiva (67).

Possuo retrato de Firmina Percilia Moreira, nossa avó tirado por esse fotógrafo no término da Guerra do Paraguai. E muitas outras fotos da época foram por ele tiradas. Angelp Moreira O estudou no Diário Popular, Pelotas, 15 out. 1981.

 

Nota: Estivemos em Canguçu em 16 e 17 de abril de 2004,onde inclusive realizamos um agradável passeio de moto ao longo do itinerário CANGUÇU- POSTO BRANCO- ESTAÇÃO DE RADARES- DESCIDA PELA ESTRADA DAS TROPAS -ESTRADA DA PRODUÇÂO- EDÁGIO- ILA DOS CAMPOS- RETORNO PELA ESTRADA VELHA A CANGUÇU. Percorremos em longas caminhadas matinais as ruas de Canguçu. E de tudo nos ficou a surpreendente impressão de que Canguçu havia retomado em progresso o que Eduardo Whilelmy havia constatado antes da malfadada Revolução de 93.Notei quanda diferença entre o Canguçu de 1983 quando lancei a 1ª edição deste livro com o Canguçu de 21 anos mais tarde .Votos de que Canguçu progrida bastante e principalmente culturalmente .Pois ele merece

CANGUÇU EM 1908 – SEGUNDO LASSANCE CUNHA

 

O autor citado, em obra específica sobre o Rio Grande do Sul (68), fornece os seguintes dados sobre Canguçu: População: total 25.000, da Vila 1.200 (falho) e Densidade 10 hab/km. Valor da terra 50.000 réis a légua quadrada. Casas de comércio no município 86 com um capital total de 120 contos. Arrecadação: Federal – 85 contos, Estadual – 48 contos e Municipal – 36 contos de réis. O rebanho do município contava com: Vácuns – 150.000; cavalares – 30.000; muares – 6.000; lanígero – 10.000; suínos – 25.000 e caprinos – 10.000.

O arroz estava sendo plantado no Bom Será. O autor citado revela o agricultor e inventor canguçuense Joaquim Mendes da Motta que em 8 anos havia selecionado o trigo Brasil, o único a receber medalha de ouro na última exposição estadual, além de ter sido premiado na referido certame com os inventos: Cultivador dos Campos e Horticultor Brasileiro. Joaquim era casado com Cecília, filha única do citado professor Wilhelmy, hoje patrono de cadeira na ACANDHIS.

No final de seu trabalho registra o projeto ferroviário Capapava – Minas de Cobre – Rio Camaquã – Canguçu – Pelotas não concretizado, mas talves viável doravante com a crise energética, com uma versão ferroviária da Estrada da Produção Sul.

 

Sétimo: Coronel Genes Gentil Bento (2º vez)

Tomou posse em 23 de junho de 1908, após a eleição, continuando no cargo que exerceu por três anos no impedimento de seu titular.

Com apoio em foto tirada, em 7 out. 1910, na Chacrinha, de propriedade de Carlos Norberto Moreira, eram as seguintes as autoridades de Canguçu: Conselho Municipal: Antônio Florêncio Duarte (69), José Ribeiro de Souza (70), José de Souza Oliveira (71), Bento Claro Cunha (72), Luiz Ferreira Porto (73), Belarmino Pereira de Moraes e Gregório Estevam Motta (74).

Juízes: Dr. Cézar Dias – de Comarca e Dr. Eufrasio Mário de Oliveira – Distrital. Promotor: Manoel R. Rodrigues do Prado. Notário: - Conrado Ernani Bento (75). Delegado de Polícia: - Ângelo Marques de Souza. Secretário do Intendente: - Ciro Mattos Moreira (76) e professor João Gualberto Pinto Bandeira (77).

Este intendente produziu relatórios de suas administrações dos quais encontrei referências no catálogo de autores da Biblioteca Rio-Grandense, em Rio Grande, não os encontrando no local, em 1973. (78)

O juiz Dr. Cézar Dias Atingiu o mais alto posto na magistratura rio-grandense. (79)

 

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Figura: CONSELHO MUNICIPAL DE CANGUÇU EM 1905. Identificados: 1 – Cel

Genes Gentil Bento – intendente; 2 – Antônio (NIco) Duarte – Presidente do Conselho; 4 – Avelino Luz – Fundador da Imprensa em Canguçu; 8 – Democrata Prestes (conselheiro); 9 – Antônio (Tita) Barbosa; 10 – Nicolau Dutra; 11 – José Albano de Souza. Outras Identificações: 17 – Conrado Ernani Bento aos 17 anos e 12-16 – integrantes da Guarda Municipal. 23 – Salão Nobre da Prefeitura. (Fonte: Arquivo Foto "Conrado Ernani Bento").

Oitavo: Coronel Genes Gentil Bento (3ª vez) (80)

Foi reeleito e empossado em 1912, ano em que Canguçu comemorou festivamente o centenário da Criação da Freguesia de Canguçu, por ato de D. João IV.

A convite do intendente Genes Gentil Bento o então jornalista J. Simões Lopes Neto e hoje nosso maior escritor regionalista, produziu histórica reportagem sob o título "O Município de Canguçu – Bosquejo Histórico", que foi publicado as páginas 55 a 64, do nº 4 da Revista do Centenário de Pelotas (81) e até hoje a mais importante fonte hiatórica de Canguçu.

Realizou reportagem fotográfica da vila de Canguçu o fotógrafo e tipógrafo Rafael Crecco. Reportagem traduzida em artísticos álbuns, hoje fonte histórica de grande valor (82). Rafael Crecco liga-se às origens do cinema de Canguçu.

Segundo a reportagem citada, Canguçu possuía uma população de 30.000 habitantes sendo 600 na sede, distribuídas em 200 residências sujeitas à taxa predial. (83)

Segundo Simões Lopes Neto, os dados que obteve lhe foram fornecidos pelas seguintes pessoas conforme registrou e agradeceu: "Com o concurso dos estimados anciãos: Querino Picanço, Graciliano Carvalho, Manoel Medina e outros, contemporâneos e figurantes de muitos acontecimentos e, do lúcido espírito dos senhores João Paulo Prestes, Martiniano Lafuente e Carlos Norberto Moreira, bem como da tenaz e vigilante inquirição do Sr. coronel Genes Gentil Bento, do Sr. César Dias, padres José Bem e Eeffel, Dr. Erico R. da Luz, Theóphilo Moreira (84), João Miguel de Moraes e tantos outros dedicados auxiliares, pudemos coligir e registrar o que fica por estas despretenciosas páginas. A todos os nossos melhores agradecimentos". (85)

Portanto, a J. Simões Lopes Neto, além de outros tantos títulos, cabe o de preservador da memória de Canguçu. Pois, não fora esta reportagem, aquela memória estaria bastante comprometida.

A parte fundamental da reportagem de J. Simôes Lopes Neto sobre as origens de Canguçu é de autoria do filho ilustre de Canguçu e seu instalador em 1857, Comendador José Manoel Gomes de Freitasm destacado historiador rio-grandense e filho ilustre de Canguçu, conforme o prova seu batistério. (86)

Data desta época o acesso a Canguçu pela direção da Estrada da Produção. Antes era feito por leste e por sudoeste. Segundo a tradição, o acesso foi aberto para obrigar os veículos a passarem pelo interiopr da vila, sem condições de desviá-la para sonegar impostos devidos à municipalidade.

Em 1915, com o apoio de sua administração, reiniciou a construção da torre norte da Igreja, que foi concluída em 1917.

Nota: Na Bibiblioteca Rio Grandense ao consultar seu catálogo fomos informados da existência ali dos relatórios anuais do intendente Cel Genes Gentil Bento. Os solicitando para consulta fomos informados que eles dali foram retirados pelo Dr Osvaldo Muller Barlem para elaborar o seu discurso comemorativo do centenário do município de Canguçu. E nesta ocasião ele já havia falecido e se extraviado lamentavelmente os referidos relatórios como preciosas fontes de História de Canguçu. Genes Bento deixou um arquivo pessoal encadernado que iniccialmente ficou com o seu filho Antônio Bento e ao este falecer ficou com o seu neto Ernani Bento Zanota que nos transferiu e entregamos a guarda de seu neto José Moreira Bento cuja esposa ocupa a cadeira Cel Genes Gentil Bento na ACANDHIS.

CHEGADA DO 1º AUTOMÓVEL EM CANGUÇU

 

O dia 6 de agosto de 1911 asssinalou a chegada do primeiro automóvel em Canguçu trazido, desde Pelotas, pelo intendente coronel Genes Gentil Bento, em pleno inverno.

Foi um Humber, cedido por empréstimo para aquele momento histórico pelo Dr. Plotino Duarte, médico pelotense. O auto veio dirigido pelo motorista Avendano.

Foi um dia de grande festa na comunidade. O automóvel desfilou entre a população formando alas, a partir da entrada da vila, na rua Silveira Martins, após transpor o passo da Olaria.

Parte da população, constituída em caravana, foi esperar o automóvel na Picada da Rosa que leva esta denominação desde o ano de 1876, quando ali morou José da Rosa. Contam os antigos que este foi o acontecimento que mais despertou a curiosidade popular. E que foram inúmeras as cenas cômicas que então verificaram, que incluíram desconfianças e temores determinantes de fugas, por ocasião da aproximação de tal engenho.

Acompanhava em outro automóvel, o coronel Genes Gentil Bento, o intendente de Piratini. Infelizmente ele chegou de breque à sua comuna, em conseqüência das condições precárias da estrada, não terem permitido a sua chegada de automóvel a Piratini.

Em 14 de Agosto, 3 dias após a chegada do Cel Genes, chegaram a Canguçu de automóvel os lustres excursionistas pelotenses, coronéis Pedro Osório e Antenor Cunha e o Dr. lldefonso Simões Lopes, que assim confirmaram aquela possibilidade.

Nono: Coronel Joaquim Maria Soares (86)

Tomou posse em 23 de julho 1916 no cargo de intendente para o qual fora eleito.

O coronel Joaquim descende dos Soares da Silva, primeiros povoadores de Canguçu. Foi durante 15 anos subintendente do então 2º distrito de Canguçu. Veterano da Revolução de 93, foi comandado do general lzidoro Fernandes. Aprisionado no cerco do Rio Negro, co9nseguiu libertar-se no combate de Sarandi, quando passou a servir na coluna do canguçuense general Hipólito Pinto Ribeiro.

O coronel Joaquim nasceu em 15 Janeiro 1854. Foi abastado estancieiro em Canguçu. Casou em 1890 com Ana Ribeiro Soares de cujo consórcio nasceu o capitão Antônio (Antoninho) Soares (87) que residia em São Lourenço do Sul e que atuara em Canguçu na Revolução de 23. Nestor Jost, ex-Presidente do Banco do Brasil, que foi delegado de Polícia em Canguçu em 1938, ligou-se por laços de famíli à do nosso biográfado.

 

Décimo: Coronel Avelino Borges

Assumiu em 1920 o cargo para o qual fora nomeado provisoriamente por indicação do então Chefe de Polícia do Rio Grande do Sul, ex-intendente Genes Gentil Bento.

Era natural de Encruzilhada do Sul. Foi destacado chefe republicano (88).

 

Décimo primeiro: Dr. Raul Azambuja (89)

Assumiu em 1921 por nomeação. Seu governo abrangeu o delicado período da Revolução de 23. Médico humanitário, participou ativamente da vida social em Canguçu, onde inclusive presidiu o Clube Harmonia. Era pelotense. Sob impulso da admiração que os canguçuenses lhe tributavam retornou a Canguçu na década de 50 onde clinicou por algum tempo.

Nota: Seu neto Flavio Azambuja Kremer tem muito escrito sobre a História de Canguçu local pelo qual devota grande afeição. Além disto coleciona preciosas fontes de História de Canguçu.

 

Décimo segundo: Coronel Orlando Cruz (90)

Teve como vice-intendente o Senécio Martins Cunha (91).

Orlando Cruz era natural de Canguçu (antigo Cerrito). Como capitão participou da Revolução de 93. tomando parte em diversas ações. Na Revolução de 23 integrou o Corpo Provisório de Pelotas, tendo se destacado no combate de Passo do Mendonça. Consta haver combatido no Cerro Partido, na entrada oeste de Canguçu, na Pacheca e em Canguçu-Velho e finalmente em Pelotas, onde teve de assumir o comando de uma unidade por morte em combate de seu comandante, ocasião foi promovido a major. A imprensa de Pelotas criou então uma legenda em torno de seu nome, em razão da coragem e bravura reveladas no comando de seu posto na Sociedade Agrícola, o único que não rendeu-se, em reação ao ousado feito do general Zeca Neto de conquistar Pelotas.

Em novembro de 1924 passou o governo para seu sbstituto. Promovido a tenente-coronel comandante do 19º Corpo Auxiliar da Brigada Militar.

Sua administração é sintetizada pelo jornal 20 de Setembro (92) de Piratini.

Nota: Nosso artigo Os 80 anos da tomada de Pelotas pelo GeneraL Zeca Neto na publicação do CIPEL de 2003 esclarece bem a sua atuação no episódio. Seu filho Juca foi oficial da Brigada Militar.

 

Décimo terceiro: Capitão Cyro Moreira (93)

Tomou posse em 20 de Setembro de 1928. tendo por Vice-Intendente José Claro Cunha, foi assessorado pelo seguinte Conselho Municipal (94): Francisco de Paula R. dos Santos; Pedro Celestino Dias; Pedro Moreira; Theofilo Moreira; Alteçor Almeida e José de Souza Oliveira, sendo os três últimos do Partido Lebertador.

Cyro Moreira interrompeu o seu mandato em setembro de 1930 para assumir as funções de Coletor Estadual, passando as de intendente a seu substituto – o último intendente de Canguçu, antes da Revolução de 30 que criou o cargo de prefeito.

Cyro Moreira foi secretário do Intendente Coronel Genes Gentil Bento, conselheiro municipal e coletor estadual, inclusive no vizinho município de São Lourenço do Sul. Retornando a Canguçu em 1945 foi candidato a prefeito.Era filho de Carlos Norberto Moreira e Firmina Matos Moreira, nossos avós maternos

Ao assumir a Intendência, o jornal 20 de Setembro desejou-lhe profícua gestão após referir tratar-se de : "Cidadão probo, espírito culto, ponderado, progressista, de quem o povo de sua terra muito espera, pois não lhe faltam qualidades de caráter comprovadas em longos anos de vida pública" (95).

REVOLUÇÃO DE 23 (97)

 

De fins de janeiro a 14 dedezembro de 1923, o Rio Grande do Sul e Canguçu por extensão, foram envolvidos pela Revolução de 23, denominada "Revolução de Cavaleiros" em "razão da violência contra o adversário vencido, ter sido exceção, enquanto na de 93 fora quase regra", segundo estudiosos das mesmas.

Foi a Revolução do período republicano que mais envolveu diretamente Canguçu.

Suas causas remotas ligam-se a divergências entre Júlio de Castilhos que conseguiu ver aprovada a Constituição de 91 do Rio Grande do Sul, se inspiração positivista, contra o ponto de vista de Assis Brasil. Suas causas próximas ligam-se à eleição, pela 5ª vez consecutiva, à Presidência do Rio Grande do Sul, do Dr. Antônio Augusto Borges de Medeiros. A oposição, liderada por Assis Brasil, imaginou a seguinte estratégia:

Desfechar uma guerra de guerrilhas contra o Governo Estadual, criando o clima ideal para o Presidente da República Arthur Bernardes, para cuja eleição Borges de Medeiros fora contra, intervir no Rio Grande do Sul e pacificá-lo a custo da queda de Borges.

Arthur Bernardes chegou à Presidência com forte reação militar. Agindo com prudência, declarou-se neutro e atuou no sentido de pacificar o Rio Grande, o que fez através do general Setembrino de Carvalho, então Ministro da Guerra. Militar que fora comandado, como capitão de Artilharia, no combate de lnhanduí pelo vencedor do mesmo – o canguçuense general Hipólito Ribeiro, pai de Hipólito Ribeiro, que atuará em Canguçu nesta revolução como se verá.

Caso fracassassem as gestões do general Setembrino, Arthur Bernardes transferiria o problema ao Congresso.

Os revolucionários e legais partiram para as coxilhas e para as serras do Caverá, do Herval e dos Tapes, dispostos a lutarem por suas verdades de arma em punho: Os revolucionários, pela revogação da Constituição de 91 e derrubada do Presidente do Estado. Os legais, pela defesa da lei, da ordem e da legitimidade de mandado do Presidente do Estado.

Esta Revolução teve as seguintes conseqüências: o Presidente do Estado permaneceu; o governo Federal não interveio; ficou proibida a reeleição do Presidente do Estado e a designação por este do vice-presidente; os revolucionários foram anistiados; a minoria assegurou sua representatividade no plano federal e estadual; o processo eleitoral evoluiu, sem, no entanto, adotar o voto direto; criou-se condições de união dos rio-grandenses em torno de uma candidatura à Presidência do Brasil, concretizada na Aliança Liberal que votou em Getúlio Vargas e esteve unida na Revolução de 30, "ou de pé pelo Rio Grande"; reforma da Constituição do Rio Grande, escoimando-a dos pontos mais atritantes que originaram as divergências Assis Brasil – Júlio de Castilhos. Embora os revolucionários não tenham sido vitoriosos no campo militar, venceram no campo político, com o aperfeiçoamento resultante de suas lutas.

Nesta revolução se fez presente a tradição rio-grandense de Firmeza e Doçura, ou um retorno ao espírito dos farroupilhas simbolizados, pelos dois amores-perfeitos em seu brazão. (98) Ou seja, no combate ou na tribuna lutar com firmeza, bravura e garra. Depois do combate, respeito à vida, à família, à honra e à propriedade do vencido. O general Osório foi um símbolo e uma das maiores expressões do gaúcho histórico firme e doce.

Esta revolução possuiu uma interessante característica, qual seja a de guerra psicológica, traduzida pelo exagero das ações militares, quanto aos efetivos em presença, baixas e vantagens táticas e estratégicas. Na falta de armas recorreu-se ao movimento, evitando-se o combate. Nas cidades, os jornalistas revolucionários, através da Imprensa, se encarregavam de conduzir a guerra psicológica sobre o governo Central o do Estado e Povo do Rio Grande.

REVOLUÇÃO DE 23 EM CANGUÇU (99)

 

Em Canguçu serão seus maiores protagonistas dois de seus filhos. Do lado revolucionário José Antônio Mattos Neto, consagrado como Zeca Neto, sobrinho do general Antônio Neto, Proclamador da República Rio-Grandense em Seival, (100) e neto de Antônio de Souza Mattos, um dos primeiros povoadores de Canguçu. (101). Do lado governista, o Cel. Juvêncio Maximiano Lemos, em verdade, da família Nunes Garcia.(102) Ambos eram veteranos da Revolução de 93, onde lutaram lado a lado, ombro a ombro e descendentes de veteranos farroupilhas, tanto os Nunes Garcia quanto os Mattos Neto. (103) Quando o general Antônio Neto faleceu, seu sobrinho Zeca Neto tinha 15 anos e votava-lhe grande admiração militar.

O primeiro, comandou o que denominou a 4ª Divisão do Exército Libertador e o segundo a 3ª Brigada Provisória, constituída de 4 corpos comandados pelos tenentes-coronéis José Lucas Martins, Francelisio Meireles, Alfredo Nunes Garcia e Hipólito Pinto Ribeiro, destacado chefe de Cavalaria no Paraguai e chefe militar de expressão na Revolução de 93. (104)

O efetivo previsto da 3ª Divisão Provisória era de cerca de 1.000 homens distribuídos em 4 corpos e o da Divisão Libertadora cerca de 200 homens. O cenário do confronto foram os municípios de Camaquã, São Lourenço, São Jerônimo, Canguçu, Piratini, Pinheiro Machado, Herval e Pelotas (105), ou mais propriamente a Serra dos Tapes, base no passado de guerrilhas de Rafael Pinto Bandeira contra os espanhóis e dos farroupilhas até 1844. Em razão disso, partidários de Zeca Neto, em momentos de exaltação romântica o chamaram de "Condor da Serra dos Tapes". Seus adversários ironicamente o chamaram de "Zeca Veado", em função da seguinte tática que adotou, para evitar um confornto armado com tropas mais numerosas, melhor organizadas, equipadas e instruídas e que não foi entendida e que assim interpreto.

Desenvolver uma guerra de guerrilhas, tirando o máximo partido da rapidez de movimento, do terreno dobrado cheio de cobertas e alternativas de itinerários, mudados de inopino e com freqüência e da segurança pelas informações sobre o adversário (informantes) escuta telefônica, etc.

Em Canguçu, Zeca Neto conseguiu a adesão do coronel João Paulo Prestes, veterano da Revolução de 93 e sobrevivente, como o coronel Juvêncio Lemos, do Cerco do Rio Negro.

