CENTENÁRIO DO PRESIDENTE EMÍLIO MEDICI (1905 - 1985)

Alberto Cláudio de Oliveira Weirich

"Passou pela vida pública com escrupulosa honorabilidade pessoal. Só ele, com suas normas tão simples quanto o cotidiano de um esquadrão de cavalaria, governou (o País) até o último dia exatamente como anunciou que faria na primeira semana". Estas palavras estão redigidas pelo jornalista Elio Gaspari em seu livro A ditadura escancarada. Esta passagem retrata fielmente a grandeza de espírito do General Médici.

Nascido em Bagé aos quatro dias do mês de dezembro de mil novecentos e cinco. Filho de Emílio Médici, comerciante de origem italiana e de Scylla, descendente de ricos estancieiros de família basca espanhola. Levou uma vida modesta e manteve uma família exemplar com sua mulher e com seus dois filhos.

Ingressou, em 1918, no Colégio Militar de Porto Alegre. Em abril de 1924, matriculou-se na Escola Militar do Realengo, no Rio de Janeiro, então Distrito Federal, sendo declarado aspirante-a-oficial da arma de Cavalaria em janeiro de 1927. Designado em seguida para o 12º Regimento de Cavalaria, com sede em Bagé. Em outubro de 1930, ao ser deflagrado o movimento revolucionário para depor o presidente da República Washington Luís, servia como oficial-de-dia e, juntamente, com a totalidade das tropas do Regimento, aderiu à revolução, atuando como elemento de ligação entre os conspiradores civis e militares da cidade. Em 1932 voltou a comandar efetivos do 12º Regimento de Cavalaria, dessa vez para combater a Revolução Constitucionalista, deflagrada em julho daquele ano em São Paulo em oposição ao governo central e sufocada em outubro pelas forças legalistas.

Em 1937 foi designado ajudante-secretário na Escola de Estado-Maior, no Rio. Em fevereiro de 39 matriculou-se na Escola de Armas, atual Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais. Em setembro foi transferido para o 8º Regimento de Cavalaria Independente, em Uruguaiana. Em fevereiro de 1940 voltou à Escola de Armas como auxiliar-instrutor, sendo em junho de 43 promovido a major. Concluindo o curso de estado-maior em março de 1944, em maio seguinte foi designado para o estado-maior da 3ª Divisão de Cavalaria, em Bagé, exercendo a chefia de diversas seções até assumir a chefia do estado-maior da Divisão. Em junho de 1948 foi promovido a tenente-coronel e em janeiro de 50 transferido para o quartel-general da 3ª Região Militar, sediada em Porto Alegre.

Em 1953 atingiu o posto de coronel e no mês de setembro foi nomeado comandante do Centro de Preparação de Oficiais da Reserva de Porto Alegre.

Quatro anos depois, a convite do então comandante da 3ª Região Militar, general Artur da Costa e Silva, assumiu a chefia de seu estado-maior. Em fevereiro de 1960 foi designado subcomandante da Academia Militar das Agulhas Negras. Em julho de 61 foi promovido a general-de-brigada e destacado para o comando da 4ª Divisão de Cavalaria, com sede em Campo Grande, MS.

O destino ofertou-lhe uma satisfação ímpar na carreira de um soldado: o Comando da Academia Militar das Agulhas Negras, em janeiro de 1963. Em sua passagem por esta Escola, ademais de seu profícuo labor administrativo, ressalto o episódio, que marcou indelevelmente os destinos do País: a Revolução Democrática de 31 de Mar de 1964. O general Médici foi um dos primeiros chefes militares que se definiu a favor do movimento contra-revolucionário. A sua decisão de empregar a Divisão de Ensino para assumir pontos sensíveis na cidade de Resende e o Corpo de Cadetes, para ocupar uma posição defensiva, na Via Dutra, com o objetivo de retardar o avanço das tropas do I Exército, evitou um inútil derramamento de sangue. A sua liderança e a sua atitude, ao viabilizar uma reunião entre os comandantes das forças oponentes, em vias de enfrentarem-se, fizeram com que imperasse o bom senso, que culminou com o retorno das tropas para os seus quartéis. Dessa reunião saíram engrandecidos, não só o General Médici, mas, também, os comandantes do I e do II Exércitos. Após a vitória da Contra-Revolução o Gen Médici assim se dirigiu aos seus subordinados: "Como é imperativo nas situações de emergência que, por dever de ofício, vez por outra têm de enfrentar as Forças Armadas, a atitude histórica tomada pela Academia Militar das Agulhas Negras foi fruto de acendrado espírito patriótico, de profunda reflexão e do reconhecimento de suas grandes responsabilidades no panorama nacional". E de modo especial ao Corpo de Cadetes: " Cadetes: pela História, atingir os umbrais da glória!".

