A PARTICIPAÇÃO DE IMIGRANTES EUROPEUS VETERANOS DA
 1ª GUERRA MUNDIAL NA REVOLUÇÃO DE 1924 EM SÃO PAULO


Cel Cláudio Moreira Bento(X)

 

                                

 

         Na madrugada de 5 de Julho de 1924, irrompeu na capital São Paulo a Revolução de 1924, contra o governo do Presidente Arthur Bernardes.

         Esta Revolta desdobrou-se em duas fases. Na primeira os revoltosos ocuparam a capital São Paulo e algumas cidades  paulistas,. Na segunda fase, forçados por tropas legais deixaram a capital E mais tarde se uniram  os revoltosos gaúchos e os paulistas e formaram a Coluna Miguel Costa/ Prestes que durante dois anos  marchou através de Brasil.

          O confronto na capital São Paulo das tropas legais com os revolucionários sob  a liderança do General Isidoro Dias Lopes foi violentíssimo e aterrador.

         Depois de 22 dias de resistência em São Paulo, os revolucionários embarcaram em trem rumo Bauru. E forçados atravessaram o Paraná e estabeleceram entre Catanduva e Guará uma linha de defesa onde resistiram três meses. E a seguir  teve curso a Coluna Miguel Costa/ Prestes.

          No combate aos revoltosos no Paraná, o Gen Ex Armando Luiz Malan de Paiva Chaves, ao estudar o Relatório do Destacamento Malan, comandado por seu avô General Alfredo Malan D´Angrone, teve sua atenção despertada  pelo informe de um prisioneiro de que um Batalhão de Alemães, composto de veteranos da 1ª Guerra Mundial, formava a vanguarda revolucionária, e abundantemente equipados de fuzis e metralhadoras. E continuou pesquisando a presença de imigrantes europeus.

         Em realidade, os revoltosos procuraram reforçar suas forças com o concurso de imigrantes europeus, de preferência  veteranos da 1ª Guerra Mundial, conforme  se concluiu da História de Revolução de 1924, na  História de Exército Brasileiro – Perfil Militar de um Povo, publicado em 1972 v.3, p. 905/919 e no livro A Noite da Grande Fogueiras de Domingos Meireles (Ed. Record 1995). E que cada batalhão teria  recebido uniformes, armas e munições. E seus oficiais seriam escolhidos em função de documentos de seus países atestando haverem  ocupado postos militares em seu país.

                                             

                                             O Batalhão Húngaro

         Que o Batalhão Húngaro era comandado por Maximiliano Ágid e foi baseado  na Av. Tiradentes n° 15. Seus soldados, teriam  recém chegado ao Brasil e de diversas profissões e inclusive Paul Harmath, jornalista em São Paulo, e ex-correspondente de Guerra na 1ª Guerra e que tinha entre suas missões, enviar para jornais europeus notícias de Revolução. Constava que havia também Adalberto Kardos, ex-detetive da Polícia de Budapeste.

         Dos 122 que teriam se alistado no Batalhão Húngaro, 13 seriam oficiais com alguma experiência em combate.

         A missão inicial que teriam recebido  seria  a de policiar São Paulo, a cavalo, e proteger o patrimônio público, impedir saques no comércio e vigiar casas abandonadas por seus moradores, A Colônia Húngara de São Paulo era de cerca de 6.000 habitantes distribuídos nos bairros da Lapa e Vila Pompéia.

 

                                   O Batalhão Alemão

 

         O Batalhão Alemão foi localizado próximo ao Batalhão Húngaro e passou a ser denominado Batalhão Patriótico da Colônia

Alemã.

         Seu comandante era João Joaquim Tuchen que junto do Capitão Arnaldo Kuhn se comunicariam  com o Batalhão em português. E que toda a documentação do Batalhão teria sido  escrita em Alemão.

         E logo teriam sido enviados para missões de combate. O mecânico Edvald Bremesk, chefia a seção de metralhadoras. Gerhard Najes  veterano da Artilharia Alemã, seria  o responsável pela manutenção dos canhões da Revolução.

        Segundo um informe, o Batalhão Alemão possuía 650 homens, sendo 200 alemães, 80 italianos e os restantes 370 eram brasileiros.