OPERAÇÕES EM CANGUÇU – SÍNTESE (106)

 

1º Mar.: Zeca Neto ocupou Camaquã após o combate da Lagoa das Guampas, na barra do Arroio Velho.

2º Mar.: Neto ocupou Canguçu reforçado por contingente do local, chefiado por João Paulo Prestes, após reação do intendente Dr. Raul Azambuja que retirou-se para a Estação Cerrito. Na confusão foi ferido levemente, por um disparo acidental, Raul Soares então com 15 anos e depois advogado local.

24 Mar.: Após suprir, recompletar e remontar, a coluna Zeca Neto deixou a vila de Canguçu com destino a São Jerônimo.

28 Mar.: Entrou na vila em sua perseguição Juvêncio Lemos. Momento fixado em foto que integra arquivo de meu pai (107).

17 Abr.: Teve lugar o combate do Passo do Mendonça no qual perdeu a vida o ilustre canguçuense João Paulo Prestes. Este combate teve lugar após Neto ocupar Encruzilhada (3 Abr), São Jerônimo, Camaquã (14 Abr) e Dores de Camaquã (15 Abr).

18 Abr.: Após o combate acima, Neto atingiria a estância, em Canguçu, do coronel Francisco Mattos (108).

19 Abr.: Neto entrou em Canguçu pela segunda vez onde permaneceu três dias (109).

23 Abr.: O Corpo do Francelisio Meireles, depois de escaramuçaram, no passo do Pantanoso e na Coxilha do Fogo, com tropas de José Luiz Brizolara e Antero Pedroso de Oliveira, entrou na vila de Canguçiu.

7 Mai.: Revolucionários e governistas escaramuçaram, em Canguçu, na estância de Gabriel Borges.

7 Jul.: Em pleno inverno, Neto ocupou Canguçu pelça quarta vez após operar junção com Estácio Azambuja e ocupar Pinheiro Machado (9 Mai), Herval (29 Mai) e Piratini(4 Jul).

10 Jul.: Entrou em Canguçu o Corpo de Francelisio Meireles.

16 Jul.: Neto escaramuçou com tropas de Francelisio Meireles em Iguatemi e cemitério do Posto Branco. (110)

18 Jul.: Tem Lugar o combate do Cerro Partido a oeste da Vila de Canguçu. Neto estivera acampado entre o Arroio Coronilha e o Pantanoso e Francelisio na Estância de Antero Soares de Paiva, entre os Arroios Pantanoso e das Pedras.

19 Jul.: Após entrar, no dia anterior, em Canguçu pela quarta vez, Neto deixou Canguçu que foi reocupado por Francelisio.

30 Jul.: Camaquã foi bombardeada por um avião pilotado por Noêmio Ferraz. No dia seguinte Neto entrou nesta localidade.

8 Ago.: Neto transpôs o Passo da Pacheca no rio Camaquã e rumou para Canguçu.

14 Ago.: Teve lugar em Canguçu-Velho, sede da antiga Feitoria Real do Linhocânhamo do rincão do Canguçu (1783-1789), o mais violento combate, entre Neto e corpos dos tenentes-coronéis Nunes Garcia e Hipólito Ribeiro, que será estudado mais adiante.

15 Ago.: Após Canguçu-Velho, Neto foi operar em Pinheiro Machado e no município de Bagé, fazendo junção pela segunda vez com Estácio Azambuja, descendente de um dos primeiros povoadores de Canguçu, o coronel Jerônimo de Azambuja.

7 Set.: Encontro da Atalaia, no Rincão dos Cravos, próximo ao passo do Acampamento, entre Neto e Hipólito Ribeiro.

7 Out.: Encontro entre Neto e Francelisio no arroio Sutil e passo Mariazinha do Camaquã, em Canguçu.

15 Out.: Escaramuças entre Neto e Francelisio no passo Bom Será do Camaquã. Neste dia, Adolfo Barbosa Brockmann ocupou Canguçu. (111)

29 Out.: Tomada de Pelotas por Neto, o último e mais ousado feito dessa revolução. Neste evento histórico destacou-se, do lado do governo o canguçuense capitão Orlando Cruz, comandante da força que defendia a Sociedade Agrícola, o único reduto que não rendeu-se. Este local ficava onde foi construído o Entreposto de Leite em Pelotas, no hoje Largo do Vernetti, legalista que tombou morto naquele local.

3 Nov.: Neto ocupou a Vila de Camaquã, após 8 meses de operações sem ser alcançado, e por haver realizado o ousado feito de grande repercussão psicológica – a conquista de Pelotas onde se reequipou, e se rearmou. Aí veio alcançá-lo o armistício de 7 de novembro. Em 14 de Dezembro foi celebrada a Paz de Pedras Altas.

COMBATE DO CERRO PARTIDO (18 JUL)

 

Teve lugar na entrada W de Canguçu. Neto partiu das nascentes do arroio Coronilha e tomou posição no Cerro Partido, entre o balneário João Paulo e a antiga Estrada das Tropas. Francelisio veio da estância de Antero Soares de Paiva. O choque teve início com os governistas tomando posição na altura da estrada defronte ao Sindicato Rural atual, onde próximo existe a sepultura de um morto nesta ação. Francelisio avançou e quase ocupou o Cerro Partido na tentativa de envolver a direita de Neto. Este, pressionado retraiu pela estrada das tropas na direção de Cerro do Baú, depois de 8 horas de escaramuças. Neto perdeu aí o tenente Gomercindo Escobar Duarte. (112)

O local onde se deu este combate é no orográfico das bacias do Piratini, Camaquã e Lagoa dos Patos. Quem estiver de posse desse conjunto, barra qualquer progressão vinda da direção de Piratini e através dos Passo das Carretas, Marinheiro, do Vao dos Prestes e da Armada no rio Camaquã. Aí Rafael Pinto Bandeira postou em 1777-78 a guarda da Coxilha Santo Antônio e, em 1843, Chico Pedro de Abreu fez suas trincheiras para cobrir-se naquelas direções, sendo atacado por Antônio Neto, tio de Zeca Neto que aí lutava.

Estas alturas barram todo e qualquer movimento que proveniente de Pelotas pretenda, através de Canguçu, atingir Piratini, Caçapava e Encruzilhada. A Geo-HIstória Militar tem confirmado sua importância. A área junto às nascentes do Pantanoso, historicamente tem servido para o acampamento de tropas militares desde a luta contra os espanhóis. Ela pertence hoje, na maior parte, ao Sindicato Rural.

A denominação de Cerro Partido remonta o período de guerra 1763-77 contra os espanhóis. Ela deriva do espigão que mergulha no antigo balneário João Paulo, ser partido a leste e apresentar-se como uma parede de pedra. È uma acidente muito característico.

Nota: Banho do João Paulo se refere a João Paulo avô dod srs Agobar e Baltazar( Macota) Duarte e não a João Paulo Prestes como se acreditava.

COMBATE DE CANGUÇU – VELHO (113)

(14 de Agosto 1923)

 

Neto acampou em Canguçu-Velho junto às ruínas do Mangueirão de pedra e sobrado que haviam pertencido à sede Real Feitoria do Linhocânhamo do Rincão do Canguçu. Ali esperava o major Adolfo Brockmann que com um piquete fora a Pelotas buscar armas e munições. A posição dominante é apoiada ao norte pelo cerro Canguçu. A leste era limitada por uma vegetação mais cerrada sobre elevações da Favila, último reduto dos índios Tapes e conhecida no tempo do Império por terra dos Tapes. Neste local justamente encontravam-se os corpos ao mando dos coronéis Garcia Nunes e Hipólito Ribeiro e uma fração do 5º BC da Brigada Militar, ao comando do capitão Campos Pacheco. A sentinela do acampamento de Neto notou certa movimentação na Fávila. Foi reconhecer o local o capitão Herculano Dutra, comandante da vanguarda, na certeza geral que era o major Brockmann que retornava. Ao mandar, o que julgava amigos, aproximarem-se teve lugar o início do combate sob a forma de tiroteio que logo a seguir generalizou-se, durando do meio-dia até o anoitecer, Neto retraiu com seus homens até às cercanias de Canguçu, reagrupando-os no Posto Branco. A fração mais duramente atingida foi a do major Herculano Dutra. Ao retrair combatendo, seus homens foram sendo abatidos em diversos locais da Fávila, até a velha Feitoria, onde alguns depois foram sepultados. Em 1957, Conrado Ernani Bento, mandou exumar os restos desses combatentes e colocá-los em cemitério especial ao lado da estrada defronte a casa de Ricardo Schellin. (114)

Os restos mortais dos revolucionários major Àlvaro Ribeiro Lemos e do tenente Jorge Edjalde foram sepultados no cemitério local e a guarda perpétua dos mesmos foi confiada ao povo de Canguçu (115).

Segundo MORAES, Victor, Reminicências de 23, Correio do Povo, Porto Alegre, 19 Set. 1981 (suplemento) com apoio em parte do Cel Hipólito Ribeiro, houve 22 mortos revolucionérios e 6 governistas. Entre os primeiros: major Àlvaro Lemos, de Pelotas; tenente Jorge Edjalde, de Porto Alegre; Àvila, de Pinheiro Machado. Entre os últimos mortos: sargento Anselmo e soldado João, mortos em Canguçu para onde foram transportados feridos e idem o sargento Ballejas falecido em Pelotas e, no local do combate, os soldados Barbosa, Viera e Luiz Nunes. Conclui-se que o combate de Canguçu-Velho provocou 28 mortos, sendo, portanto, o mais violento desta revolução.

Nota: Novamente escrevemos sobre este combate em 2003, com apoio nas Memórias de Zeca Neto, bem como na Revista do CIPEL 2003 - Os 80 anos da tomada de Pelotas pelo General Zeca Neto, integrando e interpretando diversas fontes, além de havermos abordado o assunto na História da 3a RM 1889-1953.

TENENTE-CORONEL JOÃO PAULO PRESTES

 

Comandou o contingente de Canguçu nessa revolução até tombar morto em ação, no combate de Passo do Mendonça, atingido por um balázio na fronte, ao carregar sobre uma posição adversária que punha em sério risco a vida de seus comandados. Era um homem justo, bom e idealista. Era sobrevivente do Cerco do Rio Negro, em Bagé, do qual escapou ao custo de grandes sacrifícios e sofrimentos. Comandou, em 1985, o 34º Corpo da Guarda Nacional local. Desde 1883, como secretário do primeiro Clube Republicano de Canguçu, sua ação comunitária foi destacada. Foi o vice-intendente e conselheiro municipal. Atuou muito na lmprensa local. Era líder maçon. Por ocasião da Gripe Espanhola, agigantou-se pelos desvelos que teve com "o risco da própria vida", com os canguçuenses atingidos por este mal. Deixou grande descendência. Seu nome ilustre merece uma homenagem que o imortalize na memória local. Está sepultado em Canguçu no mausoléu da família Prestes que tanto soube honrar e elevar. Era um bravo. (116) Serviu Canguçu durante 40 anos. o museu de Canguçu possui sua foto.

Nota: O Prefeito Conrado Ernani Bento entronizou sua foto no Salão de Honra da Prefeitura e agora integrando a Casa da Cultura. A homenagem que então lhe foi prestada foi registrada no Livro de Registro Histórico mandado abrir pelo citado prefeito e existente no Museu Municipal.

VETERANOS CANGUÇUENSES DE 23 (117)

 

Além dos citados e com apoio no Grupo Flor de Lácio:

Governistas: Antonio Soares, Antônio Coutinhop da Rocha, Hugo Motta e Francisco Andronico Mota (morto em Passo do Mendonça), Joaquim Carvalho Motta, Antônio Francisco Pinto, Celso Cardoso, Sílvio Rosa, Antônio Morales. (A relação é imcompleta).

Revolucionários: Juvêncio Prestes, Leonidas Damasceno, Leão dos Santos Terres, Alteçor Almeida, Adolfo Brockmann, Walter e Waldemar Oliveira Prestes, Djalma, José, Valdemar e Tarcílio Moreira Mattos (118), Mário Freitas da Silveira, Pedro (Pedrinho) Carvalho Motta, (119), João Alcídio Prestes e Maurício Luz . (A relação é imcompleta).

O LIVRO HISTÓRICO DA IGREJA E A REVOLUÇÃO DE 23

 

O padre Alberto Balaguer Valor, assim assinalou a Revolução de 23, no Livro Tombo da Igreja Nª.Sª da Conceição (120):

"Por temor ao bandido que me havia agredido e foi solto fui para Cerrito Velho (VIla Freire). A revolução estourou em março. Todas as forças, ao contrário da Revolução de 93, respeitaram a lgreja. Os combates foram travados nas coxilhas e não no interior da vila".

O padre fora agredido pelo espanhol Henrique dos Reis que na Espanha era casado com uma sobrinha sua. Foi um incidente grave ocorrido em 6 Jan. 1922, e relatado por "ARI EROM" (Firmo Moreira) (121), em 1957, no Àlbum do Centenário de Canguçu.

No citado livro de Tombo, o vigário Padre Bem havia feito o seguinte registro sobre a Revolução de 93:

"O padre foi afugentado da lgreja, que teve suas portas escancaradas e foi ordenado o saque em seu interior, onde, à guisa de cochoeiras, foram introduzidos cavalos" (122).

O padre em 93 era conhecido como Miguelsito.

Em 1843, o chefe legalista Chico Pedro havia respeitado a Igreja que inclusive restaurou com o auxílio dos soldados, seguramente seguindo orientação do mais tarde Duque de Caxias, seu comandante imediato. (123). A revolução de 93, batizada de "Revolução de Bárbaros", contrastou, pois, com as de "Cavalheiros", de 1835-1908, fez outras considerações em torno do possível destino dos terrenos doados em 1800 de Nª .Sª . da Conceição reduzidos, na época, a somente aos na qual ela foi erigida (124). È um mistério que não decifrei.

A História do Exército distinguiu a Coluna de Zeca Neto que atuou em Canguçu com duas fotos (125).

Segundo o coronel Hipólito Ribeiro, depois do combate de Canguçu-Velho onde teve espatifado seu binóculo por uma bala perdida, foi presenteado com os binóculos Lümor e Zeiss do major Àlvaro Lemos e do general Zeca Neto , sendo que o último pelo capítão Tertuliano Mota que mais tarde, nos anos 30, morreria em ação policial ao tentar prender Zifinho Fonseca, morto na ocasião.

Depois de redigido este trabalho conheceremos as Memórias de Zeca Netto. Palegre, Martins Livreiro, 1982, Elas foram objeto de artigo nosso sob o título – "Zeca Netto – traços de seu perfil militar" publicado em maio 83 no Diário Popular de Pelotas e comunicado em seções dos institutos Histórico e Geográfico Brasileiro e de Geografia e História Militar do Brasil com sedes no Rio.

Nelas Zeca Netto assinala a passagem por Canguçu, na Revolução de 93, de coluna do Cel. Claudio Savaget, mais tarde general comandante de uma das colunas que arraza Canudos na Guerra de mesmo nome, na Bahia. O artigo citado atualiza o presente trabalho.


 

CAPÍTULO 6 – CANGUÇU – DA REVOLUÇÃO AO CENTENÁRIO EM 1957

REVOLUÇÃO DE 30

 

Os republicanos e libertadores canguçuenses se uniram na Frente Ùnica em pról da eleição do Dr. Getúlio Vargas para a Presidência da República.

Para propagar as idéias da Frente Ùnica foi editado o semanário O Liberal, dirigido por Conrado Ernani Bento e Henrique de Souza Oliveira, tendo como redatores os Drs. Sisínio Bastos de Figueiredo, José Moreira Leivas, Ângelo Graña Garcia e Walter Oliveira Prestes. O referido jornal além de propugnar pelo candidato Getúlio Vargas, até a eleição do Dr. Júlio Prestes, passou a preparar os canguçuenses para a Revolução de 1930 que estourou em 3 de outubro, chefiada por Getúlio Vargas, contando com o apoio dos governos de Minas Gerais, Paraíba e vários núcleos do Nordeste, chefiados por Juarez Távora. Após 21 dias, o movimento estava vitorioso. Foi deposto o Presidente da República Washington Luiz. Em seu lugar foi investido o Dr. Getúlio Vargas e no Governo do Rio Grande do Sul, como interventor, o general Flores da Cunha. No dia 3 de Outubro o intendente Ciro Moreira, que havia transmitido o governo dois dias antes para o Vice-Intendente José Claro de Almeida, para assumir o cargo de coletor, recebeu telefonema que algo anormal ocorria em Pelotas e Porto Alegre. Dirigindo-se ao Telégrafo, seu agente comunicou-lhe haver recebido telegrama de Pelotas informando que a revolução rebentara simultaneamente em Porto Alegre, Pelotas, Bagé, Santa Maria e outros locais, tendo como chefe Getúlio Vargas e auxiliares Osvaldo Aranha e Flores da Cunha. A notícia foi comunicada à população que que a recebeu com grande satisfação. Logo após, o Vice-Intendente recebeu telegrama de Flores da Cunha comunicando-lhe haver assumido a Secretária de Estado e que a Revolução, vitoriosa no Estado, seguia sua marcha vitoriosa por todo o País.

Nos dias 4 e 5, representantes dos partidos Liberal e Republicano, identificados com a Revolução e seus ideais, fundaram a junta Revolucionária de Canguçu, integrada por três representantes de cada partido, em sua maioria integrantes da direção e redação do semanário O LIBERAL, órgão da Frente Ùnica. Foi a seguinte a constituição da Junta:

A junta, após fundada, passou a vigiar e fiscalizar hotéis, automóveis em trânsito e a censurar nos Correios e Telégrafos. Expediu circulares visando assegurar a ordem no interior e a impedir a formação de tropas por quem não estivesse autorizado por ela.Numerosos voluntários apresentaram-se à Junta Revolucionária para seguir com a Revolução. A Junta os colocou à disposição dos chefes do movimento que dispensaram o concurso por desnecessário. Fugiram de Canguçu com cavalo, armas e bagagens, os jovens Celso e Nélson Rodrigues para participarem do movimento. (7)

No dia 24 de outubro chegou comunicação à Junta Revolucionária de que o movimento estava vitorioso no Brasil.

O ponto de reunião de acompanhamento da Revolução foi na Agência dos Telégrafos onde seu agente Alberto Bandarra foi alvo de manifestação popular, pela solicitude e colaboração, além do dever, prestados às autoridades e povo.

A noite, a vitória da Revolução foi comemorada com um baile no Clube Harmonia, que então, mais do que nunca, fez juz a seu nome de Harmonia colocado logo após a Revolução de 93, para unir a família canguçuense dividida por aquela luta fraticida e agora unida pela Frente Ùnica

Em 24 de dezembro assumia a prefeitura Ulisses Coelho que fora nomeado por Flores da Cunha. Após quatro meses foi substituído por Conrado Ernani Bento, diretor de O LIBERAL e Vice-Presidente da Junta Revolucionária que governara Canguçu de 5 de outubro a 24 de dezembro de 1930.

Nota: Nelson e Celso eram filhos de Salvador(Vador) Rodrigues e de Isaura Bento Duarte e filha do primeiro matrimônio de Antônio (Nico) Duarte com uma filha do professor Antõnio Joaquim Bento e irmã do Cel Genes Gentil Bento,

PREFEITOS DE 1930 – 1957

 

Da Revolução de 30 até o centenário, Canguçu teve os seguintes prefeitos eleitos ou nomeados:

Primeiro: Major Ulisses Coelho

Assumiu em 24 Dez 30, provisoriamente. Era natural de São Pedro do Sul, onde organizara um batalhão revolucionário. Depois fiscalizou em Porto Alegre o 2ª BI da Brigada Militar. Residiu com sua família na Prefeitura.

Segundo: Conrado Ernani Bento

Foi nomeado prefeito em 23 maio de 1932, pelo general Flores da Cunha, interventor do Rio Grande do Sul e de quem recebeu integral apoio para dotar Canguçur de iluminação elétrica em 1933. Para auxiliá-lo contou com Conselho integrado por:Antônio Valente (8)Belchior Jacinto Dias (9)Gentil Goulart da Silveira (10)Nesta época instalou-se em Canguçu a atual Escola Normal N. S. Aparecida e o Sanatório do Dr. João Swintd.