Posteriormente, em junho do mesmo ano, foi designado para exercer a função de Adido Militar junto à Embaixada do Brasil em Washington. Obteve, em julho de 65, sua promoção a general-de-divisão.

Em outubro de 66, seu ex-Cmt, o General Costa e Silva foi eleito pelo Congresso, Presidente da República, e logo em seguida colocou o General Médici na chefia do Serviço Nacional de Informações.

Em março de 1969, foi promovido a general-de-exército e, pouco depois, nomeado para o comando do III Exército, sediado em Porto Alegre. Em seu discurso de posse, declarou que "o povo não é contra o que a revolução fez, mas sim contra o que ela deixou de fazer".

Foi eleito, pelo Congresso Nacional, Presidente da República em 30 de outubro de 1969 em substituição ao General Costa e Silva que apresentou problemas sérios de saúde. Exercendo tão digna função até o dia 15 de março de 74.

O primeiro ano do governo Médici caracterizou-se por uma intensa radicalização dos movimentos de esquerda que haviam optado pela luta armada contra o regime instituído em 64. Após o primeiro seqüestro de um diplomata estrangeiro, um embaixador norte-americano, a polícia e as Forças Armadas redobraram suas atividades, concentrando os esforços no combate às organizações subversivas.

Entre 1968 e 1974, a economia brasileira sofreria uma notável expansão, refletida no crescimento acelerado do Produto Interno Bruto. O período, que ficou conhecido como do "milagre brasileiro", seria marcado por taxas de crescimento excepcionalmente elevadas, que foram mantidas, enquanto a inflação, "controlada e institucionalizada", declinava.

No início de julho de 1970, o Presidente Médici criou o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA). Em meados de agosto, Brasil e Paraguai assinam acordo para a construção de uma hidrelétrica - a maior do mundo a ser localizada em Sete Quedas, no Rio Paraná, na divisa entre os dois países. Além disso, foi criado o Programa de Integração Social.

 

No dia 1º de setembro de 1970, deu início à construção da Transamazônica. Ao mesmo tempo, o Exército começou a construção de sua longitudinal, a Cuiabá-Santarém. Ainda em setembro, o presidente lançou oficialmente o Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral) e anunciou uma série de medidas destinadas a integrar a Amazônia, fato que demonstra sua visão prospectiva sobre área vital do território nacional, criando o Estatuto do Índio, a institucionalização do Projeto Rondon e a execução do Projeto Radam, de levantamento aerofotogramétrico da região.

 

Durante a sua gestão presidencial ocorreu, também, a ampliação do mar territorial para duzentas milhas e foi inaugurada a transmissão de tv em cores.

Ainda em seu Governo, o Presidente Médici foi o responsável pela "reforma do ensino", estabelecendo a fusão em um único curso de oito anos - o primeiro grau, dos antigos cursos primário e ginasial. O segundo grau adquiriu mais um objetivo: capacitar o aluno para o exercício de uma profissão especializada. Para os dois níveis foram instituídos a obrigatoriedade do ensino de educação moral e cívica, educação física, educação artística e programa de saúde. Além disso, concretizou o projeto da Cidade Universitária, na ilha do Fundão, pertencente à Universidade Federal do Rio de Janeiro.

A última obra de vulto inaugurada pelo Presidente Médici foi a ponte Presidente Costa e Silva, ligando o Rio a Niterói, em 4 de março de 1974.

Após deixar o governo, recusou convites para assumir candidaturas legislativas e cargos públicos. Faleceu na cidade do Rio de Janeiro no dia 9 de outubro de 1985 aos 79 anos de idade.

Exemplo de estadista, pela sua elevada capacidade administrativa ao conduzir o desenvolvimento do País, e de soldado, pela simplicidade de suas ações, patriotismo, e pelo seu arraigado sentimento de cumprimento de missão; o General Médici deixou-nos um legado de amor ao Brasil. Foram mais de cinqüenta anos de sua vida dedicados ao País. Desde a entrada na Escola Militar do Realengo, em 1924, até a passagem da faixa presidencial ao General Ernesto Geisel, em 74.


Nota da AHIMTB: O autor é tenente-coronel da Arma de Comunicações, formado pela AMAN em 1985. É mestre em Ciências Militares com ênfase em Política de Defesa Nacional pela Escola de Comando e Estado-Maior do Exército e Graduado em Letras/Espanhol e respectivas literaturas pela Associação Educacional Dom Bosco, Resende, RJ. Atualmente, exerce a função de instrutor-chefe da Seção de Ensino "A", Cadeiras de Geografia e História Militar da AMAN. E acadêmico da Academia de História Militar Terrestre do Brasil(AHIMTB) onde ocupa a cadeira que tem por patrono o General Cordolino de Azevedo, professor de História Militar da Escola Militar do Realengo e da Academia Militar das Agulhas Negras por 25 anos , Este seu trabalho foi lido para os Cadetes da AMAN em formatura geral no dia 15 de novembro de 2005.