         O General João Francisco que passou a ser conhecido como a Hiena do Cati, no comando de seu modelar quartel na fronteira em Santana do Livramento , escreveu ao Capitão Tavora depois da derrota revolucionária em Três Lagoas

“ Queira aceitar e transmitir a seus  comandados, esses intimoratos alemães e aos não menos bravos italianos que com os nossos estoicos e temerários patrícios constituem a sua coluna”

       Uma companhia deste Batalhão ao ter a oportunidade de atravessar o rio Paraguai de navio, desertou para o Paraguai e somente dois oficiais da Companhia não teriam desertado.

 

                                            O Batalhão Italiano

 

         O Batalhão Italiano tinha como um de seus principais líderes Lamberte Sorrentino.         Seus integrantes, em sua maioria teriam sido anarquistas, propagadores de ideias libertárias, teriam vindo e Nápoles, Veneto, Cecilia e Calábria. 

 

  A motivação dos imigrantes para lutar pela Revolução de 1924

        

            Os anarquistas teriam participado por questões ideológicas. Mas a maioria recém chegada ao Brasil teria sido atraída pela remuneração.

          Um capitão receberia 30 mil réis por dia. Um tenente 25 mil e um soldado 10 mil. Para estimular o ânimo do imigrantes mercenários,  o Comando Revolucionário teria lhes adiantado 20 dias de soldo. Teria cabido aos imigrantes cavarem fossos anti carro para conterem os carros de combate recém  recebidos pelo Exército,.

 

                A Contribuição dos imigrantes europeus

 

         Oficiais revolucionários adaptaram com blindagem, um trem na Estação da Luz, com o concurso de um engenheiro húngaro e técnicos alemães. E teriam ido mais longe, ao  montaram um carro de assalto, sobre a carroceria de um caminhão Ford.

         Com o concurso de mão de obra estrangeira os revolucionários teriam fabricado granadas e munição de Artilharia nas oficinas de ferrovia de São Paulo.

         O comandante Agid do Batalhão Húngaro, teria supervisionado a fabricação de bombas incendiárias.

         Os engenheiros alemães Kerlen e Nicolau Kotchetoff teriam comemorado  orgulhosos as suas contribuições técnicas.

         O Tenente Eduardo Gomes, observador aéreo de Artilharia, levantou vôo no Campo de Marte, a bordo de um avião Oriole, pilotado  pelo europeu. Carlos Arder. Aeronave Oriole testada por dois pilotos veteranos da 1ª Guerra Mundial, um alemão e um italiano Lucio Gordenes, incorporados ao serviço de Aviação das Forças Revolucionárias.

         Aviadores legais e revolucionários sobrevoaram São Paulo, mas não houve nenhum bombardeio.

Reações da Alemanha e do Governo Brasileiro contra os                    imigrantes mercenários

- Os alemães teriam ficado preocupados com a ameaça estampada na primeira página do Jornal do Commercio, no qual o Consulado alemão lembrava aos nacionais "que, de acordo com a legislação da Alemanha, perdem a nacionalidade alemã todos aqueles que aceitarem emprego de um Governo estrangeiro ou entrarem no Serviço Militar de potência estrangeira".

O Consulado já se manifestara contra o envolvimento cada vez maior de alemães com o movimento revolucionário. No início, fora uma advertência, uma condenação meramente formal, de natureza ética e sem ameaças, um convite aos alemães radicados em São Paulo ,a fazerem uma reflexão sobre a atitude que estavam tomando. Desta vez, o Consulado ameaçava castigar os integrantes do Batalhão Alemão com a perda da  cidadania.

Com base na montanha de documentos que os revolucionários abandonaram ao deixar a cidade, a Polícia instaurou dezenas de inquéritos. O Governo aproveitou a situação para mais uma vez denunciar o envolvimento dos imigrantes com o movimento revolucionário.

 Com base nas provas recolhidas em vários endereços da capital paulista, foram reativadas as denúncias de que os revolucionários haviam contratado mercenários estrangeiros para matar soldados brasileiros.

 A mesma acusação fora feita durante a ocupação de São Paulo. O general Isidoro viu-se moralmente obrigado a esclarecer, através dos jornais, que não estava utilizando a experiência de artilheiros estrangeiros para atirar contra as tropas do Exército.

As guarnições dos canhões dos revolucionários, de acordo com a nota oficial assinada por ele, era formada exclusivamente por brasileiros, em  sua maioria oficiais do próprio Exército que haviam aderido à Revolução.

A Polícia também acusou os revolucionários de terem contratado pilotos mercenários, como Alberto Comeli e Lúcio Gordines, italianos, Fritz Roesler, alemão, e Carlos Herdler, tchecoeslovaco, para prestar serviços à aviação rebelde...