INAUGURAÇÃO DA LUZ ELÉTRICA

 

Data do Império a iluminação pública do município. Sua iniciativa coube a Câmara de Vereadores, 1884-1888, composta por Francisco Medeiros, Bernardino Pinto Ribeiro, Patrício A. Puente, Gregório Motta da Luz e Miguel Jesus Vasque Filho. Mandaram adquirir em Pelotas 50 lampiões a querosene para a municipalidade e 40 para diversos moradores. *

Em 31 de dezembro de 1933, foi inaugurada solenemente a luz elétrica em Canguçu.O fato foi registrado com destaque pela edição de 3 de janeiro de 1934 do Diário Liberal de Pelotas (11) do seguinte modo:

"Para a inauguração solene da luz elétrica de Canguçu veio de Pelotas uma caravana presidida pelo Cel. Joaquim Augusto de Assunção, como representantes do general Flores da Cunha. Ela foi recebida à tardinha na entrada de Canguçu, pelo prefeito Conrado Ernani Bento e população em geral, depois do que dirigiram-se para a Prefeitura onde foi realizado um banquete. Falou na ocasião o Sr. Alberto Mattos Bandarra em nome do povo de Canguçu, tecendo elogios à obra administrativa e pessoa do major Conrado Ernani Bento e agradecendo ao general Flores da Cunha o apoio emprestado pelo Estado para a concretização daquela obra. A seguir o prefeito, Conrado Ernani Bento saudou o Interventor Federal, na pessoa do Cel. Joaquim Assunção. Este agradeceu e se congratulou com o povo de Canguçu pelo melhoramento introduzido pelo edil canguçuense.

A seguir o prefeito convidou o povo para assistir à cerimônia de inauguração, tendo o Cel. Joaquim Assunção cortado a fita inaugural e o prefeito Conrado Ernani Bento ligado a chave geral, ficando deste modo inaugurada a luz elétrica em Canguçu.

Discursaram nesta ocasião o Dr. Luís Simões Lopes Filho saudando a mulher canguçuense e o Dr. Walter Oliveira Prestes fazendo uma análise das possibilidades econômicas do município e encarecendo a construção da ferrovia São Pedro do Sul – Pelotas, tão fundamental ao progresso canguçuense".

A instalação da luz elétrica custou na ocasião à municipalidade a quantia de 200 contos de réis e o seu motor funcionou cerca de 20 anos sem grandes problemas até ser complementado por outro e finalmente encampado pela CEEE.

Prestaram seus serviços à Usina Municipal onde sacrificaram muitas das noites de suas vidas em meio ao barulho e a solidão entre outros: Antônio Casarin, João Escursione, Fritz, José Gonzales e Albino Rick.

Terceiro: Conrado Ernani Bento

Continuou no cargo para o qual fora eleito em 1935, mandato interrompido com o advento do Estado Novo.

Nota: Organizamos o Arquivo Conrado Ernani Bento que foi aapresentado a ACANDHIS em cerimônia fotografada em foto convite para a comemoração dos 15 anos da ACANDHIS

 

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Na foto anterior aparecem da esquerda para a direita Vanja Rocha Wiskow(secretária),Professora Marlene Barbosa Coelho(coordenadora), Corálio Cabeda, Gilberto Moreira Mussi (ex prefeito de Canguçu), Cel Cláudio Moreira Bento, (presidente da ACANDHIS) e Odilon de Almeida Meskó Prefeito de Canguçu. Sobre a mesa o Arquivo do Prefeito Conrado Ernani Bento em 4 volumes encadernados e hoje na cada de seu filho José Moreira Bento. No alto a esquerda o brasão da ACANDHIS elaborado pela sócia efetiva da ACANDHIS Maria da Graça Valente Silveira ao lado do prédio da Casa da Cultura onde se reune a ACANDHIS e hoje Casa da Cultura Marlene Barbosa Coelho como ato de justiça na voz da História.

 

Quarto: Dr. Jaime de Farias

Assumiu em 19 jan de 1938 o cargo de prefeito para o qual fora nomeado pelo interventor. Esta administração durou até 31 out de 1945, final do Estado Novo. Data de sua administração o conjunto Forum, Cadeia Civil, Delegacia de Polícia, Praça de Esportes Dr. Jaime de Farias, Grupo Escolar, etc. que é abordada pela Opinião Pública de Pelotas, 4 set de 1944.

ELEVAÇÃO DE CANGUÇU À CIDADE

 

Canguçu foi elevada a cidade, por Decreto nº 311 de 2 de março de 1938, do Presidente da República, Dr. Getúlio Vargas.

A cerimônia de instalação teve lugar em 1º de janeiro de 1939, obedecendo ao seguinte programa:

09:00 horas – Hasteamento do pavilhão nacional pelo prefeito, falando na ocasião o juiz distrital Dr. Fernando Pacheco (12). "Soprava o vento oeste". A cerimônia foi assistida por grande assistência popular.

09:30 horas – Missa campal defronte à igreja e oficiada pelo frei João Brower. Dirigiu o coral a madre Eustachia, diretora do então Colégio N. S. Aparecida.

10:30 horas – Cerimônia de intalação da cidade, no Salão Nobre da Prefeitura pela comissão presidida pelo Dr. João de Barros Cassal,( juiz de Direito) secretariada por Conrado Ernani Bento, como Notário e Oficial do Registro a Imóveis e integrada por Dr. Jaime de Farias, Prefeito Municipal, Dr. Fernando Pacheco, Juiz Municipal, Frei João Brower – (13) Pároco de Canguçu, Dr. Walter Oliveira Prestes – advogado, Dr. Raul Soares – advogado, Dr. José Mendonça – Diretor da Casa de Saúde Cristo Rei (14), Victor Petrucci – comerciante e José Albano de Souza.

Usaram da palavra o Dr. Barros Cassal 915, os advogados Walter º Prestes e Raul Soares. A cerimônia foi encerrada com a leitura da ata por Conrado Ernani Bento que após foi assinada por todos.

21:00 horas – Concentração popular defronte ao Clube Harmonia, ocasião em que foi lida a ata da instalação da cidade de Canguçu pelo Sr. Lúcio Rodrigues, secretário do prefeito. Foi feita ampla cobertura fotográfica por Egídio Camargo e a situação de Canguçu na época foi abordada em reportagem pelo Diário Popular.(16)

Figura a seguir : 1- ELEVAÇÃO DE CANGUÇU À CIDADE;Cerimônia de elevação de Canguçu à cidade em 1939. Da esquerda para a direita: Conrado Ernani Bento – Notário, lendo a ata alusiva ao ato; Dr. Jaime de Farias – Prefeito Municipal; Dr. Barros Cassal – Juiz Municipal.

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2- Semana da Pátria – 1943. Aspecto do desfile do Colégio N. S. Aparecida na rua da Igreja que conservava ainda seu aspecto imperial. O conjunto arquitetônico Igreja e sobrado, ao lado (1861) despertaram a atenção do governador Ildo Meneghetti e comitiva. O autor é tamboreiro que aparece por último. (Fonte e Foto: Arquivo Conrado Ernani Bento)

 

Dec. Municipal nº3 de 30 de jul 38 estabeleceu os seguintes limites das áreas urbanas e suburbanas da cidade de Canguçu:

"Art. 1º - Fica estabelecida como àrea urbana da cidade de Canguçu a compreendida entre os dois arroios que a circundam pelos lados Leste e Oeste. Partindo do ponto de confluência dos referidos arroios, no Moinho de Dona Florência, segue pelo arroio de lado Leste até encontrar a sua nascente no potreiro de herdeiros do casal de José Francisco Jorge, deste ponto por uma linha reta até a estrada geral até enfrentar a casa onde funciona o Colégio N. S. da Aparecida, daí em linha reta encontrar Cacimba de Ouro e deste ponto segue pelo arroio de Oeste abaixo até o ponto de partida na confluência dos dois arroios.

Art.2º -A área suburbana da cidade de Canguçu tem por limites uma linha que partindo das pontas da cancha na estrada que vai a Iguatemi, na divisa das propriedades dos herdeiros do casal de José Francisco Jorge e João de Loreto Jacondino, daí uma linha reta até o encontramento das três estradas que vão ao Arroio do Moinho, Colônia São Manoel e cidade de Pelotas, por esta até o encontramento da estrada que partindo da sede vai também a Pelotas, por esta até o seu encontramento na estrada que vai a Piratini, por esta até o travessão que liga essa mesma estrada à estrada de Iguatemi e por esta até o ponto de partida ". (17)

Nota; Acima aparecem os nomes de José Francisco Jorge e João Loreto Jacondino .Os dois são troncos da famílias canguçuenses Jorge e Jacondino

CANGUÇU NA ELEVAÇÃO À CIDADE (18)

 

Área: 409.093 Km dos quais 217.090 usados na pecuária, 192.003 na agricultura e 35.000 mais ou menos recobertos de matas. População: 60.000, sendo 3.000 na cidade. Em cerca de 8.000 estabelecimentos agrícolas estima-se foram produzidos:

Em sacos: 70.000 de batatas; 30.000 de trigo; 80.000 de milho e 15.000 de feijão.

Em arrobas: 50.000 de alpiste; 50.000 de fumo e 30.000 de cascas (curtir).

Em quilos: 50.000 de piretro; 30.000 de manteiga e 1.000 latas de mel. O rebanho era estimado em 150.000 bovinos, 30.000 eqüinos, 2.000 asininos, 30.000 ovinos, 2.000 caprinos e 20.000 suínos.

O municipio possuía 3 torrefações de café, 4 fábricas de manteiga, 2 pequenas de conservas, 3 de beneficiar fumo, 15 moinhos de grãos, 1 fábrica de pó de mosquito, 17 olarias, 30 ferrarias e 210 casas de comércio. A lavoura possuía 38 trilhadeiras a motor e 4 a força animal.

Iniciou a funcionar a Casa de Saúde Cristo Rei sob a direção do Dr José Mendonça, depois de interrompida com a ida do Dr João Swindt para a Alemanha em função da 2a Guerra Mundial.

CANGUÇU EM 1942

 

Canguçu foi visitado em 8 março 1942 pelo interventor federal do Rio Grande, general Osvaldo Cordeiro de Farias, que pouco mais de um ano depois comandou a Artilharia Divisionária da FEB na Itália, Sua visita foi registrada por ampla e elucidativa reportagem fotográfica publicada pelo Diário Popular (19), 17 maio 42, p. 7, constando arrecadação, produção agrícola e pecuária e ex-titulares da comarca.

O interventor lançou a pedra fundamental do Grupo Escolar (20) e do Forum.

Releva nesta reportagem o trabalho de saneamento e fiacalização realizado pelo Posto de Higiene nº 11 local, que mudou a face de Canguçu quanto a medidas sanitárias. Fato que testemunhamos em criança como de grande relevância e que tributamos ao general Cordeiro de Farias. Relatório do Posto registrava: População de Canguçu: - 60.000, dos quais cerca de 2.000 na sede habitando 287 prédios dos 319 existentes. Dos 23 vagos, o estavam por imposições do regulamento sanitário, sendo que 9 foram condenados pela Higiene. As privadas primitivas foram substituídas por fossas biológicas de diversos tamanhos e tipos que atendiam 319 prédios. Foram eliminados da área urbana criações de suínos, cavalares, vacuns e modificados substancialmente os padrões sanitários das casas comerciais, particularmente açougues, padarias e tambos de leite.

Antes, com freqüência, havia grande incidência de tifo, coisa que nos enchia de medo. O papel educativo do ponto de vista sanitário desse Posto de Higiene foi de grande relevância, embora na época bastante combatido por contrapor-se a costumes tradicionais. Foi seu primeiro diretor o Dr. Joaquim Barros Coelho. (21) Enfim Canguçu passou por uma revolução sanitária, coisa que assisti, em Pernambuco, a 60 Km ao sul de Recife e junto a BR 201, somente 28 anos após, na terra do interventor que visitava Canguçu e que seria por ele governada após.

2ª GUERRA MUNDIAL

 

De 1939-45 teve lugar a Segunda Guerra Mundial que ao seu final contou com a participação bélica do Brasil através de sua FEB.

Muitos canguçuenses atravessaram o Atlântico para combater na Itália, terra de Garibáldi seu reunificador e que na Revolução Farroupilha esteve em Piratini e Canguçu (22).

Dentre os 21 bravos rio-grandenses que tombaram na Itália, em defesa da Liberdade, figuram dois canguçuenses que representam cerca de 10% das perdas do Rio Grande do Sul.

São eles:

Soldado Hortêncio da Rosa do 1º RI

Filho de João Pedro Rosa e Jovelina Matias. Tombou em ação em Zoca – Itália em 22 Abril 1945. Foi agraciado com as medalhas: Campanha da Itália, Sangue do Brasil e Cruz de Combate de 2ª Classe. Sua unidade na época é o tradicional Batalhão Sampaio, do Rio.

Soldado Izidoro Matoso do 6º RI

Filho de Gregório Matoso e de Augusta Matoso. Ferido em ação faleceu em 15 de abril 1945 em posto de Tratamento a menos de um mês do final da guerra. Foi agraciado com as medalhas: Campanha da Itália, Sangue do Brasil e Cruz de Combate de 2º Classe. Seu nome está inscrito em bronze em monumento no quartel de Caçapava – SP, o atual 6º BI Mtz.

Eles incorporaram no então 9º RI de Pelotas, atual 9º BI Mtz – Batalhão de Tuiuti.

Os restos mortais de ambos encontraram-se sob o Monumento dos Mortos da II Guerra Mundial, no aterro do Flamengo, no sexto e nono conjuntos de túmulos, a contar da entrada, conforme localização que procedi em 1968. Sobre este monumento o Papa João Paulo II rezou missa no Rio de Janeiro.

As conseqüências da guerra na comunidade foram sentidas pelos racionamentos de luz e de gasolina. Pelo racionamento da última, a adoção do transporte automóvel a gasogênio, incluindo o que fazia a linha de Canguçu – Pelotas.

Ao final da guerra o jornal Opinião Pública de Pelotas noticiou o desenvolvimento da vila dos Campos, fundada em 1883 por Abel Machado de Campos (24), pai de Abel e Sabino Soares Campos.

Nota :Acabamos de reeditar livro As Forças Armadas e a Marinha Mercante do Brasil na 2a Guerra Mundial que serve de moldura para melhor se comprrender o esforço e sacríficio destes dois filhos de Canguçu que assim seriam vistos pelo grego Péricles; Aquele que morre em defesa da sua pãtria faz mais por ela naquele instante que os demais em todas as suas vidas.

A ATERRAGEM DO 1º AVIÃO DE CANGUÇU

 

Consta, que a partir de 1928, começaram a cruzar os céus canguçuenses os primeiros aviões.Este fato no início, como não poderia deixar de ser, causava grande curiosidade, levando todos à rua, principalmente por ocasião de vôos razantes.

"Em 16 de Dezembro de 1941, o piloto Fonseca tentou aterrizar na pista improvisada na frente da casa de Firmina Matos Moreira, minha sogra. Não fez por falta de largura suficiente na pista devido ao vento lateral leste reinante na manhã desse dia", segundo anotou Conrado Ernani Bento em foto do vôo razante do referido aparelho.

Em 15 de julho de 1945, aterrou em Canguçu o primeiro avião, fato que foi assim descrito em carta ao autor por seu piloto, o Dr. Osvaldo Muller Barlém, então Juiz de Direito de Canguçu e em 28 de maio de 1957, em resposta a várias questões por mim formuladas relativas a sua atuação em Canguçu. "Minha primeira aterrisagem em Canguçu, foi a 15 de julho de 1945, conforme minha caderneta de vôo. Viajei direto de Rio Grande a Canguçu. O avião era um "Aeronca", tipo turismo, então com motor de 65 HP e prefixo PPGA. Levei uma hora entre a Base Aérea de Rio Grande, na chemada Ilha Antônio Pradel, até a cancha de carreiras na propriedade da viúva Firmina Moreira. Fui pela manhã e voltei à tarde".

Na segunda aterragem do Dr. Barlém, o avião teve ao final da pista a ponta da hélice partida em conseqüência de um pequeno acidente em pista precária, agravada por vento desfavorável.

A tarde, após a hélice ter sido remendada pelo carpinteiro Lolito, um surdo-mudo, foi tentada a decolagem. Porém tão logo o avião iniciou sua corrida o remendo se desfez. Em conseqüência o avião desviou seu itinerário e cresceu sob o povo que o assistia, causando pânico e correrias sem vítimas a lamentar. O avião conseguiu levantar cerca de dois metros, e foi cair em cima de um galpão, onde estatelou-se sem danos para seu piloto. Dias depois a aeronave retornou via rodoviária para Rio Grande.

Nesta ocasião, ao convidarem por brincadeira um gaúcho canguçuense para fazer parte do Aeroclube de Canguçu, a ser fundado, atribuíram-lhe o seguinte comentário:

" – Não conte comigo, amigo! eu sou meio protestante destas coisas.E lhe digo mais! Isto só vai ter serventia para este povo se desgraçá. Não ve que outro dia aquele tal de "treco treco" quando foi arçá vôo, ficou tafoneiro, pendeu prum lado e foi cair bem em riba de um galpão. E isto para a sorte do Dr. Barleim, senão ele andaria inté hoje lá em riba, só na volta no más, tal qual oveia abichada na oreia".

Posteriormente os canguçuenses Newton e Nilson Prestes e Alaor Nunes Rodrigues praticaram por algum tempo pilotagem.

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Figura: CHEGADA DO 1º AVIÃO EM CANGUÇU – 1945. Foto histórica vendo-se ao fundo defronte o avião de gorro de couro e lenço de pescoço o Dr. Osvaldo Barlém, tendo a sua esquerda, ao centro, seu amigo Conrado Ernani Bento a cujo arquivo pertence a foto.

CAMPANHA ELEITORAL 1951.Campanha Eleitoral para prefeito em 1951, vendo-se em primeiro plano voltados para a objetiva e da esquerda para a direita:Dr. Victor Bachieri, ex-prefeito de Pinheiro Machado e mais tarde Deputado Federal; Joaquim de Deus Nunes, mais tarde o primeiro canguçuenses a ser deputado estadual e Conrado Ernani Bento. Os três disputaram a Prefeitura em campanha de alto nível e em eleição muito disputada. Com a mão na cabeça, o deputado Arthur Bachini. (Foto: Arquivo Conrado Ernani Bento).

Quinto: Dr. Osvaldo Muller Barlém

Assumiu o cargo de Prefeito na condição de Juiz de Direito.

O Dr. Barlém era natural de Rio Grande. Formou-se em Direito em 1929 em Porto Alegre. Tomou parte na Revolução de 30 nas forças do capitão Alcides Etchegoyen, tendo participado de combates em São Paulo. Foi Juiz Distrital em Rio Grande. Depois foi juiz de Direito, função que o trouxe a Canguçu. Desenvolveu intensa atividade como conferencista, jornalista, escritor e tradicionalista. Foi Prefeito de Canguçu por alguns meses após a queda do Estado Novo em 1945. Segundo declarou em carta, sua administração "tratou de amparar as classes pobres, entre elas o operariado da Prefeitura, cujos salários eram muito baixos". Foi deputado estadual em 1959, ocasião que assumiu a Presidência da Comissão de Constituição e Justiça e em 1967 presidiu a Comissão de Reforma Constitucional. Foi um dos fundadores do CTG Mate Amargo de Rio Grande. Faleceu, como deputado, quando em visita a Piratini (26). Foi orador oficial em 1957 (27) do Centenário de Canguçu. Era muito apreciado pelos canguçuenses, onde foi desportista.

 

Sexto: Dr. Jaime de Farias

Exerceu o cargo até próximo às eleições municipais para descompatibilizar-se e concorrer a vice-prefeitura.

O Dr. Jaime de Farias era natural de Sapiranga, formou-se em medicina. Chegou em Canguçu por volta de 1910, onde se estabeleceu como médico e passou a ter destacada atuação comunitária. Em 1923 integrou a coluna revolucionária ao comando do General Zeca neto. Médico humanitário consta ter sido o primeiro formado a radicar-se em Canguçu. Durante sua gestão como prefeito, conseguiu canalizar para Canguçu o apoio estadual, particularmente para os setores de Educação e Saúde. Sua obra administrativa profícua foi registrada pela Imprensa (28). Sob sua administração em Canguçu tornou-se a cidade em 1º de janeiro de 1939 (29). Por sua destacada atuação em Canguçu, torrão que amou e dignamente serviu durante 35 anos, a comunidadeo imortalizou através da Praça de Esportes Dr. Jaime de Farias que ele construiu e no estádio Dr. Jaime de Farias do E. C. América, para cuja construção concorreu como administrador, além de ser dado seu nome a uma escola do interior e a uma rua em Pedro Osório.

A maior homenagem no entanto foi a de ter sido eleito vice-prefeito em 1946, apesar de seu eleitorado conhecer seu falecimento em São Paulo, onde se recolhera em tratamento. Não sobreviveu para ver inaugurado o Grupo Escolar, obra que devotava especial carinho. O Dr. Jaime casou com Izaura Nunes Garcia, descendente dos primeiros povoadores de Canguçu, deixando descendentes radicados em Pelotas (30).

 

Sétimo: Dr. Victor Marques Porto (31)

Tomou posse em 1º janeiro 1948 para o cargo de Prefeito para o qual fora eleito. Foi substituído em seus impedimentos pelo Presidente da Câmara – Dr. Walter Oliveira Prestes.

Em sua administração os trilhos da ferrovia Canguçu-Pelotas atingiram a primeira e teve início em 1951 o tráfego regular de trens Canguçu-Pelotas. Foram inaugurados o Posto Agropecuário e as sedes de dois escritórios bancários e fundado Hospital Coronel Júlio Limeira, cuja vida e obra ligou-se intimamente à cidade de Itajubá e à unidade local ali sediada que comandei de 1981/82. O coronel Limeira foi sepultado em Delfim Moreira, próximo a Itajubá.

 

Oitavo: Conrado Ernani Bento (32)

Tomou posse em 1º Janeiro 52 para o cargo para o qual foi eleito. Teve como vice-prefeito: Hércio Dias de Almeida (33).

Data desta administração o início do calçamento da cidade; o surgimento, em 1953, do jornal A voz de Canguçu; a colocação da pedra Fundamental do Ginásio N. S. Aparecida e a inauguração do Hospital Júlio Limeira construído com o concurso do 1º Batalhão Ferroviário do Exército, e a reforma do prédio da Prefeitura, construído na época em que o prefeito nascera, por Horácio Piegas.

Conrado Ernani Bento (1888-1966). Nasceu em Canguçu em 15 Set 1888. era filho de Genes Gentil Bento (34) e Maria Conceição (Noca) Monteiro Bento, ambos hoje nomes de ruas em Canguçu. Seu nome de batismo era Conrado Monteiro Bento que depois foi acrescido de Ernani. Conrado era uma homenagem ao marechal Conrado Niemayer, seu parente político pelo lado materno e que havia se destacado na guerra do Paraguai, como engenheiro militar, que fez arriscadas subidas nos balões mandados vir dos Estados Unidos, pelo Marquês de Caxias, para reconhecer as posições inimigas de Humaitá (35).

Com 1 ano foi morar na Barra do Rio Grande onde passou parte de sua infância e depois em Itapoã. No primeiro lugar testemunhou, aos 7 anos, a parte Esquadra Brasileira que se revoltara forçar e penetrar a barra do Rio Grande, em 1895, trazendo a bordo tropas desde Santa Catarina. Este episódio ficou marcado fundo em sua memória, particurlamente as mulheres dos soldados desembarcando famintas, entregarem-se ao saque desenfreado de galinhas, porcos, etc. Fez seus estudos em Pelotas, sob a severa direção de seu avô Antônio Joaquim Bento que em 1857 fora o primeiro professor régio de Canguçu. Dos 14 aos 16 anos viveu as alegrias da vida de uma grande estância em Cerrito, administrada por seu pai.

Em 1905 retornou à vila de Canguçu para dela apartar-se somente em 1965. Acompanhou seu pai, escolhido para ser vice-intendente, e logo após intendente por morte do titular o coronel Leão Silveira Terres. Em 1913 casou com Cacilda Mattos Moreira, filha de Carlos NOrberto Moreira e Firmina Percília Borba Mattos (36).

Em 12 Jan1911, após ter sido secretário do intendente seu pai, assumiu os cargos de Notário e Oficial do Registro de Imóveis que exerceu até 13 setembro de 1958, ao ser aposentado por idade. Sua pouca vivência escolar foi compensada por uma grande curiosidade e sede de saber, responsáveis, ao longo de sua existência, pelo acúmulo, como autodidata, de apreciável cultura geral.

Tinha especial predileção pela História do Brasil, Ciências Naturais e Direito Civil. Preocupava-se com a preservação da Hiistória dse Canguçu. Na impossibilidade de escrevê-la a infra-estruturou com o alentado arquivo bibliográfico, documental e iconográfico que reuniu e anotou pessoalmente, incluindo documentos originais sobre o povoamento de Canguçu, hoje, todos em meu poder, constituindo o Arquivo Conrado Ernani Bento, base do presente trabalho. Sua vida política teve início em 1930. Foi prefeito de Canguçu por três vezes e em 1963, concorreu à Prefeitura contra uma coligação. Em matéria rodoviária seu grande sonho era atingir a BR-101, sem passar por Pelotas, o que encurtaria a distância Canguçu-Porto Alegre.

Presidiu o Clube Harmonia por três vezes, sendo que na primeira vez o dotou de luz elétrica. Seu nome liga-se à instalação da Escola Normal N. S. Aparecida, Sanatório João Swindt, Hospital Júlio Limeira. Traços de sua vida e obra foram publicados pela Imprensa (37). Como filho, de uma coisa sou testemunha, do imenso amor que dedicava às pessoas e coisas de Canguçu. Faleceu à meia-noite de 5 para 6 de novembro de 1966, na Santa Casa, em Pelotas. Hoje seu nome foi dado a uma das ruas de Canguçu. Nesta administração mandou exumar os restos mortais de quatro mortos no combate de Canguçu-Velho, dando aos mesmos sepulturas condignas. Foi dado seu nome ao Ginásio de Esportes de Pedro Osório e erigido monumento à sua memória defronte à casa que residiu.

Nota: Hoje leva seu nome o Ginázio de Esportes de Canguçue em em 1988 em seu Centenário foi consagrado Patrono da Academia Canguçuense de História pela sua dedicação em reiunis e preservar as fontes da História de Canguçu

 

Nono: Dr. Jacques Machado da Rosa (38)

Tomou posse em 1º janeiro 56 para o cargo para o qual fora eleito. Teve como vice-prefeito o Dr. Victor Marques Porto.

Sob sua administração Canguçu festejou o centenário de sua criação como município. Como homenagem à sua administração transcrevemos trechos de entrevista que concedeu ao Diário Popular de Pelotas pos ocasião de centenário (39).

"Estradas – "Governar é abrir estradas", como dizia o Presidente Washington Luiz".

Os governos de Canguçu que me antecederam seguiram à risca esta máxima, tanto que possui o município uma rede rodoviária de mais de 4.000Km.

Para conservar toda esta rede, envidamos enormes esforçose podemos dizer que apesar da inclemência do tempo, pode-se viajar pelo município em qualquer direção. Não temos a veleidade de afirmar que nossas estradas sejam ótimas, mas podemos afirmar que conservamos todas elas trafegáveis.

Melhoramos e aumentamos nosso parque rodoviário com aquisição de novas máquinas que foram acrescidas às adquiridas nas três administrações que me antecederam.

Consertamos pontes velhas e construímos algumas, colocamos bueiros, arrebentamos pedras. Enfim, procuramos tudo fazer para o livre trânsito.

Concorreu decisivamente para isto, a criação e distribuição oportuna pelo governo do estado, da Taxa de Transportes. Melhoramentos.Na cidade procuramos fazer alguns melhoramentos indispensáveis ao urbanismo.

Construímos a Casa do Centenário. Estamos empenhados a fundo junto ao governo estadual para a construção da hidráulica municipal e assim a cidade terá solucionado seu problema capital.

Canguçu pela sua altitude de 420 metros e seu clima, torna-se-á a Petrópolis da Zona Sul do estado, pois será procurada para ponto de veraneio por aqueles que preferem o clima de serra, fugindo aos verões das baixadas.

O problema de energia elétrica será melhorado através da encampação pela C.E.E.E. o que permitirá a instalação de alguma indústria.

Instrução pública tem-nos merecido todo cuidado. Aliás Canguçu está bem servido nesta parte graças aos esforços das administrações que me antecederam.

A municipalidade mantém 110 aulas isoladas que são complementadas por 3 escolas rurais e 4 grupos escolares do Estado, além de diversas comunidades religiosas para a educação de seus filhos próximo de seus estabelecimentos.

Òtima situação financeira: Considerando o que vai neste particular pelo país, estado e maioria dos municipios a situação do município é ótima.

Assim é que na data magna de seu centenário, Canguçu se apresenta como uma das comunas campeãs no que concerne à sua situação financeira.

Obelisco: Mandamos erigir na praça principal um obelisco em homenagem aos fundadores de Canguçu, cumprindo assim, um dever de gratidão da população atual para com os mortos do passado e que primeiro pisaram e desbravaram esta terra e que, além de viverem em nossos corações, viverão na praça pública, para despertar na posteridade, amor e dedicação a Canguçu ". (40)

O Dr. Jacques desapareceu no desempenho do cargo de prefeito da comunidade que ele dignamente serviu com invulgar espírito público.

Dentre as homenagens que lhe foram prestadas pela comunidade agradecida, destaco aquela em que foi dado seu nome à Casa do Centenário, construída em sua administração. Completou seu mandato João de Deus Nunes – o Presidente da Câmara de Vereadores. O Dr. Jacques é nome de rua em Pedro Osório.

1º CENTENÁRIO DO MUNICÍPIO DE CANGUÇU

 

Em 28 de janeiro de 1957 tiveram lugar as comemorações do Centenário da criação de Canguçu, município gêmeo de Passo Fundo. A cerimônia contou com a presença do governador do Estado, engenheiro Ildo Meneghetti e dos deputados Arno Arnt, Braga Gastal e Joaquim Nunes (filho de Canguçu). O orador oficial foi Dr. Osvaldo Muller Barlém. As comemorações foram assinaladas pelos seguintes eventos:

O evento foi asssinalado pela edição das seguintes publicações:

Album do Centenário, organizado pelo tipógrafo Tribuno Montagna, sob os auspícios da Comissão dos Festejos, no qual figura pesquisa sobre o Clube Harmonia, que extraímos da leitura de suas atas.

Jornal Centenário, Canguçu, 22 junho 1957 editado em Rio Grande por R. Anselmi.

 

 

Nota: Foi em 1956 com vistas ao Centenário de Canguçu que iniciamos a pesquisar a sua História, mas nossa colaboração não foi aproveitada no Album então editado pela Prefeitura, comemorativo do Centenário que creio atendeu mais a critérios políticos do que a critérios históricos, ficando muito aquém da publicação de João Simões Lopes Neto sobre Canguçu no centenário da Feguesia em 1912 que foi a base de partida de nossa pesquisa que culminou com a publicação deste livro em 1983, pelo Instituto Estadual do Livro.

ÚLTIMAS ADMINISTRAÇÕES 1957 – 1980

 

Canguçu foi administrado neste período pelos seguintes prefeitos e interventores: Dr. Francisco Carlos dos Santos (42); João de Deus Nunes; Dr. Emir Squef Waldemar Fonseca (44); João de Deus Nunes (2º vez) e Gilberto Moreira Mussi(45). Merece nossa homenagem, por motivo de falecimento e destacada e moderada ação como vereador e prefeito, por três vezes, o seguinte canguçuense: João de deus Nunes (1909-1972). Nasceu em Canguçu. Descendia dos povoadores de Canguçu. Era filho de Ataliba Nunes e de Branca Mattos Rocha. Era bisneto pelo lado materno do tenente_coronel Theófilo de Souza Mattos, comandante dos canguçuenses na guerra do Paraguai. Pelo Rochas descendia do célebre capitão cabo Rocha (Manoel Vieira Rocha), herói farroupilha, morto em ação na ilha do Fanfa. Faleceu com 68 anos, em 8 de abril de 1973, sendo sepultado no jazigo da família no interior.

Queca Nunes como era carinhosamente conhecido deixou descendente (46). O Diário Popular fez-lhe a seguinte e merecida referência póstuma (47):

"Político por vocação, exerceu essa atividade desde moço, sendo vereador, eleito pelo antigo Partido Libertador, e assumindo a Prefeitura, na qualidade de presidente da Cãmara Municipal, por motivo do falecimento do titular da Prefeitura, o médico Jacques da Rosa, cujo mandato lhe coube concluir.

Mais tarde, concorreu e elegeu-se Prefeito de sua terra, pela Frente Democrática em 1963, desempenhando o cargo de 64 a 69. Em 1972, atendendo a convocação dos seus correligionários, voltou a disputar o pleito, pela Aliança Renovadora Nacional, sendo eleito, mais uma vez.

Por três vezes, igualmente, presidiu a Associação dos Municípios da Zona Sul. De início, assumiu o cargo em substituição ao titular, o então prefeito de Pelotas, Edmar Fetter. mais tarde, por eleição, cumpriu dois mandatos de presidente da mesma Associação.

O sepultamento de João de Deus Nunes ocorreu ás 16 horas de sexta0feira, no cemitério da família, localizado na fazenda de sua propriedade, no interior do município, depois de ter sido velado o corpo, de manhã, na residência enlutada, e de tarde, no Salão Nobre da Prefeitura.

Presenciaram as cerimônias fúnebres, autoridades e povo de Canguçu – onde o extinto, a par de sua atividade pública, desfrutava da admiração, da amizade e o carinho da sociedade em geral. Comitivas dos municípios de Pelotas, Pedro Osório, Arroio Grande e São Lourenço do Sul, o deputado federal Alexandre Machado da Silva, os deputados estaduais Victor Bacchieri e Oscar Westendorf; a sra. D. Neiva Fetter, esposa e representante do Dr. Edmar fetter, que estava ausente desta cidade; o vereador pelotense Èlbio Abreu, representando o presidente da AZONASUL, prefeito Rubens Emil Corrêa; os prefeitos Flávio Pereira, de Arroio Grande, e Ronald Spi, de São Lourenço, além de outras autoridades sul-rio-grandenses.

Com o desaparecimento de João de Deus Nunes, perde Canguçu um dos seus filhos ilustres e que legou a sua terra um acervo inestimável de relevantes serviços "".

Era um homem bom. Liderava seus conterrâneos sem rancores e ressentimentos. Admirava muita sua atuação como espectador, à distância. Ao longo da História de Canguçu, João de Deus Nunes se inscreveu ao lado de Leão da Silveira Terres, Genes Gentil Bento e Conrado Ernani Bento entre os quatro canguçuenses que chefiaram o executivo por três Vezes, sendo que duas por eleição.

Seu pai Ataliba Nunes foi vice-prefeito de 1938-1945.

Nota: O atual prefeito Odilon Almeida Meskó se insere hoje nesta relação..Foram prefeitos Nelson Edi da Costa Grigoleti ( 1 jan 1889 a 1 jan 1993) e Domirio de Avila Camargo(1 jan 1993 a 1 jan 1996.Foi substituido por Odilon Almeida Mesko que assumiu pela 2 a vez em 1ºjan 1997 ,e foi reeleito para outro periodo que finda em 1 º jan 2005.

CRIAÇÃO DO MUNICÍPIO DE PEDRO OSÓRIO

 

Pela Lei nº. 3.735, de 3 de abril de 1959 que criou o município de Pedro Osório Canguçu perdeu os distritos de Cerrito e Vila Freire que o integraram durante 102 anos. Lamentavelmente, o novel município, em menos de 15 dias de sua instalação, foi assolado por uma grande catástrofe em conseq6uência da inusitada enchente do rio Piratini que, inclusive, na noite de 15/16 de abril, às 13:30 horas, derrubou as pontes ferroviárias e rodoviária junto à estação do Cerrito, jogando-as a 500 metros. Foram atingidas pela enchente, na atual cidade de Pedro Osório, 868 residências, das quais 95 foram demolidas, 122 parcialmente demolidas e 39 foram abaladas. O pároco frei Cristóvão de Vacaria registrou a tragédia em todas as suas dimensões no livro Rebelião das Águas. (48)

ADMINISTRAÇÃO ATUAL DE CANGUÇU

 

Ao concluirmos este capitulo, em 5 de agosto de 1980, em Resende – Rio de Janeiro – era a seguinte a administração de Canguçu (49):

Prefeito: Gilberto Moreira Mussi, Vice – Ernesto Maurício Arnt Neto, Chefe Gabinete – Hermes Moreira Nunes. Secretário de Administração e Finanças – Apoecides Correa Borges. Secretária de Educação e Cultura – Laedi Bachini Rosenbecker. Secretário de Obras e Desenvolvimento – Josino de Souza Bezerra. Diretor do Departamento de Saúde e Assistência Social – José Wanderlei Duarte Goulart (50). Inspetor Sanitário – Lucini Goulart Bezerra. Presidente da LBA – Norma de Souza Pinheiro Rocha e Diretor do DER – Osvaldo Martins Portelinha.

Vereadores: Carolino Ança Filho; Erlindo Rodrigues Borges; Hermes Ribeiro de Souza Filho (51); José Marques da Silva; Albino Alberto Antônio Strelow; Adão Jesus Marques (52); Pereira (suplente em exercício); Dr. Sílvio Neutzling; Francisco Assis Morales Nunes; Anatalino Silveira Vergara; Breno Schelin Hastes; Dr. Luiz Geraldo Telesca Mota, Odilon Almeida Mesko (53), Edison Lessa Goulart, Waldomiro Pereira Picanço, Ervino Zarnot, Pedro de Oliveira Luiz, Adão Jesus Coelho da Silva e Clóvis Carniato (54).

CONCLUSÕES SOBRE OS ADMINISTRADORES DE CANGUÇU 1893-1980

 

Pecuaristas: 1- Bernardino Mota, 2- Leão Silveira terres, 3- Hipólito Gonçalves, 4- Joaquim Maria Soares e 5- João de Deus Nunes – Total – 6.

Funcionários públicos: 6 – Genes Gentil Bento, 7- Orlando Vruz, 8- Ciro Moreira, 9- Conrado Ernani Bento, 10- Waldemar Fonseca e 11- Gilberto Moreira Mussi. Total – 6

Médicos: 12 – Dr. Raul Azambuja, 13- Dr. Jaime de Farias, 14- Dr. Jaques Machado da Rosa,15- Dr. Carlos dos Santos e 16- Dr. Emir Squeff. Total – 5.

Comerciante: 16- Victor Marques Porto.

O atual prefeito é Odilon Mestro, descendente de Vicente Ferrer de Almeida, primeiro funcionário público de Canguçu em 1851.

Nota: Na revista da ACANDHIS dos 200 anos de Canguçu o prefeito Odilon Almeida Meskó como presidente de Honra da ACANDHIS publicou artigo intitulado Poder Executivo –titulares 1893-1999 e o verador Conrado Ernani Bento Neto sócio efetivo da ACANDHIS publicou artigo O Poder Legislativo 1857- 2.000.

 

SEMANA LEGISLATIVA DE CANGUÇU 2004

 

A convite e como presidente da ACANDHIS contribuimos neste evento em sessão da ACANDHIS na Cãmara na noite de 4 de maio de 2004 com a seguinte materia de nossa lavra que foi lida por vários membros acadêmicos, a qual aqui transcrevo em razão de sua importância histórica para as atuais e futuras gerações canguçueses e a nossa apresentação pela ACANDHIS

 

SEMANA LEGISLATIVA DE CANGUÇU EM 2004

CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS

Pelo Cel Cláudio Moreira Bento

Presidente da Academia Canguçuense de História

 

Em 28 de janeiro de 1857, Lei Provincial criou o município de Canguçu junto com o de Passo Fundo. Isso depois de Canguçu haver integrado por 36 anos, como distrito, o município de Piratini, desde que este fora criado em 15 de dezembro de 1830, por Decreto do Imperador D. Pedro I, 3 meses e 22 dias antes deste abdicar, em 7 de abril de 1831, em favor de seu filho D. Pedro II.

Ao ser proclamada a República Rio Grandense, o distrito de Canguçu passou a subordinar-se a ela por cerca de 9 anos, como distrito de Piratini, a capital farroupilha, ocasião em que Canguçu foi considerado pelos imperiais "como o distrito de mais perigo e mais farrapo" do vasto município de Piratini.

O município de Canguçu foi criado pelo deputado imperial Brigadeiro Jerônimo Coelho, presidente da Província, um catarinense considerado o fundador da imprensa de Santa Catarina e que fora o Ministro da Guerra que emitira as diretrizes seguidas pelo então Barão de Caxias na Pacificação da Revolução Farroupilha.

Jerônimo Coelho atendeu, na criação do município de Canguçu, a pedido do Major Bernardo Pires, mártir do combate do Seival, simbolista farrapo, autor da primeira bandeira da República Rio Grandense que foi pela primeira vez desfraldada no dia 6 de novembro de 1836, pelo heróico canguçuense então Major Joaquim Teixeira Nunes, e no dia da eleição em Piratini, como Presidente da República, do Coronel Bento Gonçalves da Silva, hoje nosso patrono de cadeira na Academia Piratiniense de História que presidimos e fundada em 6 de julho de 2003 no CTG 20 de Setembro, em Piratini.

Bernardo Pires, cuja vida e obra resgatamos em Autoria dos Símbolos do Rio Grande do Sul... publicada em 1971 pela Universidade Federal Rural de Pernambuco e depois em O Exército Farrapo e os seus chefes, volume 2.

Bernardo Pires do qual descendem em Canguçu os Pires Terres e os Pires Moreira. Destes destaco os acadêmicos da ACANDHIS Gilberto Moreira Mussi, seu trineto, ex-prefeito de Canguçu e ex-deputado estadual e o Major Ângelo Pires Moreira, seu bisneto e historiador e tradicionalista pelotense.

Para organizar o município de Canguçu foram para ele designados dois antigos farrapos: Vicente Ferrer de Almeida e José Ignacio Moreira. Vicente Ferrer como funcionário da Câmara de Canguçu e que hoje tem seu trineto Odilon Almeida Mesko como prefeito municipal de Canguçu, além de o haver representado na Assembléia Legislativa Gaúcha e como seu vereador.