A morte dos oficiais alemães Ende, Kannegiesse e João Mentzel ,em Campo Japonês, durante a batalha de Três Lagoas, em Mato Grosso, foi  também explorada pelo Governo, para provar que os rebeldes não têm escrúpulos em continuar pagando estrangeiros para matar brasileiros...

As acusações se escudavam na documentação apreendida pela Polícia. Uma carta do engenheiro alemão Henrique Hacker ao general Isidoro mostrava, por exemplo, o nível de envolvimento de alguns prósperos representantes da colónia alemã com o movimento revolucionário...

O volume de documentos sobre a participação de imigrantes era tão grande que o Governo decidiu instalar um IPM só para investigar a participação de estrangeiros Revolução.

Tradutores juramentados foram contratados para classificar e traduzir a papelada recolhida nos quartéis dos batalhões rebeldes.

Os primeiros interrogados foram  os imigrantes presos ainda em São Paulo e os que caíram prisioneiros em Campo Japonês.

 A Polícia descobriu que a maioria dos combatentes não éra  formada por soldados profissionais, mas por um exército de desempregados, muitos extremamente jovens, como o doceiro Wilhelm Stuff, de 18 anos, de nacionalidade alemã, ferido por estilhaço de granada, e o iugoslavo Jacob Tescho, também de 18 anos, camponês, há pouco mais de seis meses no Brasil.

 Muitos tinham sido empurrados para as fileiras rebeldes não só por suas ideias anarquistas, mas pela fome e o desespero.

O ex-garçon austríaco João Dugaesek, 37 anos, desempregado e com a mulher doente, foi um dos 24 estrangeiros que cavaram trincheiras e lutaram contra o Governo em troca de comida.

Alguns eram apenas descendentes de imigrantes, como Reinaldo Husemann, 18 anos, brasileiro filho de alemão, que se alistou como voluntário para combater nas trincheiras da Avenida Paulista com a Rua da Consolação. Só uns poucos tinham sido  militares e lutado por seus países durante a Primeira Guerra Mundial.

Cada unidade foi investigada separadamente por um delegado especial com a ajuda de um tradutor juramentado.

 Ao se debruçar sobre a contabilidade do Batalhão Húngaro, encontrada no número 15 da Avenida Tiradentes, o tradutor teria arregalado os olhos, com ar de espanto, e começado a falar sozinho, em voz alta. A expressão do rosto seria de perplexidade.

- Mas o que é isto? Gyla Hegedues é um dos maiores astros da Hungria, membro do Grande Teatro Vigazinhaz, de Budapeste!

 Anatole Holub é um campeão de luta romana! Alajos Herceg é o nome de um conhecido meu, comerciante em Budapeste!

 Gabor Corponli e Gedeon Radar são homens públicos do meu país!

O delegado Alfredo de Assis, que preside o inquérito, não teria acreditado no que acabara de ouvir. A lista de pagamento de soldos do Batalhão Húngaro éra um deboche. O comandante Maximiniano Agid não passaria de um aventureiro internacional, espertalhão sem escrúpulos que enganara os revolucionários com uma lista de falsos combatentes.

 Agid teria  superfaturado as despesas com seus homens plantando 33 soldados-fantasmas na folha de pagamento do batalhão, para ficar com a diferença.

 A farsa de Agid fora descoberta por acaso pelo intérprete, ao examinar a lista de estrangeiros alistados entre os combatentes húngaros.

 Agid teria chegado  a incluir na relação de soldados sob seu comando romancistas, um rei do século XV, Maryas Kiraly, bailarinos, foragidos da justiça e nomes de lojas comerciais, repartições públicas e cidades de veraneio da Hungria

A lista de combatentes transforma-se em mote para piadas contra os revolucionários.

O Presidente Arthur Bernardes teria usado  o escândalo para tentar, mais uma vez, desmoralizar a Revolução. Além de ridicularizar o general Isidoro Dias Lopes, ao divulgar que este fora ludibriado por um vigarista, o Governo teria aproveitado  a oportunidade para denunciar que a Revolução estáva cercada por uma "gang" de mercenários e aventureiros internacionais,

A bibliografia citada contem mais detalhes da presença e mortos em combate e em especial do Batalhão Alemão assinalados pelo General Armando  Luiz de Paiva Chaves em pesquisa que nos entregou

 

(x) Historiador Militar e Jornalista Presidente da FAHIMTB