Veio com o Vicente Ferrrer de Almeida, natural da região atual de Lavras, o seu sobrinho político e com 22 anos, professor régio Antonio Joaquim Bento, filho de um antigo farrapo Antônio Bento que fora como farrapo o primeiro professor de Alegrete e que combatera na Guerra Cisplatina junto com Vicente Ferrer e ambos no posto de Alferes, após o que casaram em Piratini com duas irmãs Mattos de Guimarães, filhas de José Mattos de Guimarães, que construiu um moinho em Piratini, no hoje arroio do Moinho, além de construir a primitiva igreja de Piratini do tempo da Revolução Farroupilha, e também signatário da ata de instalação do município de Piratini, em 7 de junho de 1832, junto com Bento Gonçalves, Bernardo Pires , José Serafim Silveira que foi eleito vereador junto com Vicente Lucas de Oliveira que foi o primeiro presidente da Câmara de Piratini e que seria o ultimo Ministro da Guerra farrapo e na Guerra do Paraguai comandou uma Brigada do 3º Corpo de Exército, a qual pertenceu o 30º Corpo de Cavalaria da Guarda Nacional de Canguçu, assunto a que nos reportaremos mais adiante

O professor Antônio Joaquim Bento, foi o primeiro professor régio do município de Canguçu e membro do Partido Liberal, concorreu a eleição de deputado provincial sem no entanto conseguir se eleger.

Dele descendem, o seu filho o Coronel Genes Gentil Bento que foi intendente de Canguçu de 1905 a 1917, por 12 anos ; o seu neto Conrado Ernani Bento, que foi prefeito de Canguçu em três ocasiões por cerca de 12 anos; o seu bisneto José Moreira Bento que integrou esta Câmara de Vereadores por curto período e o seu trineto o vereador Conrado Ernani Bento Neto, atual vereador desta Câmara de Ver eadores.

Veio como primeiro serventuário da Justiça em Canguçu o já citado antigo farrapo Ignácio José Moreira que fora uma espécie de Chefe do Gabinete do Ministério do Interior farrapo, do Cel Ulhoa Cintra, natural de São João Del Rey. Jovem José Ignácio que certa feita fora aprisionado pelos imperiais em Pelotas junto com o seu irmão Pedro, conforme noticiou o jornal farrapo O Povo.

José Ignácio Moreira era genro de José Serafim Silveira já citado e o presidente da Câmara de Piratini, quando elevada a Legislativo da República Rio- Grandense. Personagem que continuou a presidir a Câmara de Piratini depois da Pacificação da Revolução Farroupilha e que em Canguçu possui larga descendência entre os Silveiras e os Moreiras .

Em Canguçu 5 filhos de José Ignácio Moreira casaram com 5 filhos do Ten Cel Honorário do Exército Theóphillo de Souza Matos, vereador da terceira Legislatura da Câmara de Vereadores de Canguçu no Império e que teve a missão de comandar na Guerra do Paraguai o já citado 30º Corpo de Cavalaria da Guarda Nacional de Canguçu. Presidia a Câmara de Canguçu nesta ocasião Joaquim Antonio Lessa, ancestral do canguçuense Dr. Luiz de Oliveira Lessa que foi personagem de Simões Lopes Neto no conto "Coma mais um queijo".

Eram filhos de José Ignácio Moreira Franklin Máximo Moreira, bisavô do historiador e acadêmico da ACANDHIS Cairo Moreira Pinheiro e veterano da Guerra do Paraguai e que fundou o Clube Harmonia e era irmão e amigo de Carlos Norberto Moreira, que foi vereador da 8ª e 9 ª Câmara de Vereadores no Império. Carlos Norberto como Presidente do Clube Harmonia foi quem adquiriu a sua primeira sede no local onde hoje se ergue a Prefeitura de Canguçu.

Franklin Máximo é avô de Fernando Krusser Moreira que foi vereador da 4ª Câmara de Vereadores de Canguçu em 1959, junto com seus primos Clóvis Rocha Moreira e José Moreira Bento, bisneto e neto de Carlos Norberto.

De Carlos Norberto Moreira descendem como seus bisnetos o vereador Conrado Ernani Bento Neto e o ex-prefeito e deputado estadual Gilberto Moreira Mussi e seu irmão o ex vereador Breno Moreira Mussi.

A Câmara de Canguçu foi instalada solenemente no dia 23 de julho de 1857, há 147 anos atrás. Presidiu a cerimônia o Comendador Manoel José Gomes de Freitas, canguçuense nascido em 1811 e então presidente da Câmara de Piratini e ao qual se deve a memória sobre a fundação de Canguçu como curato em 1800, mais tarde publicada na Revista do Centenário de Pelotas em 1912, por João Simões Lopes Neto, o maior escritor regionalista gaúcho.

Comendador Manoel José Gomes de Freitas que foi destacado historiador gaúcho além de deputado provincial, o consagramos como o patrono da Academia Piratinense de História e que em Canguçu entre outros descendentes registramos D. Ceres Silveira Prioto e Ari Silveira Borges .

Comendador Manoel José também patrono de cadeira na Academia Canguçuense de História ocupada pelo acadêmico Flávio Azambuja Kremer que sobre seu patrono ilustre realizou notável e original biografia.

Isto é o que nos competia considerar nesta Semana Legislativa de Canguçu, sobre o início de Canguçu em 1857 e a projeção atual daqueles personagens citados nos seus descendentes na Administração de Canguçu e em especial como legisladores.

A eleição da 1ª Câmara de Vereadores de Canguçu ocorreu em 3 de março de 1857 e foram eleitos 7 vereadores.

Na instalação do município foram empossados somente cinco: Presidente José Rodrigues Soares e mais José Antônio Pimenta, Domingos José Borges, Ignácio Francisco Duarte e Manoel Jesus Vasques.

A Câmara de Vereadores funcionou por cerca de 32 anos no local da 3ª e 4ª casas, da esquerda para a direita, na quadra da igreja e no local onde funcionou o primeiro cinema na década de 30.

Serviu de Secretário na instalação de Canguçu Vicente Ferrer Almeida que registrou com detalhes o ato de instalação do Município de Canguçu.

E vale repetir que é trisavô materno do atual prefeito de Canguçu Odilon Almeida Mesko e ex-integrante desta Câmara de Vereadores e casado coma trineta do Professor Antõnio Joaquim Bento .

Estes fatos cobertos por espessa camada de pátina dos tempos os resgatamos desde 1957 em diversos trabalhos e em especial na nossa obra Canguçu, reencontro com a História editado em 1983, pelo Instituto Estadual do Livro e que em breve o colocaremos na Internet no site da ACANDHIS.e da AHIMTB e se possivel o reeditaremos;

Tarefa na qual fomos reforçados a partir de 1988 com a fundação da Academia Canguçuense de História que se orgulha de haver resgatado o que foi possível da bela História de Canguçu que fora deixada se perder pelas gerações que nos antecederam.

Trabalho de resgate da História de Canguçu pelos membros da ACANDHIS que se acham publicadas na Revista dos 200 anos de Canguçu em que atuamos como o seu organizador, onde, as páginas 30 e 31 o vereador e sócio efetivo da ACANDHIS Conrado Ernani Bento Neto resgatou a História do Poder Legislativo de Canguçu em 1857-2000.

Isto foi o que nos foi possível apresentar como introdução nesta histórica sessão,na impossibilidade de estarmos presente na Semana Legislativa de Canguçu em 2004, como seria nosso desejo.

Um grande abraço a meus conterrâneos canguçuenses de nascimento e de coração, com votos de que se empenhem na gloriosa e cívica missão de pesquisar, preservar, cultuar e divulgar a História, as Tradições e os valores culturais, morais e históricos de Canguçu, para que eles não sejam novamente sepultados pela pátina dos tempos, de onde os resgastamos com enorme e demorado esforço desde 1957.

Aqui nos cabe agradecer o trabalho da vice presidente da ACANDHIS e presidente em exercício, a acadêmica professora Yonne Maria Sherer Bento, cidadã canguçuense, por ato de justiça na voz da História, desta Câmara de Vereadores de Canguçu, por haver em nossa ausência física, mas não espiritual, presidido a ACANDHIS por mais de 10 anos com a ajuda solidária de seus acadêmicos e sócios efetivos, onde também destacamos a falecida acadêmica professora Marlene Barbosa Coelho nossa parceira de pesquisas sobre a História de Canguçu desde antes de 1957.

Votos de sucesso nesta noite e de que os representantes do Povo de Canguçu em reforço estudem a possibilidade junto com o Poder Executivo de propiciarem por meio de Lei Municipal uma sala condigna para que a Academia Canguçuense de História possa guardar e preservar os seus arquivos sobre o passado de Canguçu .

Pois a ACANDHIS muito se orgulha de haver feito a sua parte nestes 15 anos de intensa e proficuo trabalho de pesquisa, preservação, culto e divulgação da História, das Tradições e dos valores morais, culturais e históricos da comunidade canguçuense. Pois constatar isto é obra de simples raciocínio e verificação.

BREVE CURRÍCULO DO AUTOR DESTE ESTUDO

O Coronel Cláudio Moreira Bento nasceu em Canguçu em 19 de outubro de 1931, filho de Conrado Ernani Bento e Cacilda Moreira Bento. Estudou no Colégio Nossa Senhora Aparecida de 1938-1944. Ingressou no Exército em 1950 onde fez carreira tendo cursado todos os seus cursos e servido no Sul, Centro Oeste, Sudeste e Nordeste do Brasil. É historiador militar consagrado, autor de cerca de 70 obras e mais de 1000 artigos em periódicos do Brasil e Estados Unidos dos quais possui trabalhos publicados nos anais da Câmara Federal e assembléias legislativas de Goiás e Minas Gerais e Câmaras de Recife e Resende. É cidadão itatiaiense, itajubense e resendense e foi agraciado com as comendas Conde de Resende, e com a J. Simões Lopes Neto pelas Câmaras de Resende e Pelotas e premiado pela Associação Rio Grandense de Imprensa e Assembléia Legislativa gaúcha por sua pesquisa O gaúcho fundador da imprensa brasileira que ora irá publicar. Em 1997 foi conferencista na Câmara de Deputados em Simpósio sobre a Guerra de Canudos, onde defendeu historicamente as forças do Exército, de 13 Policias Militares e de um Batalhão Civil Baiano que combateram os revoltosos de Antônio Conselheiro. Conferência que figura nos Anais da Câmara Federal

Integra cerca de 30 entidades nacionais e estrangeiras de História onde se destacam as academias de História de Portugal, Espanha, Argentina e Uruguai.

EEsta é uma síntese de nosso conterrâneo Cel Bento fundador e presidente da ACANDHIS e suas relações com o Legislativos federal, estaduais e municipais e que tem sempre procurado levar alto e longe, como soldado e historiador o nome de Canguçu.


 

CAPÍTULO 7 - FILHOS ILUSTRES DE CANGUÇU

 

FILHOS ILUSTRES DE CANGUÇU 1800 – 1957

 

Sob o título acima estudaremos os filhos da comunidade canguçuense cujas obras, de 1800-1957, se projetaram fora de seus limites, elevando bem alto o nome de Canguçu. Além de uma homenagem justa, esperamos seja a presente abordagem um estímulo a que outros filhos de Canguçu sigam seus exemplos. Outro critério foi limitar o estudo aos filhos ilustres com as respectivas biografias encerradas por falecimento.

CORONEL JOAQUIM TEIXEIRA NUNES (1802 –1845) (1)

 

- A maior lança farrapa -

 

Nasceu por volta de 1802 em Canguçu, no Vale do Camaquã. Descendia de um dos três irmãos Teixeira Nunes que figuram entre os povoadores de Canguçu (2).

Por ocasião da Guerra Cisplatina (1825-1828), que terminou com a independência definitiva do Uruguai, Teixeira Nunes dela participou. Assistiu a morte de seu bravo comandante e destacado lanceiro, o Barão de Cerro Largo e Mal. José de Abreu, então conhecido como o "Anjo da Vitória" (3).

A morte de Abreu deu-se num entrevero, em Passo do Rosário, quando ao tentar conter um ataque de Lavaleja, foi atirado pela Cavalaria deste, contra os quadrados de Infantaria de Calado. Teixeira Nunes foi, nesta campanha, alferes do 25º Corpo de Artilharia Montada Guarani, onde adquiriu a prática de liderança em combate e conhecimentos de tática, que o elevariam à condição de um dos mais destacados oficiais da República Rio-grandense, como também o foi, junto com Canabarro, Garibaldi, das maiores expressões militares da República Juliana, em Santa Catarina, por terem criado condições, com a tomada de Laguna, após longa e heróica expedição por terra e água, desde a barra do Camaquã, para que esta república fosse proclamada.

Manuel Alves Caldeira, canguçuense que participou da revolução Farroupilha assim traçou o perfil do herói conterrâneo:

"Teixeira Nunes foi um dos oficiais de maior nomeada que possuiu a Revolução Farroupilha. Era uma lança das primeiras.

Com o corpo de lanceiros a seu mando, alongava-se do exército, para operar com seus próprios meios, em qualquer parte que o inimigo aparecesse.

Era o terror dos seus inimigos. Onde carregava o corpo de lanceiros ao seu comando surgia a vitória. teixeira era humano. Durante a peleja matava por ser contingência da luta, e depois da vitória não morria um só prisioneiro. Era um oficial que sabia fazer a guerra de recursos. Esbelto e galhardo, apresentava-se à frente de seu corpo na ocasião do combate.

Oficial que manejava a lança com invulgar destreza, de sua estatura mais alta do que baixa, montando garbosamente seu cavalo, sobranceiro, seria capaz de dominar qualquer inimigo. Sua voz de comandante feria os ouvidos. Possuía invulgar espírito militar.

Em novembro de 1836, Teixeira Nunes era major do Corpo de Lanceiros Negros (corpo formado por pretos escravos e libertos), a esse tempo comandados pelo tenente-coronel Joaquim Pedro Soares.

No dia 6 desse mês, feita a eleição para Presidente da República, realizou-se na igreja de Piratini um "Te Deum". E quando as autoridades do novel Estado do Rio-Grandense e a massa popular em cortejo solene, se dirigiam para o templo, ia à frente deles pela primeira vez desdobrado à luz do céu, o pavilhão tricolor, o símbolo da República Rio-Grandense.

E quem o conduz, fremente de emoção e entusiasmo, ufano da glória de ser o primeiro a carregar a bandeira gaúcha, é o major de lanceiros Joaquim Teixeira Nunes.

Dentro de pouco tempo seria ele o comandante dos lanceiros negros. E à frente dessa força praticaria façanhas sem conta, intervindo em inúmeros combates, até ornar os punhos com os galões de coronel".

Teixeira Nunes, por seu raro valor como líder de combate, habilidade em conduzir operações de guerras prolongadas, vivendo de parcos recursos locais e a legenda de combatente humano e generoso que se criou em torno de seu nome, seria tratado pelo título honroso de "O Bravo dos Bravos".

Ele foi um dos mais constantes combatentes farroupilhas. Sua consagração como soldado adveio da expedição que relizou por terra à Laguna-SC, coadjuvado por Garibaldi por água, resultando a Proclamação da República Juliana. Esta, em sinal de reconhecimento, o promoveu a coronel, e fez de Garibaldi o comandante de sua esquadrilha naval.

Ao apossar-se, sem reação, de Laguna, em virtude de retraimento do comandante daquela praça, além dos navios de guerra que auxiliou Garibaldi e John Griggs e aprisionar ou colocar fora de combate, reforçou consideravelmente sua logística, ao cair em seu poder quatorze barcos abarrotados de mercadorias, seis bocas de fogo, cerca de 500 armas e para mais de 36.000 cartuchos carregados.

Em ordem do Dia, após a vitória alcançada, Teixeira Nunes assim se expressou ao agradecer a ação de seus bravos comandados:

"Iguais se não maiores respeitos e considerações adquiriu o capitão José Garibaldi, comandante da força naval da República. Em nome da Pátria agradeço-lhe a maneira como desempenhou a parte do plano de ataque que lhe coube executar, fazendo uma jornada de mais de duas léguas por terra (transporte dos lanchões "Seival" e "Farroupilha"), sendo o primeiro a lançar-se n’água para desencalhar o lanchão "Seival" preso ao baixio do Camacho".

Teixeira Nunes, ao chegar em Laguna, lançou proclamação vasada nos seguintes termos:

"Irmãos catarinenses, empunhai as armas conosco e arrancai a segunda província ao diadema do segundo Pedro: Mostrai porém, que os verdadeiros livres, mesmo no afã da guerra, sabem manter a ordem obedecer as leis e respeitar a propriedade...".

Em seguida, fez chegar aos líderes catarinenses uma carta circular, cujo teor reproduzimos a seguir:

"Proclamando a independência de Santa Catarina, não penseis que isto afetará os interesses do Brasil, do solo sagrado dos brasileiros, pois que a República Rio-Grandense, conscienciosa de sua diginidade, do espírito da grande maioria dos brasileiros e da honrosa missão que lhe foi confiada, não tem tanto a peito, quanto a federação aos estados seus irmãos".

Após derrotado Garibaldi no mar, Teixeira Nunes foi forçado a retrair sob forte pressão de João Fernandes, chefe legalista. Atravessou o canal de Laguna a nado, indo reunir-se com Canabarro no Passo do Camacho.

Havendo discordância sobre operações futuras entre Canabarro e Teixeira Nunes, enquanto o primeiro se dirigiu ao Rio Grande, Teixeira Nunes convicto de que perdeu uma batalha, mas não a guerra, dirigiu-se para o planalto e com ele Garibaldi, agora infante, e Anita e Rosseti, todos já ligados por laços de amizade.

Na margem norte do rio Pelotas, no interior de um mangueirão de pedra, feriu-se um cruento e encarniçado combate que passou à história, com o nome de Santa Vitória. Nele, Teixeira Nunes, tendo Garibaldi no comando de sua Infantaria, infringiu fragorosa derrota na Divisão da Serra ou de São Paulo, ao comando do brigadeiro Xavier da Cunha.

Este combate possibilitou-lhe entrar triunfalmente em Lages, vila que encontrou com os cofres raspados e sem administração, o que procurou refazer, bem como a refazer os uniformes de sua tropa, dando contas precisas de tudo aos seus superiores de Caçapava.

Em Lages, Teixeira Nunes, agora com o comando militar e político, procurou tratar o povo como amigo, dirigindo a guerra não contra a população, mas contra os defensores do governo. Procurou ignorar atitudes hostis e, habilmente, por todos os meios, conquistar a confiança dos simpatizantes da causa, revelando mais um positivo aspecto militar de sua personalidade.

Sobre sua visão política e estratégica, podemos concluir muito boa, pelos termos de carta abaixo, em que advogava a manutenção de Santa Catarina e sobretudo de Lages:

"Esta fronteira (Lages), é de primeira importância para nós, seja com respeito ao grande rendimento de tropas de gado, seja porque daqui podemos manter em observação não só a Província de Santa Catarina, como também São Paulo e vigiar com maior facilidade os distritos de Vacaria, Cima da Serra e Missões. Logo deve ser este ponto guarnecido, por uma força correspondente às infinitas vamtagens que o mesmo apresenta".

Sabendo Teixeira Nunes que tropa do coronel Antônio Albuquerque Mello andava em seu encalço, saiu à procura da mesma na direção de Curiti9banos, onde se feriu o combate de Marombas. Nele, Teixeira Nunes, após um sucesso inicial, caiu em emboscada, sendo salvo pela Infantaria de Garibaldi que o acolheu.

Salvou-se da destruição total, ao embrenhar-se numa mata, através da qual atingiu Lages no 5º dia, após indescritíveis sofrimentos no matagal.

Anita Garibaldi extraviou-se neste combate. Sendo presa por Albuquerque Mello, conseguiu empreender uma fuga épica, vindo a encontrar-se com a coluna de Teixeira Nunes e com Garibaldi, em Vacaria.

No Rio Grande, juntamente com Garibaldi e sob o comando de Bento Gonçalves, tomou parte do indeciso combate de Taquari, no qual comandou uma Brigada Ligeira de Cavalaria.

Posteriormente, sob o comando de Bento Gonçalves, se destacou no ataque de S. José do Norte, no qual combateram a seu lado seus velhos amigos de tantas jornadas na República Juliana, Garibaldi e Rosseti.

Aí, Teixeira Nunes, "Coronel Gavião", bateu-se com um denodo sem precedentes, fato reconhecido em ordem do dia de Bento Gonçalves.

Depois foi operar os lados de Bagé, atacou Jaguarão, em 19 dez 43.

Os lanceiros negros de Teixeira Nunes, foram, em grande número, recrutados nos municípios atuais de Arroio Grande, Canguçu, Piratini, Pinheiro Machado, Herval, Bagé, Camaquã, São Lourenço do Sul, Pelotas, Pedro Osório, Caçapava e Encruzilhada do Sul e fornecidos pelos estancieiros e charqueadores farroupilhas.

Finalmente, após uma dedicação extremada ao ideal republicano farroupilha, Teixeira Nunes, num encontro com Chico Pedro, "após combater como um bravo, comj o brio e heroísmo que lhe eram peculiares", foi atingido por um lançaço fatal de um adversário, vindo a morrer de lança em punho, vítima da arma em cujo manejo se celebrizara".

Ao homem que desfraldou e portou pela primeira vez o pavilhão tricolor da República Rio-Grandense, coube o privilégio de comandar no Rio Grande, a última reação armada do ideal republicano farroupilha. Ideal que não viveu para ver concretizado para todo o Brasil, 45 anos após.

Foi por certo pensando no bravo canguçuense Teixeira Nunes e nos seus bravos lanceiros, com os quais Garibaldi conviveu e padeceu irmanado, na longa odisséia desde sua derrota naval em Laguna, até o frustrado ataque a São José do Norte, que escreveu em suas Memórias e cartas estes trechos:

"Os gaúchos rio-grandenses eram homens habituados a todas as privações, e nunca de uma só boca ouvi lamentação de fome e sede; ao contrário, mesmo em tão dolorosa situação, desejavam combater".

"Eu vi batalhas mais disputadas, mas nunca vi em nenhuma parte, homens mais valentes, nem lanceiros mais brilhantes, que os da cavalaria rio-grandense, em cujas fileiras comecei a desprezar o perigo e combater dignamente pela causa sagrada das gentes".

Quando a Europa celebrava Garibaldi como a figura mais romântica do mundo, ele se lembraria do canguçuense Teixeira Nunes, seu comandante na retirada da República Juliana.

"E rapassando na memória as vicissitudes da minha vida no vosso meio, em 6 anos de atividade de guerra, de constante prática de ações magnânimas, como que em delírio exclamo! Onde estão agora esses belicosos filhos do Continente, tão majestosamente intrépidos nos combates? Onde Bento Gonçalves, Neto, Canabarro, Teixeira Nunes e tantos valorosos lanceiros que não me lembro!

Que o Rio Grande ateste com uma modesta lápide o sítio em que descansam os seus osssos; e que vossas belíssimas patrícias, cibram de flores esses santuários das vossas glórias".

O final do maior lanceiro farrapo foi assim descrito por seu citado conterrâneo, o tenente farrapo Manuel Alves Caldeira e seu comandado como porta-bandeira no combate de Rio Pardo (5).

Por ordem de Canabarro, após Porongos, Teixeira Nunes foi acampar no arroio Chasqueiro. Aí foi a procurá-lo Chico Pedro.

"Chico Pedo marchava pela estrada real na direção do passo onde se achava Teixeira Nunes – o seu inimigo dos mais temíveis e respeitado... O inimigo carregou sobre a força de Teixeira Nunes que não podendo sofrer as cargas foi derrotada e perseguida de morte em morte.O cavalo de Teixeira Nunes foi boleado e assim mesmo ele seguiu defendendo-se com sua lança. Mas foi também boleado com a dita lança e não podendo mais manejá-la, foi rodeado pelos que de mais perto o seguiam e deram-lhe um tiro em uma coxa. A seguir caiu do seu cavalo, ocasião em que chegava Chico Pedro ao qual disse – Coronel não me deixe matar. Chico Pedro seguiu e virando a cara para o lado disse: - Não matem o homem. Teixeira tinha feito um sinal de socorro e morreu".

Caldeira acusa Canabarro de ser responsável pela morte de Teixeira Nunes.

A História do Exército publica alegoria que refere a sua ação e a de seus lanceiros negros em Porongos. (6)

Nota: Abordamos Teixeira Nunes nas obras A Grande Festa dos Lanceiros.Recife: UFPE,1971, sobre a inauguaração do Parque Osório em Tramandai e em O Exército Farrapo e os seus chefes .Rio de Janeiro: BIBLIEx,1991.2v.E fornecemos dados sobre ele ao ator que o representou na novela A Casa das sete mulheres, atendendo a seu pedido pela Internet .Ele é patrono de cadeira ma ARDHIS.

MANOEL JOSÉ GOMES DE FREITAS (1811-1884)

 

 

Jornalista, historiador e político. Nasceu em Canguçu em 23 Abr 1811, conforme o comprova o genealogista Carlos Rheingantz, com apoio em seu batisfério. Como o vilamento de Piratini em 1830 para lá transferiu-se, viveu e faleceu em 1884. Em 18 Ago 1837 casou em Piratini, capital da recém proclamada República Rio-Grandense com Ana Leopoldina Dias, sua prima irmã, filha de Manoel Jacinto Dias e Ana Antônia Gomes, naturais de Maldonado e que figuram entre os povoadores de Canguçu. Era filho de Inácia Gomes de Jesus e José de Freitas Santiago, que figuram entre os primeiros povoadores de Canguçu. Era primo irmão de Francisca Gomes de Borba, esposa do tenente coronel GN Theóphilo de Souza Mattos (7) comandante dos canguçuenses na guerra do Paraguai e cunhado de João José Gomes da Costa e Silva – o primeiro professor de meninos de Pelotas, cuja aula, embora criada em 1820, foi aberta em 1833 e fechada em 1835-44 durante a Revolução Farroupilha e reaberta em 1845 (8). Aula na qual estudou Antônio Joaquim Bento, primeiro professor régio de meninos em 1857 da vila de Canguçu. Manoel José foi o instalador do município de Canguçu, em 1857, como presidente da Câmara de Vereadores de Piratini. Sua atuação foi mais como historiador geral brasileiro e regional.Produziu vários trabalhos a maioria inéditos. SAobre ele escreveu Guilhermino César (9) "destacou-se na segunda metade do século nterior como uma curiosa figura de erudito... Autor de numerosos trabalhos sobre história geral e regional. Com as iniciais de G de F, publicou na Arcádia, da cidade de Rio Grande os seguintes trabalhos: "Os jesuítas, sua criação, introdução no Brasil e motivos de sua expulsão de Portugal e seus domínios (1869)" e "Vila de Piratini – Notícia histórica geográfica e descritiva". Publicou ainda: Apontamentos dos fatos diretos ou relativos à História do Brasil e Lista das batalhas de 758 AC até 1866. Entre seus trabalhos inéditos: "Bosquejo das nações e personagens notáveis da história universal e pátria – 2v e "Apontamentos históricos e geográficos da Província do Rio Grande do Sul". O Almanaque Literário e Estatístico do RGS (1889-1917) após seu falecimento em 1888, publicou de 1903-1017 cerca de 47 trabalhos históricos de sua autoria, versando basicamente sobre biografias (10). É de sua autoria memória sobre Canguçu, transcrita por J. Simões Lopes em Município de Canguçu – Bosquejo Histórico – Cap ll – (11).

Davi Almeida o estuda em sua História de Piratini.

Pedro Villas-Boas relaciona seus Apontamentos dos fatos... como editado em 1869, em Rio Grande, na Tipografia O Diário e com 352 páginas (12).

A obra citada mereceu elogiosas referências do então Presidente da Província, Barão Homem de Mello, mais tarde destacado historiador vice-presidente do IHGB e que faleceu, em 1918, na sopé do maciço das Agulhas Negras junto hoje da Academia Militar das Agulhas Negras em Resende – RJ, onde redigimos estas linhas, numj intervalo de nossas funções de Instrutor de História Militar.

Tivesse vivido noutra época e não confinado em Piratini, por certo teria se destacado nas letras históricas do Brasil.

Ele liga-se as famílias Dias, Gomes, Borba, Mattos, Silveira que povoaram Canguçu por volta de 1800 (13) e que em parte migraram para Bagé.

Sua obra merece ser reunida e estudada mais profundamente por especialistas em literatura rio-grandense. Acredito tenha sido o rio-grandense de sua geração que mais produziu sobre História, embora confinado em Piratini, na Serra dos Tapes.

Nota:Foi estudado por Flavio Ajambuja Kremer em seu disrcurso de posse na ACANDHIS e o consagramos patrono da Academia Piratiniese de História.

FELISBERTO IGNÁCIO DA CUNHA (1824-1896)

 

Nasceu em Canguçu, em 11 Nov 1824, conforme o comprova o genealogista Carlos Rheingantz, autor da obra Titulares do Império. Descendia dos primeiros povoadores de Canguçu (14) cujos nomes ficaram em sua geografia através da Coxilha dos Cunha e Arroio do Bica, seu avô materno. Foram seus pais José Ignácio da Cunha e Zeferina Gonçalves da Cunha. Ele mais tarde charqueador em Pelotas, segundo o Almanaque Literário e Estatístico do RGS.

Em Pelotas "criou-se e recebeu a instrução que naquelas remotas épocas havia, tirando, com a sua natural inteligência e vivacidade, dela todo o possível aproveitamento.

Muito criança foi para o Rio de Janeiro, onde esteve de caxeiro alguns anos em casa de um parente, que era estabelecido com casa de fazendas.

De volta ao estado dedicou-se ao comércio, e em sociedade com o primo e cunhado Felisberto José Gonçalves Braga, montou um estabelecimento de charqueada sobre o arroio Pelotas nas proximidades do passo do Retiro. Tendo mais tarde desfeito a sociedade, fez negócio com seu avô materno Antônio Ferreira Bicca e tomou a gerência da fazenda de criação de gados que possuía na costa do arroio Jaguari, no Uruguai.

A sua inteligência e atividade postas em ação deram a essa estância uma época de notável prosperidade.

Por morte de Antônio Ferreira Bicca, ele tratou de liquidar esse negócio. Associou-se aos irmãos Barcellos, Boaventura, Luiz e Eleutherio, dos quais era parente e amigo, num estabelecimento de charqueada, de que assumiu a gerência externa.

No fim de pouco tempo, ativo e empreendedor, dando largo desenvolvimento aos seus negócios, além de sócio da firma Cunha &Barcellos, era sócio gerente de Cunha & Belchior, e parte da de Cunha & Irmão, em que era associado a seu irmão Possidônio. Fazia trabalhar as charqueadas de Vicente lopes e Antônio José de Azevedo Machado, situada no cotovelo do arroio Pelotas.

Além disso, tendo herdado por morte de seu pai José Ignácio da Cunha, uma fazenda de criação de gado no início de Jaguari, no Uruguai, e comprando outra na costa do rio Piratini, multiplicava-se para dar pontual direção aos seus negócios e fazê-los prosperar.

Grandes prejuízos teve depois, quando, por um convênio feito entre os charqueadores, após a abertura da barra do S. Gonçalo, de obrigar os navios de barra fora a virem carregar no porto desta cidade, viu-se forçado a exportar por sua conta de vendas desastrosas.

Nem por isso desanimou. Continuou a lutar como um forte que era, escudado sempre na sua proverbial lisura e honestidade.

O conceito que sempre mereceu na sociedade e as simpatias que soube grangear, são testemunho a sposições que ocupou, recusando outras para as quais não sentia disposição.

Por ocasião da guerra com a república Oriental do Uruguai em 1864 que motivou o rompimento de hostilidades do Paraguai, foi comandante da guarnição da praça de Pelotas.

Membro ativo e influente do Partido liberal, foi em 1878 nomeado comandante superior da Guarda Nacional desta comarca.

Por serviços prestados ao país, foi também pelo governo imperial nomeado doficial da Ordem da Rosa, condecoração que em tal grau dava honras militares.

Benévolo e generoso, eram sem número os benefícios que diariamente com toda a singeleza praticava.

Franca era sempre a sua bolsa para os nobres cometimentos que em Pelotas se promoviam. Não houve um único trabalho meritório do progresso ou de altruísmo ao qual ele não estivesse associado. Todas as instituições pias o tiveram no número dos seus devotados auxiliares, levando a elas concurso franco e generoso.

Tão bom coração, passou través da política calorosa das pequenas localidadesm, sem gerar ódios nem ressentimentos. Tão sincero e leal foi sempre, que, partidário decidiu como era, tinha ainda tantos amigos entre os seus como entre os adversários, que nele reconheciam um homem guiado por um espírito de justiça e de eqüidade.

Quando desta vida se apartou, levou tranqüila consciência porque neste mundo o mal não fez, nunca feriu, e muito suavisou dores.

Os pequenos defeitos foram de sobra resgatados pelas grandes qualidades que possuía. Era um coração grande e um espírito reto que as grandes causas impulsionavam, que quando com a palavra pregava era sincero e lógico com o nobre exemplo que dava. Quando esposava uma causa, essa era sempre nobre e alevantada.

O seu espírito marchava sempre na vanguarda do progresso.

Senhor de escravos, foi abolicionista quando só o eram aqueles que escravos não tinham.

Antes da lei de 28 de setembro, já ele tinha adotado para as suas escravas. Antes da libertação do município de Pelotas, já ele havia concedido liberdade a seus escravos, incondicional a muitos e aos outros com pretação de serviços a curto prazo.

Em atenção a esses alevantados exemplos, o gabinete abolicionista do conselheiro Dantas concedeu-lhe o título de Barão de Correntes.

Estimado e venerado por todos que o conheceram, no dia 19 de Dezembro de 1896, às 2 horas e 20 minutos da manhã, morria como um justo, circundado das lágrimas brotadas de corações saudosos.

No dia 11 de Novembro, robusto e com aparência de vigorosa saúde, completara os setenta e dois anos de idade".

O Barão de Correntes, ilustre filho de Canguçu, concorreu com a doação de terras para o estabelecimento da Colônia de São Lourenço em 1857 (15) nas margens do arroio Correntes do qual deriva seu título.

A família Cunha construiu em Canguçu o palacete onde o Clube Harmonia tem sua sede e que serviu de 1905-1916 de residência do intendente Genes Gentil Bento. Fernando Osório o estuda (16).

GENERAL HIPÓLITO PINTO RIBEIRO (1824-1900)

 

 

Nasceu em Canguçu por volta do ano da Independência, em prédio que existiu no local onde foi construída a Igreja do Salvador, esquina da rua Júlio de Castilhos com a avenida Exército Brasileiro (17). De origem humilde sua vida transcorreu entre aventuras e brincadeiras na sede da freguesia (18). Durante a Revolução Farroupilha lutou por seus ideais até próximo do seu final como a maioria dos canguçuenses. Combateu contra os imperiais sob o comando de Neto e Bento Gonçalves nos dias combates de Canguçu e em outros entreveros. Ao final alistou-se como voluntário. Durante a guerra contra Oribe e Rosas 1851-52 vamos encontrá-lo integrando, como alferes, o 2º Regimento de Cavalaria Ligeira de Bagé, ao comando do intrépido tenente coronel Osório. Na Batalha de Monte Caseros ou Moron, de 2 Fevereiro 1952, nas portas de Buenos Aires, recebeu a seguinte citação, em Ordem do Dia do Marquês de Caxias, juntamente com o tenente Luiz Pedro Osório: " Louvo o tenente Luiz Pedro Osório e o Alferes Hipólito Pinto Ribeiro, ambos do 2º Regimento de Cavalaria, pela bravura e comportamento com que se distinguiram no esquadrão de atiradores a que pertenciam".

Pouco depois atingiu o posto de capitão, ocasião em que deixou o Exército e ingressou na Guarda Nacional, passando a dedicar-se à pecuária na região de Santana e Uruguaiana.

Segundo o coronel Arthur Ferreira Filho que o estudou e assim apreciou suas ações (19).

"Mas naquele tempo, as mutações do clima internacional se processavam com muita rapidez, e os homens de vocação guerreira não tinham direito a repouso prolongado".

Assim, quando o Império resolveu intervir na República Oriental do Uruguai, a favor do general Venâncio Flores, o herói farroupilha Antônio de Souza Neto, residente naquele país vizinho, reuniu uma Brigada de Cavalaria Ligeira, com a qual fez a vanguarda do Exército do Sul que, sob o comando de João Propício Menna Barreto, se dirigia para a praça forte de Paissandu.

Hipólito comandava um corpo da Brigada de Neto, que o convocara como amigo e homen de confiança. Terminada a Campanha do Uruguai, de lá mesmo seguiu essa força, fazendo a vanguarda do Exército de Osório que marchava para o Paraguai. Com ela ia o major Hipólito Ribeiro. Dessa campanha, donde saiu com o renome de um dos melhores chefes de Cavalaria, voltou com o posto de Coronel. A princípio, sob as ordens de Souza Neto, e depois de Andrade Neves, o Vanguardeiro. Hipólito bateu-se e brilhou em Tuiuti, Avaí, Lomas Valentinas e em inúmeros combates e reconhecimentos, merecendo promoções a golpes de bravura e talento militar. É várias vezes citado em ordem de dia do Comando em Chefe.

Vencida a guerra, o Governo Imperial o distinguiu com o posto de Brigadeiro-Honorário e aproveitou seus serviços como comandante de Fronteira, em Uruguaiana. Antes da proclamação da República, aderiu à idéia republicana, ou melhor, reintegrou-se na idéia que o empolgara nos dias de sua mocidade em Canguçu.

Aliando-se a Pinheiro Machado, tomou parte na propagandae apoiou energicamente a chefia de Júlio de Castilhos desde os primeiros dias da República. Quando este estadista foi deposto em 91, Hipólito Ribeiro foi um dos chefes que imigraram com o Pinheiro Machado e voltaram trazendo forças para o restabelecimento da ordem republicana.

E quando a exasperação dos ânimos culminou com a revolução, Hipólito organizou em Uruguaiana, onde residia, uma Divisão constituída de tropas do Exército, da Guarda Nacional e civis que tomou o nome de Divisão Oeste. Os revolucionários já se aproximavam de Uruguaiana, quando o velho combatente, fazendo junção com a Divisão Norte, e assumindo o comando geral desse agrupamento, por ser mais antigo no generalato do que Lima, saiu ao encontro do inimigo, conquistando brilhante vitória para as armas republicanas na batalha de Inhanduí.

No desenrolar da Revolução, o general Hipólito, já na idade de setenta anos, desenvolveu extraordinária atividade guerreira, perseguindo e batendo várias colunas rebeldes. Surpreendeu e derrotou o coronel Davi Martins, nas Caneleiras, infligindo, logo depois, ao mesmo chefe rebelde, catástrófica derrota no Passo do Sarandi.

Posto este adversário fora de ação, Hipólito partiu contra o coronel Marcelino Pina, derrotando-o nas pontas do Arroio Ponche Verde e, sem lhe dar quartel, persegue-o até as proximidades de Encruzilhada, onde o surpreendeu e destroçou definitivamente.

Foram ainda elementos de sua Divisão, que venceram, em Campo Osório, o almirante Saldanha da Gama, no combate em que pereceu esse ilustre marinheiro.

Antes de finda a guerra civil, o brigadeiro-honorário Hipólito Ribeiro recebeu do Governo republicano as honras de general de Divisão.

Restabelecida a paz, ocupou um lugar na Assembléia dos Representantes e chefiou o Partido Republicano numa grande zona da Fronteira.

Depois, desgostou-se com Júlio de Castilhos que sustentou a candidatura do Dr. Romagueira Correia a intendente municipal de Uruguaiana, contra a opinião do velho general.

Seu temperamento não se compadecida com a posição de resignado, nem se conformava com o papel neutral de mero espectador. Não obstante a idade avançada, esse lutador possuía um físico vigoroso e uma formidável reserva moral de energias.

Seu verdadeiro lugar, posto que fez cinco campanhas no espaço de cinqüenta anos, não deve ser na história política, mas na história militar.

Pertence de direito à galeria onde se alinham os nossos melhores generais do passado".

Hipólito Ribeiro teve por mestres as maiores expressões da Cavalaria Brasileira. Inicialmente, o general Neto, depois Chico Pedro de Abreu e como alferes o mais tarde general Osório e atual Patrono da Arma de Cavalaria. Como major o general Antônio Neto, com o qual obrou prodígios em Potrero Pires, na Batalha de Tuiuti e, finalmente, com o general Andrade Neves de quem foi o vanguardeiro. Sendo Andrade Neves considerado o "Vanguardeiro", cabe a Hipólito o título de "Vanguardeiro do vanguardeiro".

No início do século foi dado seu nome a uma rua e uma praça de Canguçu. A praça desapareceu na década de 30 (entre ruas Saldanha Marinho e Hipólito Ribeiro e Júlio de Castilhos). A rua com seu nome, da estação ferroviária até a general Osório foi rebatizada de Exército Brasileiro. Hoje existe o CTG Hipólito Ribeiro – "O Vanguardeiro" inspirado em trabalho de nossa autoria. Era seu irmão Bernardino Pinto Ribeiro que foi vereador em Canguçu no Império.

Durante a Guerra do Paraguai recebeu grave ferimento, em 21 de outubro de 1867, em ação nas imediações de Humaitá. Nesta guerra comandou o 10º Corpo Provisório de Cavalaria, a 8ª Brigada de Cavalaria e 4ª Brigada da 3ª Divisão de Andrade Neves.

Nas Ordens do Dia do 1º Corpo de Exército (20) são encontradas referências elogiosas que o caracterizam: "inteligência e tino que o distinguem", inexcedível comandante. Recebeu a medalha do Mérito Militar. A História do Exército publicou sua foto (21).

 

GENERAL JOSÉ ANTÔNIO MATTOS NETTO –

ZECA NETO (1851-1947)

O último caudilho da família Mattos Neto. (22)

Nasceu por volta de 1854, no atual 5º subdistrito de Canguçu, no seio da família Mattos, a qual pertencia sua mãe Rafaela Mattos, mulher afeita às lides guerreiras, viúva de dois militares e no terceiro casamento com Florisbelo Neto, veterano farroupilha, irmão do general Antônio Neto. Era sobrinho do Tem. Cel. GN Theófilo de Souza Mattos que comandaria os canguçuenses na Guerra do Paraguai. Nasceu após a guerra contra Oribe e Rosas. Viveu em Canguçu até cinco anos de seu vilamento.

O Rio Grande já vivia o clima de guerra proxima que ocorrieria em 1864-70, quando viveu a parte de sua juventude, dos 14 aos 20 anos.

Foi um autêntico campeiro e tapejara (conhecedor dos caminhos) do Rio Grande. Gabava-se de ser capaz de ir a cavalo de Camaquã até Montevidéu "sem molhar as patas do seu cavalo".

Criou-se entre os Mattos e os Netos, destacados e tradicionais revolucionários do Decênio Heróico (23).

Sobre sua vida e obra. além do que já abordamos ao tratarmos da Revolução de 23, em Canguçu, dele escreveu nosso ilustre confrade Arthur Ferreira Filho (24) e veterano dessa revolução do lado governista:

"José Antônio Neto, sobrinho do farroupilha general Antônio de Souza Neto, era abastado fazendeiro no município de Camaquã.

Na Revolução de 93 comandou um corpo de patriotas castilhistas no posto de tenente coronel. Mais tarde rompeu com o chefe de seu Partido, sendo em 1923 dos primeiros a sair a campo contra o Governo de Borges de Medeiros. Sua coluna que se chamou"4ª Divisão do Exército Libertador", ficou famosa pela rapidez de movimentos com que , em parte, supria a deficiência de material bélico. E graças à grande mobilidade que imprimiu à sua tropa, logrou furtar-se a encontros decisivos com os coronéis Hipólito Ribeiro (filho) e Francelino Meireles que tenazmente o perseguiam.

Bateu-se vantajosament no Passo do Mendonça, contra o coronel José Lucas Martins, conseguindo livrar-se do cerco que lhe preparava a Brigada Juvêncio de Lemos. Sempre perseguido de perto, o caudilho cruzou durante meses a região de suas proezas, Camaquã, S. Jerônimo, Canguçu, Encruzilhada, Pinheiro Machado, Pelotas, sem nunca de seixar surpreender.

Apenas uma vez, premido por Hipólito Ribeiro, viu-se obrigado a lutar em condições desfavoráveis, em Canguçu Velho, sujeitando-se a séria derrota.

Ali perdeu muitas praças e vários oficiais, escapando-se ele próprio a duras penas. Foi quase ao findar da Revolução que Zeca Neto realizou sua maior façanha. Surpreendeu e tomou a cidade de Pelotas, ocupando-a quase totalmente, por algumas horas, não obstante a valorosa resistência oposta pela pequena guarnição republicana. A ocupação de Pelotas não foi propriamente uma vitória militar, não apenas pela desproporção numérica, entre as forças atacadas, como porque fora imcompleta e efêmera. A ocupação não alcançou toda a área da cidade, não conseguiu silenciar a totalidade dos pontos de resistência, e durou umas poucas horas, somente.

Mas fora, inegavelmente, um feito útil à Revolução, tanto pela repercussão política favorável, como porque, na rica cidade sulina, onde o caudilho contava com inúmeros simpatizantes, fácil lhe fora abastecer-se dos víveres e munições de que carecia com premência.

Ademais, o fato de conseguir atacar a segunda cidade do Estado, sem que a Brigada Juvêncio de Lemos o impedisse, deve ser levado a crédito de Zeca Neto, velho caudilho de setenta e dois anos, que assim dava provas de uma capacidade de agir e movimentar tropas que só deveria esperar de um fogoso guerreiro de trinta anos.

Houve um momento, na Revolução de 1923, em que Zeca Neto, numa de suas meteóricas incursões, chegou a estar à vista da Capital do Estado, na atual cidade de Guaíba, naquele tempo chamada Pedras Brancas.

Registrou-se, então, considerável susto popular em Porto Alegre. As famílias recolheram-se ante a espectativa de um combate. Os estrategistas de cafés revisavam seus cálculos, enquanto os boatos de todas as cores fervilhavam nas ruas.

O velho Largo dos Medeiros manteve seu prestígio, fazendo-se o centro das informações alarmantes.

Já alguns governistas cumprimentavam com mal disfarçada subserviência, certos figurões da oposição, como quem aplaina o terreno para o futuro incerto.

Aníbal estava às portas de Roma.

Entretanto, a aproximação de Zeca Neto era de todo inofensivo, pois, mesmo que não houvesse o Rio Guaíba pelo meio, restaria ainda a circunstância decisiva de não possuir o caudilho a menor condição material para atacar uma cidade bem guarnecida, como se achava Porto Alegre naquela ocasião.

Nem Zeca Neto pretenderia mais do que se mostrar à sede do Governo para efeito de prestígio e propaganda. Feita a paz de Pedras Altas, (14-12-1923), Neto voltou às atividades de fazendeiro, dedicando-se também ao aliciamento eleitoral para as fileiras da oposição. Mas, em face de novo surto de rebeldia no Estado, em 1826, não se conteve.Emigrou para o território uruguaio e lá reuniu apreciável grupo de companheiros à frente dos quais cruzou, de regresso, a fronteira rio-grandense, invadindo o Estado em tropel de guerra. Estava, então, com setenta e cinco anos de idade. Seu vigor físico era ainda perfeito, podendo, como demonstrou, montar a cavalo sem se utilizar dos estribos, mas já não encontrou ambiente para repetir as façanhas anteriores. Companheiros de valor, como Dario Crespo e outros da passada campanha, desta vez, não o quiseram acompanhar, e o caudilho se deixou cercar por indivíduos tais como João Castelhano, de tenebrosa memória. À sombra do nome do caudilho foram praticados crimes repulsivos, como o degolamento do delegado de polícia de S. Sepé, Capitão da Brigada Militar, homem benquisto por gregos e troianos naquela cidade.

Zeca Neto já não podia conter os impulsos inferiores de seus comandados.

Essa campanha felizmente durou pouco. Depois de algumas escaramuças, o caudilho foi derrotado pelo coronel Hipólito Ribeiro e perseguido, sem quartel, pelo comandante de vanguarda do "Destacamento Hipólito", tenente-coronel Delfino Silveira, sendo obrigado a regressar à República vizinha, desanimado e sem conmdições para tentar novas aventuras.

Zeca Neto que era um homem educado, de feito aristocrático, gostando de trajar com elegância, deixara crescer a barba, prometendo não a raspar enquanto Borges de Medeiros estivesse no Governo.

Cumpriu a curiosa promessa, mas, para isso, teve que esperar até 1928, quando o estadista republicano venceu o último qüinqüênio.

Com a barba longa e grisalha, um tanto hirsuta, o caudilho apresentava não o aspecto de um bondoso avô, ou de um velho homem de ciência, mas o de um sanhudo veterano da Guerra do Paraguai.

Após a Revolução Constitucionalista, emergência em que o caudilho libertador ficou solidário com a ditadura de Getúlio Vargas, veio a exercer um lugar de direção no partyido fundado e chefiado por Flôres da Cunha.

Como o golpe de 1937, que implantou o Estado Novo, extinguindo os partidos políticos e proibindo qualquer atividade partidária, afastou-se para sempre da vida pública.

Viveu muito ainda. Conservou até o fim uma rara fortaleza de ânimo e acentuado espírito de luta.

Com mais de noventa anos, ainda se exercitava, diariamente, no tiro ao alvo.

Aos que manifestavam estranheza, ante o treinamento bélico do general nonagenário, ele respondia com visível convicção:

"Ninguém sabe o que nos reserva o dia de amanhã".

E continuava atirando, para não perder o hábito.

Zeca Neto foi Llessa escreveu "Coxilhas Coloradas" que aborda aspectos de sua vida (26).Foi aclamado general em 1923 por seus liderados.

A História do Exército publica sua foto e aborda sua participação na Revolução de 23 (27). Martins Livreiro, Palegre acaba de editar suas Memórias, que se refere em Tradição, Porto Alegre, 15 mai 83, p.3.

Nota:Escrevemos sobre ele na Revista do Clube Militar e no jornal Tradição artigo General Zeca Netto –traços de seu perfil militar jan/fev 1984.E resgatamos em analise militar na Revista do CIPEL 2003 , Os 80 anos da Tomada de Pelotas pelo general Zeca Netto.

ANDRÉ LEÃO PUENTE (1855-1920) (28)

- O Grande pedagogo rio-grandense -

 

Percorrendo a Praça da Matriz em Porto Alegre, deparei com um busto contendo, no granito que o sustenta, a seguinte inscrição:

"André Leão Puente.

Morto, vive no coração de seus alunos. 11 /4 /1855".

Quem foi André Leão Puente para merecer tão grande homenagem dos seus alunos no mais importante logradouro do Rio Grande do Sul, ao lado do majestoso monumento erigido em 1906, em memória de Júlio de Castilhos e defronte ao Palácio Piratini, Assembléia Legislativa e Catedral Metropolitana? Vejamos. André Leão Puente, segundo Achylles Porto Alegre, "era natural de Canguçu", filho de simples, mas honrada família. Nasceu na sede da então Freguesia de Canguçu elevada à condição de vila em 1857, dois anos após o seu nascimento em 11 de abril de 1855.

Em Canguçu passou sua infância, tendo freqüentado a aula régia sob a direção do primeiro professor para meninos do município, Joaquim Antônio Bento.

Seu professor, impressionado com a excepicional aplicação de seu discípulo, o encaminhou para a Escola Normal de Porto Alegre, destinada aos jovens de talento que não dispusessem de recursos financeiros para cursar uma Academia.

Munido de um atestado de pobreza fornecido pelo vigário José Joaquim Fontes e de uma recomendação de seu mestre, o jovem André deixou Canguçu rumo a Porto Alegre.

Durante o curso dedicou-se de maneira inexcedível aos estudos, adquirindo, em breve, uma sólida cultura profissional e geral.

Ao diplomar-se foi nomeado professor público em sua terra natal, a vila de Canguçu. Sua permanência ali foi de 1774-1884. Logo em seguida, em reconhecimento aos seus excepcionais dotes como professor, foi transferido para Bagé para um cargo superior.

Em 1894, após assistir em Bagé os horrores da malfadada Revolução Federalista de 1893, pediu demissão do serviço público e retornou a Porto Alegre.

Ali passou a lecionar na Escola Brasileira, onde se destacou como excelente professor de Português e Geografia, tendo dirigido o internato da Escola até 1900.

Durante todo o tempo em Porto Alegre e até 1895 dedicou-se à produção de um livro didático de português, calcado nos mais modernos métodos pedagógicos alemães, aprendido inclusive, com o professor Eduardo Willelmy, natural de Stetin, Alemanha, que possuía uma Escola em Pelotas, e que por ocasião da Revolução de 93, radicou-se em Canguçu, na Florida, como professor e fotógrafo.

Sua obra institulada Gramática Portuguesa, foi lançada no ano de 1895 e logo adquiriu vasta circulação pela grande receptividade que despertou entre a juventude do Rio Grande do Sul, por sua clareza, pureza e objetividade.

Em 1895, apolítico, mas simpatizante da corrente federalista chefiada por Gaspar Silveira Martins, foi convidado para retornar ao serviço público.

Aceitando o convite, foi ocupar as cadeiras de História e Geografia do Colégio Complementar. A par de seus deveres oficiais ministrava aulas particulares.

Em suas novas funções oficiais confirmou-se o pedagogo sempre atento aos progressos da pedagogia.

Achylles Porto Alegre em sua História Popular de Porto Alegre dedicou-lhe duas páginas. Assim referiu ao ilustre mestre filho de Canguçu:

"Há homens que nunca morrem, apenas se ausentam fisicamente, estando sempre vivos no pensamento de quantos com eles trataram em vida.Pertence a este número – André Leão Puente. De uma delicadeza aristocrática, o seu trato era gentil e cativante. A sua voz, de uma doçura desafetada, tornava a sua palestra singularmente atraente. O seu olhar era suave e carinhoso, nenhum de seus alunos jamais o viu irritado.

Seus alunos nunca esqueceram o mestre admirável que lhes formou o espírito, o caráter e o coração. Alguns adquiriram fortuna com a lição que receberam. O mestre, porém, morreu pobre, legando à família um nome honrado e imperecível.

O professor por menos que seja, deixa sempre um grande legado aos que lhe ouviram as lições. O tesouro da sabedoria é o tesouro dos tesouros". (30)

André Leão Puente ao retornar a Canguçu como professor, 1874-84, foi co-fundador em 1881, junto com Eneas Gonzaga Moreira de sua primeira biblioteca, na Sociedade Eden Canguçuense. Biblioteca que foi dissolvida por ocaião da Revolução de 93 e o que sobrou foi incorporada à Biblioteca do Clube Harmonia.

Publicou no Almanaque Literário e Estatístico do Rio Grande do Sul 1889-1917 os seguintes trabalhos sobre superstições: Em 1889 – "O arco da velha"; "Os lobisomens e as almas do outro mundo"; "Maus olhares e quebrantos" e "As benzedeiras e simpatias". Em 1890 – "O Jardim Público de Pelotas e o Calor que acompanha a chuva". Em 1891 – "Os cacos" e "Nova Era". Em 1892 – "Os dois cortesãos". Em 1893 – "O aprecimento de uma titã" e em 1894 - "Pobre Rio Grande". (31)

Produziu mais os seguintes trabalhos: "O Mártir da Independência", peça teatral que encenou em Bagé e que enaltecia a figura de Tiradentes.

O gosto pelo teatro, adquiriu com seu primeiro professor Antônio Joaquim Bento que em 1858 organizou e dirigiu, segundo Simões Lopes Neto, o primeiro grupo teatral em Canguçu (32).

A vida de André Puente, como professor, teve início aos 17 anos, quando lecionou na estância de Horácio da Cruz Piegas. Após substituir por algum tempo seu primeiro professor, foi cursar a Escola a Escola Normal.

Faleceu em 23 Out 1920. Foi dado seu nome ao G.E Irmãos Andradas. É nome de Escola em Canoas e de rua em Porto Alegre próximo ao Colégio Bom Conselho onde lecionou e onde funciona o Instituto Estadual do Livro e Arquivo Histórico do RS. É sua parenta a canguçuense professora Florisbela (Florzinha) Puente Barbosa.

Nota: André Puente e patrono de cadeira na Academia Canguçuense de História.

CORONEL GN GENES GENTIL BENTO (1863-1931)

 

Nasceu em Canguçu em 1863, um ano antes do início da Guerra do Paraguai. Era filho de Antônio Joaquim Bento – o primeiro professor de meninos do município de Canguçu, e de Izabel Vaz Bento, ambos da região do passo Maria Gomes do rio Piratini e mais tarde estação do Cerrito. Fez seus estudos em Canguçu sob a direção do pai. Mais tarde, estudou e lecionou no colégio Sul-Americano em Pelotas. Por volta de 1887 casou com Maria da Conceição Monteiro Bento. Sua participação na campanha republicana foi descrita por J. Simões Lopes Neto, o príncipe de nossos escritores regionalistas e seu contemporâneo: (33)

"Genes Gentil Bento foi desde os mais verdes anos um sonhador cheio de fé do ideal republicano, ao qual deu os melhores impulsos de seu coração de moço, as premissas de sua inteligência, na tribuna, na imprensa, alhures e em Canguçu, salientando-se entre os poucos mais intemeratos pregadores do novo credo. Proclamada a República ocupou diversas comissões, revelando no desempenho delas o valor de sua competência, correção e zelo".

Em 1890 ocupou comissão de carácter administrativo na construção dos molhes da barra do Rio Grande (34). Aí foi-lhe alcançar a Revolução de 93 e a Revolta na Esquadra. Depois, morou em Itapuã, no exercício de funções administrativas ligadas à navegação da Lagoa dos Patos.

Passado o agitado período da consolidação da República, procurou melhores perspectivas na administração privada. Administrou por alguns anos uma estância em Estação do Cerrito, em sociedade com seu proprietário.

Em 1904 foi chamado a servir sua terra natal na qualidade de vice-intendente.

Em 1905, por falecimento do intendente coronel Leão dos Santos Terres, completou o seu mandato e foi eleito e reeleito intendente de Canguçu, funções que exerceu até Jul 1916, ou seja, por mais de 11 anos e meio (15 Fev. 1905 – 25 Jul. 1916), tempo record a frente do executivo canguçuense.

Em 1912, o autor regionalista citado escrevia: (35)

"O que fez e o que lutou desde 1905 o coronel Genes Bento partindo de um momento de rudes dificuldades e intolerantes agitações, o sucesso de seu esforço é a recompensa de sua dedicação nestes largos sete anos de vida pública. Dizem-no melhor que as palavras, a situação próspera do município, a justiça que lhe tributam os adversários e a arregimentação sólida do partido que chefia".

Ainda, em 1916, foi convocado pelo Presidente do Estado, Dr. Borges de Medeiros, para o exercício sucessivo das seguintes funções de confiança de 1816-1921: Subchefe de Polícia da 6ª Região com Sede em Jaguarão; Subchefe de Polícia da 1ª Região com sede em Porto Alegre, Chefe de Polícia do Estado (função equivalente hoje de Secretário do Interior) e, finalmente, de Secretário da Presidência do Estado. Do exercício dessas funções de confiança deixou muito bem desenvolvido e organizado arquivo encadernado, hoje em poder de um neto (36) e importante fonte histórica do Rio Grande do Sul 1916-1922.

No exercício de suas funções de subchefe e chefe de polícia do Estado fez diversas intervenções pacificadoras em nome do Partido Republicano, traduzidas pelo exercício temporário das funções de intendente de São Borja, São Luiz Gonzaga, São Francisco de Paula e Herval do Sul. Representou pessoalmente o Presidente do Estado e agiu em seu nome em diversas situações.

Ao tranferir-se para Porto Alegre, o fez com toda a família, permanecendo em Canguçu seu filho Conrado Ernani Bento.

Em 1921 foi nomeado Notário do 3º Ofício de Porto Alegre, na rua da Ladeira, atual cartório Dorneles, que por muitos anos levou seu nome.

Faleceu em Porto Alegre em 16 de março de 1931, onde se encontra sepultado junto com a esposa.

Dentre as publicações que ensaiam sua biografia registre-se o jornal Estado do Rio Grande, Porto Alegre, 16 mar. 1931.

Em Canguçu e Porto Alegre existem ruas com o seu nome.

Foi criador em 1913 do Colégio Elementar de Canguçu que por transformações sucessivas é o Grupo Escolar de Canguçu. Existe selo municipal de Canguçu com sua efígie.Segundo escreveu A Federação como parte de seu necrológio (37):

"Exerceu cargos de destaque como a chefia e subchefia de Polícia e Secretaria da Presidência do Estado, desempenhando no período de 1916 a 1920, por incumbência do egrégio Dr. Borges de Medeiros, missões políticas em Pinheiro Machado, Lagoa Vermelha, Erexim, Uruguaiana, Vacaria, Jaguarão, Cruaz Alta, São Borja, Santa Maria, São Leopoldo, São Francisco de Paula, Passo Fundo, Alegrete, Montenegro, São Luiz, Santo Amaro e Triunfo.

Quando da Revolução de 1923, com carinho organizou a Guarda Republicana. Foi membro Comissão Executiva do Partido Republicano, sendo Vice-Presidente de Honra do Centro Republicano Júlio de Castilhos".

Nota:È patrono de cadeira na ACANDHIS e seu Arquivo Pessoal se encontra na Casa de seu neto José Moreira Bento para onde o levamos.O historiador Sergio da Costa Franco em Gente e Coisas da Fronteira Sul .Porto Alegre:Sulina,2001 , em " "O dissidio entre os chimangos: carlistas e zeferinistas" as p.131/174 descreve a pacificação deste complexo dissidio pelo Cel Genes Gentil Bento. O Cel Genes possuia très irmãs Uma casou com Antônio( Nico) Duarte do qual nasceu Isaura esposa Vador Rodrigues com grande descendência.Outra com Genuino Aguiar e sogros de Antônio ( Antonico) Valente com grande descendência em Canguçu e uma terceira casou em Pelotas tendo como filho Adail Bento Costa. Eram seus irmãos Laranja Hermes Bento, avô de Maria Candida,esposa de Seferino Couto Terres e José (Cazusa(Monteiro Bento que foi o primeriro engenheiro agrônomo a se formar em Pelotas e depois professor da Escola Eliseu Maciel. A esposa do Cel Genes Gentil possuiu duas irmãs .Uma casou com Miguel Vasques Filho com descendentes em Porto Alegre entre eles o pesquisados Fausto Vasques e a outra casou com um oficial do Exército da familia Niemeyer sendo neto do casal, segundo Fausto Vasques o arquiteto Oscar Niemayer.

D. OTAVIANO PEREIRA DE ALBUQUERQUE (1866-1949)

- O Arcebispo canguçuense -

 

Nasceu em Canguçu em 1866, no início da Guerra da Tríplice Aliança 1865-70. Ali viveu sua infância e adolecência , tendo como primeiro professor Antônio Joaquim Bento. Em 1884, com 18 anos, ingressou no Ginásio Nª Sª da Conceição de São Leopoldo. Em 1888 foi transferido para o Seminário de Porto Alegre. Em 16 Set 1888 foi sagrado padre na Catedral de São Francisco de Paula em Pelotas. Lecionou no seminário de Porto Alegre onde depois foi vigário do Menino Deus. Foi pároco em Rio Grande. De 1904-1914 esteve em Roma como Vigário Geral. Lá foi sagrado bispo em 1914 pelo Papa Bento XV e nomeado 2º bispo do Piauí. Tomou posse em sua diocese em 23 Set 1914. Seu lema era: "Inpulchritutine paces". Nesta diocese teve as seguintes iniciativas: Criou o Cabido Honorário; nomeou 13 cônegos; promoveu a vinda das irmãs do Coração de Maria para os hospitais; deu início à construção do Colégio Diocesano; criou a prelazia de Bom Jesus da Gurgueia, em 24 Dez 1920, erigiu a paróquia S. Benedito, transformando-a em Matriz. Em 1922 foi elevado a primeiro arcebispo de São Luiz do Maranhão, dirigindo esta arquidiocese por 13 anos. Depois foi nomeado Arcebispo de Campos RJ onde faleceu, em 3 de janeiro de 1949, com 83 anos, sendo sepultado na catedral.

Em 2 de janeiro de 1922, antes de ser elevado a arcebispo do Maranhão, visitou Canguçu, sua terra natal. Sua visita foi assim registrada no Livro de Tombo da Igreja Matriz, bem como a carta que enviou ao pároco, peça literária de rara beleza:

"D. Otaviano chegou a Canguçu às onze horas e meia, tendo sido recebido na entrada Sul pelo Intendente Dr. Raul Azambuja, povo em geral e Banda do Clube Harmonia.Foi-lhe oferecido um banquete no Novo Hotel, tendo falado na ocasião, o promotor Edgar Gama.Visitou à noite o Clube Harmonia, onde dissertou sobre o tema "Harmonia". Pernoitou na casa do Intendente( local do Clube Harmonia).

No outro dia, compareceu na Intendência, onde foi lido o decreto municipal, pelo qual foi dado seu nome, a antiga rua das Flores.

À noite, na Igreja, proferiu bela conferência na qual deu mostras da grande eloqüência de que era possuidor. Na manhã do dia seguinte, visitou a Cacimba do Ouro, de saudosa memória de sua infância passada em Canguçu.

Às duas horas da tarde partiu para Pelotas, após haver feito elevada contribuição para a reconstrução da sacrista destruída por incêndio.

Foram seus colegas de infância, entre outros, Genes Gentil Bento e André Puente, segundo recordou".

Nota:D. Otaviano possui rua com o seu nome em Canguçu e é patrono de cadeira na ACANDHIS. Deixou o Piaui por desinteligências como o padre que era interventor e recolheu-se ao Seminário São Bento, no Rio. Ali organizou a primeira Pascoa dos Militares a qual não participou o Ministro da Guerra Gen Bda José fernandes Leite de Castro que combatera como major na Artilharia Francesa na 1ª Guerra de onde trouxe sua esposa que fora casada com um frances e em cuja disputa levou a melhor. Por não haver se confessado foi observado pelo Arcebispo D.Otaviano: "ão se confessou por haver tirado a esposa de outrem" segundo me informou o historiador do Seminário . Quando dirigiamos o Arquivo Histórico do Exército recebemos a missão de confirmar, a pedido da assessoria do Presidente Figueiredo se um um soldado nascido em Campos e morto na Intentona Comunista em 35, no Regimento de Infantaria da Praia Vermelha se ele havia sido morto como rebelde comunista ou não. Pois ele figurava como rebelde e sua irmã escrevera um livro sobre o seu irmão e pedira que o Presidente Figueiredo prefaciasse. Pesquisando encontramos um depoimento do Arcebispo D.Otaviano ao Presidente Getúlio Vargas afirmando a inocência do soldado em foco, por conhecer a sua família muito religiosa da cidade de Campos.Resultado foi comprovada a participação do soldado seu irmão sem nenhum envolvimento politico no caso. Foi uma vitória moral para ele.

CORONEL JUVÊNCIO MAXIMIANO LEMOS (1874-1954)

 

Este ilustre canguçuense, nascido em 22 nov 1874 foi assim estudado por nosso ilustre confrade Tarcísio Antonio Costa Taborda (39):

Iniciou sua vida pública na Brigada Militar do Estado, já nos campos de luta em 1893, tomando parte destacada em vários combates, tendo sido um dos bravos do sítio de Bagé, feito memorável onde foi gravamente ferido, conforme consta em sua caderneta de apontamentos militares:

"Novembro: A 27 recolheu-se com o destacamento a Bagé tomando parte na resistência e defesa da cidade, que se achava sitiada pelas forças revolucionárias. Dezembro: A24 foi ferido por bala de fuzil e, na mesma data, baixou ao hospital de sangue. Em 1894 – janeiro: Levando o sítio da cidade de Bagé, a nove, foi pela Ordem do Dia Regimental nº 62 , daquela data, louvado pela maneira com que se houve durante o mesmo sítio e pela bravura com que, comandando a primeira companhia, tomou uma trincheira ao inimigo, em 24 de dezembro, sendo nessa ocasião gravamente ferido.

Em novembro do ano seguinte, 1894, ainda em sua caderneta de assentamentos militares, lê-se:

Pela ordem do dia do Comando da Brigada, nº 176, de primeiro, foi público ter o Governo da República lhe concedido as honras do posto de tenente do Exército.

Em maio de 1895, pela ordem do Dia do comando da Quinta Divisão sob o número dois, de onze, foi louvado "pelos serviços prestados à Divisão especialmente no memorável sítio de Bagé, e pela abnegação e valor com que se conduziu.

No ano de 1902, já no posto de major, seguiu com a ala esquerda do 1º Batalhão de Infantaria para a região colonial do Alto Taquari, em diligência contra um fanático, chamado José Munche. Pela ordem do dia do Comando da Brigada, nº 412, foi louvado, em nome do Presidente do Estado, "pelo tino, critério e inteligência com que dirigiu as operações contra o grupo de bandidos e fanáticos que infestava a zona colonial do Alto Taquari, onde, em penosas diligências, atento à escabrosidade do terreno e as constantes chuvas, conseguiu exterminar completamente auqela horda perturbadora da ordem pública".

Foi em 1903 organizador e comandante da ala esquerda do 1º Regimento de Cavalaria, erm Santa Maria. Foi comandante do corpo desde 1913, época em que também organizou o 2º Regimento da Cavalaria, sediado em Livramento.

Durante a Revolução de 1923, foi comandante e organizador da 2ª Brigada Provisória do Oeste e, logo a seguir transferido com o seu Estado Maior para a 3ª Brigada Provisória do Sul, que também organizou e comandou.

Por ocasião da sedição de 1925, comandou um destacamento de forças à disposição do Governo Federal, do qual fazia parte o 4º Batalhão de Infantaria Montada, hoje 4º Batalhão de Caçadores em Pelotas de que foi ainda organizador e primeiro comandante.

Nestas funções prestou à Pátria relevantíssimos serviços de vigilância nas fronteiras com o Uruguai e Argentina, merecendo do general Comandante da 2ª Divisão de Cavalaria as mais elogiosas referências.

Em 1926, achando-se doente no hospital de Uruguaiana, pediu transferência para o Hospital da Brigada Militar, na Capital do Estado, recebendo, ainda, do mesmo Comandante da Divisão de Cavalaria, o seguinte:

"Elogio – Ao se afastar desta Divisão o Coronel Juvêncio Maximiliano Lemos, distinto camarada, velho mantenedor da ordem da disciplina e da Lei, que, por motivos de saúde, seguiu para o Hospital Militar da Brigada, faça-o com dor d’alma por me ver privado da coadjuvação profícua de tão brilhante chefe. Desejo que melhore o seu estado de saúde, a fim de que continue a prestar seus serviços ao Governo do Estado e da República".

Pouco depois, ainda por motivo de saúde, solicitou reforma do serviço ativo da Brigada Militar, no posto de Coronel graduado, visto não haver mais do que um coronel na mesma força estadual. O Governo do Estado fê-lo incluir no Almanaque da Bragada entre os coronéis ativos, vistos receber vencimentos deste posto.

A par de sua vida de soldado, "honrado, valoroso e dedicado, que nunca mediu sacrifícios para o integral e exato cumprimento de seus deveres", conforme seu assentamento militar, o coronel Juvêncio desempenhou, ainda, importantes comissões, como as de Intendente Provisório e, posteriormente Intendnte eleito dos municípios de Bagé (duas vezes) e Livramento, bem como a de subchefe de Polícia do Estado, na mesma cidade de Livramento.

Os acontecimentos políticos locais, que culminaram com a anulação da eleição de 11 de Fevereiro de 1909, fizeram com que o Governo do estado provesse a administração de Bagé, para evitar a acefalia. Assim, pelo Decreto nº 1459, de 11 de abril, resolveu nomear um intendente provisório, que exerceria as funções de intendente, convocaria eleições municipais e exerceria as funções do Conselho Municipal.

Depois, em 1929, para contornar nova crise política, seu nome foi outra vez lembrado. As eleições desse ano foram abjeto de recurso, apresentado ao Tribunal de Apelação do Estado, pelos candidatos do Partido Libertador, Drs. Luiz Mércio Teixeira e Carlos Kluwe. Acirrados estavam os ânimos políticoa. No âmbito estadual, se formava a Frente Única, e havia necessidade de levar a união até os municípios, não podendo, por isso, continuar a luta local. Oswaldo Aranha, vindo a Bagé, promoveu a pacificação, que concluía com a retirada dos recursos interpostos, a renúncia dos membros do governo municipal, e a eleição de um intendente republicano, do agrado das duas correntes, um vice-intendente libertador, cinco conselheiros libertadores e quatro republicanos. Quando da escolha do intendente, foi apresentado o nome do Dr. Adolpho Luiz Dupont, com o qual não concordou uma forte corrente maragata, integrada pelo jornalista Fanfa Ribas e pelo Dr. Cândiso Gaffrée. Levado o caso à presença do Presidente do Estado, Dr. Getúlio Vargas, reunidos os chefes políticos locais, nasceu o nome do Coronel Juvêncio Maximiliano Lemos como o capaz de aglutinar todos os grupos, dado o prestígio que gozava em nosso município, pelas suas qualidades pessoais.

Candidato da Frente Única, foi eleito e empossado em 3 de março de 1930, e tendo apoiado o movimento revolucionário de 3 de outubro, foi em 1º de dezembro de 1930 confirmado no cargo como Prefeito, em cujo lugar permaneceu até 8 de novembro de 1932.

Sua gestão foi muito proveitosa para os negócios municipais.

Na cidade de Pelotas, onde fixou residência depois de reformado, exerceu ainda os cargos de diretor do Colégio Municipal Pelotense e provedor da Santa Casa de Misericórdia. Não obstante o seu precário estado de saúde, o coronel Juvêncio prestava, nos últimos anos, seus serviços a vária instituições sociais e culturais dessa cidade, fazendo parte de suas respectivas diretorias.

Muito jovem, com vinte e um anos incompletos, casou em Bagé, com D. Gertrudes Jardim Lemos.

Faleceu na cidade de Pelotas, em 12 de janeiro de 1952.

Em complemento poderíamos dizer com o apoio em informações de seu neto tem. cel. Inf. QEMA Juvêncio Saldanha Lemos: Seu avô viveu na Coxilha do Fogo em Canguçu até os 19 anos onde era inspetor de quarteirão. deixou Canguçu num cavalo zaino para participar da Revolução, sendo Logo destacado para integrar a Brigada Militar. foi ferido no sítio de Bagé com um projétil de fuzil que perfurou-lhe o pulmão. Ao falecer, a imprensa de Pelotas deu ampla e justa cobertura ao fato (40). A última homenagem lhe foi prestada pela Santa Casa de Misericórdia da qual era "irmão Grande Benfeitor" através da palavra de Miguel Soares da qual destaco este trecho:

"Coronel Juvêncio Lemos. Nobre amigo. Devotado companheiro. Felizes os que partem como tu, deixando uma copiosa lista de benefícios, uma comovedora esteira de saudades. A tua personalidade foi sempre a mesma: inalterável, ao serviço do Dever, da Honra e do Bem. Até nas campanhas políticas que torcem e desfiguram os homens, tu, comandando forças governistas, combatendo os rebeldes norteados por um ideal diverso do teu, nunca deles merecestes uma palavra de censura ou menosprezo. Eras até aí o cavaleiro "Sans peur e sans reproche" (41).

O coronel Juvêncio Lemos, ao qual Canguçu até hoje não homenageou, talvez por desconhecimento de sua naturalidade, deixou descendentes (42).

O Batalhão de Polícia Rural Montada em Santana do Livramento que organizou e foi o primeiro a comandar chama-se Batalhão Coronel Juvêncio. O Museu Davi Canabarro possui objetos que lhe pertenceram.

Nota : O Coronel Juvêncio é patrono de cadeira na AHIMTB e muito de suas ações descrevemos em artigo Os 80 anos da tomada de Pelotas por de Zeca Neto em 1923

Preservadores da Memória de Canguçu

Na foto a seguir na parte superior, o Cel Genes Gentil Bento e sua esposa e estimuladora Conceição(D.Noca) Monteiro Bento que promoveu a vinda a Canguçu em 1912 do jornalista J.Simões Lopes Neto( hoje patrono de cadeira na AHIMTB) que produziu monografia de grande relevância para a elaboração deste trabalho, além de haver preservado e transmitido a seu filho abaixo ,valiosas fontes da História de Canguçu. Na parte inferior Conrado Ernani Bento que colecionou anotou , preservou e transmitiu ao autor fontes históricas que em conjunto , estruturaram significativamente Canguçu reencontro com a História,razão de sua consagração como patrono da ACANDHIS.

Nota : Depois da edição Canguçu reencontro com a História em 1983 foram produzidas outra obras históricas que inventariamos a seguir:

BENTO,Claudio Moreira.Canguçu –síntese histórica. São Lourenço do Sul: Prefeitura Municipal de Canguçu/ACANDHIS,1991. Apresentação pelo prefeito Nelson Edi Grigoltti.

(_____).A Real Feitoria do linhocânhamo do Rincão do canguçu 1783/89.São Lourenço do Sul –localização.São Lourenço do Sul: Prefeitura Municipal de Canguçu/ACANDHIS,1992.

(_____) Conrado Ernani Bento.Rio de Janeiro: Ed/autor , 1988.Distribuida na Fundação da ACANDHIS.

(_____).Canguçu 200 anos. Resende-RJ: GBOEx/ACANDHIS, 2000.Prefacio do cel Omar Lima Dias ,presidente do GBOEx.

(_____).Os 200 anos da igreja Matriz N.S da Conceição de canguçu 1800/2000.Resende-RJ: ACANDHIS,1999.

(_____).Piratini um sagrado símbolo gaucho farrapo.Resende:

(_____).Antologia do CIPEL .Publicou assuntos de interesse de Canguçu anos 1993,1994,1995,1996,1997,1998,2.000,2002 e 2003.

(_____).(Organizador) ACANDHIS -Revista dos 200 anos de Canguçu.Resende-RJ ACANDHIS,2000.Com artigos dos seguintes membros da ACANDHIS ou convidados apresentados em ordem alfabética:ADÂO JESUS M. PEREIRA,ADRIANO TELESCA MOTA,ALDA MARIA DE MORAIS JACCOTTET,ALLIETE MARTINS RIBEIRO,AMILTON VALENTE DA SILVEIRA, ANGELO PIRES MOREIRA, ANNA LUIZA OLIVEIRA DE S.TOMAZ,ANTONIO CARLOS de S .OLIVEIRA, ARMANDO ECIQUO PERES, BASÍLIO DE$ WS> BARBOSA, CAIRO MOREIRA PINHEIRO, CARLOS EUGÊNIO MEIRELES ( SARAVÁ), CARLOS NORBERTO MOREIRA( in memoriam), CECILIA REGO( irmã franciscana),CERES DA ROSA GOULARTE, CLAUDIO MOREIRA BENTO, CLAUDIO NELSON FONSECA,CONRADO ERNANI BENTO NETO,DARCY SOARES DE FREITAS , DOMIRIO CAMARGO, ÉLIDA DE ÁVILA CANEZ, FLAVIO AZAMBUJA KREMER, GILBERTO MOREIRA MUSSI, GLADIS H. GOULART, IVETE POSSAS DA SILVEIRA, JARDEL VALENTE MOREIRA, JOSÉ LINO DIAS, JOSÉ MOREIRA BENTO, LAEDI BACHINI BOSENBECKER, LÚCIO NEWTON PRESTES, LUIZ CARLOS VALENTE DA SILVEIRA, MARIA DA GRAÇA VALENTE DA SILVEIRA, MARIA HELENA FONSECA RODRIGUES, MARIA DE LOURDES BRANDÃO JORGE, MARLENE BARBOSA COELHO (in memoriam), MOACYR PEREIRA DE MATTOS, NELSON EDI GRIGOLITTI, NILSON MEIRELES PRESTES, NORMA ROCHA, ODILON DE ALMEIDA MESKÓ ,OSORIO SANTANA FIGUEIREDO, ROSENDA BARBOSA TELESCA, SEBASTIÃO RIBEIRO NETO, VANJA ROCHA WISKOW, YONNE MEIRELES PRESTES, YONNE MARIA SHERER BENTO e ZOMAR M. DE OLIVEIRA.

BOSENBECHER.Laedi Bachini,História de Canguçu ditatico escolar.Canguçu: Ed da autora,1989.

JACOTTET,Alda Maria Morais. Caderno de Genealogia.Ostinadas famílias de canguçu-RS (Livro de batismos n º 1 B de batismos 1813-1819..Pelotas: Ed autora, 1999,Prefácio de Marlene Barbosa Coelho)

NEVES, Ilka Guittes.Canguçu-RS Primitivos moradores ,primeiros batismos 1800-1813 . Pelotas: Editora Universitária, 1998.Prefacio de Claudio Moreira Bento).

Nas fotos a seguir alguns destaques canguçuenses; Eneas Gonzaga Moreira abolicionista e co- fundados da primeira biblioteca de Canguçu .André Leão Puente destacou-se no magistério estadual e foi co- fundador da primeira biblioteca de Canguçu. Cel Juvêncio Lemos .Foi prefeito de Bagé e Livramento Organizou o 4 º Batalhão da Brigada em Pelotas .Dr Luiz Oliveira Lessa foi o primeiro canguçuense a formar-se em Medicina, alvo mais preciso juizo. Foi prefeito de Piratini para onde levou seu parente também canguçuense Dorvalino Lessa, mais tarde destacado prefeito de Piratini e hoje patrono de cadeira na Academia Piratiniense de História onde na inauguração de sua cadeira em 17 abril 2004 no antigo Palacio da República Rio Grandense, recordamos esta preciosa lição comunitária que então deu.

Logo depois da Contrarevolução de 1964 ele foi procurado por um grupo político que procurava com um delegado am tiracolo a fazer repressão de politicos tido como " "subversivos" .Perguntado se em Piratini havia subversivos respondeu ; Em Piratini nos somos uma família muito unida e a nossa roupa suja nós lavamos em casa.E os aproveitadores seguiram em frente.Este é o ambiente que sempre sonhei para minha comunidade de que a amisade e o respeito esteja acima ,mas muito acima de questões de natureza poíltica. Pois como pode se deduzir deste trabalho os canguçuenses integram hoje uma grande familia de bisnetos,trinetos etc de muitos dos fundadores de Canguçu . Que a lição do canguçuense Dorvalino Lessa em Piratini esteja sempre presente na memória dos canguçuenses hoje uma grande famllia unida por laços de sangue armados nestes 200 anos de Canguçu.

E com estas palavras encerramos este trabalho que esperamos seja util as gerações de Canguçu usuarios da INTERNET

FIM

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